Londres - 1878.

Quando chegaram em Londres já de madrugada, todos estavam exaustos tudo o que queriam era uma boa noite de sono, mas como não haviam conseguido informar Charlotte que voltariam antes do previsto, teriam  que ir a pé até o instituto. 

— Meus pés estão me matando! - Queixou-se Clary.

— Logo estaremos lá, falta pouco. - Disse Jem. 

O garoto não estava realmente prestando atenção nela, seus olhos não deixavam Will, estava muito preocupado com o parabatai, Will não havia dito uma única palavra após ter dito que sua irmã estava morta. 

Continuaram seguindo as ruas escuras e desertas de Londres, um vento frio soprava sem piedade fazendo os jovens caçadores se encolherem de frio. 

— Jace como pode não estar sentindo esse frio? - Perguntou Clary admirada, todos a exceção de Jace e Will estavam encolhidos, o vento estava castigando. 

— Porque eu sou quente, muito quente, achei que já tivéssemos tido essa conversa antes. - Respondeu maroto. 

Clary bufou enquanto Alec revirava os olhos.

— Will? Não está com frio? - Perguntou Tessa cautelosa. 

Ver Will nesse estado estava deixando-a angustiada.

O rapaz nem se deu ao trabalho de responder, continuou andando, ao chegar em uma encruzilhada o garoto disparou a correr na direção oposta ao instituto. Com um xingamento baixo Jace começou a correr atras dele, mas sentiu uma vertigem muito forte que o fez se curvar sobre os joelhos, Jem passou por ele e seguiu correndo por onde Will havia ido. 

— Jace o que houve? - Perguntou Clary preocupada. 

Jace parecia ter se recuperado do veneno, o yin fen parecia ter surtido efeito, durante todo o tempo que passaram na casa de Starkweather Jace não havia tido nenhuma recaída. Então por que agora?

O garoto não respondeu, olhava para sua mão horrorizado, podia ver através dela. Levantou as mão a altura dos olhos e continuou vendo através delas. Soltou um ruído de espanto. 

— Jace o que está havendo? O que você tem? 

Ainda sem responder Jace mostrou suas mãos para ela e para Alec que estava ao seu lado também esperando a resposta para a pergunta de Clary. Clary forçou a vista tentando entender o que o garoto queria mostrar. Olhou com atenção para as mãos que ele estendia e apesar da fraca iluminação das luminárias da rua Clary pode ver o que tanto assustara o rapaz. Deduziu que Alec viu a mesma coisa ao ouvi-lo se engasgar.

— Jace o que está havendo com você? - Perguntou assustada. 

Tessa que até então olhava desesperada por onde Will e Jem haviam partido, olhou para Jace ao ouvir a pergunta da pequena ruiva.

— Eu não sei! - Respondeu Jace assustado.

— Essa não! Acho que sei o que você tem Jace! 

— E o que é Alec? Diga logo! 

— Acho que mudamos muito a historia, alguma coisa está diferente, alguma coisa está acontecendo que faz com que você não exista em nosso futuro! -  Respondeu Alec angustiado. 

Jace sentiu seu chão sumir, então era assim que ele acabaria? Simplesmente deixaria de existir? 

                                           * * * 

— Will pare por favor! - Pediu Jem ofegante. 

Will corria sem exitar e Jem o seguia com certa dificuldade. O garoto prateado olhou por onde passavam, conhecia aquelas ruas, eram as ruas onde ficava os piores lugares de Londres, desde bordéis até o antro de perdição onde Will comprava seu yin fen. Era o lugar preferido pelos seres do submundo.

— Will por favor! Pare Will! 

O garoto parou de repente quando uma crise de tosse sacudiu todo o seu corpo. Will que corria mais adiante parou na hora e olhou para atras preocupado, Jem estava de joelhos curvado enquanto tossia. Correu de volta onde estava o parabatai. 

— James? Está tudo bem? - Perguntou visivelmente preocupado. 

Jem tirou a mão da boca e em seus dedos havia sangue, Will olhou para o sangue nauseado. A culpa era sua, eles já deveriam estar no instituto se ele não tivesse surtado e corrido daquela forma. Jem estaria em sua cama confortável e seguro. 

— James? Pode andar? - Perguntou angustiado, tinha que tirar Jem dali o mais rápido.

— Sim. Will vamos pra casa sim? Por favor, volte comigo. - Pediu Jem. 

Ele sabia que era golpe baixo pedir qualquer coisa a Will estando nessas condições, pois seu parabatai nunca lhe negaria nada, não queria fazer esse tipo de chantagem emocional com ele, mas não havia outra coisa a se fazer, se Will fosse a qualquer um desses antros de perdições estando tão abalado psicologicamente quanto estava agora, temia que o garoto acabasse machucado ou pior. Nunca agradecera tanto por uma de suas malditas crises. 

— Tudo bem James, vamos para casa. - Disse Will com um suspiro cansado. 

Nem deram o primeiro passo e várias criaturas mecânicas aparecerem no beco atras deles, Will se virou rapidamente ao perceber uma movimentação atras de si, quando viu tantas criaturas arregalou os olhos, sabia que se estivesse sozinho daria conta delas, mas estava com Jem e este não estava bem, não sabia como conseguiria sair dessa, pela primeira vez sentiu medo, não por si, mas por seu irmão de sangue. 

                                   * * * 

Jace olhava pasmo para suas mãos, elas pareciam voltar ao normal, mas ainda assim estavam mais pálidas que o normal. Soltou um suspiro de alívio quando não conseguiu mais enxergar através delas. 

— Isso só pode ser um pesadelo! - Disse Clary. - Como assim o Jace está deixando de existir? Explique isso direito Alec! 

O garoto abriu a boca para responder mas foi impedido pelo por um som estridente e nada humano. Clary e Tessa tremeram. 

— O que foi isso? - Tessa perguntou assustada. 

— Já ouvi isso antes! - Disse Jace se levantando e e começando a andar em direção a rua que Will e Jem haviam tomado. - Clary fique aqui, já volto. 

— Não Jace, eu também vou, posso ajudar você sabe! - Disse a garota o segurando pelo braço.

— Clary, pelo menos uma vez me escute, fique aqui está bem? - A garota começou a movimentar a cabeça em negação quando Jace segurou seu rosto com ambas as mãos. - Clary, não é que não confie em você, eu confio, confio a minha vida, mas já ouvi isso antes, são as criaturas de Mortmain, preciso que fique aqui e mantenha Tessa segura é a ela que ele quer. Eu vou voltar para você, sempre volto! Pode fazer isso por mim Clary? 

A garota assentiu devagar com os olhos marejados. Jace suspirou aliviado e selou seus lábios num beijo casto e cheio de promessas. Um beijo com a promessa de que voltaria para ela, de que tudo ficaria bem. Quando sentiu o ar lhe faltar, Jace a soltou e virou-se para o parabatai.

— Alec preciso que fique aqui com elas. 

— Não diga asneiras, sou seu parabatai, você precisa de mim num combate e pelo som não são poucas as criaturas! Nós sempre lutamos juntos Jace!- Disse Alec nervoso.

— Eu, sempre fico mais forte com você ao meu lado, sempre preciso de você, mas entenda Alec, eu preciso de você aqui com elas, preciso que proteja Tessa, pois se Mortmain a tiver nosso futuro inteiro será comprometido, mas acima de tudo, preciso de você aqui com Clary, você é a única pessoa a quem confio para protege-la e mante-la segura. 

— Deixe ao menos que eu desenhe algumas runas de proteção em você. - Disse Alec com um suspiro derrotado. 

Jace estendeu os braços e Alec começou a desenhar as runas, Clary assistia a tudo angustiada, tinha um pressentimento de que algo ruim aconteceria. 

Tessa também estava angustiada, queria ir atras de Will e Jem, precisava saber se estavam bem, mas sabia que Jace jamais deixaria que ela fosse e também poderia acabar atrapalhando tanto Will como Jem. 

— Jace, por favor, traga-os de volta para mim. Eu te peço! - Disse Tessa, as lagrimas escorrendo por seu rosto. Não podia perder nem Will e nem Jem, não suportaria. Queria ir atras deles, mas ela viu o que estava acontecendo com Jace, tinha medo de tentar ajuda-los e acabar fazendo algo que mudasse mais ainda o futuro, não queria ser responsável pelo desaparecimento dele, não suportaria a culpa, assim como Will nunca a perdoaria também. 

Jace segurou suas mãos e olhou em seus olhos, Tessa pode ver sinceridade e determinação e um brilho ardente que parecia vir de sua alma, um brilho que parecia existir apenas nos Herondales. 

— Prometo que tentarei o que for preciso para traze-los para você. 

— Obrigada! - Sussurrou a garota. 

Jace deu um abraço no parabatai e mais um beijo em Clary antes de sair em disparada para onde Will e Jem haviam seguido. 

                                        * * * 

Nova York - Dias atuais.

— Magnus! - Gritou Tessa. 

O bruxo entrou preocupado e assustado no quarto de hospedes no qual a garota estava. A encontrou sentada na cama tremula e com lagrimas escorrendo pelo rosto. O bruxo a abraçou e perguntou suavemente.

— Tessa, o que houve? 

— M-Magnus, e-eu vi! - Respondeu a garota chorando. 

— O que você viu Tessa? Me diga por favor. - Pediu o Magnus com medo.

— Eu vi Jace e Jem ensanguentados, e vi Will morto, eles estavam em um beco escuro, eu vi Magnus! Will vai morrer! Ele realmente vai morrer! - Gritou a garota desesperada. 

Magnus apertou o abraço entorno dela. 

— Tessa se acalme, por favor se acalme! Não vamos permitir que isso aconteça, nós daremos um jeito! 

— Como Magnus? Me diga, como salvaremos eles? Como posso salvar Will?! 

Magnus sentiu um nó se formar na garganta, não sabia a resposta para aquilo, não sabia como traze-los de volta, como colocar a história de volta nos eixos. Estavam ficando cada vez mais desesperados e sem tempo. Alec não tinha mais tempo, se Will morresse, talvez até o próprio Alec deixasse de existir, pois não haveria um motivo para Cecily ficar entre os caçadores!

— Eu não sei Tessa. Mas temos que ter fé! Will é forte, sempre foi, vai sobreviver a isso, tenho certeza! Além disso Alec, Clary e Jace estão lá, você sabe o quanto eles são teimosos, não deixarão  nada acontecer a Will. 

Tessa ia retrucar quando ouviu um som ensurdecedor e sentiu o quarto tremer, as janelas começaram a bater, assim como a porta do quarto, o teto começou a rachar, o guarda-roupas caiu  e Tessa se encolheu e se segurou mais apertada em Magnus. O bruxo assustado fez uma barreira de proteção para que os pedaços de concretos que se soltavam das paredes e do teto não os acertassem. 

De repente tudo se acalmou, o som cessou, as janelas pararam de bater o quarto parou de tremer. Magnus olhou boquiaberto para o canto do quarto onde sentiu uma aura maligna e poderosa, semicerrou seus olhos de gato e o que viu o deixou apavorado e irado ao mesmo tempo. 

— O que faz aqui?! - Perguntou agressivamente abraçando Tessa mais apertado numa tentativa inconsciente de protege-la daquela criatura asquerosa.

— Isso são modos de falar? Onde está sua boa educação Magnus? - Peguntou a criatura com uma voz cavernosa e irônica.

— Diga logo o que quer aqui pai! 

— Pai?! - Perguntou Tessa aturdida. 

                                         * * * 

Londres - 1878.

Já fazia um bom tempo que Jace fora atras de Will e Jem e ainda não havia retornado. O som horripilante das criaturas havia cessado, o vento cortante trazia consigo um cheiro asqueroso de óleo queimado e algo podre. 

Clary, Tessa e Alec estavam escondido entre entulhos em uma viela estreita e escura. Alec ficava a frente em guarda enquanto Clary e Tessa estavam mais atras. 

De repente ouviram passos. Esticaram o pescoço na tentativa de ver quem estava chegando. 

— Não consigo ver nada! Maldito tamanho esse meu! - Reclamou Clary. 

Alec colocou o dedo nos lábios pedindo silêncio, a garota se calou e olhou com apreensão para a rua a frente. De repente alguém trajando um casaco cinza e puído apareceu no campo de visão. Tessa arquejou conhecia aquele casaco era de Jem.

— Jem! - Chamou a garota. 

O garoto olhou na direção ao qual a voz veio, foi quando Tessa arregalou os olhos, não era Jem, era uma das criaturas de Mortmain! De repente mais criaturas começaram a aparecer. Alec disparou uma flecha na criatura que usava o casaco de Jem e puxou Tessa rapidamente. 

— Precisamos sair daqui e rápido! - Disse Alec. 

— Não tem como Alec, essas coisas nos alcançaram em questão de minutos! - Disse Clary. 

— E também não podemos deixar Will, Jem e Jace para atras! - Protestou Tessa.

Alec respirou fundo. 

— Não temos escolha, se ficarmos aqui seremos pegos, prometi a Jace que cuidaria de vocês e é isso que farei, tirarei vocês daqui e depois voltarei para ajuda-los. 

— Não pode fazer isso sem nós! - Protestou Clary. 

— Clary não é hora para a sua teimosia, eles estão cada vez mais perto, vamos logo! 

Dizendo isso ele empurrou Tessa em direção as sombras, havia uma pequena brecha entre as duas casas, eles poderiam passar por lá sem problemas. 

Quando Tessa atravessou Alec olhou impaciente para Clary. 

— Clary anda! Vamos logo! 

— Vai você primeiro. 

— Não vou deixar voc . . . 

— Eu tenho uma ideia Alec, ou melhor uma runa. Vou selar a nossa passagem assim estaremos seguros. 

A contra gosto o rapaz obedeceu. Clary atravessou logo atras dele, voltou-se rapidamente para o muro de tijolos e desenhou um símbolo, uma runa que Alec nunca havia visto antes.

— Que runa é essa? 

— Acabei de criar, se chama impedimentum e vai impedir a passagem daquelas coisas.

Alec soltou um suspiro de alivio. 

— Estamos seguros por agora, precisamos de um esconderijo, com certeza essas coisas devem ter bloqueado todas as ruas que levam ao instituto. 

— Nós precisamos voltar! Não sabemos o que aconteceu com os meninos! - Disse Tessa angustiada.

— Concordo com ela Alec, precisamos voltar! 

— Não! Vocês precisam de um lugar seguro para ficarem, também precisamos de um jeito de avisarmos Isabelle e os outros. Eu vou voltar e procura-los, antes eles pegarem a  mim do que qualquer uma de vocês!