Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 32
O Ataque da Peralta Diabólica


Notas iniciais do capítulo

Olá!

Eu já disse alguma vez que escrever é meu maior ideal de vida terrena? Sim, eu assisti Anne com "E", e sim, admito que escrever histórias é tudo pra mim!

Bom, agora já me expressei, vamos ao capítulo do dia:

"Ele ficou em casa, com a promessa de arrumar tudo; elas foram se divertir, na esperança de uma tarde agradável. Será que as expectativas serão correspondidas?"



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No caminho para o shopping, Luisa falava com a amiga sobre o encontro das outras garotas no portão de sua casa mais cedo, e como tivera que inventar uma história maluca sobre estar vendo um filme para abafar os gritos histéricos dos dois, nos fundos da casa. Melissa, por sua vez, caiu na gargalhada.

—Não vai me dizer que elas ouviram os gritos enlouquecidos do Doutor?

—Não só os do Doutor, né dona Melissa? –repreendeu Luisa. –Um dia! Ele só passou um dia lá em casa e quase a rua toda já sabe da existência dele! Eu só espero que vocês dois se comportem daqui para frente...

Nós dois? E o que eu tenho a ver com isso? Sou a calmaria em pessoa... –ela disse com um sorriso abusado no rosto.

—A tempestade, você quer dizer?

—Luisa! Será que eu devo te lembrar de quem foi a idéia de chamar o “Maluco Beleza” lá pra sua casa?

—Não –disse Luisa, mordendo o lábio. –Mas eu sei que não fiz mal! Ele é um bom rapaz. Só é um pouco descuidado... Só isso! Todo mundo tem defeito...

—Mas ele, mais do que todo mundo, não concorda? –arriscou Melissa, ousada, cutucando a amiga com um grande sorriso acusador no rosto.

—Pare de ser pretensiosa! –riu Luisa, da cara de boba dela. –Você deveria mesmo levar a sério a hipótese de se tornar uma atriz... Ainda está com aquela idéia ridícula na cabeça, de virar uma sorveteira?

—Não sei. –ela disse pensativa, fazendo mais caras e bocas. -Só se for para usar o Doutor como alvo das bolas de sorvete em um parque de diversões...

—Você tem sonhos bem ambiciosos... –Luisa revirou os olhos. –Engraçado como o Doutor também faz parte deles, não é? –cutucou Luisa.

—Não me venha com essa! Não vá pensando que eu vou facilitar para o “profeta” , só porque ele salvou as nossas vidas uma ou duas vezes...

—Foram três ao todo. –interveio Luisa. –Fala sério, “Profeta”? Na real, de onde você tira todos esses “apelidinhos carinhosos”?

—Do meu dicionário de “apelidinhos carinhosos” que eu estou escrevendo... –ela tirou um mini-caderno do bolso e folheou-o: tinha várias páginas cheias com todos os nomes à que ela já se referiu ao Doutor; alguns ainda nem haviam sido usados.

Maníaco do Parque?—Luisa ergueu uma das sobrancelhas, ao ler o título por cima do ombro da amiga.

—É, é! Esse eu ainda não estreei, mas pretendo utilizá-lo em breve... Amanhã talvez –falou ela, guardando discretamente o caderno de volta no bolso.

—Melissa! Você é impossível... –riu Luisa.

—Corrigindo: Sou Improvável. Se lembra?  -ela esbanjou seu sorriso mais sedutor, sobressaltando o olhar sombreado, com os cantos puxados em uma pintura perfeita. Estava espetacular! Entretanto, ela interveio: -Eu ainda acho você não devia deixá-lo sozinho...

—Melissa! O Doutor não é uma criança...

—Apesar de agir como uma –completou Melissa. –Aham, sei.

—É. Mais ou menos. Mas de qualquer jeito... Vamos dar uma força pra ele! Quem sabe ele não acaba nos surpreendendo deixando a casa toda em ordem até antes das cinco?

—Ah, minha cara Luisa... Tão inocente... –cantarolou. –Sonhos até podem se realizar. Já milagres... Isso ninguém pode prometer! –ela disse e começou a rir, ao que Luisa revirou os olhos, e com isso, avistou o shopping ao longe.

—Vamos Melissa! Vamos seguindo em frente... Já posso ver o telhado do Shopping! –e as duas dispararam para lá, sem mais se demorarem nas conversas.

*   *   *

Em casa, o Doutor perambulava feito um zumbi, de um lado para o outro, procurando por onde começar a limpeza.

—O que está fazendo chefe? –perguntou Nik, o cão de Melissa.

—Estou vendo que você está fazendo bom uso do dispositivo de voz que eu instalei em você hoje de manhã...

—Pois é chefe! O que acha que a minha dona Melissa vai achar quando me ouvir falando pela primeira vez?

—Eu não sei: algo entre desmaiar e sair gritando. Pode escolher se quiser... –ele falou indiferente, subindo na mesinha de centro da sala para ter uma visão periférica de tudo. Fez uma moldura com os dedos, tentando enxergar tudo encaixado nela.

—Com todo respeito chefe, mas o que você está fazendo?

—Estou tentando ter uma visão dessa sala arrumada, através do caos existente nela... –após concluir sua experiência, ele pulou de volta ao chão. O movimento brusco fez um porta-retrato, sob a mesinha de centro, tombar para trás. O acontecimento repentino chamou atenção do Doutor. Em seqüência, o rapaz se voltou para o objeto, pegou-o em mãos e o observou: nele havia uma foto com uma menina e um menino brincando numa piscina. Sem dar muita importância para isso, o Senhor do Tempo recolocou-o sob a mobília, esfregou as mãos e voltou ao foco inicial. –Certo. Aonde eu estava mesmo...? Oh, sim: Organização caótica.

—Uh! Parece muito complexo. –o cão ficou muito sério. –Au! Vamos brincar de pegar com a minha bola! –ele saltou no colo do Doutor, que caiu sentado sobre o sofá.

—Argh! Bolinha de cachorro toda babada... Temos que dar um jeito nisso, amigão –disse o Doutor analisando o objeto cheio de saliva de cachorro, em suas mãos.

—Que tal começarmos com a geladeira? Parece bem bagunçada pra mim...

—Por Deus, não Nik! Não podemos mexer na geladeira... É a única parte inteira que ainda persiste na casa! Não. Definitivamente não mexeremos na geladeira!

O cachorro encolheu o corpo e baixou as orelhas, triste.

—Arrr! Tudo bem. Eu vou lhe dar só um biscoito de cachorro, mas é só isso! –o Doutor saiu andando e o cão correu atrás dele, fazendo festa.

—Oba! Você não irá se arrepender chefe! Eu prometo...

—Por que eu sinto como se estivesse sendo manipulado por um cão falante? –ele lançou a indireta para o animal, enquanto apanhava o biscoito. O cão nem respondeu, ficou hipnotizado pela refeição suculenta nas mãos do Senhor do Tempo.

—Eu não faço idéia chefe! –ele proferiu alegremente, abanando o rabo e preparando-se para dar o bote.

—É, mas eu faço –o Doutor arremessou o biscoito que o cão apanhou no ar, engoliu de uma vez... E parou. Esperando outro petisco. –Ah, não! Eu avisei que era só um. O que você pensa que eu sou? Uma máquina de biscoitos? Se quiser mais biscoitos, vá preparar os seus!—ele bateu o braço em cima da mesa, onde estava a caixa de biscoitos, que cambaleou e caiu no chão. O Cão correu feito um rojão na direção dos petiscos, enquanto o Doutor estapeava sua própria testa.

—Doutor burro! Doutor burro! Au!—gemeu ele ao bater muito forte, pela terceira vez, na própria testa.

—Ei chefe! Se controle! O cão aqui sou eu... –falou Nik, sem largar o posto em cima dos biscoitos.

—Tem razão... Eu vou pegar gelo... –o Doutor caminhou rumo à geladeira mais uma vez, mas escorregou em uma trouxa de roupa suja e patinou até bater a cara no frízer, ainda a pouco aberto. –Ai! Por que eu me sinto participando de um episódio dos três patetas?

—Porque o senhor é um palhaço, chefe? –sugeriu Nik. O Doutor lançou-lhe um olhar penetrante.

—Cale a boca e coma seu cereal! –reclamou o rapaz. No momento seguinte, a campainha tocou. –Ah! Mais essa agora... Quem poderá ser?

—Se for o carteiro, não mande ir embora! Ainda não tive a oportunidade de urinar nele essa semana...

O Doutor fez um sinal vazio com as mãos e seguiu para fora da casa, estressado. Porém, mudou logo a carranca quando viu de que se tratava. Parada ao portão da frente da casa, estava uma moça loira, cabelos presos num coque, olhos castanhos claros, roupas bem justas e um tanto provocativas. Ela portava um carrinho de bebê que estava coberto por um capote e esbanjava um sorriso irresistível.

—Olá. Eu sou Beth. A vizinha da rua de cima. Enfim, Sally Jackson disse que haveria gente em casa hoje para tomar conta da Mika...

—T-Tomar conta? –ele gaguejou. –Mas ninguém me avisou de nada disso...

—Pois é, foi meio de ultima hora. É que eu preciso sair urgentemente! Eu bem que tentei, mas não há outra casa onde deixar a minha queridinha! Sally disse que sua filha Luisa e dois amigos estariam em casa à minha espera. Acho que não devo estar enganada, afinal, você está aqui...

—É. Acho que eu estou... –ele sorriu meio sem jeito, fechando a camisa que estava meio desabotoada. A mulher não tirava os olhos dele. O Doutor mudou de assunto, sem graça.

—Bem, vai deixar a sua cachorrinha aqui então? Mika, não é? Caramba, parece que o Nik se deu bem, no fim das contas... –disse ele, já balançando as chaves do portão na fechadura, para deixá-la entrar.

—Mika não é o meu cão! –disse a mulher aparentemente ofendida. –Mika é a minha filha!

O Doutor franziu o cenho.

—Como é?

—Dentro do carrinho... –indicou a mulher com o dedo. O Doutor saiu para a calçada e caminhou até o carrinho de bebê, fechando a capota deste e vislumbrando logo abaixo, uma menininha perfeitamente saudável, que começou a chorar ao vê-lo aparecer. –Está vendo? Mika é uma menina! Agora, trate de cuidar dela! Digo, por favor... Que eu tenho muito que fazer... –a mulher se retirou apreçada para o outro lado da rua, deixando o rapaz sozinho com a criança. Entretanto, quando o Doutor se deu conta de que teria que olhar a menina sozinho, já que Luisa e Melissa deram no pé, saiu correndo tentando alcançar a mulher, já no fim da rua.

Não! Espere... Ninguém me falou nada sobre cuidar de crianças! Isso não estava no script! Calma aí! Você ainda não me disse...—ele parou no ato, quando a mulher terminou de virar a esquina, desaparecendo de vista, sem nem ao menos olhar para trás. –... Seu nome. Puxa! Isso que é um tipo super maternal... –disse sarcástico, correndo de volta para perto do carrinho.

Ao se aproximar, percebeu que a criança balbuciou alguma coisa, então se abaixou para vê-la mais de perto.

Oh! Mais que bebezinho bonitinho... Ai!—a criança jogou o chocalho contra o rosto dele. O Doutor afastou-se indignado, massageando o olho atingido. –Você me paga seu pequeno Dalekzinho!

A menina deu uma gargalhada bem infantilizada, se animando com a cara amarrada dele.

—Ei! Você ta rindo de quê? Não sou eu que tenho uma mãe maluca que pôs o nome da filha dela de “Mika”!-reclamou ele rebocando o carrinho da calçada. -Humanos! Sempre inventando moda...

Ele guiou o carrinho até dentro do jardim, empurrando-o depois até os fundos da casa (porque seria difícil subir os degraus da porta de entrada, com aquele carrinho), então rumou até a cozinha, onde estava Nik à sua espera, abanando o rabo euforicamente e cheio de migalhas de biscoitos espalhadas nos pelos. A refeição parecia ter sido boa. Pelo menos alguém parecia estar se divertindo enquanto tudo aquilo acontecia.

*   *   *

No shopping, as coisas estavam indo relativamente bem. Quando chegaram ao ponto de encontro (a bilheteria do cinema) encontraram todos os integrantes do seu circulo da amigos da escola, saindo para encontros grupais ou, somente em casal. Luisa logo foi bombardeada pelas amigas que lhe disseram que Ned já estaria para chegar. Como foi que elas perceberam tão rápido o interesse dela, no garoto? Bem, afora esse pequeno detalhe, o passeio estava agradável, com todos falando a sua versão de “como foi incrível e calorosa a experiência de recomeçar a semana sem ter que aparecer na escola, só para variar, já que todos já haviam completado o ensino médio”. É claro que esse foi o papo que mais rolou durante o dia. Luisa estava entretida com as amigas, quando avistou, a distancia, a prima Maria Jackson. Rapidamente, ela pediu licença à elas, e dirigiu-se correndo para a prima. Luisa ainda não tivera a chance de agradecê-la e perguntar como Maria tivera a idéia de acobertá-la enquanto ela viajava com o Doutor, dizendo à sua mãe que a garota estivera na casa dela o tempo todo. Isso a deixara um tanto intrigada, e Luisa não conseguiria sossegar até que tudo fizesse sentido.

—Oi! –Maria sorriu amigavelmente, depois abraçou a prima. –Eu passei na sua casa hoje cedo, mas achei melhor não incomodar...

—Que besteira! Até parece que você incomoda!—Luisa retorquiu. –Por que não me chamou no portão? Eu certamente viria correndo...

—Você parecia estar muito ocupada... –ela comentou. –O jardim estava em tons coloridos, pouco comuns, o cachorro de Melissa estava roxo, salpicado de bolinhas amarelas e havia fumaça, nos fundos da casa...

—Azul com bolinhas amarelas, na verdade... –Luisa lembrou-se da confusão de mais cedo. –É verdade. Você deve ter aparecido na hora que a frigideira pegou fogo...

Como é que é?—indagou Maria, incrédula. –A frigideira pegou fogo?

—É... Uma longa história que eu farei questão de te contar depois... –Luisa contornou a situação. –O que eu preciso muito fazer agora, é falar com você sobre isso—e mostrou-lhe a mensagem do celular que Maria lhe enviara no dia anterior, pouco depois deles aterrissarem com a TARDIS, em casa.

—Ah! Você recebeu minha mensagem a tempo! –ela alegrou-se. –Então, parece que conseguimos evitar um conflito...

—Um conflito? O que você quer dizer com isso?

O quê? No que você estava pensando? “Que voltaria numa boa e sua mãe não teria percebido nada?” –Maria arqueou uma das sobrancelhas. –Eu sei que é uma máquina do tempo, e tudo mais, mas você tem que saber que o Doutor nem sempre acerta voltar na hora certa... Ontem ele atrasou um dia, mas e se depois ele atrasar uma semana? Pense, Luisa! Nós temos que estar preparadas...

Luisa olhou para os dois lados, com cautela: não queria que ninguém escutasse sua conversa com Maria.

—Mas como você conseguiu pensar em tudo isso? –ela sussurrou. –Foi brilhante!

—Eu não vou mentir que foi tudo idéia da Sarah Jane... –Maria admitiu, sincera. -Ela disse que é assim que sempre acontece, e que eu deveria alertá-la contra possíveis imprevistos temporais... Afora isso, eu sou sua prima, e não poderia deixar você ser descoberta! Afinal, eu também ando por aí com Sarah Jane... Eu sei muito bem o que é isso.

O tio Alam não sabe de nada sobre vocês?—Luisa surpreendeu-se.

—O meu pai sabe de tudo! Basicamente, é minha mãe que fica sem saber das nossas aventuras... –Maria riu pelo canto dos lábios. –Você sabe como é a dona Chrissie: ela surtaria se descobrisse que eu estou ajudando a salvar o mundo com um grupo de adolescentes, um cão robô, um computador extraterrestre e uma jornalista, ex-viajante do tempo... Apesar de tudo isso, ela nunca nem ao menos desconfiou de nada. O fato é que, desde que meus pais se separaram, ela só vem aqui de vez enquanto, então nós sempre conseguimos contornar as coisas quando ela está por perto... E, devo admitir que o fato dela ser muito distraída ajuda bastante.

—Eu sei –Luisa riu, grata pela ajuda. –Valeu, prima! Nem sei o que eu teria feito para explicar as coisas, se não fosse você...

—É obvio que, se você quisesse continuar com isso, sua mãe não poderia ficar sabendo da verdade. Meu pai mesmo demorou a aceitar logo no inicio... E, não acho que você tenha que passar pela mesma situação. –Maria sorriu. –E, não foi nada. Mesmo. Só vê se não se esquece de dar realmente uma passada lá em casa, quando lembrar de voltar para Rua Bannerman...

Pode deixar!—Luisa abraçou-a novamente, então, de repente ela ouviu alguém gritar seu nome. Elas se separaram para conferir: As amigas de Luisa faziam sinal para ela se aproximar do grupo novamente. Aparentemente, Claire chegara com novidades e elas não queriam que Luisa perdesse uma só palavra. Sem perder tempo, Luisa agradeceu mais uma vez pela ajuda da prima, pediu que também agradecesse à Sarah Jane, prometeu visitá-los em breve, depois despediu-se de Maria e correu na direção das amigas.

A recém chegada Claire falava alguma coisa sobre uma garotinha nova, magricela, de óculos e um tanto tímida, que encontrara também a caminho do shopping. As duas pareciam ter chegado juntas. A outra estava perto dali, mas por algum motivo não específico, Raven e as outras pereciam descontentes com isso:

Mas quem é ela?—perguntou Raven à Claire pela terceira vez seguida.

É uma tal de Suzie Capitinga. Ela é nova na cidade e só tem o intuito de se juntar a nós para fazer amizades...—disse Claire, como se houvesse decorado um discurso.

—Tudo bem espertinha, ela mandou você dizer essa baboseira toda? Porque não colou! —cochichou Raven para a outra, com sua lixa de unha subindo e descendo nas pontas dos dedos.

—Não pessoal... É sério! Ela veio falando comigo sobre várias coisas. Dá pra notar na cara dela como ela é gente fina!

As meninas se inclinaram para ela e a garota fez cara de santinha, com direito a sorriso bajulador e tudo o mais.

—Eu não sei. Ela não parece ser “tão tímida” como você diz. –concordou Chelsea. -Esse jeitinho falso dela não engana ninguém...

—Eu sei gente. Mas talvez ela só queira um pouco de atenção –defendeu Violetta. –Vão por mim, eu sei o quanto é ruim ficar só...

—Mas não se trata disso –interveio Summer, grudada nos braços de Dillon. –Ainda não sabemos se ela é confiável o bastante para estar no grupo...

—Que tal assim: se vocês meninas chamarem ela para conversar? Depois que tiverem formado uma opinião sobre ela, vocês reclamam, criticam, descascam o inferno todo para cima dela! Não é mais fácil assim? –supôs Dillon, recebendo um monte de olhares reprovadores para cima dele. –Está bem! Estou vendo que não agradei...

—Gente –chamou Julie. –Ela tá vindo... Disfarcem!

Todas as garotas disfarçaram, fingindo estarem entretidas com alguma coisa. A única que se manteve no mesmo lugar foi Raven, que queria ter uma conversinha com a nova garota.

—Olá Capivara –sorriu Raven estendendo-lhe a mão, fingindo gostar dela.

—É Capitinga... –interveio a menina, sem graça.

—Tanto faz. Ah! Olha só... Sabemos que você é nova aqui, então pode ficar com a gente se quiser, mas não dê em cima de nenhum dos nossos rapazes, ouviu bem? Rá-rá! Como se você tivesse cara para fazer uma coisa dessas... Não é? Você não teria coragem... Teria?—sondou Raven, rindo primeiro, depois adotando uma postura muito séria perante ela.

—Eu... –Suzie ia começar a responder, quando Ned surgiu no recinto, vindo do outro lado do shopping, caminhando na direção da turma. Ele ainda estava muito distante, mas acenava alegremente para o grupo de amigos dispersos pela bilheteria do cinema com sucos, refrigerantes, batatinhas, chocolates e pipocas nas mãos. Conforme o garoto se aproximava, Luisa pôde ver que ele estava com seu estilo habitual: camisa xadrez azul (de três tonalidades diferentes, no mínimo), calça jeans, tênis pretos, cabelo penteado e mochila nas costas, com uma só alça pendurada no ombro. Ah! E um sorriso de tirar o fôlego, como já era de costume. A garota sentiu um frio na barriga quando ele já estava quase os alcançando.  

—É o Ned... –sussurrou ansiosa para Moze, ao seu lado. –Espere aí! O que eu faço agora?

—Tente ser o mais natural possível, e o mais importante: Não esqueça de respirar. –ela lançou-lhe um sorrisinho amigável. -Ele com certeza vai se amarrar no seu visual...

Luisa fitou-a por um instante, foi somente então que percebeu uma coisa estranha:

—Por que você está me ajudando? Quero dizer, pensei que tivesse terminado com ele...

—Terminado? Nós nem começamos! –riu Moze. –Entenda uma coisa Luisa: o Ned e eu somos só amigos. Sempre fomos. É claro que teve aquele lance do beijo na formatura, mas aquilo não significou nada. Na verdade, foi até bizarro! E acredite quando digo que os dois desfrutaram do mesmo sentimento... Na real, foi tudo no calor do momento. Eu pensei que havia sentido alguma coisa... Achei que devia ter certeza de que tudo não passava de amizade entre nós. Só quis comprovar isso e a resposta não podia ter sido mais objetiva. Não deu certo entre nós, mas veja pelo lado bom: estou com Cameron agora. Ned e eu continuamos a ser amigos, apesar do ocorrido, e o caminho ficou livre para vocês dois tentarem se aproximar. Quem sabe dá certo dessa vez...

—Desta vez? Como você sabe que já ouve outras tentativas? –Luisa abriu o jogo de uma vez. Aquelas garotas estavam sabendo demais para o seu gosto!

—Raven me contou do lance de vocês –esclareceu Moze, ao que Luisa lançou um olhar penetrante à Raven, que fingiu estar mais interessada do que nunca, na sua lixa de unha. Será que todo mundo tinha que saber daquilo?

—Então... –Luisa agilizou. O garoto estava agora cumprimentando os amigos, logo chegaria nelas. –Não estão ficando juntos porque não deu certo entre vocês, mas está me ajudando a ficar com ele?

—Não acredita nas minhas intenções? –indagou ela e Luisa corou, sentindo-se culpada por desconfiar da amiga. –Tudo bem. Não há problema algum nisso. Eu sei o quanto vocês se gostam, mas como isso nunca deu muito certo...

—Raven te contou isso também?

—Não. –riu a outra. -Isso eu notei por conta própria. –disse Moze e Luisa ergueu uma das sobrancelhas, intrigada. –Não me entenda mal... Acho que o Ned sempre deu certos “sinais” de que estava interessado em você... Afinal, você não achava que ele andava se distraindo demais nas aulas por qualquer motivo estúpido, não é? Ou que ele levava muito tropicão dos alunos nos corredores porque era muito distraído? Ou que acabava se atrasando para a primeira aula de toda quarta feira, só porque tinha perdido a hora? Quem você acha que ficava se arrumando todos os dias no banheiro masculino, mais do que uma pré-adolescente, antes das aulas começarem, só para impressionar uma certa pessoa?

—Calma aí... Isso era tudo pra mim?—disse Luisa incrédula. Para ser franca, até que agora aquilo tudo fazia algum sentido. Pena que ela fora lerda o bastante para não notar as investidas dele. Foi com o rosto enrubescido que ela prosseguiu: -Ele ficou louco? Poderia ter perdido o ano por minha causa!

—Está vendo? Ele sempre gostou de você. Se tinha alguma dúvida, agora isso acabou. –ela tocou-lhe o ombro, dando-lhe força. –Vá em frente que ele está vindo aí. Conversem bastante... Espero que dê tudo certo... –Moze sorriu amigavelmente.

—Obrigada –Luisa agradeceu. Suas pernas bambeavam um pouquinho. Moze cumprimentou Ned primeiro e depois se afastou, dando espaço aos dois. O garoto caminhou na sua direção, até ficar emparelhado com ela e Luisa lançou um sorrisinho tímido para ele.

—Oi –ele sorriu amigavelmente, e uma fileira de dentes perfeitos irrompeu de sua boca, contrastando com o brilho de seus olhos azuis oceano.

—Oi! –ela estava bastante nervosa, mas ainda assim continuava espontânea. –Como vai?

—Eu vou bem –ele disse, tentando esconder a ansiedade. –Nossa! Eu não te vejo desde a formatura...

—Pois é. Desde anteontem! –disse ela, como se já fizesse um século e meio que não se viam. Os dois riram do tom de humor usado por ela. Porquê mesmo Luisa sumira do baile? Ah sim! O Doutor. Não, espera! Tinha que pensar nele justo agora? Estava tentando ter o encontro dos seus sonhos...

—Já que falamos nisso, eu gostaria de me desculpar... –anunciou ele, meio sem jeito. -Eu queria muito ter falado antes com você, ainda na festa, mas eu não te encontrei em lugar algum, então a minha mãe chegou e... Bem, você sabe como são as mães! –ele disse lançado a ela um olhar divertido que Luisa retribuiu de boa vontade. –Enfim, eu só queria... –ele passava a mão na nuca, totalmente sem jeito. Era obvio que estivera se convencendo o caminho todo de que seria fácil conversar com ela, mas na hora H, perdera um pouco a coragem. Luisa achava-o uma graça, e o fato dele estar sem jeito na sua presença tornou-o ainda mais fofo.

—Eu queria dizer uma coisa... –emendou ela. Já não tinha controle total sobre suas ações. –Eu... –ela corou intensamente. –Eu também queria ter falado com você na formatura.

—Q-queria!? –gaguejou ele numa junção de empolgação e espanto. –É sério?

—Seriíssimo. –ela concordou, quase não podendo se conter. –Eu... Eu só não sabia ao certo como dizer...

—Eu também –ele interceptou-a delicadamente, de um jeito não rude. -Bom, eu pensei muito sobre isso. Na verdade passei a noite inteira em claro...

—Jura? –o coração dela foi a mil. Ela já sabia o que viria a seguir, mas tentou permanecer calma. Começou a brincar com um detalhe da saia, distraidamente, enquanto o ouvia falar.

—Eu nunca consegui dizer, mas eu te acho incrível! –falou ele de uma vez só. Os olhos dela cintilaram esperançosos.

Luisa deu uma olhadinha por cima dos ombros: de longe, as amigas fitavam-na com ansiedade, tentando captar um trechinho da conversa para saberem o que estavam falando. Elas não ficariam ali por muito tempo, pois o filme já ia começar e eles precisavam entrar na sala do cinema. Luisa não pôde deixar de sorrir e Ned virou-se para conferir o que ela tanto olhava.

—O que elas querem?  

—Estão de olho em nós –disse Luisa, segurando o riso. –Elas estão entre a cruz e a espada! Não sabem se entram na sala para ver o filme, com os garotos, ou se ficam aqui bisbilhotando nossa conversa. A curiosidade delas quase tem vida própria... Duvido que conseguirão prestar atenção no filme enquanto estivermos aqui.

Ned sorriu balançando a cabeça, como se dissesse: “Essas Garotas não tem jeito mesmo!”.

—Esqueci que garotas sempre fazem isso –ele riu. As outras meninas sorriram para Luisa, de longe, quando ele voltou-se para ela e fizeram sinais de positivo com os dedos, incentivando-a a continuar naquele caminho; Elas compraram os ingressos: teriam que entrar no cinema. Quando todas elas adentraram na sala escura, Luisa percebeu um clima diferente entre os dois. Ambos estavam bem mais soltos, e também, bem mais calmos. Embora o nervosismo só começasse a se dissipar, eles já tinham o controle de suas reações. Estava tudo se encaminhando bastante bem. Ned continuou falando: -Olha... Eu sei que pode ser meio precipitado de minha parte, mas...

Luisa sentiu a empolgação envolver seu corpo:

É agora! É agora!

Você aceitaria sair comigo hoje?—convidou ele, simplista. -Sabe? Podemos ver um filme e tudo mais...

O coração de Luisa explodiu de emoção. Ela quase não conseguiu controlar a respiração disparada. Tudo teria dado cem por cento certo se não fosse por uma interferência inesperada: Capitinga resolveu dar as caras.

—Caramba Ned! Eu adoraria! –começou Luisa, animada. Ele esticou o braço para ela segurar, quando foram interceptados.

É queridinha! Tenho certeza que sim...—a garota irrompeu entre os dois e passou uma rasteira em Luisa, derrubando-a de costas no chão.

Luisa!—gritou Ned. Depois se debateu, tentando se soltar dos braços daquela garota estranha que surgira do nada. –Me solta! Quem você pensa que é pra tratar ela assim? Eu já disse pra me soltar!—ralhou ele, surpreendendo a todos com sua atitude, ao tentar defender Luisa.

O quê? O quê está acontecendo? Vocês viram aquilo? Viram o que aquela menina fez?—gritos desesperados irromperam de todas as direções do shopping. As pessoas desconhecidas que estava perto dali assustaram-se com os movimentos bruscos na bilheteria. 

Luisa massageou as costas, ainda no chão: devia ter batido a cabeça de leve na queda, pois estava enxergando tudo embaralhado. Quando conseguiu finalmente enxergar de novo, deparou-se com a cena da garota “tímida”, nova no grupo, segurando firmemente os braços do garoto que ela gostava, fazendo um tipo de chave de braço nele. A expressão de dor em seu rosto era evidente, mas ela só reagiu quando ouviu-o resmungar:

Ai! Está me machucando... –gemeu, desconfortável, tentando se desvencilhar dela.

Luisa olhou-a mais atentamente. A garota parecia uma menina comum, mas havia algo de errado com seu rosto: as expressões dela eram vazias –como se não houvesse sentimento nela.

Solta ele!—gritou Luisa enfurecida, voltando a ficar de pé, enfrentando a outra cara a cara.

Melissa, que estava na lanchonete comprando alcaçuz e Coca-Cola, parou, derrubando a bandeja de guloseimas. 

Ah não! Lá vamos nós de novo... –ela disparou na direção da confusão, onde um grupo de curiosos iam se aglomerando, à certa distância do “evento”. –Luisa!

Luisa virou-se para a amiga, de relance, e a garota Capitinga aproveitou sua distração para mostrar-se ainda mais agressiva: Num piscar de olhos, arremessou-a com uma força brutal, em uma grande distância de onde se encontravam. Melissa levou as mãos ao rosto, horrorizada. Era evidente que o primeiro empurrão fora um aviso. O segundo, já era uma guerra declarada. Luisa, porém, não se deixou abater, nem amedrontar. Ergueu-se com dificuldade e caminhou vacilante na direção da rival –que agora ela tinha certeza –não podia ser uma humana normal.

—Calma... Podemos resolver isso de outro jeito... –começou, tentando negociar. Entrementes, Melissa correu para ampará-la.

Você foi reconhecida como Luisa Parkinson Guimarães Jackson. Acusada de ter afetando drasticamente o curso da história diversas vezes, utilizando-se de tecnologias cronologicamente à frente de seu tempo, e viajado pelo tempo e espaço. —falou a garota Capitinga, como se tivesse sido possuída. –Vim incinerar os causadores da desordem temporal! Interferências históricas não serão mais admitidas pela proclamação das sombras... Desobedientes das leis serão severamente punidos.

—O quê isso significa? –perguntou Melissa, confusa. –Não desobedecemos nenhuma lei! Não que eu saiba...

A garota virou sombria para Melissa, fitando-a com um ar assustador.

Você é Melissa Rivera Alcântara—falou a mesma, sem expressões. –Acusada de ter intimidado uma senhora idosa em 1703, em Pisa, e lutado contra interferência extraterrena há duas noites atrás. Estado atual: Viajante do Tempo. Sentença: Culpada!

Mas que palhaçada é essa?—disse Melissa, receosa, recuando junto de Luisa. –Você é tipo a polícia alienígena? Eu não sabia que éramos punidos por nos auto-defendermos de velhinhas esquizofrênicas desmioladas...

—Eu não entendo... –murmurou Luisa. –O que foi que eu fiz?

—Não se trata somente do que fez, mas também do que ainda irá fazer... –esclareceu a garota esquisita, depois de uma longa pausa.

—Como assim?

—Vocês são perigosas. Precisam ser detidas! A Teselecta foi atualizada. Agora qualquer um que interferir no curso da história será punido! Vocês são culpadas!

—Culpadas pelo quê? –indignou-se Melissa. –Por termos tirados umas férias prolongadas no espaço?

Interagiram com personalidades históricas. Reescreveram a história. Vocês tem provas que comprovam as acusações...

Luisa engoliu em seco, seu pulso tremeu.

—Está se referindo...

Precisamente, você mantém consigo um lápis Plano-Dimencional futurista, um colar de 1860, dado de presente pela própria Princesa Isabel, uma lasca de um vaso do Palácio São Cristóvão, também de 1860, uma bolsa que tem o interior maior que o exterior e um livro que nunca deveria ter estado em sua posse...

—Livro? Mas que livro? –indagou ela, confusa.

O Livro do Destino. –proferiu a criatura.

Luisa arregalou os olhos. Não sabia do que aquela coisa estava falando.

—Luisa! –Ned chamou-a e ela atendeu prontamente. –Fuja! Eu não sei o que essa coisa quer com você, mas com certeza não é nada bom... Saia daqui!

—Eu não vou deixar você! –interveio ela. -Como vai escapar depois?

—Eu dou um jeito, além do mais, não pode ser pior do que já está sendo... –retorquiu ele com urgência na voz. –Só mais uma coisa: O que ela quis dizer com “interferiram na história”? –disse ele de mau-jeito, preso contra os braços dela que mais pareciam duas chapas de aço.

—Eu... Eu não... –gaguejou Luisa. Ela não sabia o que dizer a ele. Qualquer confidencia na frente daquela criatura metida a policial poderia ser crucial para determinar a diferença de sua pessoa viva ou morta. Por isso, talvez fosse melhor não arriscar...

Muita conversa, pouca ação!—como se tivesse lido sua mente, a garota com voz possuída e expressões vazias, deu um giro, arrastando o garoto consigo. Quando ficou frente a frente com as duas meninas, encurralando-as contra o corrimão da fila da lanchonete, a criatura abriu a boca e liberou um raio sonoro que chocou-se contra um dos pilares que segurava o teto do shopping no lugar, e explodiu-o de uma vez só. As pessoas correram e gritaram por todas as direções. As duas meninas se abaixaram, rolando por baixo do corrimão e conseguiram fugir para longe. Todavia, no meio do caminho, Luisa parou e voltou-se para o ser, indecisa. Melissa puxou-a pelo braço, em desespero.

Vamos! Ou vamos acabar morrendo aqui!

—Não podemos deixar essa coisa solta por aí... Vai matar todo mundo! –grunhiu Luisa, exasperada. –E o Ned! Ele ainda está preso nas garras dela... –os olhos de Luisa brilharam, mais assustados que nunca.

Luisa, me escuta—Melissa disse, com urgência. –Temos que sair daqui agora!

Cuidado!—a voz de Ned ressoou por todos os lados, ao mesmo tempo que mais um raio sonoro chocou-se contra o ultimo lugar onde elas se encontravam.

Luisa caiu pro lado, sem reação –como se tivesse levado um balde de água fria no rosto. A questão ali era: Como aquela garota miudinha podia ter um ser dentro dela que estava rendendo o garoto por quem Luisa fora apaixonada secretamente desde o primeiro ano do ensino médio, além de estar pondo em perigo a vida de tantas outras pessoas que se encontravam no shopping naquele exato momento? Como? Qual era a lógica daquilo tudo?

—Socorro!!!—gritou Melissa exasperada, escapando por pouco de um novo sinal sonoro. Luisa sentiu medo. Um medo incontrolável, mas também raiva. Uma raiva que nunca sentira antes na vida... E que no fim, foi responsável por devolver-lhe a coragem. Inesperadamente, ela se ergueu, mais determinada do que nunca, e caminhou na direção daquela coisa. Porém, referiu-se a Ned, ao se aproximar.

—Me desculpe por isso... –ela disse, preocupada com ele. De certo modo, sentia-se culpada por ele estar passando por tudo aquilo.

—Que diabos está acontecendo? –perguntou Ned, ainda assustado. –O que essa coisa quer comigo?

—Com você? Nada, eu acho...

Engano seu—retrucou a criatura com rosto de menina. –Eu disse que vim impedir os infratores da lei! E punirei todos os envolvidos...

—Mas o Ned nunca esteve presente em nenhuma das nossas aventuras! –defendeu Luisa, irritada. –Ele não tem nada a ver com isso!

Pode não ter interferido ainda... —a criatura insinuou seu scanner de pulso na direção dele e fez uma análise completa da mente do rapaz, em questão de segundos. –Está vendo? Aqui diz que ele é culpado! —a garota impiedosa apontou o raio sonoro exclusivamente para o pescoço do rapaz. –Ele terá o que merece... Infratores da lei sofrerão com as conseqüências!

—NÃO! –gritou Luisa, exasperada. –SE AFASTE DELE!

—Luisa! –disse Ned, quase sem mais força para reagir (a garota possuída o estava apertando demais). –Me desculpe. Acho que estraguei o nosso passeio... —ele sorriu com dificuldade.

—Não repita uma besteira dessas nunca mais... –interferiu ela, sentida. Então voltou-se para o ser: -Solte ele!

Nunca!—retrucou a criatura, divertindo-se ás custas de seu sofrimento. De repente, os olhos dela faiscaram, tornando-se vermelhos, e o garoto sumiu entre seus braços, seguido por Capitinga (ou pelo menos da entidade que controlava seu corpo) que sumiu através de um tele-transporte.

Com muito dificuldade, Luisa conseguiu formular a próxima frase:

O que é você? —a garota franziu as sobrancelhas, o ar estava escasso em seus pulmões cansados. Sua pressão estava ficando baixa. Sem controle algum, ela caiu de joelhos. A voz de Melissa irrompeu em seus ouvidos pouco depois:

Luisa! Luisa! Está tudo bem? —as coisas rodopiaram um pouco até voltarem ao normal.

NED!—exclamou logo depois, ao se recuperar, correndo para o lugar onde ele estivera à um segundo atrás, então virou-se para Melissa, exasperada: -Ele morreu? Ele não pode ter morrido! Me diga que ele não morreu... –ela falava incrédula. Uma lágrima silenciosa escorreu do rosto da garota.

—Precisamos informar o Doutor sobre isso... Ele deve saber o que fazer! –falou Melissa, aturdida.

Nessa mesma hora o celular de Luisa tocou e cinco chamadas urgentes irromperam na tela:

Chamada 1: Luisa venha para casa assim que possível.

Chamada 2: É sério, não me ignore!

Chamada 3: Você está me ouvindo?

Chamada 4: Temos uma emergência em andamento...

Chamada 5: Eu já mencionei que é URGENTE?

 

Aquilo pareceu trazê-la de volta.

Imediatamente Luisa enxugou o rosto e saiu correndo com Melissa em seu encalço.

—Não, não. Você fica! –interveio ela, para com a amiga, no meio do trajeto.

—O quê? E se você precisar de mim? –brandiu a outra, esbaforida.

—Não se preocupe comigo. Ficar aqui será mais importante agora... Quem sabe até consigamos uma pequena vantagem sob o inimigo... –ela fez uma pausa, revirando a bolsinha rosa. -Eu preciso que você faça uma coisa pra mim. –Luisa entregou-lhe um embrulho manchado do tempo. Melissa quase caiu para trás.

O Lápis Impossível?

O próprio. Você tem que usá-lo... Nós temos que reverter as coisas! –disse ela sentida. –Você precisa ficar aqui e tentar rastrear aquela criatura... O lápis pode criar um atalho dimensional pelo tempo, assim como um tele-transporte de pulso! Você tem que voltar alguns segundos atrás, antes daquela coisa desaparecer com o Ned. E desta vez, impedi-la de escapar! Ou, na melhor das hipóteses, conseguir seguí-la até seu esconderijo particular...

—Mas... E se não der certo?

—Deu certo para criar portais dimensionais em Pisa –falou Luisa. –Vamos torcer para que também sirva para rastrear tecnologia alienígena...

—Está certo, mas como eu faço isso?

—Você só precisa desenhar uma porta imaginária, no “nada” e pensar para onde quer ir. Mas você tem que se concentrar no momento exato, ou então não conseguirá criar um atalho. Quando chegar neste mesmo lugar, há alguns minutos atrás, você deve tomar cuidado para não perder aquela criatura de vista... É a única forma de restaurarmos a paz e encontrarmos Ned, se ele ainda estiver vivo... 

Ela não gostou de pensar daquela forma, mas estava mais assustada do que jamais estivera, e quando ficava daquele jeito, seu cérebro funcionada mais veloz do que nunca. As duas se despediram com um aceno rápido de cabeça e correram em direções opostas, já esperando pelo pior: teriam muito trabalho pela frente.

Melissa seguiu seu caminho. Ia fazer o que Luisa dissera. Bom, tentaria. Estava se concentrando para criar a passagem imaginária quando uma garota apareceu correndo, de não se sabe onde, e gritou um estrondoso “Pare!”, eufórica. Melissa se virou espantada.

—O que foi agora? Eu preciso terminar isso!

—Não pode –a outra interveio, apoiando as mãos nos joelhos, sem fôlego. Era morena, um pouco baixa, tinha feições meigas e um vestidinho azul de bolinha, com babado. Parecia muito com uma daquelas bonecas cheias de fru-fru que Melissa ganhara quando pequena, (e fizera questão de atirar encima do telhado). –Você não pode seguir com o plano... Não antes de dar explicações!  

—Dar explicações?

—É! –a garota tomou o lápis de suas mãos. –Caso não tenha notado, está cheio de gente aqui que precisa de alguma explicação do que eles acabaram de testemunhar... Conto com você para fazê-los esquecer de tudo o que viram. –então franziu levemente a testa. –Meu Deus... O Doutor não ensinou nada à vocês? –então relaxou a expressão novamente e tornou a sorrir com o canto dos lábios para ela. –Enfim... Tudo nessa Terra pode ser aprendido. Vamos lá!

—Mas não posso fazer duas coisas! –Melissa protestou. –Luisa já me incumbiu de seguir o inimigo... Não posso me dar o luxo de me atrasar, dando explicações à todas essas testemunhas!

—Mas quem disse que você o fará sozinha? –a outra se inclinou, sorridente para ela. Então tirou do bolso um objeto triangular e o estendeu para Melissa. –Toque nele.

Melissa deu de ombros e o fez. A outra imitou o gesto, então juntas, as duas ergueram o objeto para cima, na direção das pessoas confusas. O objeto brilhou e se acendeu, iluminando o lugar. Todas as pessoas que foram pegas pela luz, esqueceram-se de imediato dos últimos vinte minutos no shopping, de modo que seguiram o curso de suas vidas, sem questionar nada. A mulher baixou imediatamente o objeto e as duas se encararam sorridentes por um momento.

—O que você usou neles? –Melissa perguntou, surpresa.

—Não se assuste. Era apenas uma caixa armazenadora de rachadura temporal. Ela guarda uma pequena parcela da luz de uma rachadura no tempo e espaço, que a propósito, em grande quantidade pode causar esquecimento completo em uma pessoa, ou fazê-la ser esquecida. Não é difícil de entender. É só saber usar a dosagem certa... E pronto! As pessoas só esqueceram dos últimos vinte minutos de suas vidas.

Fácil assim?—Melissa disse pasma. –Caramba! –checou o relógio. –Não se passou nem um minuto! Eu não perdi tempo algum... Ainda posso alcançar aquele desgraçado! Obrigada pela ajuda... Hã... Qual seu nome mesmo?

—Sou Oswin Oswald. E não tem de quê. –a outra emendou. E com isso, guardou o objeto no bolso e preparou-se para partir. Parecia muito inquieta. –Agora siga com seu caminho... –e entregou-lhe o lápis impossível de volta. –Garanto que uma coisa tão chamativa, como a criatura que está prestes a seguir, não tem o rastro apagado com tanta facilidade... –e saiu correndo, até virar a esquina na primeira loja do shopping e desaparecer, como se nunca tivesse estado lá.

—Ela vai pra lá... E eu vou pra cá. –Melissa não perdeu tempo. Correu até um lugar pouco visível e desenhou a porta mágica, o mais disfarçadamente possível. –Já chega de chamar atenção por hoje... –então, ao concluir o trabalho, entrou na passagem, sumindo de vista.

*   *   *

Luisa saiu correndo desembestada por todo o trajeto de volta para casa. Ainda não acreditava no que acabara de testemunhar na frente do cinema. Não sabia de que “emergência” o Doutor se referia, mas só de pensar nessa palavra, ela tinha calafrios. Desceu rapidamente a ladeira do shopping e ficou atenta às ruas laterais, já que a quinta era a Rua Bannerman. Correu feito uma condenada, até virar a esquina: já estava quase em casa. Chegou ofegante no portão de casa. Abriu-o na velocidade de um míssil e adentrou no quintal, disparando aflita na direção da porta da frente, já esperando o pior. Porém quando entrou, deparou-se com uma cena ainda mais terrível do que a que esperava:

—Ai meu Deus... –balbuciou ela, pasma com a situação da sala de estar: a casa inteira estava de pernas pro ar.

O Doutor, com seus 1,85 de altura, estava encolhido em cima de uma cadeira, como fazem aquelas madames nos filmes quando tentam ficar fora do alcance de uma ratazana enorme no chão. Quando viu a garota surgir na porta da sala, ele arregalou os olhos, deliberadamente.

—Luisa! Graças a Deus! –sorriu, agora já mais aliviado.

—Por Deus, Doutor! Passou um tornado por aqui?

—Quase isso. Na verdade, uma garotinha camada Mika. Eu estou cuidando dela essa tarde. Talvez eles tenham algum tipo de parentesco afinal –ele disse casualmente. –Agora, será que você poderia me dizer onde fica o “botão de desligar” dessa criança? 

—Que criança? –falou Luisa, confusa.

—Mika! A filha da sua vizinha maluca da rua de cima... A que só tem três anos e já parece um diabo de saia!

—Eu não conheço nenhuma criança chamada Mika –interveio Luisa. Ela pôs a mão na testa dele. –Se sente bem? Parece estar meio quente...

—Não me venha com essa! –ele tirou a mão dela de sua testa. -Eu estou perfeitamente são!

—Doutor, admita! Você não limpou a casa e está tentando se safar inventando historinhas bobas... Ah! Fala sério! Acha mesmo que eu vou acreditar nessa desculpa esfarrapada de “criança indemoniada”?

—Eu não estou inventando nada! Aquela menina é o capeta! Desde que eu a trouxe para dentro de casa ela subiu nos sofás, revirou o lixo, arrancou as espumas das almofadas e até tentou colar o Nik na parede! Eu tive que colocar o cão em cima da geladeira para que ela não o alcançasse...

Ah, Tá bom!Criança encapetada”, nessa você se superou! –Luisa bateu palma pra ele, com sarcasmo. 

—Estou falando sério, Luisa! Se não quiser acreditar, então não acredita! Isso fica a seu critério, tá legal? Mas a verdade é só uma: essa criança veio até aqui pra nos atrapalhar e eu preciso de ajuda para detê-la!

—E vai fazer o quê? Dar um chocalho sônico pra ela? –disse Luisa irônica.

—Na verdade, eu até pensei em acalmá-la com alguma coisa, então peguei o objeto mais velho e sem valor que vi pela frente...

Nessa hora, Mika atravessou a sala segurando um ursinho de pelúcia. Os olhos de Luisa se arregalaram.

—Você deu o Percy pra ela? –a garota revoltou-se com o amigo. –O meu ursinho?

—Seu ursinho? Esse trapo velho? –ele perguntou incrédulo.

—Não chama ele assim, seu ladrão de ursinhos indefesos! –ela deu-lhe um tapa no braço.

—Ai! Mais o que foi que eu fiz? –disse ele indignado, massageando o braço dolorido. –Como é que eu ia saber que você gostava tanto dessa coisa? Eu sou um Senhor do Tempo, ora bolas! Não um Médium!

Luisa pôs as mãos na cintura.

—Você deveria ter me consultado antes! –disse ela, emburrada. –Esse não é um ursinho qualquer! Esse é o Percy, o meu ursinho preferido!—ela tomou-o das mãos da criança e esfregou-o na cara do Doutor. -O que esteve ao meu lado desde que eu nasci! Desde que aprendi a falar! Desde que ganhei uma personalidade...

—Ok! Ok! Já entendi! O urso é importante. –disse ele, balançando as mãos na frente do rosto, pedindo que ela não se aproximasse mais, já que ele recuara até a parede e não havia mais para onde ir. –Muito importante... –ele recomeçou, agora muito sério, olhando por cima dos ombros dela e fazendo uma cara de puro terror.

—O quê foi? –ela foi tentar se virar, mas o Doutor a impediu, segurando seus ombros de frente para ele.

—Não! Não! Olhe pra mim! Olhe somente pra mim. Para frente! Sempre para frente... –aconselhava ele.

—Por que você está agindo estranho? Está com cara de quem viu um fantasma... –percebeu ela, desconfiada.

—Não, não mesmo! Essa é a minha cara de sempre! A minha cara de bobo de sempre... –tagarelou ele. Luisa franziu a testa, cruzando os braços para ele.

—Tá legal Doutor... –disse ela mais bem humorada. -O que é que tá rolando?

—Rolando? Nada! Nada está rolando por aqui. A não ser é claro aquela transformação sinistra lá atrás... –disse ele aturdido.

—Transformação sinistra?

—Não Luisa! Não olhe! –ele tentou impedi-la, mas já era tarde de mais.

Minha nossa!—a garota se virou e deparou-se com uma segunda Luisa. Uma cópia exata da original. Também carregando uma duplicata exata do ursinho de pelúcia nas mãos; só havia uma coisa de diferente entre as duas: as expressões faciais da duplicata eram totalmente vazias, assim como a da menina no shopping. A lembrança de Ned desaparecendo retornou à sua memória e, por um momento, ela teve vontade de chorar. Assustada, ela imediatamente recuou para junto do Doutor, que segurou em sua cintura, trazendo-a o mais perto possível de si.

—Calma... Muita calam agora –disse ele. –Nós temos tudo sobre controle...

—É igual a do shopping! –soltou ela.

—O quê?

—O rosto dessa coisa! Não tem sentimentos... É a mesma expressão vazia da criatura que nos atacou no shopping...

—Espere aí! Quando vocês foram atacadas no shopping? –perguntou ele.

—Hoje mesmo! Acabei de sair de lá... Melissa está cuidando dos danos...

—Cuidando dos danos? –ele repetiu incrédulo.

—Não é hora para piadinhas, Doutor! –reclamou Luisa. –Precisamos de um plano!

A duplicata de Luisa começava a abrir a boca, fazendo menção de ativar o raio sonoro.

—O que vamos fazer? –brandiu ela.

—Eu não sei. Rezar talvez... –eles se abraçaram. Ouviram um estrondo, mas o impacto do raio não ocorreu. Quando voltaram a abrir os olhos, depararam-se com Nik em cima da Luisa falsa, já estirada no chão. Eles correram até ela.

—Consegui chefe! –disse Nik e a Luisa verdadeira sobressaltou-se de susto.

—Esse cachorro está falando?

—Bom moça, latindo português é que eu não estou! –falou o cão de Melissa alegremente.

—Doutor... –Luisa olhou brava para ele. –Andou mexendo nas funções da chave sônica de novo?

—Eu vou fazer o quê? É uma tarefa irresistível! –replicou ele, dando de ombros.

—Precisamos sair daqui chefe, agora mesmo! Antes que a Luisa malvada acorde... –alertou o cão.

—Desculpe, mas só eu achei essa frase um pouquinho bizarra? –disse a garota, em protesto, apesar da duplicata estar lhe causando arrepios.  Enquanto isso, o Doutor scanneava agitado, a garota desmaiada no chão.

Teselecta!—gritou ele espantado, algum tempo depois. –A Teselecta é um robô com várias figuras humanas miniaturizadas vivendo em seus interior. Ela pode tomar a forma de qualquer coisa, por isso conseguiu copiar a imagem de Luisa com tamanha perfeição e rapidez. Eles basicamente servem para punir. Fazendo todas as pessoas ruins pagarem caro por seus crimes, pouco antes de sua morte. Mas vir procurar por nós? Ora, mas isso não faz sentido algum... Não vou dizer que sou totalmente respeitador das leis, mas até EU tenho meus limites... Da ultima vez que nos vimos, a Teselecta e eu trabalhamos em equipe como parceiros de verdade, porque então eles estariam se voltando contra mim logo agora?

—Boa pergunta. –disse Luisa, jogando-se no sofá, exausta. –Espera aí! Quer dizer que têm pessoinhas dentro de cada um desses robôs humanóides? –disse ela incrédula.

—Certamente que sim. –afirmou o Doutor. –Todos eles trabalham para o departamento de justiça do futuro. São humanóides treinados para punir criminosos e não pessoas do bem. Não seriamos alvo desses caras nem se voltássemos no tempo e pichássemos o muro de Berlim. Eles não se ocupam com qualquer besteira... Hoje em dia qualquer idiota consegue viajar no tempo, ou pelo menos conseguirão futuramente. Se eles estão apelando para punir essas pessoas que nada fizeram, então a coisa deve estar feia... –o Doutor pôs uma mão no queixo, pensativo. –Será que sofreram um corte no orçamento?

—Eu não sei... –disse Luisa presunçosa. –Mas acho que não devemos ficar parados esperando que a resposta venha nos encontrar... –disse ela se erguendo do sofá. –Temos que agir.

—Tudo bem então... –ele entrou no jogo dela. Começou então a fazer perguntas: -O que sabemos até agora? O shopping. Fale-me do Shopping... O que foi que exatamente aconteceu por lá?

Luisa deu-lhe uma narração completa dos fatos que incluíam a participação de seus amigos no cinema, o surgimento de uma nova integrante no grupo, o encontro com Ned e depois, a transformação da menina nova em uma pessoa sem expressões, sentimentos ou traços qualquer, com jeito de quem fora possuída e com as instruções de punir qualquer um que violasse as leis do tempo.

—Sim, sim... Certo, certo! Mas isso ainda não faz muito sentido... Porque vieram tirar satisfações com os passageiros se sou eu quem pilota o táxi? Não que a TARDIS seja um táxi... Na verdade é um pouco mais complexo do que isso... Bem, de qualquer forma, a responsabilidade teria que ser toda minha e não descontada nas costas de vocês duas!

—Mas eles também mandaram uma Teselecta atrás de você. De outro modo, porque Mika estaria aqui? –indagou Luisa. –Ela foi enviada para puni-lo...

—Mika não existe, foi apenas um fantoche utilizado por eles para poder se aproximar de mim, assim como a garota do shopping que você mencionou, também não era real... –constatou ele, sombrio. –Está certo, isso tudo é compreensível. Mas ainda não consigo entender porque vieram atrás de você —ele fitou-a bem nos olhos. –Tem algo que está me escondendo?

—Tipo o quê? –ela perguntou, recuando. –Sabe tudo sobre mim...

—Será mesmo? –sondou ele, desconfiado, erguendo uma sobrancelha. –Vamos lá... Sempre há alguma coisa que queremos ocultar... Eu duvido muito que eu saiba tudo sobre você. Tão pouco essa não é minha intenção no momento... Só queria ter certeza de que não existe algum motivo em especial para estarem atrás de você. Talvez alguma coisa no seu passado...

—Ou talvez no meu futuro! –ela disse arregalando os olhos, com sua própria colocação. –É isso! A Teselecta comentou lá no shopping algo que pareceu muito com isso... Ela falou que nos impediria. Mencionou erros cometidos, mas também deixou algo em aberto... Como se temesse alguma investida que ainda não aconteceu...

—Seria possível? –indagou o Doutor erguendo-se do sofá, empolgado com o rumo da conversa. –Seria possível que eles estivessem punindo as pessoas pelos erros que ainda não houvessem cometido? Talvez eles estejam estudando a linha do tempo de cada suspeito... Quando encontram indícios de interferência temporal, surgem para fazer justiça... Mas o fazem aleatoriamente. Sem seguir uma ordem cronológica. Você disse que eles foram re-programados? Está aí o problema! Eles já não seguem mais o padrão antigo, na verdade, acho que não estão seguindo padrão algum, por isso estão tão descontrolados. A memória padrão de trabalho foi alterada, e eles não sabem como restaurar o programa... –disse o Doutor, sério.

—Doutor –chamou Luisa. –Eles levaram o Ned. Antes de desaparecerem por completo, mencionaram que ele tinha alguma ligação com os problemas, mas ele nunca esteve com a gente na TARDIS, o que sugere...

—Que ele ainda pode fazer algo no futuro –completou o Doutor. –Fique de olho nesse garoto! Ele pode causar problemas...

—Mas como ficar de olho nele se a Teselecta o levou embora?

—Você me disse que Melissa estava trabalhando nisso...

—É! Da mesma forma que você me disse que deixaria a casa arrumada até as cinco horas! –retorquiu ela. –Desculpa. O que estou tentando dizer é que precisamos de um novo plano, caso Melissa não obtenha sucesso...

—Vamos por partes –ele recomeçou a caminhar de um lado para o outro. -Estamos falando da Teselecta. Eu sei o modo de trabalho deles: Judiam e punem os culpados até chegar perto de matá-los, então fazem a miniaturização das pessoas até deixá-las do tamanho exato para poder caber dentro do robô Teselecta. Só então, os “anticorpos” da máquina se ativam e se espalham, detectando uma presença desconhecida no recinto, como se fosse um vírus no corpo de um ser humano e então eles o destroem para sempre... –ele batucava os dedos na própria testa. –O quê mais? O quê mais?

—Essa coisa é um clone meu? –disse Luisa, observando a garota idêntica a ela, de longe.

—É apenas uma duplicata. Capta a sua imagem e a recria em si própria. É como um espelho! Ela reflete a sua imagem, guardando seu histórico no banco de dados...

—Meu histórico? –ela engasgou. –Quer dizer que as minhas informações todas estão aí dentro?

—Precisamente.

—Uau. –ela ficou pasma. Uma ponta de curiosidade percorrendo-lhe o corpo. –E nós podemos consultá-la?

—Para quê você quer consultar a si mesma?

—Bom –ela começou, caminhando até ele. –Ás vezes as respostas estão nos lugares mais óbvios... Quem sabe não descobrimos algumas informações...

—Não sei não... –interveio ele. -Isso pode ser perigoso. Acessar os seus arquivos pessoais pode revelar informações valiosas, mas que se descobertas fora do momento certo, podem causar graves seqüelas...

Ela chegou-se mais perto dele, quase emparelhando seus rostos.

—Eu não tenho muita escolha, não é? –disse ela com um olhar triste. -O Ned desapareceu. Essas coisas estão atacando pessoas inocentes e nós temos uma Teselecta bem aqui na nossa frente... Acho que não há mesmo muita escolha...

Ele fitou-a demoradamente, os olhos lacrimosos dela pareciam decididos. Naquele momento o Doutor sobe que nada do que ele dissesse mudaria sua opinião quanto a isso.

—Está bem... –suspirou ele, finalmente cedendo. –Mas veja bem: Eu farei as perguntas. Não vamos arriscar que você navegue muito no seu próprio banco de dados, estamos combinados?

—Estamos. –ela aceitou sem relutância.

Os dois seguiram para perto da Luisa adormecida –eles a haviam colocado sentada contra a parede –o Doutor se agachou  perto dela e proferiu:

—Você está bem? Pode me ouvir? Nós pedimos desculpas por tê-la desativado... –falou ele com a máquina. –Manifeste-se! Vamos! Reinicie o programa defeituoso... Você precisa de um técnico em sistemas de operação e adivinha: hoje é o seu dia de sorte! Eu sou o Doutor e vim reinstalar suas configurações...

Na mesma hora, a humanóide abriu os olhos e fitou-o, sem reação. Então uma voz sem emoção falou:

Nos ajude! A Teselecta se perdeu no programa de reajuste automático. Não conseguimos reiniciar... Está com pane no sistema. O programa de punição ficou maluco e não conseguimos comandar a nossa própria base. Não conseguimos entrar em contato com ninguém. Apenas um dia uma unidade defeituosa começou a dar pane e, nos próximos dias, todos os agentes da Teselecta passaram pelo mesmo processo. Estamos em grande quantidade, espalhados pelo universo. Precisamos reatar os controles antes que seja tarde demais! Nos ajude! Nos ajude Doutor...

—Não se preocupem... Vou ajudar vocês –disse ele bondosamente. –Mas antes, gostaria de pedir o protocolo de segurança e ter acesso ao banco de dados de Luisa Parkinson... Isso é importante! Pode salvar muitas vidas, inclusive a de vocês aí dentro...

Protocolo de segurança ativado. Pedido de abertura do banco de dados particular de Luisa Parkinson: aceito. Informações disponíveis...

—Certo –Luisa respirou fundo. –Lá vai... Doutor, pergunte à ele sobre o paradeiro do Ned.

—Computador –disse ele. –Sabe alguma coisa sobre o rapaz chamado Ned, que foi recentemente capturado por uma de suas unidades soltas por aí?

Afirmativo—disse a Luisa humanóide, com um ar robótico. –Ned Bigby se encontra agora desacordado e vivo no interior de uma de nossas unidades. Ele não morrerá. Já foi identificado como “pessoal autorizado”, assim como o resto da tripulação. Ele está ligado parcialmente com a dona deste histórico. Informações seguintes poderão ser prejudiciais...

—Tudo bem! Não precisamos de conhecimentos futuros... –cortou o Doutor. Esperando a próxima pergunta da garota.

—Pergunte à ele se eles conseguem rastrear a Teselecta do shopping...

—Computador –recomeçou o Doutor. –É possível localizar as coordenadas da unidade que capturou o garoto?

Unidade desconhecida. –disse a duplicata, decepcionando-os.

—Não há nenhuma outra forma de encontrá-la? -insistiu o Doutor.

Um silêncio profundo recaiu sobre eles, aumentando o suspense.

Só existe uma forma—intensificou a Teselecta na sala, restaurando a expectativa dos dois. –Vocês deverão embarcar em nossa unidade.


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Notas finais do capítulo

:D

Sim, eu escrevi BASTAAAAAAAANTE dessa vez! Espero que não se importem com isso...

Yes! Teselecta na área! E não se preocupem, caros leitores, eu prometo, os problemas só estão começando! (kkkkkkkkkk Help)

Beijos e até a próxima semana!

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Até mais!



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