Proposal escrita por wldorfgilmore


Capítulo 2
Capítulo 2




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 As estradas de terra do Vale do Café faziam o carro de Darcy pular constantemente por entre as pedras e buracos que apareciam durante todo o seu trajeto. Gruniu, aquilo o incomodava de uma forma que ele não sabia exemplificar em palavras calmas e educadas. Era acostumado ao afasto de Londres, e definitivamente, aquilo poderia apresentar-se como uma antítese as estradas suntuosas de sua cidade natal. Enquanto dirigia quase sem pausa com o intuito de otimizar o seu tormento, amaldiçoava o dia em que teve a ideia de expandir o complexo ferroviário que seu tio iniciara em campinas para os campos do Vale do Café.

Apesar de apresentar o planejamento de forma inspiradora aos sócios de seu pai, com o objetivo de obter o financiamento necessário, Darcy não calculou que seria obrigado a instruir o andamento da obra de forma presencial. Suspeitava que se por um momento aquilo divagasse por sua cabeça, nunca teria idealizado o empreendimento.

Seu destino era a fazenda Ouro Verde, infelizmente, em sua visão, sua mais nova residência, onde parte de sua família se instalara quando o projeto desenvolvido na região começou. Apesar das pragas que jogava em si mesmo, sentia falta de sua família. Darcy se recordava que eles haviam se dirigido ao Brasil quando o menino era muito pequeno e, apesar de voltarem para Londres com uma certa frequência em algumas das férias que se davam como empreendedores, o pequeno não teve mais contato com aquela parte da família, já que fora enviado para um colégio interno no Sul da Inglaterra e por muitas vezes se desencontraram em seus recessos. Só Felisberto, tio de Darcy, conhecia o sobrinho depois da vida adulta, já que ambos, como economistas e responsáveis pelos negócios da família, marcavam reuniões em Londres com certa frequência. Ofélia e as primas eram só uma visão distante de Darcy.

Contudo, a ansiedade em encontrar sua tia Ofélia e rever seus parentes não eram suficientes para Darcy amenizar o sentimento crescente de estresse que ele se encontrava. Não gostava de estradas de terra, não gostava do cheiro que as árvores em conjunto produziam, tampouco suportava os mosquitos que zuniam em seus ouvidos. Sua vida era as casas noturnas de Londres, seus bares requintados e movimentados, suas lojas preferidas na avenida central, seu cafés e chás com homens de negócio e não reuniões com operários e pessoas fofoqueiras em cidade pequenas. De fato, estava sendo preconceituoso em seus dizeres, mas fora ensinado que cidades pequenas caminhavam da forma com que agora estereotipava e não duvidava nem por um segundo do fardo que seria sua vida de agora em diante. Uma das únicas certezas que tinha era que, com a conclusão da construção, voltaria no primeiro navio para a sua amada cidade desenvolvida.

Darcy desceu do seu carro assim que avistou o grande portão da fazenda Ouro Verde, já dentro das instalações da fazenda. Foram necessárias três batidas na porta para a governanta recebê-lo.

— Pois não? - disse Teresa, ao olhar para o grande homem a sua frente.

— Sou Darcy Williamson, acredito que essa seja a Fazenda Ouro Verde, não? - ele carregava duas malas nas mãos.

— Oh, Lorde Williamson. - Teresa fez uma reverência desajeitada, Darcy franziu a testa, mas sorriu de forma educada. Aquelas pessoas tinham modos estranhos. - Entre.

Ao assentir com a cabeça, Darcy adentrou a grande sala. Por um momento, estranhou os móveis antiquados que o ambiente interno revelava, era de uma diferença exorbitante a sua mansão na Inglaterra. Ele limitou-se a ficar de pé enquanto Teresa dirigiu-se ao escritório de Felisberto para anunciar sua chegada. Não demorou muito para ouvir a voz familiar do tio.

— Oh, meu sobrinho. - Felisberto se aproximou. - É um prazer enorme revê-lo e recebê-lo aqui, em nossa casa.

Darcy e Felisberto trocaram um contido abraço. Darcy sorriu.

— O prazer é todo meu, meu tio. Eu é que agradeço por a recepção.

— Não há o que agradecer, a casa agora também é sua.

— Admito que é diferente da nossa residência em Londres, mas me parece bem aconchegante.

— Não seja cortês. Eu entendo que não é nada comparado a vida que levava em Londres e entendo também que haverá um tempo de adaptação. Mas tenho certeza que irá gostar do ares do Vale do Café. Essa é uma terra muito rica.

— É o que os investidores e papai me disseram. E torço que todos vocês estejam certo. - disse de forma educada, não queria ser deselegante com o Felisberto. Sua fala respondia mais a questão da riqueza da região do que da habituação ao convívio naquelas terras. Ele duvidava muito que se acostumaria com a falta de tudo que tinha.

Seus pensamentos foram interrompidos por uma voz esganiçada - e bastante conhecida - que surgia ao fundo com mais quatro mulheres, imaginava que aquelas seriam parte de suas primas.

— Darcy! - a tia o chamou um tanto alto. Ele riu.

— Minha tia! - Darcy abraçou a matriarca. - Quanto tempo não a vejo!

— Que sobrinho desnaturado este meu. Era tão apegado a titia quando criança e olha só, há mais de 20 anos não o vejo. - lembrou, dando um tapa leve no ombro do menino.

— Desencontros da vida, minha tia. - exclamou, com um sorriso aberto. Estava realmente feliz em revê-la. - E vocês devem ser… - ele voltou-se às primas.

Ofélia colocou a mão na cabeça, como se lembrasse de algo.

— Que tola sou, deixe-me apresentar parte de suas primas. Não conheceu algumas delas, não? Três nasceram aqui no Valé. - Darcy concordou com a cabeça. - Essa aqui é Jane.

Ofélia apontou para a loira com rosto angelical, que o cumprimentou com um leve aceno de cabeça. A sua tia continuou:

— Essa é Cecília e Lídia, as nossas mais novas. - as duas fizeram o mesmo movimento que Jane, sorrindo para ele de forma simpática. Eram três mulheres lindas. Darcy voltou o olhar para a quarta benedito e um reconhecimento genuíno nasceu em seus olhos. - E essa você conhece, é nossa Mariana. Ela tinha apenas 4 anos quando saímos do Vale do Café.

— Lembro bem de meu primo pentelho. - Mariana disse, rindo. Darcy acompanhou sua risada. Apesar de não brincarem com frequência, Darcy sempre se deu muito bem com a prima.

— Como poderia esquecer? - ele disse ao oferecer-lhe um abraço. - Que mulher linda você se tornou. - elogiou. - Não só você, mas todas as outras. Sou bem afortunado com as primas que tenho. Com o convívio, posso fazer o papel de irmão chato que escolhe a dedo seus pretendentes. - brincou. O clima do ambiente tornou-se tão ameno que Darcy até esqueceu do fardo que criara em sua cabeça.

Mas os pensamentos logo foram roubados por um estalo que apareceu em sua mente. Ali haviam quatro das Benedito-Williamson e a presença marcante como a que lembrava com bastante precisão não se encontrava naquela sala. Inconscientemente, Darcy olhou para os lados. Ofélia, astuta e bem perceptiva, seguiu o olhar de Darcy e logo lembrou do elemento faltante na sala.

— E falta Elisabeta, claro. Sempre falta Elisabeta. Elisabeta é do mato, não para nem por um minuto dentro de casa. - reclamou, olhando para o sobrinho que erguia a sobrancelha.

— Continua da mesma forma? - Darcy comentou, com uma curiosidade crescente acerca da prima.

— Sem tirar e nem por. Elisabeta vai ser a mesma até que complete um milhão de anos.

Darcy riu, acompanhado de todos no local. Elisabeta tinha uma presença tão impactante que até hoje o homem se lembra da prima. Mas não de forma saudosa. Elisabeta era um dos motivos de Darcy sentir o fardo de voltar ao Vale do Café. Claro que sua memória não esquecera as brincadeiras quando criança, mas suas lembranças também não deixaram passar todas as brigas e implicâncias anotadas em sua mente consciente. E, se Elisabeta de fato tivesse a mesma personalidade de anos atrás, Darcy sabia que não seria fácil a convivência.

Sentir o vento bater em sua pele e bagunçar os seus cabelos era uma das coisas que Elisabeta mais sentia prazer em toda a sua existência. A sensação era como estar viva, era como voar. Ela sentia-se parte daquela natureza que tanto amava quando estava em cima de seu Tornado. E Tornado corria como poucos cavalos dali.

Vivia em cima de seu cavalo. O ganhou quando chegara ao Vale do Café, como um presente de seu pai para habituá-la a região. A menina chegou com certeza relutância, mas logo tomou todo o Vale para si e nunca mais conseguiu se imaginar em outra região. Agora sentia que o jardim de sua residência em Londres era pequeno demais para os campos largos que encontrou no seu lugar preferido do mundo.

Elisabeta era jornalista. Sua formação foi feita toda em campinas - e o trajeto da sua faculdade nas costas de seu cavalo -, apesar da vida rural que levava no Vale do Café, sempre gostou de escrever e quis levar isso para a sua vida. Ainda não trabalhava, apesar de escrever ocasionalmente para alguns jornais da região e conseguir algum dinheiro com aquilo. Estava fazendo um planejamento para abrir um jornal próprio na região.

Em meio a devaneios, logo chegou ao seu destino. Iria esconder-se dos Benedito-Williamson na casa de sua melhor amiga, Ema Cavalcante.

— Ai, Ema. Eu não aguento mais aquela conversa sem fim, aquela babação sem fim, aquele mesmo assunto todos os dias. - Elisabeta entrou no quarto de Ema sem ao menos bater.

— Bom dia pra você também, querida amiga. - brincou com os modos da amiga. - O que houve? - Ema estava penteando seus cabelos próximo a penteadeira.

— Darcy, Darcy, Darcy. É todo dia Darcy.

— O seu primo que irá vir morar com vocês na fazenda? - perguntou. Elisabeta já havia lhe contado parte da história.

— É esse mesmo. Não tem como conviver em uma casa em que o assunto é só a vinda de Darcy Williamson. O idealista da ferrovia que liga campinas ao Vale do Café.

— É uma bela obra. Precisamos admitir.

— Claro que é, Ema. Mas não há motivo para tal idolatração. - Elisabeta revirou os olhos, soltando todo o ar de sua boca.

— Acho que está sendo um pouco radical, minha amiga. E acho que isso se deve ao fato de vocês não se gostarem muito quando criança.

— Acho que a palavra é detestarem.

— Mas isso faz muito tempo, Elisabeta. - examinou, pensativa. - Ele pode ter mudado. Crianças são chatas mesmo.

— Mas ele era a criança mais chata do mundo. - tentava justificar, Ema sorriu. Elisabeta não tinha jeito, quando pegava implicância com alguém, aquela reclamação era eterna. - Quebrava tudo que era meu.

— Pois eu estou louco para conhecê-lo. - contrariou a amiga. - Seu pai já me disse que ele é um ótimo homem. E é um Lorde.

— Está interessada? - Elisabeta se jogou na cama da Ema. - Pois faça bom proveito, amiga traidora.

Ema caiu na risada, a expressão aborrecida de Elisabeta não conseguia ser levada a sério.

— Vai que é o amor da minha vida chegando para fazer meus dias mais felizes?

— Ai Ema, como você é brega! - Elisabeta fez careta.

— E você é uma sem coração. Claro que vou averiguar a carne, não sou boba e nem nada. E, minha querida, se pensa em fugir de sua família por todo o assunto em volta de Darcy, trate de enclausurar-se no meio da mata do Vale, pois este também é o assunto da cidade inteira.

— Como? - Elisabeta olhou de forma intrigada para Ema.

— Isso mesmo. - Ema levantou de sua penteadeira e sentou na cama, ao lado de Elisabeta. - Ontem fui ao centro da cidade e a questão que se debatia na Casa de Chá de Dona Agatha era: “quem seria a moça a conquistar o coração de Lorde Williamson?”

Elisabeta olhava para Ema boquiaberta. Sabia que ela e suas irmãs também eram a fonte de ouro dos homens de toda a cidade e seu pai fazia grandes entrevistas para possíveis partidos para elas. Mas Darcy era abominável demais para tal admiração. E duvidava muito que houvesse mudado de forma drástica, já que só assim ele poderia ser minimamente apresentável.

— Porque não o conhecem. Espere algumas semanas. - tratou de alfinetar. - Sem contar que pelo que me lembro, ele é noivo de outra prima minha. Que por sinal, é igualzinha a ele. - Elisabeta lembrou. E logo colocou a mão na boca. - Ai, meu deus do céu. Tomara que Briana não tenha vindo nas malas de Darcy. Se um já é horrível, os dois seria meu pior pesadelo. - fez drama, agora foi a vez de Ema revirar os olhos.

— Quanto drama, Elisabeta. - riu. - Mas sobre o noivado, as mulheres não parecem se importar. Agatha está mais por dentro da história que você. - disse de forma despretensiosa. - Neste mesmo dia, ela disse que investigou o boato e aparentemente, ainda não há casamento em seu currículo.

— Menos mal, menos um na minha casa. - disse prática.

— E mais chance de eu ou outra mulher daqui nos tornarmos uma Lady. - provocou Elisabeta. Ema não tinha a menor intenção de conquistar Darcy, mas já havia percebido o efeito da pronúncia que o nome do rapaz tinha sobre a amiga.

— Azar o de vocês - deu de ombros. - Imagina que carma enorme ser destinada ao casamento com Darcy Williamson? Ainda bem que convivo com a tranquilidade da impossibilidade de ser parte dessa lista. - Elisabeta deitou no travesseiro da amiga, com as mãos embaixo da cabeça, em uma expressão relaxada.


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