O Justiceiro de Bela Vértice escrita por Farrel Kautely
Alguns dias se passaram e mais corpos foram encontrados. Nenhuma câmera lhes forneceu pistas de como os corpos chegavam onde eram deixados.
E os corpos não eram deixados apenas em ruas simples, mas em grandes avenidas e ruas importantes da cidade; porém nunca nos subúrbios.
Segundo Wallace, o Justiceiro queria chamar a atenção para o fato de conseguirem burlar o policiamento e que sabiam onde estavam os pontos cegos das câmeras da cidade.
Um estudo feito por Taylor, baseado em rastros encontrados em cantos, marcas de escaladas em muros e algumas outras evidências nas cenas onde os corpos eram abandonados, os fez perceber que os pontos cegos eram utilizados mesmo que isso implicasse ter de passar pelos mais diversos obstáculos.
– O policiamento foi intensificado, mas isso não impede os corpo de aparecerem – Taylor refletia em voz alta. – A quantidade de corpos encontrados vem diminuindo. Há dias que nenhum aparece, e outros que apenas um ou dois são encontrados.
– Mas isso não necessariamente implica que estamos dando trabalho para ele – Wallace rebateu, por trás de seu jornal. O dia ainda não havia começado a clarear, mas os dois haviam adquirido o habito de chegar bem cedo na central. – Nós não estamos, e tão pouco a tal equipe do secretário.
O secretário havia lhes informado no dia anterior que uma equipe de policiais federais havia sido montada e que nem mesmo eles (Taylor e Wallace) saberiam como estava indo o trabalho. Taylor ficou contente, mas Wallace lhe disse que achava que a tal equipe não havia feito avanço algum.
– Por que acha isso? – Taylor o questionou.
Wallace cruzou os braços e refletiu, como se fosse uma daquelas coisas que se sabe, mas é difícil de explicar.
– Não faz sentido. Não faz sentido algum o que ele propôs. Ele tem passado muito tempo em reuniões com os políticos da cidade, inclusive com o comissário extremamente inútil. Além do mais, não vejo neste pais a polícia federal envolvida em um caso semelhante que não seja aberto. Não parou para pensar que todos tem tratado este justiceiro com certo desmazelo?
– Você mesmo não estava interessado em investigar quando cheguei – Taylor o lembrou. – Conversei com outros investigadores daqui e nenhum deles parecia se preocupar.
– Você não entende meu pobre amigo. Estão com medo. Todos eles. Cada pobre policial.
– Por que estariam com medo?
Wallace gargalhou de alegria. Levou um tempo para conseguir parar, antes de falar com Taylor num tom que o fez sentir-se o mais ingênuo dos homens:
– Cada pequena porcentagem de dinheiro apreendido que não chega aqui. Cada apreensão de drogas que chegam aqui faltando de gramas a quilos. Cada pequena e grande milícia. Cada tentativa disfarçada de corrupção.... É disso que eles tem medo. Eles temem sofrer da justiça do justiceiro.
– Que justiça podre é essa que fecha os olhos para alguns e fixa o olhar em outros?
– Esse tal justiceiro tem um alvo muito bem definido. Ele não pega ladrões de galinha.
– Não existe diferença entre um ladrão de galinha e ladrão de milhões – Taylor falou.
– Seus valores são puros. Mas se o ladrão de milhões não roubasse os milhões, talvez o de galinha poderia comprar uma galinha, e não precisaria roubar.
– Uma coisa não anula a outra – Taylor rebateu.
– Acredito que o ato de roubar tem muita semelhança com o ato de mentir – Wallace disse, sério. – A briga de uma esposa ao descobrir que o marido comprou uma determinada marca de salame para o café da manhã que não é a que ele disse ter comprado não será tão feia quanto a briga que terão se ela o pegar a traindo. O roubo de uma galinha é insignificante perante o roubo de milhões.
– É no que você acredita?
– Sim.
– O roubo da galinha será insignificante para o dono da galinha? – Taylor perguntou.
– Não se o dono da galinha for um milionário – Wallace rebateu, rindo. – Nunca precisei roubar, mas tenho certeza que o teria feito se não houvesse outra opção.
Taylor pareceu se irritar e ficou calado. Wallace continuou lendo seu jornal e, depois de um tempo, o abaixou e falou:
– Escute, eu entendo você. Mas é insano comparar os dois. Me agrada muito mais a ideia de ir atrás de quem rouba milhões que um misero frango. Mas estou limitado; não tenho condições para tal. Faço o melhor que posso.
– Você tem medo? – Taylor perguntou.
– Medo de quê?
– Que o justiceiro venha atrás de você?
– Por que eu teria medo?
– A maneira que você falou faz parecer que todos os policiais dessa cidade possuem uma dívida com a dignidade. Com a justiça.
– Não este policial aqui – Wallace respondeu firmemente. – Meus trambiques são limpos. Bem, limpos até onde um trambique podem ser, é claro.
– Mas não precisamos nos preocupar realmente que ele venha atrás de nós, policias, não é mesmo? – Taylor perguntou, irônico. – Afinal, ele possui um alvo muito especifico.
– Ah, os alvos dele irão acabar se expandindo qualquer dia desses – Wallace comentou com certa indiferença, voltando ao seu jornal.
– Como é possível que você saiba disso?
– Isso não sei, é apenas um palpite.
No dia seguinte, Taylor invadiu a sala com euforia, mas parou decepcionado, ao ver que o parceiro ainda não havia chegado. Ficou andando de um lado para o outro, inquieto.
Quando finalmente Wallace apareceu (duas horas depois), Taylor já estava irritado de tanto esperar.
– Pensei que havíamos combinado de chegar às cinco.
– Não precisa ficar irritado, eu estava trabalhando.
Taylor ouviu aquilo e ficou surpreso. Pediu para que o parceiro lhe contasse no que estava envolvido mas ouviu um “não contarei até ter comido algo”. Saíram da central e foram até uma padaria ali perto, onde Wallace falou de boa cheia:
– Fui dar uma olhada nessa tal equipe de federais do secretário.
– Onde eles estão trabalhando? São muitos? Fizeram algum avanço?
– Calma meu chapa, não precisa ficar afobado. Você parecia ter algo para me contar.
– Tive uma excelente ideia. Talvez devemos compartilhar com a equipe dos federais.
Wallace soltou mais uma de suas recorrentes gargalhadas. Eram divertidas, mas Taylor não gostava quando estas pareciam estar zombando deles.
– Não há equipe alguma, meu amigo.
Aquilo foi como um tapa na cara de Taylor.
– Você não pode estar falando sério. Por que o secretário mentiria?
– Não sei, mas tenho minhas suposições. Elas envolvem falcatruas, pilantragens grandes e um desejo de deixar que o justiceiro limpe essa cidade.
– Você definitivamente não pode estar falando sério – Taylor disse, indignado.
– Estamos sozinhos nessa, meu chapa. E sinceramente, nós dois somos o suficiente. Estou curioso para saber qual é a sua ideia.
– Antes disso, me diga como descobriu isso a respeito dos federais.
Wallace engoliu metade de um pão de uma só vez antes de dizer:
– Acredite em mim quando eu digo que sinto o cheiro de mentiras de longe, principalmente quando a mentira é mal contada. Principalmente. Antes de mais nada, eu já havia lhe dito que não via sentido em uma equipe de federais trabalhar de forma anônima. Parei o secretário ontem à noite e o interroguei, pedindo para que nos apresentasse a equipe diversas vezes. Fiz perguntas simples e ele se enrolava em todas elas. Por fim, decidi lidar com outra pessoa.
– Quem?
– Thais. Abordei mulher em sua casa hoje por volta das três. Da maneira que ela me olhou quando me viu, parecia acreditar que era o próprio justiceiro que batia em sua porta.
– E o que disse a ela? – Taylor perguntou, querendo que o parceiro fosse direto ao ponto.
– Contei para ela seu maravilhoso trabalho mapeando as rotas e as várias tentativas de criar um padrão para as ações do justiceiro. Ela acha o mesmo que nós: as diferentes peculiaridades e constantes ações inusitadas indicam que não é o justiceiro, e sim os justiceiros, como você mesmo havia sugerido outro dia.
– Ainda não é possível saber... – Taylor começou a dizer.
– Sim, sim. Eu sei – Wallace o interrompeu, impaciente. – Eu disse a ela que sozinho ele não trabalha, mas que podemos considerar que há um líder e seus capangas; não uma sociedade de membros iguais. Mas, não sei se você sabe, ela entende muito de psicologia.
– Ah, sério? – Taylor perguntou, irônico – E o que isso tem a ver com tudo isso?
– Ela sugeriu que há aí uma grande mentor por trás de subordinados. São leais e fieis ao seu líder, pois agem de forma independente até certo ponto, até que cheguem naquele que é imposto pelo líder.
– As torturas diferenciam-se muito uma das outras. Algumas são monstruosas e algumas são leves, mas no final sempre termina...
– No tiro que mata – Wallace terminou.
– Mas nós questionamos isso sem a ajuda dela.
– Sim, mas é aí que ela me deu algo interessante para considerar.
Wallace disse isso calou-se, olhando para Taylor. O outro esperou alguns instantes antes de pedir:
– Me conte logo o que é.
– Veja se concorda com ela: Até agora, o pegou ladrões, estupradores e drogados. Todos eles com apenas uma coisa em comum.
– Homicídio.
– Exatamente. Concordamos que, para o justiceiro, há esse cúmulo num bandido: matar. Podemos então supor que ele dá valor a vida e que esses criminosos foram o mais longe que um perdão pode alcançar, tirando a vida das pessoas.
– Mas é justamente o que ele está fazendo, não? Matando as pessoas. Isso para mim é o cúmulo da hipocrisia.
– Mas o que Thais realmente propôs é algo interessante, que eu gostaria de saber se você concorda antes de nos juntarmos a ela.
– Me diga logo o que é – Taylor pediu, já sem paciência.
– O castigo que ele impõe às pessoas é apenas a tortura, e ele só as mata quando elas pedem isso.
Taylor continuou encarando o parceiro por um tempo, enquanto uma expressão de horror tomava seu rosto lentamente.
– Mas que filho duma... – disse depois de um tempo, sem terminar a frase.
– Vejo que concorda com essa ideia – Wallace disse, parecendo satisfeito. – Uma coisa para considerar: os que desapareceram há muito tempo e ainda não foram encontrados pelos cantos têm resistido fortemente.
– E quando foi que ela lhe falou a respeito da equipe de federais.
– Ah, ela desmentiu tudo em algum ponto de nossa conversa, não sei dizer exatamente em qual. De qualquer maneira, ela quer nos ajudar.
– Ótimo! – Taylor disse.
– Agora, me diga qual a sua excelente ideia – Wallace pediu.
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Olá!
Espero que goste e acompanhe a história.
Caso tenha alguma dúvida, sugestão ou correção (pois posso ter deixado passar algo na revisão), eu adoraria conversar com você.
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