Roda do Tempo escrita por Seto Scorpyos


Capítulo 7
Capítulo 7




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Harry abriu os olhos e encarou o teto escuro. Piscou algumas vezes para se localizar e mexeu o corpo levemente, fazendo uma careta ao senti-lo pesado. Virou a cabeça de um lado e quando o fez do outro, deu com Luna e um sorriso a seu lado.

— Bem vindo de volta, Harry! – ela murmurou, inclinando na cadeira.

Ele sorriu de volta, incerto.

— Oi...

Quando tentou se levantar, ela o impediu suavemente.

— Você não está bem o suficiente, Harry. – disse, ainda baixinho.

— O que aconteceu?

Ela se sentou e puxou a cadeira para mais perto dele, ganhando tempo ao servir um pouco de água fresca para o bruxo, que não a recusou.

— Luna... – ele acrescentou, ajeitando a cabeça.

— São notícias ruins, irmão. Eu não sei se sou a pessoa mais indicada... – parou, ainda sem olhar para ele – Talvez amanhã, alguma outra pessoa.

— Não faça isso comigo, irmã. – ele respondeu, rouco – Ninguém é melhor do que você para me dizer o que exatamente tenho que enfrentar quando aquela porta se abrir, amanhã ou daqui a vinte minutos.

Harry a observou segurar sua mão entre as delas. Os olhos azuis se suavizaram e ele se preparou.

— Tem duas semanas que está desacordado, acho que os efeitos da imperdoável se juntaram com os ferimentos do ataque e tudo acabou resultando no seu esgotamento. Você se queimou nos braços e  mãos, mas já está quase curado. – ela parou e molhou os lábios – Arkyn está bem, quero dizer, mais ou menos, mas está bem. Andreas perdeu um braço... – Harry arregalou os olhos e ela o encarou, segurando mais firme a mão entre as suas – Tek está imobilizado do pescoço para baixo e ainda não acordou... e...

O bruxo a encarou de volta e depois de alguns minutos, os olhos verdes se encheram de lágrimas.

— Não...

— Sinto muito, Harry.

— Droga, não... não... – ele murmurou, as lágrimas escorrendo.

Luna segurou a mão dele e acariciou o cabelo revolto enquanto o amigo chorava baixinho. Longos minutos se passaram até que ele se controlasse um pouco. Cuidadosa, ela buscou um lenço na bolsa e secou o rosto moreno.

— Sobrou alguma coisa de pé? – ele perguntou, depois de mais alguns minutos de silêncio.

— Não. A casa foi arrasada totalmente. – a loira respondeu baixinho – O que sobrou foram pequenas coisas, que eu juntei e coloquei numa caixa. Está na minha bolsa, eu não quis que ninguém mexesse...

Ele virou a cabeça e a encarou. – Você foi até lá?

— Fui, mas não precisa brigar, Rolf foi comigo e me ajudou. Estava tudo cercado com magia, para afastar os curiosos e tive que brigar com Hermione, que não queria que eu tirasse nada de lá sem que os investigadores do ministério tivessem feito um laudo. – a loira bufou, irritada – Como se eu fosse prejudicar ou algo assim...

— Ela pode ser muito chata quando quer. – o bruxo comentou, seco.

— Muito! Ela e o marido se merecem! – Luna colocou a mão de Harry com cuidado sobre a barriga dele – Gina esteve aqui e armou o escândalo de sempre... e até Sirius, também tentou entrar à força e chegou a dar uns berros... Não sei o que pensaram que fazer isso ia resolver.

— Posso ver o que sobrou? – o mago perguntou, fazendo força para se levantar. Quando ela se aproximou de novo, ergueu os olhos – Por favor, Luna...

A loira o ajudou a se sentar e colocou mais travesseiros atrás dele. Depois, sentou-se de novo e abriu a bolsa, mas teve que usar um feitiço para achar a caixa.

— Como eu disse, leva a casa aí dentro... – ele gracejou, olhando-a com carinho.

— Não enche! – Luna devolveu, mas estava sorrindo.

Dentro da caixa, depois desta aumentada, havia poucas coisas e tudo miniaturizado. Algumas peças de roupas e livros, alguns frascos e uma caixinha de itens de poções. O mago balançou a cabeça e então sorriu, erguendo a mão. Estava segurando uma pequena caixa amarela desbotada.

— Por Merlin! Que ótimo! – disse, recostando-se aos travesseiros.

Luna encarou a caixinha. – Algo importante?

— Sim. Tudo. – ele respondeu, guardando-a de novo – Pode ficar com você até eu sair daqui?

Ela sorriu e voltou a coloca-la na bolsa.

— O que tem na caixinha? – perguntou, depois de alguns minutos.

— Tudo o que eu considero mais importante. – ele se aninhou e ela o cobriu com cuidado – Ainda bem que tive a idéia de guardar tudo e proteger com feitiços... - Luna o observou enquanto ele fechava os olhos – Tudo o que vou precisar para pegar os malditos...

A bruxa tirou alguns travesseiros e acomodou o amigo, que não voltou a abrir os olhos.

****

Harry encarou a casa e sentiu a raiva começar a borbulhar no peito. Lupin, a seu lado, olhou para o auror, preocupado.

— É sério, isso? – o mago perguntou, os olhos verdes estreitos.

Gina o olhou e então, pegou da mão de Sirius uma bolsa leve com roupas.

— Mas é claro que é! Sua casa, Harry. Vamos, entre, as crianças estão esperando!

Empolgada, a bruxa não notou que o auror sequer se mexeu. Foi na frente segurando as poucas roupas que Lupin levara para ele de manhã no hospital. Na porta da casa, os três filhos o encaravam e apenas o mais velho estava um pouco sem jeito. Lílian estava mexendo o cabelo, olhando para as unhas.

— Vem logo! – Sirius pegou o braço de Harry e puxou com força, desequilibrando-o.

Remus olhou feio para o companheiro, ajudando o auror a se ajeitar.

— Sinto muito, Harry.... – murmurou, envergonhado.

— Sente mesmo?

Sirius parou a dois passos do afilhado, olhando-o irritado.

— Qual é o seu problema, hein! Vai ficar aí parado por quê?

— Você está me vendo, Sirius? – Harry perguntou, encarando o outro nos olhos.

O mago bufou e olhou para cima. – Deixa de ser idiota, garoto! Vem logo!

— Volto a perguntar: está me vendo, Sirius?

O outro finalmente pareceu perceber que o clima mudara e deu um passo para trás.

— Harry... – Lupin tentou, alarmado.

— No que estava pensando em me trazer para cá? – o auror perguntou, sem desviar os olhos do padrinho – Eu me separei da Gina, se não se lembra, e aqui é o último lugar em que ficarei para me recuperar.

Sirius piscou e balançou levemente a cabeça. – Sua família está aqui, Harry e...

— Minha família? – havia sarcasmo na voz do auror – Acha que eu não sei que eles estão usando o sobrenome Weasley?

— Harry, talvez se entrarmos... – Remus ofereceu, sem saber direito o que fazer.

— Ou talvez esteja se referindo a Gina, que aproveitou a visita dos filhos e deu meu endereço ao jornal, causando morte e destruição apenas para se vingar um pouco de mim. – os olhos verdes caíram sobre a bruxa, parada um pouco além do portão, pálida – Está magoada e amarga, não é? Mas agora acho que não é mais minha vítima inocente.

— As crianças não... – Lupin tentou, mas Harry o fulminou com o olhar.

— Não são mais crianças, Lupin. São filhos da Gina. – o auror rebateu, cáustico – Querem ser filhos do herói e não do homem. Nunca sequer olharam para o homem, nunca foi importante para eles. Isso deve explicar porque foi fácil me apagarem totalmente de suas vidas.

O ar em volta de Harry começou a esfriar e Remus teve que soltá-lo, afastando-se. Sirius encarou o afilhado com preocupação pela primeira vez.

— Podemos ir a outro lugar... – disse, sem se aproximar.

— Você nunca olhou para mim, padrinho. Primeiro por causa da guerra, Ordem da Fênix e todo o maldito resto, depois disse que talvez um dia, mas esse dia nunca chegou. E quando conseguiu voltar do outro lado do véu, não procurou a mim primeiro. Foram necessários dois anos até que finalmente se dignasse a me contar que estava vivo.

Sirius encarou o afilhado sem conseguir responder. Harry ergueu a sobrancelha e sorriu, glacial.

— Acha que me esqueci como se comportaram quando pensaram que eu era o herdeiro de sonserina? – a voz baixou ainda mais – Acha que me esqueci de todas as malditas vezes em que se afastaram por que fiz ou disse algo que não combinava com o herói do mundo bruxo?

Os olhos verdes finalmente saíram de Sirius e passaram pelos outros, caindo sobre os três parados na porta.

— Eu não quero nem preciso mais disso. – disse, antes de aparatar.

— O quê... – Gina ainda correu até onde o auror estivera parado, mas não conseguiu alcançá-lo.

— Estão usando o sobrenome Weasley, Gina? – Remus perguntou, gelado.

A bruxa o encarou e então ajeitou os cabelos.

— Desculpe, Remus, mas isso não é da sua conta. – rebateu, sem encará-lo.

Sirius baixou a cabeça diante do olhar afiado e o professor respirou fundo, antes de aparatar sem se despedir.

— Acho que não devia ter feito... – ela murmurou, pálida.

— O quê? Trocar de nome ou dar o endereço dele para os jornais? – Sirius perguntou, suspirando – Acho que dessa vez ele ficou realmente com raiva.

— Qual o melhor lugar para ele se recuperar? É junto com a família, Sirius! Tentamos para o bem dele! – a mulher rebateu, nervosa – Aqui ele iria ter todo o cuidado do mundo e talvez...

— Bem, não deu certo e duvido que consigamos chegar perto dele de novo. – o tom soou sombrio e o olhar pesado dele caiu sobre a bruxa – Como assim são só Weasley? Você até comentou que estava com vontade de trocar, mas nunca pensei que realmente faria.

Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e molhou os lábios, sem erguer os olhos.

— As crianças estavam sofrendo na escola... e em todos os lugares... achei que ia melhorar porque não existem muitas fotos deles... – apertou a alça da mochila de Harry – Só queria que meus filhos não sofressem...

— Mas isso apenas trouxe mais problemas, além de ser injusto. – Sirius rebateu, sério – Você os arrastou para a confusão quando os colocou contra Harry...

— Eu não os coloquei contra Harry! – Gina ergueu a cabeça, o rosto vermelho – O escândalo estava aí! Para todos verem! Eles souberam de tudo! Como fui traída e todo o resto! Traída! E se ainda não fosse horrível o suficiente, ele arrumou um amante! Um homem! E o pior inimigo dele durante anos! Um comensal da morte!

As palavras se tornaram gritos e Sirius se encolheu, irritado. Os jovens já tinham entrado na casa e apenas os dois estavam parados no jardim.

— Se você fosse uma boa... – ele começou e ela ficou ainda mais irritada.

— Eu fui uma boa esposa, uma boa mulher para ele e uma ótima mãe para nossos filhos! Foi ele que jogou tudo fora! Foi ele que trouxe a podridão para nosso casamento! Eu sou inocente! E agora, mesmo fazendo de tudo para ter minha vida de volta, ainda tenho que ouvir...

— E como amante dele, Gina? – o bruxo a interrompeu, seco – E como companheira e cúmplice dele? E os namoros no fim da noite, as viagens a sós...

A mulher balançou a cabeça, desprezando a intervenção com um gesto.

— Éramos casados e temos filhos... ninguém espera que haja muito romance com três crianças e toda a responsabilidade do ministério...

— Talvez era o que ele estava esperando. – Sirius rebateu, antes de aparatar, deixando a bruxa sozinha.

*********


     Luna escutou o plopt característico e se virou, assustada. Harry não sustentou o peso do corpo e caiu, gemendo baixo de dor.

— Harry! – ela o ajudou a se deitar no sofá, aflita – Por Merlin!

— Po... posso ficar por aqui? – a voz dele soou rascante e baixa.

— Claro! Não precisava nem perguntar. – ela respondeu, ajeitando uma manta sobre ele – Até fui ao hospital, mas o professor Lupin disse que já tinha um apartamento...

— Não era.

— Não era o quê? – a loira perguntou, sentando-se no chão ao lado do amigo.

— Não era um... apartamento. – ele se virou e ajeitou o corpo, franzindo a testa com o esforço – Era a casa da Gina.

A palavra que ela soltou soou como um palavrão e ele sorriu, fechando os olhos.

— Concordo plenamente.

************

 

Arkyn e Harry ficaram em silêncio diante da lápide de Janus, no cemitério vazio. A pequena aldeia natal do auror, longe dos grandes centros, ainda trazia aquele ar de século passado.

— A família dele está assistida? – o mago perguntou, depois de alguns minutos.

— Sim. O ministério disponibilizou uma pensão para a viúva, e tem também os valores dele no banco, que ficaram para ela. – Arkyn respondeu, baixo.

— Acha que é o suficiente?

— Bom, eles tem um tempo de casado, mas não tiveram filhos. Ela vai ficar bem. – Arkyn respondeu, observando Harry se abaixar e tirar um tufo de grama da lápide – Já conseguiu um lugar para morar?

— Estou com Luna, Rolf e os garotos por enquanto. – o auror teve que se apoiar no amigo para se levantar – Moro na parte de cima do celeiro deles.

O silêncio voltou e Harry respirou fundo, olhando para cima e passando a mão pelo cabelo.

— Adeus, amigo. – murmurou para a lápide.

Os dois se viraram e Arkyn varreu o lugar com o olhar. Harry encolheu os ombros, colocando as mãos dentro do casaco.

— Fiz um feitiço simples de ocultação. Não podem nos ver. – explicou, baixo.

— Achei mesmo que você não estaria totalmente desprotegido aqui.

— Não mesmo. – a voz do mago saiu cansada – Onde estão Andreas e Tek?

— Vamos nos encontrar com eles saindo daqui. Está bem para aparatar? – Arkyn perguntou, estendendo a mão.

— Não, mas isso não me impediu até agora. – Harry respondeu, segurando a mão estendida com firmeza.

**************


— O ministro fez o quê? – Harry perguntou, começando a se irritar.

— Harry, relaxa, por favor. No meu estado atual, enquanto não conseguir dominar minha magia e até conseguir usar o braço esquerdo, não sou de muita ajuda. – Andreas interveio, soando conformado.

Ele não deixou a manga vazia balançando, antes a prendeu com o cinto.

— E eu estou fazendo exercícios. – Tek acrescentou, a voz forte apesar da palidez – Os mendibruxos que estão me tratando estão otimistas que posso recuperar os movimentos, mas eu não me apego muito a isso. Não quero ser decepcionado depois de todo esse esforço.

O mago olhou o amigo na cama, recostado em travesseiros. O auror estava mais magro e pareceu realmente frágil, mas o brilho no olhar indicou que ainda não estava vencido.

— Acha que existe uma chance de não conseguir? – Harry perguntou, aproximando-se e sentando-se ao lado da cama – Quero saber quais poções está tomando e quais feitiços foram usados.

Tek respirou fundo e riu, acompanhado por Arkyn e Andreas.

— Qual a piada? – o mago perguntou, olhando de um para outro.

— Eu disse que faria isso. – Tek respondeu, olhando o amigo – Eu sabia que não me deixaria nas mãos deles apenas.

— Não quero dar uma de sabe tudo, mas posso dar uma olhada. – Harry comentou, baixo – Não é legal te ver assim.

Houve um momento de silêncio constrangido e então, Arkyn puxou uma cadeira e se sentou, Andreas fazendo o mesmo.

— Um resumo rápido nessas três semanas que ficou longe, Harry. – Arkyn começou, sério – O ministro designou Mills e Talbot para a segurança dos Malfoy e cada um levou seus homens, cerca de quatro cada um. Mas posso dizer que estão passando um perrengue doido, já que foram cinco ataques nesses dias e o último, visou exclusivamente o Malfoy filhote.

Harry franziu a testa, pensativo. – Alguma baixa?

— Não. Parece que os atacantes estão tomando mais cuidado agora. Isso é interessante, eles parecem preocupados em não ferir os aurores. – Andreas respondeu, balançando a cabeça – Li os relatórios e vi as memórias, não tenho dúvidas que eles estão tomando cuidado.

— E agora tem uma mudança... um bilhete para Lucius Malfoy informando que ele pagará por seus erros. – Arkyn acrescentou e encolheu os ombros diante do olhar de Harry – Tentamos descobrir algo do bilhete, mas não conseguimos.

— Onde o bilhete foi deixado? – o mago perguntou, depois de alguns minutos.

— O primeiro foi deixado em um escritório ao lado de Gringotes. Parece que é de lá que os Malfoy fazem a administração das propriedades. O primeiro ataque foi lá também. – Arkyn explicou, respirando fundo – Depois mais dois foram deixados, o último com Scorpius desmaiado. A mensagem era a mesma em todos eles.

— Isso é curioso... – Harry se levantou e caminhou até a janela, balançando a cabeça.

— E não faz sentido. – Tek se manifestou pela primeira vez, atraindo os olhares – Quero dizer, o Malfoy pai foi um comensal da morte e só não foi preso por causa das conexões importantes, o filho foi pelo mesmo caminho e só a derrota de Voldemort interrompeu a carreira.

— É mesmo... – Andreas murmurou, pensativo.

— Veja bem... Quantas pessoas o Malfoy pai seqüestrou e torturou, talvez até  matou por Voldemort na primeira ascensão? – Tek voltou a falar – Na segunda acho que ele não foi tão ativo assim, mas na primeira... ele foi um de confiança da cobra...

— E além do mais, ele fugiu do interrogatório e não deu informações, mas quando o neto foi atacado, eu o achei abalado, apesar de tentar esconder. – Arkyn comentou, erguendo os olhos para Harry – Pode ser um palpite furado, mas acho que ele tem uma idéia boa do que está acontecendo e quem quer a cabeça dele.

— Mudando de assunto, não encontramos Dekell. – Andreas falou, seco – Namorada, pais e amigos... ninguém tem notícias dele.

Harry se encostou à janela e inclinou o corpo, cruzando as pernas. Pensativo, encarou a ponta do tênis por longos minutos e ninguém o interrompeu.

— Para ser totalmente lógico, Lucius deve ter feito alguma coisa com alguém e agora, um parente ou amigo... talvez marido ou namorado... esteja querendo a pele dele como pagamento. – comentou, ainda pensativo – O que não consigo entender e nosso papel nisso tudo. Quero dizer, começou com um ataque a nós, especificamente.

— Eu não ia dizer nada, mas tem uma coisa estranha aqui. – Andreas começou, hesitando – No primeiro ataque, Janus foi chamado e então, chamou Harry. O usual seria uma mensagem para todos, mas não foi isso o que eles fizeram. Dekell chamou Janus que por sua vez, chamou apenas Harry. A cadeia se quebrou quando Harry mandou a mensagem pedindo por apoio.

Os quatro ficaram em silêncio, pesando as conclusões. Andreas respirou fundo e balançou a cabeça.

— Na sua casa, quando fomos atacados, ele estava a seu lado, não é? – perguntou para Harry, baixinho.

— Tentamos fazer um escudo. – o auror respondeu, seco.

— O viu pegar a varinha? – a pergunta veio suave – Ou o ouviu dizer alguma coisa?

Harry encarou Andreas, que apesar da palidez não desviou o olhar.

— Não lembro muito bem, mas acho que não.

— Você estava fraco por causa da imperdoável... eles sabiam disso e foram com tudo, mas...e se o alvo foi Janus e não você? – Tek perguntou, franzindo a testa – De repente, estavam cortando as pontas soltas.

O mago respirou fundo e encarou os amigos.

— Ok. Vamos checar isso. Andreas fica com a casa de Dekell e Arkyn com a de Janus.

— Fui dispensado do serviço depois de perder o braço! – Andreas exclamou, confuso – Os mendibruxos até tentaram fazer os ossos crescerem ou algo assim mas todos foram arrancados! Eu não...

Harry o observou, a cabeça inclinada levemente.

— Eu sou o chefe dos aurores e digo que está dentro. Faça um feitiço de ligação com Tek e ele será seus olhos e ouvidos. Qualquer sinal de perigo, peçam ajuda nível vermelho. – voltou o olhar sério para o homem na cama – Qualquer sinal de perigo, ok?

Arkyn se levantou e olhou os dois.

— Querem ajuda com o feitiço, pombinhos? – perguntou, divertido.

— Morra! – respondeu Andreas, sério.

— E onde vai estar, chefe? – Tek perguntou, um pouco mais animado.

— Vou voltar para o ministério. Antes vou passar no hospital e verificar seus medicamentos e então, quero ver o que o ministro conseguiu com Lucius Malfoy.

*******

De cabeça, Harry podia listar pelo menos mais três poções que Tek devia estar tomando para os músculos se revigorarem mais rápido, mas simplesmente deixou para lá.

“Vou verificar se alguma está nas que sobraram e se não, posso providenciar os itens para fazer, nem é tão complicado...” pensou, atravessando o grande salão do ministério, absorto demais para notar os olhares e os cochichos.

Hilda quase o sufocou com perguntas e então, serviu suco de abóbora gelado e deixou-o trabalhar, mas o mago logo deixou os relatórios de lado e quando já ia se levantar, a porta se abriu de repente.

Draco Malfoy literalmente invadiu sua sala, com Hilda reclamando e tentando impedi-lo. Harry os olhou por um momento e então, suspirou.

— Tudo bem, Hilda.

A secretária fulminou o loiro com o olhar e saiu, deixando a porta aberta. Draco se virou e a fechou, mas quando voltou para perto da poltrona, a porta se abriu de novo. O loiro chegou a se virar para voltar, mas a voz calma do auror o interrompeu.

— Nada de portas fechadas por aqui, Malfoy.  – disse, sentando-se – O que posso fazer por você?

— Não há nenhum tipo de privacidade aqui? – o loiro devolveu, a sobrancelha erguida.

— Não, na verdade, mas fique a vontade para fazer um feitiço de silêncio, se quiser.

A resposta desinteressada de Harry fez Draco comprimir os lábios, desgostoso. Um rápido feitiço isolou o som na sala.

— O que é isso? – este perguntou, observando pequenas explosões de luz pela sala.

— Existe outro feitiço aqui que identifica magia sem ser a minha. Não se preocupe, confirmei seu feitiço. – colocou as mãos sobre a mesa e encarou o outro – Dizia...

Draco voltou alguns passos e se sentou, olhando para a sala arrumada e a porta aberta. De onde estava podia ver Hilda em sua mesa, escrevendo alguma coisa.

— Isso é muito desagradável. – comentou, seco.

— É tudo o que vai ter. – Harry rebateu, sem se abalar.

Ambos se encararam e pela primeira vez, o auror não foi o primeiro a quebrar o silêncio.

— Mandei diversas cartas e não respondeu... – apoiando o braço aristocraticamente no castão da bengala, Draco encarou o ex amante – Me deixou esperando.

— Achou mesmo que eu iria? – o mago perguntou, um pouco surpreso.

— Você nunca deixou de atender um chamado meu. – o loiro reclamou, torcendo um pouco o lábio.

— É... mas pode ir direto ao assunto? Tenho que ir ao Saint Mungus.

O loiro estreitou os olhos. – Ouvi dizer que estava bem.

Harry apenas encarou o outro, sem vontade nenhuma de dar explicações. Draco aguardou em silêncio que o outro acabasse contando tudo. Ele sempre fazia isso.

Durante longos minutos, nenhum dos dois disse nada e então, Harry se levantou, provocando um meio sorriso em Draco, que logo sumiu ao ver o moreno se encaminhar para a porta.

— O que está fazendo? – perguntou, abismado.

— Estou indo embora. – o outro respondeu, parado já no portal – Vejo que está a fim de jogar e eu não tenho tempo nem vontade para isso, Malfoy.

— Potter! Isso é... – começou, se levantando. A raiva o fez apertar a bengala até os nós dos dedos embranquecerem ainda mais.

— Desagradável, insultuoso ou o que seja, Malfoy. – o auror deu um passo para fora – Aceita que dói menos...

Draco engoliu seco a raiva e tentou se controlar.

— Estou aqui por meu pai. Soube do último ataque, não é? – perguntou, odiando a forma como o moreno simplesmente se virou e cruzou os braços, ainda no portal.

— Sim, eu soube. – o auror respondeu – Mas acho que Mills e Talbot são os aurores designados para a família Malfoy.

— Você não é o chefe deles? – o loiro perguntou, elevando uma sobrancelha.

— Sou, mas se está desatualizado sofri um ataque também, estive no hospital e tenho alguns amigos doentes e precisando de ajuda. – o moreno rebateu, calmo – Não posso estar em todas as frentes ao mesmo tempo.

— Porque se recusou a fazer nossa segurança? – Draco se sentou ao ver Harry voltar e se sentar na ponta de uma mesa, no canto da sala.

— Porque conheço você e sei que ia usar qualquer chance que tem para conseguir o que quer.

Draco sorriu, provocativo.

— Está com medo de mim, Potter? – perguntou, jocoso.

— De você? Não. Do que pode fazer? Com certeza. – o moreno balançou a cabeça, soando resignado – Ainda te amo, por mais que isso seja idiota depois do que fez, mas não há nada que eu possa fazer por enquanto. – olhou o loiro nos olhos – E sei que você usaria meus sentimentos a seu favor sem qualquer tipo de remorso.

A admissão calma e consciente de Harry fez Draco piscar e finalmente, demonstrar algum tipo de reação. Ele desviou os olhos e levou alguns minutos para se recompor.

— Seu pai sabe ou tem suspeitas fortes de quem seja o atacante. Não é um perigo para as outras pessoas ou uma ameaça para o mundo bruxo, então, não vejo porque tenho que bancar o guarda costas para a sua família. – o auror continuou, sério – E mesmo assim, acabei salvando a pele do seu pai de uma imperdoável. Acho que estou com crédito para recusar arriscar fazer isso de novo.

— Meu pai está estranho desde que tudo começou. – o loiro falou, sem encarar o moreno – Tentei sondar para saber se pode um comensal com alguma rixa ou algo do tipo e ele desconversou...

O auror não disse nada. Draco estava apenas sintetizando o que já sabia e isso não levava a nada. Concentrou-se em manter as defesas erguidas e não dar brecha para que o outro não o arrastasse novamente para um pesadelo.

Draco ergueu a cabeça e encarou o outro com atenção.

— Não tenho muita confiança que os outros nos ajudarão... você é o chefe dos aurores e já provou que é capaz. Se eu prometer não... – sorriu, malicioso – te provocar muito, vai reconsiderar?

— Não.

O loiro arregalou levemente os olhos e se levantou.

— Harry, seja compreensivo. É da minha família, do meu filho que estamos falando. Eu só quero garantir a segurança deles e...

— Garantir uma boa diversão no processo. Eu entendi – o auror completou, seco.

— Meu pai disse que o encontrou no apartamento. – o loiro se aproximou, disposto a mudar de tática – Não é verdade que dividimos o espaço... na verdade, nem sabia que ele mantinha amantes... ele mentiu, Harry. Para te fazer se afastar porque desconfiou que eu não ia fazer o que ele queria.

Draco se irritou com a calma que viu nos olhos verdes e desviou os olhos, irritado também com a porta aberta.

— Não podemos mesmo ter privacidade? – perguntou, passando a mão pelo cabelo.

— Seu pai pediu ao ministro que eu fosse o segurança de vocês, mas eu recusei. Agora você está aqui, tentando com todos os argumentos para me fazer capitular. É triste pensar que seu pai é capaz de te prostituir depois de tudo o que me disse naquele apartamento, apenas para não ter que encarar as consequências de seus atos.

Harry se levantou e caminhou para a porta, passando tão perto de Draco que este pode sentir o cheiro do perfume suave que estava usando. Outro detalhe novo e surpreendente no auror sempre desligado de si mesmo.

— Está me chamando de prostituta do meu pai? – a voz de Draco falhou, de raiva e súbito desejo – Como ousa...

O auror parou no portal e o encarou de novo.

— Não é ousadia. São os fatos. Eu recusei os três pedidos de encontros que me mandou, e agora recuso o cargo de guarda costas da sua família – balançou levemente a cabeça – E devo ressaltar que tais convites só surgiram depois da recusa. Fala sério, Draco, você teria me procurado se seu pai não tivesse ordenado?

— Não estou aqui porque meu pai mandou. – o mago respondeu, irritado.

Harry ergueu uma sobrancelha, cético. – Eu não acredito em você.

Draco o encarou com mais raiva. – Não tenho que te provar nada!

— Concordo. Agora por favor, eu tenho mais coisas a fazer. – com um gesto de cabeça, Harry indicou a porta.

O mago passou por ele bufando, sendo observado por Hilda e Harry, que apenas trocaram um olhar. O auror deixou passar alguns minutos e fechou a porta, saindo.

— Vou ao Saint Mungos, Hilda. Se der volto hoje. – avisou, vestindo o casaco.


No saguão do ministério, Harry acabou reencontrando Draco, que simplesmente virou o rosto ostensivamente. O auror balançou a cabeça e atravessou o corredor, para ir a uma lareira mais longe. Antes que completasse o caminho, uma explosão o jogou contra a parede e por reflexo, usou os braços e um feitiço amortecedor. Assim que se virou, arregalou os olhos ao ver pelo menos nove bruxos encapuzados em vassouras, dentro do saguão.  Eles lançaram alguns feitiços nas lareiras, que apagaram o brilho verde e o auror soube que estavam desconectadas. Olhando em volta, viu algumas pessoas machucadas pelos pedaços de paredes e outras se levantando lentamente, Draco entre elas.

Um dos bruxos encapuzados se aproximou dele e Harry se levantou, parando ao ver uma varinha diretamente apontada para sua garganta.

— Sem heroísmos hoje, Harry. – a voz soou rouca e baixa – Quantas vidas acha que ainda tem?

Sem esperar resposta, o invasor tirou o capuz e o auror piscou diante da figura do outro. Se não fosse por ser certamente mais velho e ter cicatrizes no rosto, estaria olhando para uma cópia de Draco Malfoy.

— É assustador, não? – o homem sorriu sem humor e deixou outro bruxo no lugar, ameaçando o auror de perto.

Perto demais para o gosto de Harry, que tentou manter a calma ao ver o homem atravessar o espaço e parar de frente para Draco, que não escondeu a surpresa. Os dois se encararam por um longo tempo.

— Você machucou meu filho. – Draco quebrou o silêncio, soando gelado.

— Seu pai, ou devo dizer, nosso pai, só entende a linguagem da ameaça. – o outro respondeu, calmo.

Draco franziu a testa, mas não teve tempo de dizer nada.

— Sim, sou filho de Lucius Malfoy, o primogênito dele, apesar de bastardo. E não devia, já que ele prometeu à minha mãe, Missy, que se casaria com ela e eu seria o herdeiro.

Harry arregalou os olhos ao ouvir o homem. “Missy?” pensou, espantado “A ex esposa de Urick?”

—... então ele a deixou, e nunca mais voltou. Ela ficou esperando como boba, vivendo afastada de tudo e todos, sonhando com a glória e o dinheiro que ia desfrutar... – ele se aproximou de Draco, que se manteve imóvel – Meu nome é Dionísius, e foi ele mesmo que escolheu. Devia ser Dionísius Malfoy, mas sou apenas Dionísius, filho de Missy. Por causa da covardia dele.

— Eu não sabia disso. – Draco comentou, os olhos estreitos.

Dionísius riu, balançando a cabeça.

— Eu acredito. Ninguém devia saber sobre mim e minha mãe. No começo vivíamos de uma mesada que ele mandava. Dinheiro bom, que fez minha mãe pensar que era para sempre. Só que não foi. – o bruxo abriu a capa e mostrou um medalhão elaborado com o brasão Malfoy no centro – Isso foi tudo o que restou.

— Eu e minha família não temos nada a ver...

— Nada a ver com meu sofrimento? – o homem interrompeu Draco, aumentando o volume da voz – Não tem nada a ver com tomar o meu lugar e sua mãe, o da minha? – os olhos azuis avermelharam de raiva e Draco lamentou ter dito alguma coisa – Quando o dinheiro acabou, minha mãe começou a vender as coisas da casa... depois começou a beber e usar ervas de sonho... sumia por semanas, indo atrás do seu pai e sendo rejeitada... até que por fim, me deixou na porta de um orfanato trouxa e sumiu de vez.

Os rostos dos dois bruxos estavam agora a centímetros um do outro e Draco temeu pela primeira vez.

— Eu cresci sem saber porque era tão diferente até que encontrei um bruxo que me ajudou, mas também me obrigou a ser seu escravo. Consegue imaginar o que isso faz com alguém de sete anos? Até que por fim eu o matei, mas já estava do lado bruxo da coisa e aprendi o que precisava sozinho. – o homem se afastou alguns passos, mas dois outros cercaram Draco por trás – Sou um ótimo detetive, sabia? Podia ser auror da sua equipe, Harry.

O sorriso que endereçou ao auror foi amistoso e Harry sorriu de leve de volta, balançando a cabeça.

— Não ameaçando gente inocente. – respondeu, calmo.

— Draco não é inocente. – Dionísius rebateu, seco.

— Não estou falando dele nem de mim, mas dos outros. Deixe esse pessoal sair... o lugar já deve estar cercado. – falou, olhando o outro nos olhos – Eu fico com você.

— Seu senso de dever é impressionante, Harry. Mas me diga, o que fez por Lucius foi por reflexo, não foi? – perguntou, curioso.

— Totalmente. – Harry foi sincero.

— Instinto de auror...  – o mago se aproximou – Um herói, sempre.

— Deixe as pessoas saírem, por favor.

Dionísius e Harry se encararam por alguns minutos e então, o primeiro sorriu.

— Lamento Harry, mas eles tem que ouvir a verdade. Mas não se preocupe, não é minha intenção machucar ninguém, se mantiverem o bom senso. – voltando seus passos, parou perto de Draco de novo – Lorde Voldemort sabia do meu nascimento e tudo sobre a minha mãe, e acho que nos guardou em algum canto da mente para usar depois. Seu pai já estava casado, mas você ainda não tinha nascido.

Harry notou com desgosto que a maioria das pessoas estava ouvindo com atenção e respirou fundo. Era exatamente a atenção que Dionísius precisava para jogar toda a sujeira no redemoinho. Conhecia aquela sensação e sabia que Draco também percebeu, por causa do olhar escuro de raiva e humilhação.

— Na segunda ascensão, ele se encarregou de me achar e me contar tudo. Me deixou com alguns bruxos para me ajudarem a aprender sobre magia e todo o resto... percebi que não sabia nada e fui sedento, aprender qualquer coisa que pudesse me ajudar no dia em que eu e Lucius finalmente fossemos acertar as contas.

— Não devia confiar tanto em Voldemort. – Draco comentou, seco.

— Eu sei. Ele mentiu e enganou todo mundo e não hesitava em usar um aliado se fosse preciso, mas acho que ele também tinha algumas questões com seu pai, por isso me usou para enfraquecê-lo.

— Meu pai sabia onde estava? – o mago franziu a testa, confuso.

— Sim. Seu pai sabia onde eu estava, mas nunca foi me ver. Ele agiu como se eu não existisse, exatamente como antes. – o sorriso doentio transformou o rosto de Dionísius em uma máscara pálida – E agora vou fazê-lo pagar.

Uma grande explosão destruiu a parede lateral e Harry aproveitou para empurrar o bruxo à sua frente para o lado, jogando-o no chão. Invocou um escudo e protegeu um grupo de pessoas, enquanto desarmou dois bruxos encapuzados. Alguns homens do ministério também reagiram.

Draco não foi tão rápido e levou um feitiço que o jogou contra a parede, e no meio do caos e dos gritos, viu Dionísius se aproximar.

— Não vou te matar, irmãozinho, mas quero o que é meu. – disse, sério.

Aurores invadiram o lugar, lançando feitiços para todos os lados. Harry teve que se jogar no chão e rolar para o lado para não ser atingido. Dionísius olhou os recém chegados e sorriu de uma maneira horrível. Ele e seus homens aparataram no meio da confusão.


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