Três Formas de Amar escrita por Mi Freire


Capítulo 15
Se perca algumas vezes.




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Não consegui parar de pensar pelos próximos dias o que teria acontecido se eu tivesse permitido que Yuri me beijasse.

Certamente as coisas não teriam acabado bem.

Uma parte de mim sabia que era muito errado ficar pensando naquilo. Mas a outra parte de mim era mais forte e mais curiosa. Ela teria dado tudo para viver aquele momento.

Liguei para o meu pai aquela tarde. Eu precisava muito ouvir a voz dele. Quando ele atendeu, eu não resisti e comecei a chorar. Ele não entendeu e eu disse que era apenas saudade.

Quando vivíamos todos juntos de baixo do mesmo teto era tudo tão mais fácil. Éramos só nós quatro dentro do nosso mundinho colorido. E não havia mais ninguém para confundir a gente ou dividir nossos sentimentos.

− Princesa, me conta o que aconteceu. Estou ficando preocupado.

Eu não tinha muito porque mentir para o meu pai. Nós não conversávamos sobre tudo, até porque certos assuntos não me deixavam confortáveis, mas eu confiava nele.

Então desabafei. Contei sobre como eu o Lucas estávamos distantes e nem parecíamos mais os mesmo de antes. Contei sobre o meu namorado que não atendia minhas ligações e estava em turnê. E contei também sobre os meus sentimentos tão confusos pelo Yuri, o meu vizinho chato.

− Quer um conselho do seu velho pai? Não se cobre tanto, querida. Você é tão jovem. É nesse momento que vivemos as coisas mais intensas e confusas de nossas vidas. Apenas aproveite. Se permita se perder algumas vezes. Porque eu tenho certeza que você vai se encontrar no momento certo. Por enquanto, apenas viva sua vida. Erre, quebre a cara, sofra, chore. Você pode ter certeza que um dia, quando for mais velha, vai rir de tudo isso.

Como eu amava meu pai! Para ele era tudo tão prático e simples. As coisas pareciam tão fáceis. Porque eu não podia ser assim ? Viver intensamente como se esse fosse o último momento da minha vida.

Será que meu pai tinha sido um adolescente inconsequente? Pelo jeito que ele falou me parece que sim. Só de pensar nisso eu dei risada. Não conseguia imaginar o meu pai hoje tão sério vivendo desse jeito anos atrás.

Postei o vídeo da pintura no quarto do Yuri e imediatamente as meninas comentaram em baixo o quanto ele era bonito, gostoso, atraente, charmoso. E logo quiseram saber se ele era o meu namorado ou porque ainda não era.

Eu: As meninas tão pirando em vc

Yuri: O q foi q eu disse? Eu sou irresistível.

O legal do Yuri é que mesmo daquele climão que rolou entre nós no sofá, ele estava agindo naturalmente, como se nada tivesse acontecido. Como se ainda fossemos grandes amigos. O que ajudava a amenizar a minha culpa.

Pela primeira vez em muito tempo eu peguei meu velho caderno de desenho e rabisquei alguns looks que tinham passado pela minha mente naquele momento de tédio.

E não é que eu me surpreendi com o quanto meu talento para desenhos havia aumentado depois que entrei na faculdade?

− Manuela, você viu isso? – Lucas entrou furioso no meu quarto, interrompendo meu momento de inspiração.

Ele me jogou seu celular e eu o peguei para o ver o que era dessa vez.

Na tela havia uma foto dele e da Helena que ele postou ontem em seu Instagram com um trecho fofo de uma música do Ed Sheeran. Tá, mas qual é o problema? Ele quer esfregar na minha cara o quanto eles estão felizes?

− Olha os comentários! – Ele pediu ríspido, como se lesse minha mente levemente confusa e intrigada.

Lucas tinha muito seguidores graças a mim. Desde que ele apareceu nos meus vídeos as meninas ficaram encantadas e começaram a segui-los em todos os lugares.

Principalmente no Instagram, onde elas viviam comentando o quanto ele era fofo nas fotos que ele postava.

Mas dessa vez elas pegaram pesado demais.

Deu vontade até de rir, mas me segurei para não ferir os sentimentos dele.

Minhas leitoras comentaram em baixo:

“Nossa, que garota estranha”

“ Ela é feia, Lucas. Não combina com você!

“ Sou mais a Manu. Ela é linda!

“Essa é a sua namorada, Lucas? Feia demais!

“Lucas você não vai ser feliz com essa aí. Eu prefiro você mil vezes com a Manu. Vocês combinam tanto!”

Até as minhas leitoras que pouco sabiam dos meus problemas estavam do meu lado.

− Que palhaçada é essa, Manuela?

Entreguei o celular a ele.

− Como é que eu vou saber? Olha, eu não sei se você sabe mais eu não controlo a opinião das pessoas.

Ele me olhou feio.

− Foi você que mandou elas comentaram essas porcarias não foi?

− Pelo amor de Deus, Lucas. Eu não seria tão baixa!

− Eu duvido! Você tem me decepcionado muito ultimamente.

− Ah, é? E porquê? Porque eu estou vivendo a minha vida longe de você? Ah, por favor, me deixa em paz.

Voltei-me para os meus desenhos.

Ele pegou o caderno das minhas mãos e atirou longe.

Olhei abismada para ele.

− Que porra você fez, Lucas? – Olhei para ele horrorizada, se acreditar que ele tinha mesmo feito aquilo.

− Quando eu tiver falando com você, você olha para mim.

Eu ri.

− Sério isso?

− É mais do sério, Manuela. Você não entende a gravidade da situação? A Helena está arrasada com isso. Ela teve até que bloquear o próprio Instagram, pois as meninas também estavam comentando coisas feias nas fotos dela.

− Eu ainda não entendo o que é que eu tenho a ver com isso, Lucas. Bloqueia seu Instagram também. Simples!

− Não! Isso não pode ficar assim. Eu não vou deixar que você e suas leitoras sem noção machuquem a Helena.

− Minhas leitoras sem noção? – Dessa vez eu me levantei, muito brava. – Quem você pensa que é para falar delas assim, Lucas? Meu trabalho depende delas!

− Entenda, Manuela. Seu trabalho escroto não é mais importante que o meu relacionamento com a Helena.

Não resisti. Bati na cara dele com tudo.

Aquele não era o meu Lucas. Aquele garoto estava cego. E estava sendo cruel comigo e dessa vez eu não tinha feito nada para ele e nem para sua querida namoradinha.

Lucas saiu bufando do meu quarto como um touro bravo. Antes ele me olhou com tanta decepção que eu senti um aperto no coração. Mas não me arrependi do que fiz.

Peguei meu caderno que ele jogou com violência no chão e para a sorte não rasgou nem uma folha. Se ele tivesse estragado meu caderno eu iria dar na cara dele duas vezes sem pensar ou feito coisa pior.

Quando saí do meu quarto mais tarde, encontrei Helena chorando no sofá e Lucas a consolando como se ela fosse um animal ferido. A vaca com certeza deveria estar jogando todas as pedras possíveis em mim, até convencer o Lucas de que a culpa era toda minha.

Mas quem disse que eu me importo com essa encenação toda?

Yuri e eu nos encontramos no campus na manhã seguinte durante o intervalo. E ele, é claro, já sabia da última confusão.

− Helena está realmente magoada com você.

− Mas eu não fiz nada!

− Eu sei. – Ele sorriu. – Suas leitoras pegaram pesado dessa vez. Mas elas até que são muito criativas. Eu li os comentários e quer saber? Eu me diverti muito com eles.

Finalmente alguém me entendia e estava do meu lado.

− Você tem Instagram também? Logo, logo elas vão procurar por você. Então toma cuidado.

− Não precisa se preocupar. Eu não tenho nada disso. Sou mais reservado. Não curto muito essas coisas.

− Você é maluco! Como você consegue viver sem redes sociais? – Eu sei que estava exagerando um pouco, mas nunca pedia uma oportunidade de zoar o Yuri. – Nós não estamos mais na idade da pedra, sabia?

Fui direto para a academia com o Yuri depois da aula. E como ele não tinha aula naquele horário nós ficamos treinando sozinhos e ele me ensinou umas novas técnicas, caso eu precisasse arrebentar a cara do Lucas outra vez.

− Não acredito que você bateu no seu irmão.

− Eu nem sei mais se ele é meu irmão. – Eu chutava o saco de bancada com força total. Estava ofegante. – Irmãos não fazem esse tipo de coisa um com o outro. Lucas não é mais o mesmo!

As coisas que Yuri comprou na internet chegaram no final daquela tarde e ele me chamou para ajudá-lo.

Mais uma vez eu filmei tudo.

− Você sempre filma tudo da sua vida?

− Praticamente sim.

− Você não se importa em se expor tanto?

− Não. É o meu trabalho!

− É meio... Estranho.

− Não é não. Depois você se acostuma.

Já eram quase onze horas quando terminamos de arrumar tudo. Agora sim parecia um quarto descente.

− O que você achou? – Perguntei enquanto tirava algumas fotos para postar no blog.

− Eu gostei. Parece que deu mais vida ao ambiente.

− Tá vendo? Todo detalhe faz uma grande diferença.

Não fui a aula na manhã seguinte. Eu merecia uma folga, vinha me esforçando muito ultimamente. E sozinha.

Eu merecia um descanso.

Aproveitei o tempo livre para lavar meus pinceis de maquiagem. E mais uma vez filmei todo o processo.

Eu já estava quase terminando quando meu celular começou a tocar dentro do quarto.

Eu saí correndo da área de serviço e fui ver o que era.

Kevin.

− Oi, amor. Que bom que ligou! Eu estava começando a ficar preocupada.

− Me desculpe, Manu. A vida por aqui está uma loucura. Nesse momento estamos indo para o Espirito Santo.

− Você está no aeroporto?

− Quase lá. Mas adivinhe só? Nós conseguimos grana o suficiente para comprar nosso próprio transporte!

− Um ônibus da banda?

− Exatamente!

− Que incrível. Tira foto e depois me manda!

− Pode deixar.

− Me conta.... Como vão as coisas por aí?

Kevin me falou sobre todos os detalhes do show. Sobre as experiências em cada cidade do país. As brigas da banda. As sessões de autógrafos com os fãs. As sessões de fotos para pôsteres e cartazes. A venda de camisetas exclusivas. As reuniões sobre as escolhas de músicas para o CD.

Mas em nenhum momento me perguntou como eu estava na faculdade ou como as coisas estavam em casa e meu trabalho. E pela primeira eu não me importei tanto com isso. Porque as coisas por aqui estavam feias e eu não queria preocupa-lo, nem aborrece-lo. Eu só queria que ele estivesse bem, feliz a realizado.

− Eu vou ficar sem ligar por um tempo, ta bom? Eu sinto muito.

− Tudo bem. Eu entendo. Se cuida. E vê se liga quando puder.

Depois de quase uma hora de conversa ele desligou para poder embarcar no avião.

Só depois eu me dei conta de que ele não disse que me amava em nenhum momento.

Mas porque isso importava tanto? Eu também não tinha dito que o amava desde que reatamos.

Helena entrou em casa no meio da tarde. Agora ela entrava e saia a hora que quisesse.

− Estava chorando, Manuela? Porque? Seu namoradinho não dá mais notícias?

− Como é que você sabe?

Eu não estava chorando. Ou será que estava?

− Lucas me contou que você anda estranha ultimamente e que ele nunca vê seu namorado te ligar ou aparecer.

Então o filho da mamãe fofocava de mim para ela?

− Meu namorado é um homem ocupado, querida. Ele tem uma banda e precisa fazer shows para sobreviver.

Ela riu, debochada.

− Sei...

Impressão minha ou ela estava sendo sarcástica?

Eu já não estava muito bem e com ela me provocando eu fiquei pior. De repente senti uma vontade absurda de voar em cima dela. Então me lembrei do que meu pai disse no telefone: Se permita se perder algumas vezes. Foi o que fiz.

Eu fui para cima dela com tudo.

Ela caiu de costas no chão comigo em cima.

− Cala a boca, sua vaca. Você não sabe nada sobre mim! Não ouse se meter na minha vida.

Ela se debatia e tentava se livrar de mim. Mas com os treinos eu tinha ficado mais forte nesse requisito mesmo ela sendo toda atlética.

− Sai de cima de mim, Manuela. Eu vou contar tudo para o Lucas!

− Conta! Vai correndo contar para ele. Se acha mesmo que eu tenho medo daquele franguinho idiota?

Poderia ser pior? Claro que poderia! Mas eu tive dó de bater nela até a sua cara sangrar e ficar em carne viva.

Mais tarde, quando o Lucas chegou em casa, ele veio direto para o meu quarto. Na certa já sabia o que tinha acontecido mais cedo e veio tirar satisfações.

Mas eu já estava preparada. Olhei para ele, mas juro que não ouvi nada do que ele disse. Eu só queria que ele pensasse que me importava. Só que eu não me importava mais.

E convenhamos que ele estava exagerando um pouco. Eu nem bati na Helena. Eu só dei um recadinho a ela.

Agora sim ela sabia exatamente com o tipo de pessoa que estava lidando.


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Notas finais do capítulo

Pelo jeito as coisas não estão NADA bem por aqui hahahaha Comentem!