O Justiceiro de Bela Vértice escrita por Farrel Kautely
Taylor não viu Wallace novamente no dia anterior, mas preparou uma surpresa para o parceiro. Levantou-se bem cedo no dia seguinte, antes mesmo do dia amanhecer. Vestiu seu sobretudo novo e saiu da casa que alugara, levando um baita susto.
Enquanto descia as escadas da sacada já tirava seu celular do bolso e ligava para a CPIBV no intuito de pedir uma viatura e legistas, ao tempo em que avaliava o homem que estava ali.
Alto e forte, o sujeito tinha grandes entradas de calvície e estava sentado nas escadas. Parecia que havia sido posto ali delicadamente, com as mãos sobre os joelhos.
E suas mãos chamaram a atenção de Taylor. A esquerda estava totalmente sem unhas, e na direita faltavam alguns dedos. Na cabeça do homem, bem no meio da testa, o buraco do tiro que com certeza era a causa da morte.
“Será que é uma puta coincidência?” Taylor pensou.
Wallace entrou na sala rindo, mas parou instantaneamente quando viu o que Taylor usava.
– O que diabos é isso? – perguntou.
– Gostou? Achei legal o seu e resolvi comprar um para mim.
Wallace o observou por alguns instantes antes de rir e dar de ombros. Jogou um pacote em cima da mesa (que provavelmente era um sanduíche) e sentou-se.
– Soube o que aconteceu? – Taylor perguntou.
– Sobre o sujeito sentado na porta da sua casa? Sim – o outro respondeu, abrindo um jornal e pondo-se a ler.
– E não tem nada para dizer a respeito? – Taylor perguntou, surpreso com aparente indiferença.
– Já tem muita gente para lhe dizer coisas a respeito. Pensei que estivesse lhe poupando de chateações deixando de lhe perguntar – Wallace respondeu, ainda lendo o jornal.
– Não me chatearei. Pode me dizer o que acha.
– Me desculpe, mas não acredito que tenha algo a dizer que possa contribuir. Posso, no máximo, dizer que é algo bem peculiar.
– Acha que é uma coincidência?
– Sinceramente, acho. Você só teve o azar da sua casa ser a escolhida. Afinal, você alugou a casa na mesma rua onde o sujeito havia roubado e matado uma moça.
Aquilo pegou Taylor de surpresa. Desde que havia chegado, há uma hora e meia antes, todo mundo falava apenas sobre morto; ninguém mencionara seus crimes. Pediu para Wallace lhe contar.
– O que aconteceu foi o seguinte – o outro se pôs a contar, descansando o jornal na mesa e olhando para Taylor: Esse sujeito roubou e matou uma moça chamada Letícia, enquanto ela voltava de algum lugar. Não me lembro agora se da faculdade ou da academia; só sei que ela havia ido nos dois lugares neste dia. Enfim, ele a abordou e roubou o dinheiro dela. Uma quantia pequena, se bem me lembro, e de brinde deu dois tiros no peito dela. Ele foi preso, mas solto uma semana depois com algum argumento qualquer que envolvia um maldito bom advogado chamado Thomas.
– Como sabe de tudo isso? – Taylor perguntou.
– Fui eu quem prendi o morto – Wallace falou, voltando ao seu jornal.
Taylor ouviu aquilo e quase engasgou-se de espanto.
– Mas, então talvez ele tenha sido deixado na minha porta...
– ... por você ser meu novo parceiro? Talvez, se quem o matou não foi o justiceiro. Ele costuma usar de despachar os mortos em lugares próximos de um dos lugares que ele cometeu seus crimes.
– Levantei um questão interessante – Taylor disse, querendo chamar a atenção do parceiro.
– Qual? – o outro perguntou, por trás do jornal.
– Quanto tempo irá levar até que outras pessoas matem e deixem os corpos pelos cantos querendo se passar pelo justiceiro?
– Isso já foi feito, e quem fez foi pego – Wallace respondeu, rindo com gosto por trás do jornal. – É confidencial e não deixaram sair nos jornais. Chega a ser engraçado. Encontramos até agora, se não me engano, cinco sujeitos com “impostor” tatuado na testa; embaixo da palavra um tiro. Eu disse para que informassem a população e os futuros espertinhos que quisessem repetir a genialidade, para evitar que isso acontecesse, mas não quiseram me ouvir.
– Como será que ele descobriu quem o havia imitado?
– Devemos considerar uma coisa – Wallace disse, abaixando o jornal e encarando Taylor.
– O quê?
– A possibilidade dele ser ou ter investigadores melhores que a polícia de Bela Vértice.
– Senhores – Alguém os chamou da porta. Olharam e se depararam com Thais ali.
– Pois não, minha flor? – Wallace disse.
– O secretário quer falar com vocês.
Sentados na mesa do secretário com Thais os observando, eles ouviam o homem dizer:
– Sinto uma indiferença muito grande por parte dos investigadores – ele disse. Parecia irritado – Talvez estejam querendo sentar e se divertir observando o circo pegar fogo, quando na verdade deveriam estar com os extintores nas mãos. Não sei se foi coincidência o corpo na porta de um de vocês, mas vamos usar isso. Senhorita Thais, por favor – ele disse, indicando o computador da sala com um gesto. – Pedi para que Thais separasse para nós uma reportagem.
Thais virou o monitor para eles e apertou o play.
No vídeo, uma mulher estava de frente à casa de Taylor, cercada por outros repórteres. Atrás, a pericia aparentemente terminava seu trabalho por trás do cordão de isolamento. Havia alguns policiais ali.
– Hoje, no inicio do dia – ela dizia –, um homem chamado Jesus Abrantes foi encontrado morto em frente à casa de um dos investigadores de policia da cidade. Nem mesmo a casa de um dos representantes da lei faz com que o Justiceiro deixe de realizar seus atos. Jesus foi acusado e preso pelo assassi...
O secretário não esperou o fim da fala e fez um gesto para que Thais pausasse o vídeo.
– Então, vamos apelar. Talvez vocês devessem ver as outras reportagens, onde os repórteres parecem estar felizes com tudo isso. A população está contente e pedem mais desse justiceiro. A mídia aparentemente o apoia e nos faz parecer incompetentes. Precisamos revidar, e eis o que vocês irão fazer:
“Marquei uma coletiva para hoje à tarde. Vocês dirão para os repórteres que estão investigando o Justiceiro e que este corpo foi deixado na porta da casa de vocês como represália, por terem avançado nas investigações.”
– Porta da casa de vocês? – Wallace perguntou– O que parecemos ser? Um casal homossexual? Me desculpe senhor secretário, mas poderíamos usar essa sua brilhante ideia se o cadáver tivesse sido deixado na minha porta, já que fui eu quem prendeu o sujeito.
– Faça o que eu digo, senhor Wallace. As pessoas irão engolir a história, e você poderá se aproveitar dela para prender o assassino do sujeito.
– Eu não estou nem aí para a morte dele. Ele não estaria morto se estivesse na cadeia, como o deixei.
– Escute aqui, vocês dois – o secretário disse, autoritário. Taylor se perguntou por que tinha de passar por aquilo; sequer havia dito uma palavra desde que se sentara – Vocês serão os investigadores oficiais agora. Poderão trabalhar de forma independente, mas sempre reportando as coisas para a equipe que irei convocar para essa investigação. Enquanto a equipe não é montada ou apresentada a vocês, deverão reportar a mim.
– Independentes? – Wallace perguntou, irritado. – Seremos um bode expiatório, pelo que estou vendo. Quer fazer com que o justiceiro pense que nós, o sujeito aqui ao meu lado e eu, somos os investigadores principais para desviar a atenção da verdadeira investigação?
– Está com medo, senhor Wallace?
– Não senhor, estou indignado; e prestes a mandar o senhor para o inferno.
– O inferno é aqui, meu bom detetive – o secretário disse.
– E você quer fazer parecer que o justiceiro é o rei capetão.
– E não é?
– Não haveria justiceiro se não tivéssemos tantos assassinos por aí. Sabe o que eu acho? Os capetinhas elegeram seu rei. Foi a existência de demônios que criaram a necessidade de um rei para o inferno.
– Só faça o que eu disse senhor Wallace, sem questionar.
– Fazer farei, pois não tenho escolha. Mas não pode exigir de mim ausência de questionamento.
Wallace disse isso e saiu da sala. Taylor o seguiu sem pensar duas vezes.
– Vamos mesmo mentir para a imprensa? – Taylor perguntou, tentando acompanhar os passos rápidos e irritados do parceiro.
– Vamos sim, mas não mentiremos quando diremos que iremos investigar.
– Ontem Gustavo e Fernando me disseram que o secretário não estava interessado em prender o justiceiro. Eu disse-lhes que era tolice, mas discordaram. Ora, se o secretário não quisesse, por que ficaria tão irritado conosco?
– Ele está agindo assim por ter se irritado com a mídia nos acusar de incompetentes.
– Então não haverá a outra equipe de investigação?
– Vai saber o que se passa na cabeça desse desgraçado. – Wallace disse, rindo. – Mas, mesmo que haja, vamos chegar ao justiceiro primeiro.
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Olá!
Espero que goste e acompanhe a história.
Caso tenha alguma dúvida, sugestão ou correção (pois posso ter deixado passar algo na revisão), eu adoraria conversar com você.
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