Uma vida feliz para Arlequina? escrita por Dani Tsubasa


Capítulo 4
Capítulo 4 – Lembranças são coisas perigosas




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Capítulo 4 – Lembranças são coisas perigosas

                O Coringa estava sentado sozinho em seu escritório. O comportamento de Harley na noite anterior o levara a fazer algo perigosamente doloroso. Lembrar. Por mais que falasse sobre o perigo de se fazer tal bobagem, a mente não esquece as coisas simplesmente porque você não quer lembrá-las. E esse era o abismo perigoso onde caiam as pessoas normais. Elas se deixavam envolver pela dor de suas lembranças ruins sem saber lutar contra elas quando vinham de repente e assim muitas se afogavam aos poucos.

                - E aqui estou eu... Tentando lidar com a descoberta de que até o Coringa tem coisas que não consegue esquecer, mesmo que eu lute o tempo todo pra não lembrar...

                {Flash Back}

                Passou alguns minutos parado na porta após sair do banheiro, observando a mulher que chorava encolhida na cama. Ela mal comera no jantar aquela noite e nem a Hera Venenosa fora capaz de consolá-la completamente. Seus olhos se voltaram paras as coisas que haviam restado em volta, dois berços, um com enxoval rosa e outro azul, uma banheira de bebê, duas fotos que Harley insistira em deixar em cima da cômoda, dos quatro juntos e sorrindo no dia que os gêmeos nasceram, e a outra com Pâmela sorrindo de orelha a orelha com os bebês louros nos braços. Guardariam todas aquelas coisas em outro lugar no dia seguinte. Pensou em repetir para Harley todo o seu discurso sobre deixar lembranças no passado e esquecer tudo, mas não faria aquilo naquela noite. Ver os filhos partirem havia invocado lembranças terríveis há muito tempo enterradas nas areias do tempo, de alguma forma, que ele não sabia explicar, aquilo fazia alguma coisa doer dentro dele também.

Caminhou ao redor da cama, se detendo ao encontrar os dois ursinhos de pelúcia brancos no chão, onde os gêmeos tinham brincado com eles pela última vez horas atrás. Harley colocara um lacinho azul no pescoço de um e dois lacinhos rosas nas orelhas do outro. Se abaixou para pegar os dois bichinhos e finalmente se deitou ao lado de Harley, entregando-os a ela. A mulher agarrou os dois ursinhos e chorou ainda mais. Abraçou-a enquanto acariciava seu cabelo.

— Shh... Calma. Eles vão ficar bem, Harley.

— Nunca mais vamos vê-los, Pudinzinho – ela murmurou com a voz embargada – Nossos bebês longe de nós... Isso não é justo. Tudo culpa do Batsy! Eu vou arrancar as asas daquele morcego!

— Eu vou bater muito nele quando nos virmos de novo, amor. Eu juro. Tente dormir agora.

— Quem vai cantar pra eles pararem de chorar? Quem vai amamentar eles? Quem vai contar historinhas dos problemas que criamos pro Batsy pra eles dormirem?

E assim foi até ela dormir cansada de tanto chorar. Mesmo ele demorou a dormir naquela noite. Olhou para Harley e secou uma lágrima que ainda corria em seu rosto adormecido. Porque aquilo também estava doendo nele? Não deveria doer, não tanto. Será que estava ficando louco? Foi impossível evitar rir com aquele pensamento, e riu, tendo o cuidado de não acordar Harley.

— Eu já sou louco. E você também é, minha doce Arlequina, por isso sei que pode encontrar um jeito de continuar a partir daqui, amorzinho.

{Fim do Flash Back}

Abriu uma das garrafas de bebida que mantinha em seu escritório e a entornou enquanto lutava para afastar memórias distantes, tão distantes que nem se lembrava mais quem realmente era o dono delas, num tempo em que sequer sonhava que em algum lugar conheceria uma mulher chamada Harleen Quinzel e que aquilo seria como um abalo sísmico na vida de ambos. Continuou bebendo enquanto retocava as ideias do plano da escuridão para o Batman em cima da mesa e assim os minutos correram até um de seus homens bater na porta.

— Senhor.

— O que você quer?! – Respondeu irritado e já claramente alterado pelo efeito da bebida.

O homem abriu a porta apreensivo, se atentando à garrafa vazia sobre a mesa e a outra quase na metade.

— Se não quer nada, então suma da minha frente.

— Só queríamos saber se há algum planejamento pra essa noite e se vai agora dar uma olhada nos dois novos contratados. Estão aguardando do lado de fora como nos pediu, para que não tomem conhecimento do interior de suas propriedades.

— Nada pra hoje, Jonny. Nada mesmo! Nada! – Falou se levantando e passando pela porta, levando a garrafa com ele.

Frost se arrepiou com o tom e as palavras dele. Na linguagem do Coringa uma palavra nunca era uma simples palavra. Os dois desceram as escadas e caminharam para fora, andando até um dos becos escuros em volta do lugar, onde os outros capangas esperavam juntos a dois novatos assustados.

— Eu já disse, quem não tem certeza do que quer não serve pra trabalhar pra mim.

— Achamos que valia a pena tentar, senhor. E não é a primeira vez que estariam nessa vida. Já tem algum tempo que começaram depois de ficarem desempregados. Não tinham nada a perder. Sem mulher, sem filhos, sem família, também não tinham nada a ganhar, mas era isso ou morrer de fome. Então estão nisso há alguns anos. Eles já fizeram pequenos assaltos, já mataram, roubaram. Uma das vítimas fui uma mulher grávida de seis meses. A criança também não resistiu. Eles têm uma boa dose de perversidade, por isso pensamos que seriam adequados.

Todos os homens prenderam a respiração e deram um passo atrás quando viram chamas de ódio e descontrole se acenderem nos olhos de seu líder quando ele caminhou para os novatos, que fizeram o maior esforço de suas vidas para não saírem correndo.

— Em que os dois trabalhavam antes? – O Coringa perguntou.

— Um deles era um músico fracassado e o outro trabalhava numa indústria de químicos, foi demitido ao explodir umas coisas sem querer com uma mistura errada.

Todos os presentes quase tiveram ataques cardíacos quando o Coringa começou a rir loucamente naquele momento e deu um longo gole na bebida antes de atirar a garrafa contra a parede mais próxima, fazendo-a se espatifar, espalhando bebida e cacos de vidro pelo chão. Em seguida puxou a arma atirou nos dois homens que deveriam ser seus novos contratados, matando-os instantaneamente.

Os homens em volta permaneceram em silêncio e devido ao fato de já estarem praticamente treinados para momentos como aquele, em segundos suas expressões de susto haviam se neutralizado novamente.

— Que pena... – o Coringa falou olhando para os corpos no chão – Esses dois não deram a sorte de me encontrar num bom momento pra negócios. E ainda me fizeram lembrar! EU JÁ DISSE QUE NÃO GOSTO DISSO!!! – Gritou descarregando as balas que restaram nos dois homens mortos a sua frente – Livrem-se disso – falou tão calmo quando guardou a arma que ninguém no mundo teria dito que acabara de cometer uma atrocidade.

— Sim, senhor.

Os homens observaram o chefe partir e virar a esquina em direção à casa, claramente bêbado, e logo se ocuparam de cumprir a tarefa de limpar o lugar.

******

Harley estava sentada na sala assistindo TV, com o cabelo solto e já de camisola e com um robe de cetim metade rosa, metade azul, feito especialmente para ela, logo iria dormir. Tinha escutado os gritos e todos os tiros lá fora, e também uma garrafa se espatifando no chão ou na parede. Ele tinha matado os dois novatos antes mesmo de contratá-los. Preferia nem se perguntar o que haviam ou o que não haviam feito para acontecer tal coisa. O Coringa entrou na sala de repente, e Harley o observou, estava bêbado sem dúvida. Andava de um lado para o outro nervosamente enquanto rosnava de raiva e tentava se controlar.

— Quer conversar?

— Harley, sai daqui!

— Eu sabia que não – ela respondeu, já se levantando.

— Sai!!

Não se deu ao trabalho de responder, desligou a TV e foi embora para o quarto, fechando a porta e ouvindo coisas se quebrarem no andar de baixo.  Sempre que ele a mandava sair num desses momentos era uma tentativa de proteger Harley de sua fúria e evitar bater nela, embora às vezes ela fosse teimosa tentando acalmá-lo e acabasse se machucando, mesmo que nos últimos tempos ele tentasse se conter até mesmo depois de perder o controle e a mandasse ir embora mesmo depois de já tê-la machucado um pouco. Estava finalmente se cansando daquilo. Ele podia estar se esforçando para não feri-la, mas nada garantia que ele sempre conseguiria. A recusa dele em lhe dar carinho muitas vezes, a frieza em suas palavras e ações para com ela, os gritos e explosões também a machucavam. Ele nunca bebia e enlouquecia sem motivo, mas jamais lhe falava quais motivos eram esses quando ela mesma ou o Batman não eram os culpados, e isso também doía.

Quarenta minutos se passaram até ele entrar no quarto e seguir para o banheiro sem ao menos olhá-la. Não conseguia dormir, nem ler, estava sentada na cama olhando para o nada. Ouviu o chuveiro ser ligado e cogitou a ideia de se juntar a ele e persuadi-lo a se acalmar, mas quando se decidia entre fazer isso ou não ele saiu já vestido e se deitou ao lado dela sem dizer nada. Harley deslizou para baixo do lençol também e o olhou.

— Você podia me contar as coisas de vez em quando, Pudinzinho. Por que ficou com raiva?

— Nada importante.

— A culpa é minha?

— Vá dormir, Arlequina.

Aquelas palavras fizeram Harley se calar completamente e sentiu seu coração se contorcer de dor dentro do peito. Deu as costas a ele e se encolheu num canto da cama, ficando o mais longe possível, virando-se minutos mais tarde para olhá-lo rapidamente e ter certeza de que ele não a veria nem ouviria chorando.


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