Guertena escrita por KyonLau


Capítulo 4
Personificação do Espírito


Notas iniciais do capítulo

Como vão, pessoas? Bem? Assim espero :3
Está demorando um tiquinho, eu sei. Infelizmente estou meio enrolada em trabalhos e provas múltiplos e infindáveis ♥ Mas tudo bem... A vida segue. E a história também~

Soundtrack: "Uneasiness"
https://www.youtube.com/watch?v=1EYnuMz9OjE



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Alguém cutucava dolorosamente entre suas costelas repetidas vezes, mas Iza não queria acordar. Sentia-se absolutamente cansada, como se tivesse acabado de fazer um simuladão em menos de quinze minutos.

— Para... — disse finalmente, a voz lenta e carregada de sono e preguiça enquanto se virava para o outro lado da cama para tentar achar uma posição mais confortável — Mais cinco minutos, mãe...

As cutucadas continuaram.

Iza bufou, irritada. Desde quando sua mãe era tão insistente? E por que ela não falava absolutamente nada?

Algo em sua mente piscou, e fez ela sentir um arrepio desagradável que descia de sua cabeça até a base do tronco quando se deu conta de que aquilo estava errado. A vaga sensação de sentir-se asfixiar ainda parecia fazer latejar seus pulmões quando Iza finalmente abriu os olhos, assustada.

Pondo-se de pé num salto quase que acrobático, primeiro checou a si mesma. Não havia nenhum ferimento, e nem ela sentia nada doer. Suas roupas estavam secas por alguma espécie de milagre, mas ela podia dar adeus ao dinheiro que gastara no cabeleireiro com aquela escova.

Iza olhou à volta, virando o pescoço com tanta violência que praticamente o deslocou. Ela se encontrava parada em meio à um corredor cujo chão, parede e teto eram todos de um azul tão escuro que ela poderia imaginar que aquele mergulho no quadro realmente a conduzira até o mais profundo Oceano. Não havia nenhuma porta ou janela, apenas mais corredores, e Iza teve a desagradável sensação de que ainda estava na Galeria. E, acima de tudo, não havia ninguém ali que pudesse tê-la cutucado daquela forma.

Aquilo foi como um golpe no meio do estômago. A garota começou sentir-se zonza e precisou procurar algo para se apoiar antes que se esborrachasse no chão. Ela foi tateando pelas paredes lisas até finalmente sentir os dedos passarem por cima de uma superfície diferente. Era gelado e molhado, e quando Iza se afastou para ver melhor, percebeu que eram fios de cabelo que, de alguma forma, saíam da moldura de um quadro onde uma mulher dormia. Com uma exclamação de horror e nojo, Iza deu um salto para trás, percebendo finalmente palavras escritas em uma pequena plaquinha onde deveria ser a descrição do quadro.

— "Quando a rosa murchar... — leu com certa dificuldade devido ao fato de simplesmente não querer chegar perto da pintura — ... você também murchará"? — terminou, estranhando — Que rosa?

Ela deu uma olhada no quadro. Só havia a mulher, ainda de olhos fechados. O fundo do quadro era de um cinza escuro, mas nenhuma rosa, em lugar algum, poderia ser vista.

Sem conseguir entender absolutamente nada, a garota decidiu que era melhor simplesmente ir andando. Não adiantava ficar ali, e aquele quadro a perturbava muito mais do que o do gato preto.

Decidia quanto a isso, ela deu meia volta e virou-se para começar a percorrer, não com certo desgosto, os corredores à sua frente para se deparar com algo que não estava lá há meio minuto atrás.

Iza soltou um berro e se afastou ao ver, no final do corredor, bloqueando sua passagem, uma espécie de manequim. Estava sem a cabeça e o corpo feminino era enfeitado por um vestido vermelho até bastante simples, que certamente nunca atrairia ninguém se fosse posto na vitrine de uma loja qualquer. Suas mãos estavam estendidas para a garota, e seguravam algo.

Se aproximando um pouco mais, mas ainda guardando uma boa distância entre ela e aquela coisa, Iza deu uma olhada melhor no que era, e engoliu em seco. Era uma rosa. Uma rosa de pétalas negras.

— Você... Você quer que eu pegue isso? — perguntou a garota hesitante enquanto apontava para a flor.

Obviamente, ou talvez nem tanto assim, pois àquela altura Iza já achava que nada mais a surpreenderia, o manequim permaneceu parado, a rosa erguida com cuidado, como se fosse algo muitíssimo delicado, que fosse desaparecer ao sinal do menor movimento.

Aqui, Iza admitiu não saber o que fazer. Provavelmente teria tentado passar direto pelo manequim, caso não tivesse lido o aviso abaixo do quadro da mulher bizarra. E ela não podia fingir que aquilo não lhe incomodara. Não entendera direito o que significava a parte de "murchar", mas até ali não lhe aconteceram coisas boas o suficiente para convencê-la de que ela não precisava se preocupar com o que quer que aquilo significasse.

Enchendo-se de coragem, Iza começou a se aproximar do manequim imóvel como se estivesse tentando chegar perto o suficiente de um leão faminto para acariciar-lhe o focinho. A mão direita erguida em direção à rosa tremia e se estendia até sentir a textura sedosa das pétalas acariciarem seus dedos.

Respirou fundo.

Apanhou a rosa.

Iza deu um salto para trás, como se estivesse esperando que algo ali explodisse, mas nada aconteceu. O manequim permaneceu imóvel.

Aliviada, a garota examinou a flor em suas mãos. Nunca antes na vida vira uma rosa com pétalas negras, mas aquela parecia tão real ao toque que era difícil acreditar ser artificial. E enquanto virava e revirava-a na mão acabou acidentalmente espetando seu dedo médio em um espinho particularmente afiado.

Com uma pequena exclamação de surpresa e dor, Iza examinou o dedo machucado. Enquanto observava, uma pequena gota de sangue se formou e então, como que num passe de mágica, desapareceu.

A garota ficou encarando o dedo, perplexa. Não só o sangue havia desaparecido como o próprio machucado, além da dor, também sumiram. Enquanto encarava o dedo curiosa, um barulho se fez ouvir. Parecia algo como pedra tentando se mover. Ou então metal enferrujado.

Já até imaginando o que poderia ter causado aquilo e com um crescente desânimo, Iza ergueu o olhar para ver bem a tempo o manequim, até então imóvel, abaixar os braços com aparente dificuldade, como se não se mexesse à muito, e ela não precisou pensar demais sobre isso para entender que não era bom continuar ali.

Deu um passo para trás.

O manequim deu outro passo, para a frente.

Mais dois passos.

O manequim fez igual.

Iza encheu os pulmões de ar e, segurando a rosa com força, deu as costas para aquela coisa e saiu em disparada pelos corredores.

Ela sequer se atrevia a olhar para trás. O manequim fazia barulho numa frequência suficientemente rápida para ela saber que estaria ferrada se tentasse diminuir o passo nem que fosse só um pouco. Vez ou outra ela o ouvia se esborrachar contra as paredes, mas nem assim parou.

Durante sua corrida ela podia ver que passava por vários quadros, mas não estacou para vê-los tampouco. Eles passavam como um lampejo de cores por sua visão periférica e logo desapareciam atrás de si.

Iza não sabia dizer há quanto tempo estava correndo, mas positivamente estava começando a se sentir cansada. Sua velocidade começava a diminuir sensivelmente ao passo de que a do manequim permanecia a mesma, senão mais veloz. Ela precisava despistá-lo de alguma forma e, por alguma espécie de providência divina, não muito tempo depois, ela encontrou uma bifurcação. Apostando tudo o que tinha no leve palpite de que talvez a estátua a perseguia às cegas, a garota entrou derrapando pela passagem à direita e se jogou na parede, praticamente virando uma pintura ela mesma e, prendendo a respiração enquanto via o vulto barulhento se aproximar cada vez mais.

Iza se comprimiu ainda mais na parede quando viu o manequim se esborrachar contra a parede. Ele parou, tateando com as mãos, e então virou para o mesmo lado que a garota, que fechou os olhos, contrariando seu impulso de retomar a corrida frenética.

Agora ambos estavam separados apenas por alguns poucos metros.

Iza prendeu a respiração, angustiada e então...

O manequim passou por ela, correndo tresloucado.

Até que o ruído do manequim correndo e batendo pelas paredes não tivesse morrido inteiramente, Iza não se atreveu à se descolar da parede fria. Quando, no entanto, tudo mergulhou novamente no mais profundo silêncio, a garota suspirou aliviada e, sentindo que não aguentaria retomar a caminhada por enquanto, se deixou cair onde estava mesmo, retirando a mochila das costas e abraçando-a com força.

A única coisa que ouvia agora era sua respiração descompassada. Lembrando-se repentinamente de algo, ela verificou a mão esquerda. A rosa negra permanecia em sua mão, bem segura, mas não sabia por quanto tempo continuaria assim. Ela quase se esquecera de sua existência durante aquela corrida, e só de pensar em deixá-la cair a fazia sentir-se zonza de preocupação.

Tendo uma súbita ideia, ela abriu a mochila e começou a mexer em seu interior. Jogou seu estojo e caderno para todos os lados até encontrar o que procurava: uma fitinha de cabelo azul que na verdade era de sua priminha mais nova, mas que acabara ficando com ela quando se esqueceu de devolvê-la.

Iza pegou a rosa e, fixando-a na alça de sua mochila, enrolou-a com a fita por todo o caule, até ver que estava bem segura, e então deu um nó bem firme. Em seguida, pegou a mochila e começou a sacudi-la para todos os lados, para ver se a rosa permaneceria intacta.

— Ótimo — aprovou ela quando viu que fora bem sucedida em sua ideia.

Feito isso, ela começou a vasculhar o que tinha dentro da mochila. Estranhamente, não sentira fome ou sede durante sua estada ali, e ela poderia apostar que já fazia mais de três horas, pelo menos, desde que escrevera seu nome naquele livro da recepção. Enquanto remexia o conteúdo, acabou reencontrando o panfleto da exposição. Abriu para folheá-lo até parar na terceira página.

Havia uma foto do maldito manequim que a perseguira e mais dois logo atrás. Ao lado direito da imagem estava escrito em negrito o seu título: A Morte do Indivíduo. Não pode deixar de rir, pensando na ironia do título. Logo em seguida estava escrito um pequeno trecho descritivo.

A vontade de Iza era amassar e tampar aquilo na parede, mas pensou melhor. Em vez disso, recolocou o livrete novamente dentro da mochila, com cuidado para que não amassasse e, ao fazer isso, sentiu algo em um dos bolsos laterais.

Com um grito de triunfo, Iza retirou o celular de dentro da mochila, mal conseguindo acreditar que havia se esquecido disso. Sem sequer perder tempo se amaldiçoando pela imbecilidade, ela praticamente martelou no teclado digital o número de casa.

— Vamos! — disse enquanto ouvia o telefone chamar, mordendo o lábio inferior para controlar o nervosismo — Atende, por favor...

O telefone tocou um pouco mais. E então, surpreendentemente, milagrosamente, uma voz se fez ouvir do outro lado, coberta de estática.

Alô...

— MÃE! — berrou Iza sem conseguir se conter, levantando-se num pulo, o coração mais leve só de ouvir a voz doce e calma dela.

— ... Obrigada por ligar, mas no momento, nós estamos fora ou ocupados. Deixe seu recado para que possamos retornar assim que voltarmos, ok?

O som do bip da secretária eletrônica se vez ouvir e em seguida, apenas estática. Iza não conseguia se obrigar a falar. Um nó vinha se formando dentro de sua garganta e queimava.

A garota tornou a se sentar no chão. E então chorou.


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Notas finais do capítulo

Por que uma hora até os mais fortes precisam chorar, né? Não que a Iza seja particularmente forte, mas se fosse eu, teria chorado muito antes, e vocês? Comentem aí o que acharam :3
Beijos e até o próximo capítulo~



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