Sorriso Insano escrita por LoneGhost


Capítulo 8
Mentalmente doente


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem do capítulo...
e boa leitura ^^



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Abri os olhos, acordando e me senti um pouco tonta. Estava em uma cama e percebi estar no quarto de Thomas, então me sentei. Olhei para o canto e lá estava ele, sentado no chão, afiando o machado com uma pedra de amolar, me olhou e voltou a amolar o machado. Minhas mãos ainda estavam sujas de sangue e minha boca estava com um gosto extremamente horrível. Já era tarde e já estava começando a ficar bem escuro, deixando o clima muito bizarro. Em cima do baú que tinha me escondido, havia um pequeno prato e uma vela em cima, acesa, trazendo um pouco mais de claridade.

—Que horas são?- perguntei.

—Acho que quase seis da tarde.- respondeu olhando para o machado.

Essa era uma das piores partes, nunca sabíamos a hora exata. Me lembrei do que ocorrera antes.

—Você me trouxe para cá?- perguntei.

—É óbvio- ele respondeu.

—Quando Jeff vai chegar?- me lembrei do que ele havia dito de irmos matar.

—Ele não disse exatamente quando.- disse Thomas.

Saí da cama e me agachei perto dele. Ele olhou para mim.

—O que você quer?- perguntou.

—Thomas, eu não posso fazer isso. Mal consegui matar o...

—Não posso fazer nada a respeito.- ele me interrompeu.- Eu disse que não seríamos amigos.

—Por favor, me ajude.- coloquei minhas mãos nas dele.

Ele observou meu gesto e não reagiu de forma muito boa, se afastando um pouco mais, o que me fez perguntar quando tivera seu último contato físico afetivo com alguém. Talvez não se lembrasse nem de como seria o conforto de um abraço de verdade.

—Entenda, Wendy...- disse voltando a amolar sua arma.- Se deseja acabar com Jeff como quer, precisa fazer isso.

—Acha que é por isso que estou aqui? Acabar com Jeff?- perguntei.

—E não era isso que havia dito?- falou calmo.

—Isso era antes de saber que estava presa em ilusões criadas por Slenderman.

Ele não respondeu, só voltou fazer o de antes. Não me importei. Peguei minha mochila, que estava no pé cama, com minhas armas e tudo que estava lá e comecei a sair do quarto.

—Wendy.- disse Thomas.

Me virei para ele e em um raio de segundos, o vi pulando em cima de mim com o machado para bater em minha cabeça. Consegui me esquivar a tempo antes de ele me acertar, e bater o machado no chão.

—Seus reflexos são ótimos.- ele disse.

—Seu louco.- respondi ofegante e coração acelerado.

Não entendi que diabos ele queria com aquilo que fez.

—Eles estão vindo, Wendy. Eles estão em todos os lugares.

—Me deixe ir, Thomas.- o ignorei.- Você não é meu amigo, não precisa de mim e nem eu de você. Se eu morrer, que seja.

—A verdade é que... não posso te deixar ir.- admitiu.

—O que?- perguntei.

—Não é só pelo fato de Jeff esfolar minha pele se eu fizer isso. Eu não aguento mais viver sozinho. Você pode não ser melhor companhia, mas a solidão é a pior punição. Não fomos feitos para ficar sozinhos, nem a pior das pessoas.

—Então por que não fugimos?- perguntei indignada, gesticulando com as mãos.- Thomas, isso não é viver. Por que se recusa a fugir?

Ele me analisou por um tempo, provavelmente pensando em uma resposta.

—Por que já me acostumei com isso. Minha família não existe mais. Todos que eu conheço estão mortos. Eu estou morto.

Eu realmente não o entendia. Por um lado, desejava ficar, por outro, desejava partir. Não queria ser meu amigo, mas queria minha companhia. Não estava preparado para a vida normal.

—Não importa.- eu disse.- Eu realmente queria que partíssemos juntos, queria poder te salvar, te levar para uma vida fora dessa loucura toda.

—Ninguém pode me salvar.- ele disse.

Não respondi, simplesmente comecei a andar para a porta. Passei pela sala que estava com tochas nas paredes que eu não havia visto antes. Seu fogo iluminava meu caminho. Abri a porta e olhei para trás, onde Thomas me olhava sem expressão. Senti uma pontada em meu coração, de medo, de tristeza e raiva. Olhei para frente e observei a floresta escura, iluminada apenas pela luz da lua, fazendo tudo ter um tom prateado. A brisa bateu perigosa e friamente em meu rosto, fazendo meus cabelos voarem para o lado. Engoli em seco.

—Adeus, Thomas.- falei.

 

 Dei mais um passo e fechei a porta atrás de mim. O vento soprou mais forte. Gemi de medo e pensei em voltar para dentro no mesmo instante, só de me lembrar de Slenderman, Jeff e qualquer outra criatura que pudesse ter ali. Pensei que não cumpriria minha vingança, mesmo que fosse uma ilusão. Mas tomei o fôlego e comecei a andar para a densa floresta, e em segundos, estava entre as árvores. Não sabia para onde deveria ir, mas tomei o caminho que tinha feito para chegar no chalé. Pensava em voltar até onde estava a estrada em frente à casa e esperar um carro passar por ali para me dar uma carona, e certamente perguntaria o motorista “Oh, o que uma garotinha como você faz numa hora dessas em uma floresta escura?” e provavelmente, eu responderia “Só estou fugindo do cara surreal que assassinou minha mãe, mas acho que você não acreditaria em nada, então, só me leve à cidade, por favor” e o motorista provavelmente também seria um assassino, que me mataria e me tiraria logo desse mundo. 

Me perdi nos pensamentos e continuei andando, pisando em galhos e folhas secas. Esperava que alguém pulasse na minha frente e me impedisse de ir embora, ou que me assassinasse logo. Minha mãe me veio à cabeça e comecei a chorar lembrando-me dela. Sentia falta dos seus abraços, e com certeza, nós deveríamos estar rindo naquele momento em nossa casa. Queria estar nos braços de meu pai, ou jogando no video game com meu irmão. Eu chorava alto e as lágrimas rolavam por minhas bochechas. Somente a luz da lua iluminava meu caminho e os olhos cheios d’água atrapalhavam minha visão.

 

 Andando, percebia que não chegava a lugar algum (talvez o choro realmente estivesse confundindo minha direção). Tentei organizar minhas memórias e me lembrar onde estaria a saída. De repente, comecei a ouvir algo... uma voz.

Wendy...

Sussurrava e se mostrava suave. Era irreconhecível e não prestei atenção em seu gênero... mas era totalmente atrativa. Vinha da minha esquerda e comecei a segui-la. Quanto mais eu andava, o sussurro ficava melhor de se ouvir. De repente, cheguei a um ponto em que parei de escuta-la. Olhei para os lados, para cima e para baixo e não havia ninguém. Imaginei estar louca e logo me estremeci pensando em Slenderman. Olhei para todas as árvores tentando identificar alguma coisa. Nada.

—Quem está aí?- perguntei.

—Vire para trás.- a voz disse.

Vire-me e vi uma garota de cabelos castanhos escuros e olhos verdes, parecia ter minha idade e se parecia estupidamente comigo, como uma irmã gêmea. Estava ali em minha frente, um clone meu, como se eu estivesse olhando para um espelho, mesmas roupas, mesma mochila, mesma expressão de horror na face. Olhei o fundo de meus olhos e vi aquela criança despreparada para viver, despreparada para o mundo, com olhos tristonhos e olheiras já fazendo parte de si. Cheia de sangue seco nas roupas e desesperada para encontrar uma saída. De repente começou a falar comigo.

—O que está fazendo aqui?- tinha a mesma voz que a minha.

—O-O que...

—Não posso ir para casa.- e sua (ou minha) expressão ficava cada vez mais depressiva.- Não posso! Não posso...

—O que está acontecendo?- perguntei com as mãos na cabeça, me sentindo louca.

—Eles estão vindo. Eles estão em todos os lugares!- meu reflexo disse com as mãos na cabeça como eu.

—Quem?!- gritei.

—Eles!- meu clone gritou de volta apontando para trás de mim e sumiu, se desfazendo em vapor no ar.

Não me virei, apenas corri sem direção alguma. Me cortei em galhos, caí no chão e me levantei, mas não parei de correr. Não ouvia ninguém atrás de mim e mesmo assim eu corria, tentando alcançar alguma coisa, tentando alcançar um lugar inexistente.

 

 Parei ofegante e suada, mesmo estando frio. Meu coração estava acelerado e minhas pernas estremeciam. Me inclinei e coloquei as mãos nos joelhos tentando recuperar o fôlego. Respirava alto e rápido. Me endireitei e olhei para cima.

—O QUE ACONTECEU COMIGO?- gritei.

—O que aconteceu com você?- disse uma voz na minha frente, saindo das sombras das árvores.

A figura encapuzada e com a maior aura de negatividade que já havia sentido ficou de pé em minha frente. Havia me encontrado novamente com Jeff. Comecei a tremer e o fiz por Jeff estar puxando um corpo pelos cabelos. Não queria olhar para ele, mas era inevitável. O corpo já parecia estar em decomposição, como se Jeff o tivesse desenterrado de algum local. Não olhei para o rosto, ou vomitaria, como já estava quase acontecendo, e além disso, as sombras da noite o deixava quase irreconhecível. O cadáver estava podre e podia sentir seu cheiro horrível de onde eu estava. A pessoa parecia estar cinzenta e já mutilada. Sentia o olhar de Jeff sobre mim, mas eu não olhava para ele. Não conseguiria olhá-lo depois de ver aquele corpo mutilado em suas mãos, não conseguiria olhá-lo lembrando-me de tudo que ele fazia.

—Me responda.- ele disse.

—E-Eu...- falei balançando a cabeça e gaguejando.- Estou... confusa.

—Confusa?- soltou o cabelo da pessoa e começou a ir em minha direção.

Não sabia como estava sua expressão, mas sua voz soou irônica. Ele chegou na minha frente, estando a alguns centímetros longe de mim. Eu olhava para seus pés, sentia sua respiração e sentia seu cheiro. Sua calça estava coberta de sangue, assim como seu moletom. Ele esticou sua faca para mim, e no primeiro momento, pensava que fosse me atacar, mas ele logo disse:

—Desconte sua confusão em alguma coisa.

Engoli em seco. Hesitei um pouco mas peguei sua faca, a clássica faca. A faca que foi usada para fazer um corte em meu rosto, a faca que Jeff usara para assassinar seus pais e seu irmão, a faca que já tirara tantas vidas, a faca usada para fazer aquele sorriso maldito sorriso no rosto daquele maldito assassino, e que agora estava em minhas mãos. Ele saiu de minha frente, abrindo caminho para eu chegar até o corpo. Comecei a andar indo em direção a ele. O vento fazia o cheiro de morte chegar às minhas narinas e eu ia fazer aquilo de novo. Mas aquela pessoa estava morta, eu tentaria aliviar minhas dores naquilo. Fui rapidamente em direção ao corpo e segurei a faca com as duas mãos. Comecei a fincar a faca desesperadamente sobre a barriga, e o sangue jorrava sobre o chão e meu rosto. Batia a faca por tudo aquilo e pensava em tudo que estava acontecendo, na minha vida maldita, na morte de minha mãe, em Thomas, e tudo, pensava em tudo. Atingia diversas localidades do tronco e atingi muitos órgãos. Pegava a faca com uma das mãos e segurava o corpo com a outra, batendo-a em vários pontos não mutilados ou que eu já tivesse esfaqueado. Estava descontando tudo naquilo e estava gostando. Coberta de sangue, parei de bater no corpo.

—Ótimo.- disse Jeff se aproximando.- Agora vamos deixar essa pessoa bonita.

Finalmente olhei para ele e seu rosto estava como antes, insano. Ele sorria de forma macabra e seus olhos atravessavam minha alma. Levantei-me e sorri para ele, automaticamente, como se fosse uma doente mental.

—Como?- perguntei.

—Um sorriso, é claro!- exclamou sorrindo.- Precisamos dar um sorriso para ela! Ela parece muito triste, não acha?

—Eu posso fazer isso.- falei e quase me virei.- Mas me diga uma coisa antes, quem é essa pessoa?- perguntei.

Ele hesitou um pouco para responder, mas sorriu e disse:

—Sua mãe. Eu costurei a cabeça dela no pescoço de novo. Pensei que você fosse gostar.

Parei de sorrir. Não pensei duas vezes e me virei para ver o rosto da pessoa, que ainda não tinha visto. As sombras das árvores, tais como a escuridão, não me deixavam ver direito a face então me abaixei e toquei os cabelos. Olhava para o rosto e meus olhos e adaptaram à escuridão. Era mesmo a minha mãe, totalmente mutilada e horrível, e havia feito aquilo com ela. A cabeça estava quase desgrudando do pescoço, e eu podia ver  algumas linhas finas passando sobre ele, como quando levamos ponto do hospital. Eu havia feito aquilo com seu corpo, algo que deveria ser respeitado e guardado. Eu estava me tornando como Jeff, estava me tornando um monstro, e não havia para onde correr. Virei lentamente meus olhos na direção de Jeff, que sorria monstruosamente e parecia gostar daquilo.

—Gostou de fazer isso?- perguntou-me.-  Eu também fiz isso com a minha mãe. Logo você fará muito mais.- disse agachando-se ao meu lado.- E vai me deixar orgulhoso!

Eu não parava de olhar para minha mãe.

—Vou te ensinar a esculpir o sorriso perfeito.- ele disse pegando minha mão que segurava a faca.

Eu estava trêmula e senti a pele daquele psicopata tocando a minha, rasgando a pele do rosto de minha mãe. O que eu faria, Deus?

Engoli o grito. Queria berrar mais do que nunca, queria mostrar o que o mundo estava fazendo comigo, mas não podia. Toda a raiva e mágoa que descontara no corpo, voltara duas vezes mais pesado para mim, como se carregasse um fardo que não saia nunca de minhas costas. Cada vez mais me tornava como meu “mentor”. Cada vez mais me tornava um monstro.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por chegar até aqui.
Nos vemos no próximo capítulo.



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