Make Your Choice escrita por Elvish Song, SraFantasma


Capítulo 12
Picnic


Notas iniciais do capítulo

Olááááááá! Continuação da história!
Obrigada a todas as fofíssimas que vêm acompanhando e comentando nessa história. AMAMOS VOCÊS!



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Dois dias depois do entendimento entre Erik e Christine, Madame Giry veio visita-los novamente, acompanhada de Meg e, como de costume, Renée D’Albignon. Não que houvesse necessidade de acompanhamento médico, agora, pois todos os ferimentos da adolescente haviam se curado, mas a médica parecia ter-se tomada de afeição pela paciente e por seu estranho “companheiro”, de modo que continuava a vê-los semanalmente. Para a surpresa geral das três, porém, quem as atendeu não foi Erik, tampouco Louise, mas a própria Christine, trajando um vestido branco, os cabelos cacheados penteados para trás e presos com uma fita cor-de-rosa; seu olhar ainda era tímido e um pouco assustado, mas essa expressão se desfez ao fitar Madame Giry.

— Mãe! – exclamou ela, abraçando a mulher mais velha. A senhora se surpreendeu, retribuindo o abraço, antes de se afastar um pouco, segurando a menina pelos ombros:

— Christine! Meu Deus, o que houve, criança? Que milagre a transformou deste modo em apenas uma semana, minha filha? Quando a vimos, era apenas a sombra da mulher que um dia fora...

— Entrem. – disse a jovem, simplesmente, afastando-se para o lado para dar passagem às outras. Meg e Renée também a abraçaram com ternura, e a médica piscou um olho para a cantora, satisfeita e feliz em ver a jovem outra vez agindo como uma mulher de verdade, e não como uma sombra pálida e quebrada.

Entraram e se acomodaram na sala, e não tardou para Erik surgir, descendo as escadas; estava bonito e elegante como sempre, e saudou as mulheres beijando a mão de cada uma delas.

— É um prazer revê-las, minhas damas.

— Podemos dizer o mesmo – manifestou-se Meg – mas o que aconteceu aqui?! Christine parece perfeitamente bem, e você... Você desceu aquelas escadas sorrindo!

O Fantasma deu um sorriso, e foi se sentar ao lado da soprano, que corou um pouco e deu um sorrisinho tímido. Tomando a mão da moça, ele explicou:

— Nada teria sido possível sem Louise. Foi ela quem conseguiu tirar Christine de seu estupor. –e beijou a mão de sua amada.

— E como você está, querida? – perguntou Renée.

— Bem. – respondeu Christine, e obrigou-se a erguer o olhar – ainda é difícil conversar, e mais ainda manter a cabeça erguida para falar. Preciso lutar para não me fechar num casulo, mas Erik e Louise garantem que eu não o faça, pelo que sou muito grata. – ela suspirou, e fechou as mãos sobre o colo, apertando-as nervosamente. Aquele fora um sestro que adquirira nos últimos dias, ao se forçar a comunicar com os outros. Não era fácil... Não era nada fácil, mesmo, mas ela estava dando tudo de si para tentar voltar a ser quem fora.

— Ainda assim, você está de volta. Consegue interagir, falar e, se bem a conheço, cantar. – disse Antoinette, feliz com a recuperação da moça.

— Cantar foi uma das coisas que me trouxe de volta, Madame. – concordou a moça. Renée observava o modo tímido e um tanto retraído da jovem, e de repente se levantou, pedindo:

— Christine, gostaria de falar com você a sós. Importa-se?

— De modo algum. – a dama acompanhou a mulher mais velha até a sala de jantar, onde a outra perguntou:

— Como estão as coisas, menina?

— Perdão? – ela não compreendeu a pergunta.

— Como ele a está tratando? Bem, mal?

— Se esta perguntando sobre Erik, ele é meu Anjo. – afirmou a adolescente - Ele me ama, e tem não apenas cuidado de mim, mas tido enorme paciência comigo, quando nem eu mesma tenho. Ele e Louise são dois anjos bons que Deus pôs em minha vida.

A médica sorriu, satisfeita:

— Fico feliz em saber disso. Mesmo porque, se ele não a estivesse tratando como merece, eu mesma ia arrancar os olhos daquele Fantasma.

Christine riu baixinho, e a doutora não soube dizer se por achar engraçado, ou se por nervosismo. Ela parecia bem desconfortável, então Renée soube que era melhor não forçar ainda mais a vontade da jovem, que muito já fazia em se obrigar a sair daquela catarse na qual ficara por semanas. Mas havia mais alguém com quem queria conversar:

— Pode me dizer onde está Louise?

— Está no jardim – disse a soprano, acompanhando a médica até a porta que dava para o espaço amplo, coberto de grama verde e flores coloridas, com algumas árvores grandes a fazer sombra na fonte que rumorejava ao centro do lugar. Louise estava sentada aos pés de uma árvore, pensativa, acariciando uma flor com um sorriso nos lábios. A médica pediu licença a sua paciente e foi ter com a jovem ruiva, enquanto a soprano voltava para a sala.

— Onde está Renée? – perguntou Meg, ao ver Christine voltar sozinha.

— No jardim, falando com Louise. – e para Erik – ah, ela ameaçou arrancar seus olhos se você me tratar mal. – aquilo arrancou um sorriso de ambos, antes que Madame Giry se manifestasse:

— E quando vocês pretendem nos visitar, afinal? Queremos que conheçam nossa casa, e, se já se sentir bem o bastante para tanto, minha menina, que vá ao conservatório.

— Madame Giry... – começou Erik – Sabe que não impedirei Christine de ir aonde bem quiser, mas eu não apareço em público. Especialmente depois do... Acidente com o lustre.

— Você quer dizer depois que você incendiou a Ópera. – disparou Meg, percebendo o modo como a amiga se encolheu muito discretamente ante as lembranças daquela noite... Por Deus, o que teria se passado entre Erik, Raoul e ela, nos subterrâneos? Erik e sua mãe nunca lhe haviam contado nada... – Mas Erik, mamãe e eu resolvemos isso. Você sabe que foi dado como morto, e que o “caso do Fantasma da Ópera” está encerrado. O Persa nos ajudou com tudo isso.

— O Persa... – murmurou o homem – por falar nele, como está? Desapareceu já faz uns dois meses.

— Bom, ele tem tido seus próprios problemas, depois de ser acusado de acobertar você, durante os eventos da Ópera Garnier. Agora que se livrou dos problemas, está tirando umas merecidas férias, escrevendo assuntos mais amenos e publicando folhetins a partir de uma casa no campo.

— Então ele está bem – sorriu o Fantasma. Christine então se manifestou:

— O Persa? O jornalista?

— Ele mesmo – respondeu Meg – amigo pessoal de seu Anjo da Música. Acho que a única pessoa que pode ser chamada assim.

— Não a única. – corrigiu o Fantasma, fitando as Girys. Antoinette sorriu, e então declarou:

— Bem, o convite está feito. – e para Christine – ao menos tentará arrastar este ranzinza mal-humorado para nos ver?

— Certamente que sim, mãe. – garantiu a adolescente morena. Nisto, Louise e Renée entraram na sala, às gargalhadas. Riam tanto que chegavam a lacrimejar, e o Fantasma imaginou se deveria ou não se preocupar com o que quer que a médica estivesse ensinando a sua criada, para com a qual desenvolvera certo sentimento de proteção. Coisa boa não haveria de ser, é claro!

Entre lágrimas de riso, a médica se virou para as Girys e, recompondo-se, disse:

— Meninas, preciso ir. Vão ficar aqui, ou irão comigo?

— Renée, sua tonta, viemos juntas de coche! – ralhou Antoinette, que já se tornara amiga da outra, fazendo Christine, pela primeira vez em meses, dar uma gargalhada sonora, o que fez Erik a encarar com uma expressão de pura alegria. Não menos feliz do que o amigo, a viúva acariciou a mão da filha adotiva, e continuou a falar para a outra mulher – é claro que precisamos ir com você, criatura! Como iríamos? A pé?

— Eu poderia leva-las, se quiserem. – disse o Fantasma, solícito, mas a senhora declinou:

— Agradeço, Erik, mas temos de ir. Aulas, dentro de uma hora.

Todos se despediram, e logo Erik e Christine se viram sozinhos na sala, pois Louise desaparecera sob pretexto de ter algo para fazer. O Fantasma, percebendo que aquela conversa, embora deliciosa, havia exigido muito esforço de Christine para interagir normalmente, abraçou-a com carinho e falou:

— Estou orgulhoso de você, meu amor. Sei que não foi fácil.

— Não... Mas consegui. – ela sorriu para ele – graças a você. E a Louise, que já desapareceu de novo – riu-se a jovem.

— Você parece cansada. – disse o Anjo.

— Talvez um pouco... – Ela caminhou para o sofá onde passara algum tempo lendo, e pegou seu livro, mas, em vez de começar a lê-lo, fitou seu amado com um pedido no olhar. Ele compreendeu e se sentou ao seu lado, deitando-a contra seu peito, partilhando com ela da leitura. E embora ele nunca fosse confessar isso, o homem sequer prestava atenção ao livro: o cheiro da jovem, a maciez dos cabelos castanhos espalhados sobre os ombros do músico, o suave calor de sua pele... Tudo isso tomava completamente a atenção do Anjo que, por alguns instantes, teve a certeza de estar vivendo o mais belo sonho de sua vida.

*

Christine acordou cedo, como de costume, estranhando não ver Erik ao seu lado. Geralmente, quando acordava, ele estava sentado ao seu lado, já vestido, observando-a... Mas hoje não havia sinal dele!

A moça se levantou, e ia pegar um vestido no armário quando reparou que já havia um estendido aos pés da cama, branco e azul. Confusa, trocou a camisola pela peça de roupa e saiu do quarto. Mal apontou no alto da escadaria, viu Erik erguer o rosto para si e abrir um lindo sorriso.

— Bom dia, meu Anjo. Dormiu bem? – perguntou ele.

— Bom dia – respondeu a moça, descendo as escadas, intrigada: Erik estava vestido com uma camisa menos formal, colete de cor clara, calças claras e botas marrons, em vez de pretas. Sua máscara não era a que usava normalmente, mas uma no mesmo formato da que usara em Don Juan Triunfante, porém branca. Ele parecia... Animado? – o que houve, meu Anjo?

— Bem – De repente ele pareceu um pouco tímido, e isso era muito confuso... Para onde fora toda a arrogância do Fantasma? – hoje está um dia ensolarado e... pensei que poderíamos sair em um passeio. – ele pareceu um pouco desapontado – mas é claro, se você não quiser...

— É claro que eu quero! – exclamou a moça. Bem, talvez não quisesse com toda a empolgação que imprimiu à própria voz, mas a gentileza dele, a delicadeza de chama-la a sair, quando ele próprio era tão recluso... Ela não o magoaria, jamais, com uma negativa! – apenas não estava esperando por isso. – a jovem sorriu – mas um passeio seria maravilhoso!

Erik sorriu, parecendo aliviado com a concordância dela, e falou:

— Que bom que pensa assim. César já está esperando. – ele lhe ofereceu o braço – senhorita?

Ela corou até a raiz dos cabelos, dando um sorrisinho constrangido: senhorita? Parecia já ter sido há muito tempo que fora tratada daquele modo, e com tal delicadeza! Mas será que seu Anjo nunca parava de surpreendê-la? Ela estava desistindo de compreender este homem que, ora era furioso, ora manso como um cordeiro, ora misterioso, ora poderoso e perigoso... E ela nunca sabia qual “Erik” encontraria junto a si.

Ele a conduziu para fora, para a rua, onde César aguardava atrelado a uma charrete bonita e elegante, negra e dourada – Christine sorriu ao pensar como aquilo era claramente do gosto de seu Anjo – e, dentro desta, havia uma cesta fechada. Ela o olhou indagadoramente, e ele respondeu:

— O passeio pode demorar um pouco. Não vamos ficar com fome, certo? – e ajudou-a a subir no carro, tomando as rédeas longas e pondo a charrete em movimento depois que sua amada estava bem acomodada.

Quando o “veículo” se pôs em movimento, ela se desequilibrou por um instante e, sem querer, tombou sobre o peito de Erik; levemente constrangida, apoiou a mão no peito dele e tentou se afastar, mas ele sorriu e passou o braço pro sua cintura:

— Pode ficar aqui, se quiser. – a moça hesitou, mas acabou acomodando-se melhor, mais perto do músico do que estava antes. Ele a fitou com carinho, e perguntou – quer conduzir?

— Acho que eu não saberia como.

— Não há segredo – riu-se ele, pondo as rédeas nas mãos dela – é exatamente como comandar um cavalo a partir da sela.

— Erik, eu não sei cavalgar! – exclamou a jovem, desconcertada. Erik riu (ele vinha fazendo isso com tanta frequência, ultimamente! Mas qual seria o motivo, uma vez que ela jamais o ouvira rir, quando vivia no teatro?) e passou um braço por trás das costas da cantora, segurando as mãos dela nas suas, ensinando-a a manter o cavalo no curso, a fazê-lo virar, a mudar o ritmo do animal, que respondia ao menor toque de rédeas. Na posição em que estavam, o peito do homem pressionava as costas da adolescente, que sentiu um estranho arrepio percorrê-la. Não um arrepio de medo... Depois do modo como Erik cuidara dela, nunca mais conseguiria ter verdadeiro medo dele... Mas então, que sensação era aquela, que fazia suas mãos suarem frio, e acelerava seu coração?

O cavalo seguia pelas ruas de Paris, indo cada vez mais para fora da cidade. Passavam por cima de uma pontezinha quando o Fantasma retomou as rédeas, elogiando a “habilidade” de Christine, que riu:

— habilidade em agarrar as rédeas e congelar no lugar. Se fosse eu conduzindo, Anjo, acabaríamos presos numa valeta.

Ele riu, concordando, mas seu riso morreu quando fitou os olhos castanhos de sua amada; aqueles olhos castanhos, tão profundos, até mesmo inocentes, a despeito de tudo o que lhe acontecera. Olhos nos quais ele queria se perder e se afogar...

Para Christine, o olhar de seu Anjo da Música era um oceano profundo, no qual ela se perdia, dentro do qual mergulhava. Um mar azul, vasto e insondável, misterioso demais... Um verdadeiro oceano, do qual ela só podia descobrir uma pequena parte, de todo o vasto mundo que havia na alma do Fantasma. E por algum motivo, ela ansiava por descobrir cada recanto daquela alma...

O cavalo parou ao sentir as rédeas serem largadas, mas o casal sequer reparou nisso; a jovem tinha as mãos pousadas no peito do músico, que a segurou delicadamente pelos ombros e, num gesto lento, uniu seus lábios aos dela. Pensou que a dama recuaria, mas, ao contrário, ela passou os braços por seu pescoço e retribuiu, entreabrindo os lábios. Beijaram-se com amor, e nenhum dos dois queria parar. Para Erik, porém, aquele beijo despertava uma euforia, uma alegria intensa, uma necessidade de sentir mais de sua Christine! Suas mãos desceram para a cintura dela, puxando-a para seu colo, e o beijo se aprofundou ainda mais, tornando-se intenso. Isso a assustou, e ela o empurrou levemente, mas sem romper o beijo. Quando ele continuou a beijá-la, as emoções foram mais fortes do que o autocontrole da menina, que deu um tapa no lado exposto do rosto de Erik, afastando-se dele como se saltasse para longe de uma serpente, os olhos assustados e ofegante.

Ao perceber o que tinha feito, ela ia se desculpar, mas o Anjo foi mais rápido; envergonhado por seu comportamento, baixou a cabeça e murmurou:

— Perdoe-me, Christine. Ah, meu Deus, me perdoe, eu... Eu nunca... Eu não queria... Bem, é claro que eu queria, mas nunca sem que você... Por favor, me desculpe, me desculpe! – Ele parecia tão arrasado quanto se houvesse sido ele a bater nela! Comovida com a atitude dele, ela acariciou os cabelos dele, e respondeu:

— Não precisa pedir perdão... – e tocou levemente a pele dele, vermelha pelo tapa – Desculpe pelo tapa... Eu não queria.

— Foi o mínimo que eu mereço, minha Christine – disse ele, colocando-se ereto no banco e tomando as rédeas outra vez. O restante do percurso foi feito num silêncio constrangedor, em que nenhum dos dois tinha coragem de dizer o que fosse.

*

Quando finalmente chegaram ao lugar, Christine mal pôde crer em seus olhos: nunca sequer imaginara que haveria um bosque perto da cidade! Um campo de grama verde, macia e, no meio deste, um pequeno bosque de árvores jovens e antigas, com o chão coberto de folhas. Ela sorriu, encantada, e aquele sorriso aliviou Erik, que se sentira muito mal após beijar seu Anjo daquele modo. Droga, o que ele estava pensando? Por que insistira num beijo que, claramente, era demais para Christine? Por que sentia aquelas chamas se acenderem em seu corpo, quando ela o tocava? Eram muitas perguntas, e perguntas que não sabia como responder... Vira muitas vezes os casais indiscretos que trocavam carícias e mesmo faziam amor pelos corredores da Ópera... Vira os homens corteses tratarem suas damas com toda a deferência, e procurarem agradá-las... Vira casais apaixonados trocando beijos roubados, passando momentos juntos... Mas isso era tudo o que sabia sobre o relacionamento entre um homem e uma mulher. Seus atos ao sequestrar e tentar força Christine a casar-se com ele mostravam isso: ele não sentia pela moça nada além e um profundo e intenso amor, mas... Não fazia ideia de como demonstrá-lo. Tudo o que fizera fora na intenção de provar a ela que a amava, mas só conseguira assustá-la, exatamente como fizera com aquela droga de beijo!

Descendo do coche, ele ajudou sua amada a descer. Ela o fitou com olhos tímidos, e então teve a ousadia de tocá-lo! Mas aquele era um toque tão suave, tão carinhoso, que ele não teve forças de se afastar. Pelo contrário, segurou a mão da moça junto a sua face, e abriu os olhos para observá-la melhor, a pura expressão da beleza, que tinha um ar culpado no rosto.

— Anjo... Perdoe-me. Perdoe-me pelo tapa, eu... Você é a última pessoa a quem desejo magoar, mas... – Ela estava corada, e lacrimejou um pouco – Estou lutando contra as lembranças,  meu amor. Estou lutando com todas as minhas forças, mas... Às vezes reajo sem controle. Quando percebo, estou imersa em uma memória, o terror me toma, e me faz reagir. – ela gaguejava e falava com dificuldade, mostrando o quão forte ainda era seu trauma – o que eu quero dizer é que... Eu não quis fazer... – Erik a silenciou, pousando um dedo sobre seus lábios. Ele sorria, não um sorriso radiante, mas um compreensivo, e falou:

— Eu sei. Também tive culpa nisso. Sua dor ainda é muito recente, e eu deveria respeitar isso. – ele a viu corada e de olhos baixos, e perguntou – o que foi? Sabe que pode me dizer o que for.

— Seria muito... Estranho... Se eu perguntasse se posso lhe beijar? – perguntou ela, erguendo o rosto. Ele riu e a abraçou:

— Seus beijos são uma alegria para mim. Mesmo que o preço seja um tapa, cada toque de seus lábio valerá à pena. – disse ele, e beijou-a outra vez, agora de modo lento e gentil, sem forçar o ritmo. Controlou-se ao máximo, e conseguiu manter o beijo delicado e gentil, em vez do beijo feroz pelo qual seu corpo e mente ansiavam. Quando se separaram, falou – Como eu já lhe disse, meu amor... Temos todo o tempo de que precisar.

— Eu queria não ter de esperar... – resmungou ela, baixinho, para si mesma. Erik pensou ter ouvido errado, e perguntou:

— O que disse?

— Nada! – ela pegou a cesta, para disfarçar, enquanto o Anjo desatrelava César da charrete e o punha a pastar perto de um regato raso, onde o animal poderia matar a sede. E o modo como o Fantasma cuidava de seu animal, falando baixinho com ele e dando tapinhas gentis nos flancos do corcel, que resfolegava de alegria, fez a moça sorrir. Por baixo da máscara de assassino, Erik tinha uma alma gentil. – Eu te amo, Erik Destler.

Ele parou o que fazia, ante aquelas palavras, e seu olhar era sereno, cheio de uma felicidade surpresa.

— Eu também te amo, Christine. – ele a tomou pelo braço e a acompanhou pelo campo até o bosque – venha, quero lhe mostrar uma coisa.

Adentraram juntos as árvores, até chegar a uma clareira onde borbulhava uma fonte cristalina. Christine estava fascinada e encantada com tudo aquilo, e ele sorria ao ver o encantamento dela.

Abrindo a cesta, Erik estendeu no chão a toalha, onde ambos se sentaram juntos, ouvindo o som dos pássaros e da pequena fonte. Era como estar num cantinho do céu. Como se a cena desagradável do percurso até ali não se houvesse passado.

Conversaram e riram, felizes, falando de assuntos amenos, até que Erik ficou sério, de repente. Preocupada, a moça indagou o que havia, e ele respondeu:

— Christine... Quero lhe dizer algo delicado.

— Diga, meu Anjo. Não creio que haja mais espaço para volteios, entre nós.

— Pois bem... Nós temos vivido como casados. Você vive em minha casa, dormimos na mesma cama... Isto não é certo. – ele procurou pensar bem em suas palavras – veja bem... Se dependesse de minha vontade, eu a levaria agora até uma capela, e nos casaríamos, e toda mancha em seu nome seria apagada. Mas eu já desconsiderei sua vontade uma vez e... E tudo aconteceu de um modo totalmente errado. Assim, eu quero saber o que você quer.

— Se eu quero me casar com você? – perguntou ela, com alegria e receio a um só tempo.

— Não apenas. Quero que você entenda ser livre: se quiser ir para a casa de Madame Giry, e trabalhar no conservatório, eu vou entender, mas... – suas palavras foram interrompidas por um beijo de Christine, que disse:

— Eu quero ser sua esposa, Erik. Sua, e de mais ninguém. Sempre pertenci a você, mesmo enquanto tentava fugir disso, e isso não vai mudar. Eu te amo. Entende isso? Eu te amo. – Ela ficou séria – mas nos casarmos... Eu... Eu queria muito. Eu quero muito. Mas como...

— Sabe que jamais a tocarei sem que esta seja sua vontade. – ele pôs uma mecha de cabelos dela para trás - Casados ou não, não importa. Eu te amo. – eles se beijaram novamente, e de repente todo o estranhamento desapareceu! Estavam à vontade um com o outro, estavam felizes por estarem juntos.  Ele a puxou para outro beijo, mas ela escapou. Não de medo, como Erik pensou que seria, mas lançou-lhe um olhar faceiro, livrando-se dos sapatos e caminhando ali por perto, ao redor das árvores. Debruçou-se em um tronco inclinado e sorriu para ele.

Fascinado pela beleza de sua amada, que agora assemelhava-se a uma linda ninfa, o Anjo se perdeu em contemplação: queria gravar a fogo na memória cada simples detalhe daquele momento, cada cor, cada som, cada forma... Mas o que já era belo tornou-se perfeito quando ela começou a cantar. Cantava uma melodia sem letra, suave e melodiosa. Aproximou-se do Anjo, sempre cantando, e sentou-se ao seu lado. Ele respondeu à melodia dela, juntando suas vozes, e acariciou seus cabelos. O tempo perdeu sentido, a vida perdeu qualquer motivo que não fosse o ali e o agora, naquele perfeito começo de tarde.

 


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Notas finais do capítulo

E então? O que acharam?
Beijos enormes, flores do nosso jardim!