Lovebelt escrita por Nina Antunes


Capítulo 10
Capítulo 10




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Capítulo 10

Rin entrou pela porta da confeitaria, ainda sem conseguir sentir as pernas. Seus joelhos tremulavam tanto que chegavam a se tocar sob a calça jeans de barra larga e lavagem clara. Os olhos dourados estavam fixos nela, o que fazia com que ela tentasse controlar o tremor do corpo, mas seu olhar denunciava o nervosismo por vê-lo ali. A imagem dele estava diferente -- o semblante estava mais suave, embora ainda fosse sério. Sabia que era Sesshoumaru ali, mas quase não podia reconhecê-lo. E ele sabia o motivo daquilo.

Mesmo que a decisão de deixar tudo pra trás tivesse sido tomada há dias, antes mesmo de ele voltar para Nova York, sentia como se um peso tivesse sido livrado de suas costas. Sentia-se mais leve, permitindo-se demonstrar um pouco mais de emoções. A maior de suas preocupações havia desaparecido, embora ela desse lugar para o medo que Sesshoumaru sentia de ser rejeitado por Rin, e de não poder ter a segunda chance que tanto sonhou. Melissa o tirou dos seus pensamentos, chamando-o.

— Por que demorou? Eu te esperei ontem. - O rosto dela ainda estava apoiado no peito largo do pai, e ela fazia pequenos desenhos com o indicador sobre o tecido da camiseta que cobria o bíceps dele.

Ele puxou o ar pela boca, olhando pro alto, pensativo. - Digamos que o problema que eu fui resolver me deu um pouco mais de trabalho que eu imaginava, e eu me atrasei. - Ele voltou o rosto pra ela, encontrando os olhos cor de mel agora o fitando. - Você guardou o que eu te pedi?

— Sim! - Lissy exclamou, revelando o relógio entre as mãos. Sesshoumaru pegou a peça, reparando que o metal estava quente de tanto que a menina o havia segurado.

Ele envolveu o relógio de volta no pulso e afagou os cabelos da filha. - Obrigado por ter guardado ele pra mim, enquanto eu estava fora. E obrigado por ter me esperado.

Embora ele falasse em um tom baixo e direcionado somente à Melissa, Rin conseguiu captar cada uma das palavras. O ambiente da confeitaria estava vazio naquele momento, o que favorecia a escuta da conversa.

Mais uma vez, pensava em como ele estava mudado. Nunca havia ouvido palavras tão doces e simples da boca dele, embora sua memória resgatasse momentos em que Sesshoumaru havia sido gentil e mais transparente com ela. Eram momentos de seis anos atrás e momentos da noite que passaram juntos, dias atrás. Um arrepio percorreu a pele de Rin e ela esfregou o braço direito com a mão esquerda - um hábito canhoto.

Sesshoumaru voltou a olhá-la, percebendo que o olhar de Rin havia passado de surpresa para alívio e agora para ternura. Uma centelha de esperança se acendeu no peito dele.

— Eu estou com saudade de ficarmos juntos. Você pode me levar pra ver o telescópico de novo? - Lissy pediu, tirando-o daquele olhar.

— Amanhã ou depois, está bem? - Ele afagou os cabelos dela de novo, vendo um desapontamento no olhar dela. - Hoje a lua está cheia. Lembra do que eu disse?

— Quando a lua está cheia não dá pra ver bem as estrelas. - Ela repetiu em um ritmo de tédio, rolando os olhos. A cena fez com que Sesshoumaru abrisse uma linha de sorriso.

— Quando eu percebi que ia me atrasar eu pensei em te comprar uma coisa, pra me redimir. – Ele disse.

— O que é redimir? - Lissy torceu as sobrancelhas claras, mostrando confusão.

— Para que você me desculpe. - Explicou em uma voz suave.

A expectativa fez com que os olhos dela brilhassem em expectativa. As mãos de Sesshoumaru buscaram um embrulho que estava próximo e entregaram para a menina. Ela saltou do colo do pai e apoiou o pacote retangular em cima da mesa, desfazendo o laço do embrulho. Assim que ela se livrou do papel que cobria o presente, Lissy viu que se tratava de um livro: O Pequeno Príncipe. A capa, que exibia o jovenzinho em cima de algo que parecia um planetinha rodeado de estrelas, fez com que ela sorrisse.

— Uaaaaau. Esse livro é sobre o quê? - Ela perguntou para o pai.

— Esse menino aqui mora em um asteroide, no espaço. - O dedo indicador dele apontou para a figura da capa. - É a história dele. - Resumiu. Sabia que a graça daquele livro ia muito além disso.

— Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. - Rin disse e se aproximou, dobrando os joelhos para ficar da altura da filha. Lissy sorriu. - Essa é a frase que mais gosto desse livro, que é muito bonito. - Comentou, finalmente olhando Sesshoumaru.

A linha de sorriso de Sesshoumaru se ampliou e ele sentiu o coração acelerar.

— Tia Sango, olha o que eu ganheei! - A menina bateu algumas palmas, dando pequenos pulinhos. Ela pegou o livro nas mãos e levou para a outra morena, que observava toda a cena do balcão.

Sesshoumaru inclinou-se, aproximando o rosto de Rin, que continuava agachada na mesma posição, do lado da mesa. - Podemos conversar hoje? - Pediu, com uma voz suave.

A hesitação ficou evidente no rosto dela, e Rin mordeu o lábio inferior, fazendo o coração de Sesshoumaru ficasse ainda mais descompassado.

— Eu não sei, tenho que cuidar de Lissy... - Ela começou a falar, passando a mão de forma nervosa pelo braço.

— Sango disse que pode ficar com ela. - Sesshoumaru interrompeu, mantendo o sorriso no rosto. Rin olhou para a amiga, que folheava o livro repleto de figuras ao lado de Lissy. Ela deu um sorriso travesso, indicando que tudo já estava combinado.

Rin ficou com os lábios entreabertos, sem saber o que dizer. Olhou de novo para Sesshoumaru, encontrando os orbes dourados a encarando intensamente.

— Tudo bem. - Concordou.

— Eu te pego na sua casa às sete e meia. - Ele disse, vendo o choque aumentar no rosto dela. Apesar de estar hesitante, Rin não conseguiu contrariá-lo, apenas acenando a cabeça. Isso não será um encontro, afirmou pra si mesma.

Antes mesmo que pudesse concluir o pensamento, Lissy voltou com o livro em mãos. Ela jogou-se nos braços de Sesshoumaru de novo, sequer percebendo a conversa que acontecia alguns segundos antes. - Eu amei o presente! Obrigada, papai.

— Agora eu acho que seria uma ótima ideia se fôssemos brincar no balanço da praça. Assim você me conta como foram seus últimos dias e eu te conto da viagem. - Ele sugeriu.

Outras palminhas e pulinhos empolgados vieram e Lissy emitiu um sonoro "eba!" antes de tomar o pai pelas mãos, seguindo como um furacão para a porta da confeitaria. A praça ficava do outro lado da rua, perto de árvores que cobriam o sol daquela tarde que caminhava para o fim.

Assim que eles saíram, fazendo com que a sineta da porta soasse, Rin apoiou as mãos nas coxas e se levantou. O olhar questionador seguiu direto para Sango, que jogou o pano de prato por cima do ombro e deu meia volta em direção à cozinha.

— Volta aqui! - Rin exclamou, indo atrás da amiga. Sango passou pela porta estilo faroeste que dividia o salão da cozinha, fazendo com que a madeira começasse um vai e vem. Rin segurou a porta, evitando que ela recuasse contra si. - Agora você trama planos por minhas costas?

— Em minha defesa, foi ele quem pediu. - Sango virou-se de uma vez, fazendo com que Rin quase topasse o corpo contra o dela. Ela estendeu uma mão no ar, em um sinal defensivo.

— Desde quando você colabora com Sesshoumaru? - Rin estreitou os olhos, colocando as mãos na cintura.

— Em minha defesa, eu não estou colaborando com ele. Eu estou colaborando com você. - Ela estendeu o indicador no ar e fechou os olhos, parecendo convencida.

— Comigo? - A outra morena torceu as sobrancelhas. - Você está ajudando Sesshoumaru, sabendo que as coisas não estão resolvidas entre mim e seu irmão. - Rin passou a mão pelo rosto, evidenciando a culpa.

Sango suspirou pesadamente, sentindo a culpa também invadi-la por um instante. - É tão errado assim tentar fazer a coisa certa? Kohako vai entender.

— Ele não fala mais comigo. Lissy tem sentido falta dele. - Rin sentou-se sobre uma das banquetas de pedra da cozinha, apoiando o rosto no queixo. - Me sinto muito mal pelo que fiz.

— Rin, você nunca enganou meu irmão. Quando você deu uma chance a ele, Kohako sabia que você não havia esquecido Sesshoumaru. - Ela sentou-se na banqueta ao lado da amiga.

— Mas daí para ele descobrir que eu dormi com Sesshoumaru é um caminho muito longo. – Esfregou as mãos pelas pálpebras. - E errado.

— Tudo bem, não foi a melhor coisa a se fazer. - Sango viu o brilho de culpa passar pelos olhos de Rin, que agora encarava o piso frio. - Mas... - Ela estendeu o indicador no ar outra vez, mostrando que teria um contraponto. - Se você ainda sente algo por Sesshoumaru e se ele é um homem diferente, não entendo por que isso é errado.

— Quem garante que ele é um homem diferente? - Rin ponderou, cruzando os braços na altura do peito.

— Bom, o que meus olhos viram e o que meus ouvidos escutaram parece bem convincente. E você ouviu muito mais que eu: ele não te disse que te ama? – A morena apoiou o rosto sobre os punhos fechados.

— Sim, mas... - Rin começou, gaguejando.

— Ele não voltou pra você e pra Lissy? - Ela continuou, com um sorriso entre os lábios.

— Pode ser, mas...

— Ele não deixou tudo pra trás? - Sango cruzou os braços também, com um ar vitorioso.

— Será? - Rin questionou, torcendo os lábios. - E se amanhã ou daqui a alguns dias ele se arrepender? E se quiser voltar pra tudo, assim como já fez uma vez?

— Bom, se essa fosse a vontade dele, Sesshoumaru não estaria aqui hoje. - Sango buscou as mãos da amiga, prendendo-as entre as suas. - Só... só escuta o que ele tem a dizer.

— E quanto a Kohako? - Ela encarava as próprias mãos sobre o colo da amiga.

— Ele não seria capaz de ser feliz, porque você não o ama da forma que ele espera. – Ela suspirou. - No final das contas, vai ser melhor assim. - Sango bateu sobre as costas da mão da amiga uma única vez. - Ele vai encontrar alguém que o faça feliz. Isso não significa que ele vá desaparecer da sua vida e da vida de Melissa. Logo essa mágoa passa. – A morena sorriu.

Rin olhou a amiga novamente, sentindo vontade de abraçá-la. E assim ela fez, descansando o queixo sobre o ombro de Sango. - Às vezes olho pra você e vejo meu pai. É incrível como sua calma e clareza para enxergar as coisas são iguais às que ele tinha.

— Sinto falta dele. - Sango admitiu, suspirando.

— Eu também.

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O relógio estava a poucas voltas de alcançar as 7:30 da noite, e Rin estava sentada sobre o sofá de casa. As mãos suadas sobre o colo denunciavam o quanto ela estava ansiosa. Esfregava as palmas contra o tecido azul marinho bordado do vestido que usava, sentindo a umidade se espalhar por ali. Estava prestes a desistir daquela ideia de ficar sozinha com Sesshoumaru de novo, mas precisava admitir que estava curiosa para ouvir o que ele tinha a dizer.

Sango havia passado para buscar Lissy há vinte minutos e as duas iriam para Ellsworth, para assistir a um filme no minúsculo cinema da cidade. A amiga confessou a Rin que Kohako se juntaria às duas naquela tarefa, pois não estava suportando a distância da menina. Aquilo havia trazido um pouco de alívio para o coração de Rin, embora a culpa ainda estivesse presente.

Assim que o relógio bateu 7:30, a campainha tocou. Rin suspeitou que Sesshoumaru havia chegado antes, mas estava esperando pelo horário combinado. Caminhou até a porta sem conseguir sentir as pernas outra vez. A mão trêmula alcançou a maçaneta e ela abriu, encontrando Sesshoumaru com um meio sorriso estampado no rosto. A leveza era evidente na expressão dele.

— Boa noite. - Ele cumprimentou, oferecendo a ela um narciso volumoso de cor branca e rosa. Aquilo levou por água abaixo a autodefesa de Rin que dizia que aquilo não era um encontro.

Ela estendeu a mão esquerda pra ele, ainda de forma hesitante, e pegou a flor entre os dedos. Levou-a ao rosto em um gesto quase automático, sentindo o perfume invadir suas narinas.

— É muito bonita, obrigada. - Falou, com a voz entrecortada. Tinha dificuldade de olhar os orbes dourados profundos à sua frente, então fixou os olhos nas pétalas da flor.

Ele deu espaço para que ela passasse e Rin saiu, trancando a porta. Virou-se e encontrou um carro sedã prata que parecia já ter bons anos de uso, embora estivesse conservado. A placa era do estado de Nova York.

— Onde está seu carro? - Ela perguntou.

— Você está olhando pra ele. - Uma linha divertida passou pelo rosto dele. Sesshoumaru levou a chave até a porta do motorista, destravando todas as maçanetas. Rin caminhou até a porta do passageiro, ainda parecendo surpresa.

— Desde quando você decidiu trocar sua BMW por um Toyota antigo? - Ela perguntou, não evitando o sorriso que surgiu no rosto.

— Eu te conto tudo . - Ele abriu a porta, sentando-se do lado do motorista.

onde? - Rin quis saber assim que entrou no carro também, tendo ainda a flor que havia recebido em mãos.

— Você vai saber . - Ele manteve a linha divertida no rosto e ligou a ignição, dando partida no carro.

Dirigiram por alguns quilômetros pela estrada que ligava Lovebelt a Ellsworth, entrando então por uma via mais estreita, que levava a algumas fazendas de soja da região. Rin conhecia aquele caminho e sabia que não havia nada ali, exceto as plantações e algumas poucas fazendas.

Não fosse pela música que tocava no rádio, em um volume quase inaudível, o silêncio teria sido absoluto. Rin olhava pelo lado de fora do vidro, sentindo-se muito estranha naquela situação.

Pararam a certo ponto em frente a uma cerca de madeira. Sesshoumaru desligou o carro e apagou os faróis, fazendo com que tudo ficasse iluminado só pela luz intensa da lua cheia. Rin sentiu o coração acelerar.

Ele desceu, abrindo o porta-malas do carro. Tirou dali três lamparinas elétricas e uma cesta, que tinha uma toalha dobrada pendurada na ponta. Rin desceu do carro também, olhando em volta. Sesshoumaru caminhou até a cerca e subiu na madeira de forma hábil, estendendo a mão para Rin.

— Venha. - Pediu.

Ela caminhou até ele e encarou a mão estendida na sua direção.

— Você quer mesmo me ensinar a fazer isso? Sério? - Um riso divertido brotou no rosto dela e Rin se apoiou na madeira, passando as pernas habilmente por cima da cerca. Ela segurou o vestido um pouco mais pro alto, para que a tarefa ficasse mais fácil. Sesshoumaru tentou evitar, mas os olhos dele pousaram nas coxas morenas. 

Ele balançou a cabeça negativamente, ainda com uma linha de sorriso. Desceu em um salto, vendo Rin fazer o mesmo.

Caminharam em silêncio por alguns minutos até que chegaram a um ponto alto, de onde dava para ver uma imensidão de soja plantada. A luz iluminava a paisagem e refletia na água de uma lagoa que estava na planície abaixo. Sesshoumaru parou, fazendo com que Rin parasse também. Ele estendeu a toalha no chão e prendeu as pontas do tecido com o peso das três lamparinas. Apertou o botão de ligar de cada uma delas, fazendo com que o rosto dela fosse iluminado aos poucos pela luz amarelada. Sentou-se, apoiando a cesta na ponta que restou da comprida toalha. Rin o seguiu, mas acomodou o corpo uma distância considerável dele. Estavam cobertos por uma frondosa árvore, que balançava conforme a brisa.

— Nunca tinha vindo aqui. - Ela confessou, sem conseguir tirar os olhos do horizonte. - Quer dizer, eu conheço a região, mas nunca havia visto sob esse ponto de vista.

Sesshoumaru ficou quieto por um instante, também observando o horizonte. A brisa da noite batia contra os cabelos prateados curtos, fazendo com que os fios se balançassem. De novo, o cabelo parecia charmosamente desalinhado e ele vestia uma blusa cinza chumbo de manga três quartos.

— E então? Vai me contar a história do carro? - Rin insistiu, fazendo com que ele a olhasse outra vez.

— Não há muito o que contar. Sabia que não podia ficar com o carro do garoto do hotel por mais tempo, então decidi comprar um. - Ele deu os ombros.

— E para onde foi seu gosto refinado? - Ela riu, sabendo que o alfinetaria com aquela pergunta.

— Não preciso de mais do que isso. Ele cumpre seu papel. - Apesar de saber que ela havia feito a provocação de propósito, não se importou.

— Tá bom, agora pode explicar a placa de Nova York? - Ela cruzou os braços, levantando uma sobrancelha.

— Acho que isso é meio óbvio: o carro é de Nova York. - Ele arqueou as sobrancelhas.

— O quê? Você veio dirigindo de lá até aqui? - Rin tinha os lábios entreabertos, demonstrando perplexidade.

— Sim. Foi por isso também que eu demorei mais que o planejado para voltar.

— Você tá brincando. - Ela ainda parecia não acreditar. Começou a fazer as contas mentalmente para calcular a distância do estado que ficava na costa leste até o Kansas. - Você dirigiu mais de 2.200 quilômetros?

Ele acenou uma única vez. A expressão calma e séria não abandonou o rosto dele, nem diante da perplexidade dela. - Pelo menos me deu tempo suficiente pra pensar.

— Por quê? - Rin inquiriu.

— A gente precisa conversar sobre isso. - Ele suspirou, encarando o tecido da toalha sobre a grama.

O coração dela pulou uma batida, não evitando o mal-estar que aquela frase exercia em seu peito. O pensamento negativo sempre a acompanharia -- o medo de ouvi-lo dizendo que tinha mudado de ideia era sempre presente. Rin ficou em silêncio, apenas olhando-o.

— Eu deixei tudo pra trás. Tudo mesmo. – Ele enfatizou as últimas duas palavras, interrompendo os pensamentos dela.

— Como assim? - Ela torceu as sobrancelhas.

— Eu dei entrada no meu divórcio. No fim, Rebeca concordou com um processo amigável. - A voz suave saía dos lábios dele, deixando Rin cada vez mais perplexa. - Mas ela ficou com os bens e com as contas bancárias. Eu não fiquei com nenhuma parte do dinheiro que tínhamos.

— Deus... - Rin levou a mão aos lábios, encarando Sesshoumaru diretamente. - Isso quer dizer que...

— Quer dizer que eu virei um homem de poucas posses, pra dizer o mínimo. - Um riso frio escapou do fundo da garganta dele, e Sesshoumaru desviou os olhos. - Eu tinha algum dinheiro guardado em uma conta que abri quando ainda estava na universidade. Mas não era o suficiente para pagar o processo de divórcio, a passagem, o carro e as outras coisas que eu precisei comprar.

A pergunta de Rin que foi interrompida não era aquela. Ela não estava interessada em saber sobre o dinheiro, porque, embora estivesse surpresa, aquilo não a interessava. Mas deixaria  de lado por um instante a pergunta que realmente queria para entender melhor o que estava acontecendo.

—Por que não me disse? Eu podia ter te ajudado. - Os olhos dela tremulavam e Rin tentava digerir o que havia acabado de ouvir. - Você depositou o dinheiro do seguro daquela BMW na conta de Melissa, eu podia ter enviado de volta pra você...

— Não. - Ele a interrompeu. A voz saiu mais séria que o normal. - Aquele dinheiro servirá para pagar despesas da nossa filha até que eu consiga me estabelecer. Já fiz contato com alguns colegas de faculdade e vou começar a advogar do zero.

— Sesshoumaru. - Rin sussurrou, sem saber o que dizer. - Você... você fez isso mesmo?

Ele acenou mais uma vez, virando-se pra ela. Rin sentou-se sobre os joelhos, diminuindo um pouco a distância entre eles. - Você se separou dela? - Era essa a pergunta que queria fazer desde o início, embora não conseguisse pronunciar o nome daquela mulher.

— Acredito que em alguns dias estarei completamente livre. Os termos do divórcio precisam ainda ser aceitos por um juiz, mas isso deve acontecer logo. - Ele disse.

— E você terá que voltar pra Nova York pra isso? - O primeiro sinal de desapontamento ficou evidente no rosto de Rin e Sesshoumaru percebeu que Lissy havia feito a mesma expressão mais cedo. A memória de quando ele viu a filha pela primeira vez, meses atrás, veio à sua mente e ele pensou o quanto as duas eram parecidas.

— Não, Rin. O advogado vai cuidar do restante. E como eu abri mão de tudo, não há nada mais que me prenda em Nova York. - Disse. O coração dele estava acelerado, e o receio da rejeição crescia a cada instante. E se Rin dissesse que não o queria ali? Pra onde mais iria?

A aflição nos olhos dela se transformou logo em alívio e Rin sorriu. Não foi um sorriso qualquer, e sim o mais genuíno que Sesshoumaru havia visto desde que eles se encontraram. As bochechas apertaram os olhos dela, evidenciando a linha fina de lágrimas que havia surgido sobre os cílios cheios dela.

— Meu lugar é aqui. - Ele disse, inclinando o corpo na direção dela. Agora os rostos estavam a apenas alguns centímetros de distância, e Sesshoumaru teve que se segurar para não beijá-la.

O coração de Rin acelerou e ela passou a olhá-lo fixamente, sentindo a respiração quente dele sobre seu rosto. Suas mãos se moveram sem que ela mandasse e repousaram sobre as dele, na toalha. O calor da mão dele fez com que um choque passasse por seus braços, subindo até o peito.

— Eu sei que não posso apagar o que passou, mas eu quero estar do seu lado, Rin. - Ele disse, envolvendo os dedos dela. Ajeitou-se na toalha, aproximando-se ainda mais. - Quero... - Depositou um beijo suave sobre a bochecha esquerda dela. - ... curar... - Outro beijo na bochecha direita. - ... todas as suas feridas. - Por fim, encostou os lábios nos dela, em um rápido beijo suave, que Rin correspondeu. - Eu te amo. - Disse, levando a mão até o pescoço dela, passando o polegar pela bochecha quente e rosada dela.

Os olhos de Rin já transbordavam lágrimas, embora ela não estivesse triste. Segurou a mão dele com gentileza, olhando-o diretamente nos olhos. - E se você se lembrar que eu sou só uma menina do Kansas americano, que não estudou e não...

Ele escorregou o polegar sobre os lábios dela suavemente. - Não se esqueça que eu sou um garoto do subúrbio de Nova York que não tem um único centavo pra te oferecer.

Ela sorriu. Dessa vez a iniciativa de reunir os lábios dos dois foi dela. E dessa vez não foi um beijo rápido. A língua aveludada dela encostou na dele e Sesshoumaru sentiu um choque no corpo. A mão que estava depositada no pescoço dela avançou, explorando os cabelos da nuca. E a outra mão envolveu a cintura dela, trazendo-a para o seu colo. Rin envolveu o pescoço dele com um dos braços e com outro segurou o tecido da blusa dele.

— Eu estou sonhando? - Ela sussurrou de olhos fechados enquanto Sesshoumaru passava os lábios pelo pescoço dela.

— Não. Isso é real. - Sesshoumaru guardou um sorriso nas linhas da boca, passando os lábios para a orelha dela. Rin deslizou a mão pelo braço forte, sentindo o tecido grosso da gaze do curativo em seus dedos. Ela interrompeu o caminho de beijos dele e esgueirou-se para olhá-lo. Só então lembrou que havia visto aquele curativo mais cedo, quando Sesshoumaru vestia uma camiseta de manga curta.

— O que é isso? - Ela perguntou, deixando Sesshoumaru confuso por um instante. Ele voltou o olhar para a mesma direção que Rin olhava, só então percebendo o que era.

— São cortes. - Disse, simplesmente.

— Você andou brigando por aí? - Ela perguntou, com um brilho divertido nos olhos. Virou-se pra ele e percebeu que Sesshoumaru não estava mais sorrindo.

Ele respirou fundo uma vez, procurando as palavras certas. - Digamos que Rebeca não aceitou bem a ideia do divórcio, a princípio.

— Ela fez isso em você? - Rin parecia de novo perplexa. - Como?

Ele suspirou. - Não tem mais importância.

— Eu quero saber. - Ela insistiu.

— Um copo. Ela quebrou um copo... - Olhou para o curativo, sentindo memórias daquela noite detestável invadindo sua mente.

— É sério isso? Essa mulher podia ter te machucado de verdade. - Rin exclamou, exasperada.

— Tudo isso já ficou no passado. - Ele voltou a beijar suavemente o pescoço dela, passando a mão forte pela cintura de Rin.

— Sesshoumaru? - Ela chamou, fazendo-o parar. - E se essa mulher te procurar outra vez?

— Rebeca? - Ele perguntou, torcendo as sobrancelhas. Rin somente acenou. - Não se preocupe com isso. – Respirou fundo, sentindo o perfume dela preencher seus sentidos. - No fim, acho que tenho pena dela.

Rin levantou uma das sobrancelhas, contrariada. - Ela faz isso com você e você ainda tem pena? Muito nobre da sua parte. - Ironizou.

— Ela não consegue perceber que vive uma vida de mentira, e que o pai a manipula. - Ele deu de ombros, divertindo-se com a contrariedade dela. Afinal, aquilo era ciúmes?

Rin rolou os olhos. Verdade seja dita, ela tinha muita mágoa daquela que em breve seria ex-mulher de Sesshoumaru. Sabia que ela havia sido responsável por mantê-lo longe por tanto tempo, embora não fosse capaz de esquecer a culpa que o próprio Sesshoumaru tinha naquilo tudo. Decidiu deixar aquele assunto de lado por ora.

— E se você não se adaptar à vida daqui? - Rin perguntou após um tempo de silêncio.

— A minha vida agora são Melissa e você. Onde vocês estiverem, eu estarei feliz. - Ele disse, abrindo uma linha de sorriso no rosto.

Ele fez menção de se aproximar, mas Rin recuou. Ela apoiou as mãos na toalha e saiu do colo dele, recolhendo-se do outro lado. Passava a mão no braço, gesto típico de quando ela estava hesitante. Não sabia o que dizer. Na sua mente, o lado emocional travava uma batalha intensa contra o lado racional, argumentando que Sesshoumaru havia, sim, mudado. Mas o lado racional a lembrava de cada um dos anos em que ele passou longe e tudo que ela teve que enfrentar sozinha.

Lembrou da dor e da mágoa por ter sido deixada pra trás e pensou em quanto a vida a endureceu. A verdade é que sua maturidade havia sido moldada na dor causada pela indiferença de Sesshoumaru.

— Muito tempo passou. – Ela murmurou, desviando o olhar. - Eu sou uma pessoa diferente agora. Você também é.

— Eu te conheço, Rin. – O medo estava de volta e ele sentiu um bolo na garganta. – Vejo exatamente a pessoa por quem me apaixonei seis anos atrás.

— Mas eu não sou. – Ela o interrompeu. Rin ficou sobre os joelhos e então se levantou, levando as mãos até as têmporas. Aquela batalha intensa dentro de si estava causando dor de cabeça. – O tempo muda as pessoas. Não dá pra fingir que esse tempo não foi nada.

— Eu sei que não. – Sesshoumaru demonstrou o primeiro sinal de irritação na voz, acompanhando os movimentos dela com o olhar. – Se eu pudesse mudar... se eu pudesse voltar atrás, eu faria. – Em uma das poucas vezes da vida, as palavras faltavam à boca dele, embora os sentimentos fossem muitos dentro do seu peito.

— Mas não dá. – Rin exasperou-se, passando a mão pelos cabelos. – Não pense que eu não vejo mudança em você. Eu sei que você mudou, Sesshoumaru. – Ela voltou os olhos pra ele, vendo confusão nos orbes dourados. Era confusão e algo mais, que Rin não conseguiu identificar.

Ele esperou que ela continuasse, mas houve um breve silêncio. A mente de Rin trabalhava para tentar lembrar quando viu aquela expressão em Sesshoumaru, mas nada vinha à memória. De repente, o clarão de um trovão e um barulho de chuva fez com que ela recuperasse algo. Então era isso, pensou. O que havia nos olhos dele era medo, o mesmo medo que estampava o rosto de Sesshoumaru na noite em que Lissy estava perdida na floresta.

— Eu acredito nisso, acredito que você mudou. – Ela continuou a falar, tendo a voz mais suave que antes. – Mas nós passamos seis anos separados. Eu não conheço você mais.

Sesshoumaru sentiu um gosto amargo ocupando sua boca. Era verdade, seis anos era tempo suficiente para uma vida – Melissa era prova disso. Mas ele ainda via em Rin tudo que fazia com que ele tivesse se apaixonado no passado. Exceto pelo fato de que ela não era mais uma menina. Rin havia amadurecido, se tornado uma mãe incrível, e estava lidando bem com os problemas dela até ele aparecer.

Além disso, ele mesmo também havia mudado. Fora a reviravolta recente, que motivou o fim do seu casamento, Sesshoumaru havia também se tornado menos frio, menos duro. O rancor que penalizou seu coração desde a infância havia se acalmado – tudo amenizado pelo tempo.

Então era isso. Era de tempo que eles precisavam.

— Você tem razão. – Ele levantou-se devagar, mostrando de novo a diferença de altura dos dois. As pernas longas estavam abrigadas por uma calça jeans preta, que marcava as formas fortes. – E eu estou disposto a começar do zero.

Agora era o coração de Rin que estava fora de controle. Seu lado emocional apontava aquilo como mais um sinal da mudança de Sesshoumaru. Ele não havia reagido mal à rejeição, e sim mostrava-se, de novo, aberto a tentar reparar seus erros. Ela sentiu a garganta arder, e a culpa pela resistência veio. No final das contas, por que ela tinha medo? Sua primeira barreira havia sido a relação de Melissa e Sesshoumaru. Tentou mantê-lo afastado da filha para evitar que ela ficasse magoada, quando ele voltasse para Nova York. Mas ele não voltaria mais para lá. E já tinha conquistado seu espaço no coração de Melissa. Então por que?

Sesshoumaru aproximou-se, contendo a vontade de tomá-la em seus braços de novo. Aquele vai e vem estava o atordoando – há apenas alguns instantes Rin estava no colo dele, e ele roçava a ponta do nariz no pescoço dela. O recuo e a hesitação constante o confundiam, mas ele não podia culpá-la por isso. Ele aproximou-se e Rin tremeu. O lado emocional dela implorava pelo toque dele, mas ela não conseguiu se mexer. Sesshoumaru estendeu a mão pra Rin, a surpreendendo.

— Sou Sesshoumaru Taisho. – Disse, com um meio sorriso no rosto.

Ela não conseguiu evitar um sorriso. Não podia acreditar que o advogado renomado, rico e orgulhoso que conheceu anos atrás estava na sua frente, disposto a realmente começar do zero. E aquele seria um recomeço como poucas pessoas estavam dispostas a enfrentar: Sesshoumaru deixou tudo que conhecia para ficar com ela. Com elas, na verdade.

Rin apertou a mão dele com força, balançando duas vezes. – Sou Rin Ozawa. Conheço bem a região, posso te ajudar.

Aquilo fez com que ambos lembrassem daquele dia de sol quente em que ele apareceu na fazenda, vestido de terno e gravata. Rin só percebeu a presença ali quando ele desceu do carro, com o paletó apoiado no ombro. Os óculos escuros escondiam os olhos dourados, reluzindo diante da luz do sol. Já ela tentava organizar as máquinas que começariam a colheita. O barulho dos motores era tão alto, que Rin não conseguiu ouvir uma única palavra sequer que ele disse.

Agora era o silêncio absoluto que envolvia os dois. Sesshoumaru ainda tinha um sorriso no rosto e ainda segurava a mão dela. A vontade de abraçá-la era enorme, mas ele resolveu dar aos dois aquilo que era necessário: tempo.

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Ele encostou o carro na porta da casa dela, desligando a ignição. Rin olhava para o lado de fora, evitando que o olhar dos dois se encontrasse. Assim que deixou de ouvir o som do motor, ela esticou-se e pegou o narciso branco e rosa em cima do painel, olhando mais uma vez para a flor que Sesshoumaru havia dado a ela. Cheirou as pétalas outra vez e o olhou.

— Obrigada pelo presente. – Ela abriu uma linha de sorriso, sentindo as bochechas queimarem.

Ele acenou uma única vez, abrindo um sorriso de lado. Queria perguntar a ela se eles poderiam se ver de novo amanhã, e depois, e depois, e depois... Sabia que a convivência com Lissy os aproximaria mais vezes, mas sentia vontade de estar com ela a sós, como haviam ficado hoje. Rin o arrancou daqueles pensamentos quando se inclinou, depositando um doce beijo na bochecha dele. Sesshoumaru sentiu o coração perder o ritmo, vendo-a sair pela porta.

Ela deu a volta no carro e inclinou-se do lado do motorista. Ele abriu o vidro, encarando os olhos castanhos, que tinham um brilho diferente.

— Boa noite, Sesshoumaru. – Sussurrou.

— Boa noite, Rin.

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Depois de uma noite revirando-se na cama e ponderando tudo que Sesshoumaru havia dito na noite anterior, Rin decidiu levantar-se. Vestiu o robe cinza e sentou-se na varanda, com uma caneca de chá nas mãos, exatamente como seu pai fazia. Agora que as emoções estavam menos à flor da pele, sua racionalidade havia começado a trabalhar de forma mais ativa. E ao contrário do que Rin imaginava, seu lado racional não a empurrava mais para longe de Sesshoumaru; na verdade, agora era o oposto. Racionalmente, concluir que ele havia pedido o divórcio e deixado todo o patrimônio para Rebeca só reforçava a ideia de que, se não era diferente, ao menos Sesshoumaru estava se esforçando para ser.

E mais: quando ele disse que começaria do zero na profissão, sabia que provavelmente seria para valer. Embora tivesse o peso no currículo do título de ser sócio de um dos maiores escritórios de advocacia do país, Sesshoumaru agora não tinha dinheiro e não tinha como abrir o próprio escritório. Sendo assim, ele provavelmente teria que começar de baixo em algum outro escritório já estabelecido.

Abrir mão da profissão e do dinheiro, que eram as duas coisas que ela acreditava que Sesshoumaru mais amava, foi surpreendente. Rin começava a sentir uma segurança em relação a ele que jamais havia sentido – nem quando estavam apaixonados, seis anos atrás. Sabia que, caso as coisas não dessem certo entre eles, não seria por causa da vida alternativa que ele levava. Sabia que não seria por causa do luxo, do escritório e da esposa dele, porque nada disso mais existia na vida de Sesshoumaru.

Não podia desapegar-se da possibilidade de tudo dar errado. Seu lado cético não a permitia imaginar que finalmente a sua vez de viver o "felizes para sempre" havia chegado. Os anos de sofrimento a convenceram que não existia coisa como aquela.

Rin olhou no relógio de pulso, vendo que já eram quase nove da manhã. O sol ameno de outono já começava a invadir a varanda, esquentando as pernas esticadas sobre a poltrona branca de madeira. Pegou a caneca de chá, que repousava sobre uma mesinha ao lado, e levantou-se, voltando para dentro de casa. Apesar de não ter dormido à noite, não sentia cansaço. Seu corpo estava ainda repleto de adrenalina, e a mente não parava por um único instante.

Decidiu que iria buscar a filha na casa de Sango. Trocou de roupa e seguiu direto para a garagem, saindo com sua barulhenta caminhonete vermelha. Chegou à casa de Sango e tocou a campainha da casa, esperando por alguns instantes antes de ser atendida pela amiga e por Lissy. A menina mal esperou a porta abrir para abraçar as pernas da mãe e olhar pra cima.

— Bom dia, mamãe! - Ela exclamou, recebendo um afago nos cabelos. - Vem tomar café com a gente, vem. - Lissy demandou, já puxando a mãe pela mão.

Errr, acho melhor não. - Rin travou os pés no chão, à porta. Olhou Sango com um olhar de desespero e viu a amiga sorrindo. Ela sussurrou entre os lábios para Rin: ele não está aqui.

Rin sabia que encontrar com Kohako não seria nada agradável, ainda mais após a volta de Sesshoumaru. Os sentimentos que floriam no peito dela faziam com que ela se sentisse mais viva, mas também ampliavam a culpa que ela sentia em relação ao irmão de Sango. Não sabia o que dizer a ele, por isso não sabia se queria encontrá-lo. Mas tinha consciência que, cedo ou tarde, teria que enfrentar aquela conversa definitiva e necessária. Ainda que ela também estivesse ainda com medo de reabrir as portas da própria vida para Sesshoumaru.

Ela finalmente cedeu e acompanhou as duas até a cozinha. Uma farta mesa de café da manhã já estava posta e Rin sentou-se à ponta, percebendo que Lissy já havia começado a refeição. Serviu-se uma xícara de café e um pedaço de um bolo de laranja, feito por Sango.

— E então? - Sango pigarreou, chamando a atenção de Rin.

— Sango?! - Ela franziu as sobrancelhas, reprimindo a amiga. Sabia muito bem onde Sango queria chegar com aquela pergunta, mas aquele assunto não podia ser tratado na frente de Lissy de forma alguma. Até porque, na cabeça da menina Rin ainda namorava com Kohako e Sesshoumaru era apenas o pai dela.

A outra morena revirou os olhos, sabendo que sua curiosidade teria que esperar.

— O filme foi muuuito legal. – Lissy começou a contar animadamente, tomando um gole do suco de melancia. – O tio Kohako segurou minha mão na parte em que eu tive medo, mas eu gostei muito.

Rin sorriu, embora seu peito se apertasse. Kohako havia sido um companheiro presente, compreensivo e carinhoso. Companheiro... um amigo, Rin corrigiu. O namoro, que havia começado apenas meses antes de Sesshoumaru voltar, começou porque ela acreditava que ele era um bom homem, e que ela poderia tentar ser feliz. Tentou, só Deus sabe quanto tentou. E foi, sim, feliz ao lado dele, mas não como havia sido nos meses em que esteve do lado de Sesshoumaru. Tentou negar isso a si mesma por tempo demais, mas a paixão que vivia no seu peito não se acendia por Kohako. No fim, ela o amava. Como o amigo, companheiro e melhor padrinho que Lissy poderia ter. E só isso.

Ouviram a porta da frente ser aberta e Kohako logo apareceu na cozinha. O sorriso que ele tinha no rosto foi rapidamente se desmanchando, assim que ele viu Rin ali. Ela engoliu seco, sentindo o coração disparar.

Ele fez menção de dar as costas, mas Rin o chamou.

— Kohako. - Ela levantou-se da mesa, sendo acompanhada pelos olhos curiosos de Lissy. - Posso falar com você por um instante? – Aproximou-se para que a pergunta fosse feita em um sussurro. Embora ainda não se sentisse pronta para aquela conversa, sabia que continuar naquela situação seria torturá-lo. Seria desrespeitá-lo, e desrespeitar o que ela mesma sentia.

Ele coçou a nuca, em um óbvio sinal de dúvida. Após alguns instantes ele acenou positivamente, seguindo o caminho de volta para a porta da frente.

— Termine de comer e depois ajude sua tia com a louça, ok? - Recomendou, virando-se para a filha. Lissy acenou uma única vez, intrigada pelo clima pesado do ambiente.

Rin saiu pela porta da frente, encontrando Kohako prostrado na varanda, com os braços cruzados. Ela colocou as mãos nos bolsos de trás da calça jeans, demonstrando nervosismo.

— Eu quero pedir desculpas pelo que aconteceu. Sei que o que eu fiz não foi certo, e sei que magoei os seus sentimentos. - Ela olhava pra ele, embora Kohako tivesse os olhos pregados no chão.

— Soube que ele voltou. Melissa só falava disso ontem. - Ele comentou. A voz firme estava mais séria que o normal. - Me parece que você está com sua família completa. Parabéns. - Agora o sarcasmo era evidente.

Rin suspirou. - Você e Sango também são minha família. Minha e de Lissy.

— Não é o que parece. - Ele deu as costas.

— Eu nunca vou esquecer o que você fez por mim. - Rin passou a mão pela pele exposta do próprio braço, logo abaixo da manga dobrada da camisa branca de algodão. A mágoa dele a feria profundamente.

— Você já esqueceu o que ele fez. - A frase não soou como uma pergunta.

— Não, eu não esqueci. - Rin deu um passo à frente, fazendo com que Kohako finalmente a olhasse. - Mas ninguém tem o poder de mudar o passado. E eu não posso mais me punir por isso, não posso punir Lissy por isso. Também não posso punir Sesshoumaru.

— Tomara que você esteja certa. – O nome dele soava áspero nos ouvidos do rapaz. Um tom amargo tomou o rosto de Kohako e ele deu as costas de novo. Rin aproximou-se, tocando os ombros dele com as duas mãos.

— Lembra quando eu era criança e você me defendia dos meninos da escola? - Ela sorriu, sentido o corpo ele encolher com o toque dela.

— Como se precisasse... - Kohako suspirou, rendendo-se às lembranças.

— Um dia eu aprendi que podia botar medo neles. - Um riso escapou dos lábios da morena.

— Você nunca precisou realmente de mim, não é? - Ele perguntou de forma retórica, com um tom de voz amargurado. - Foi burrice da minha parte imaginar que sim.

— Kohako... - Rin o interrompeu, passando os dedos para o braço dele, prendendo-os no tecido da camisa azul que ele usava. - Eu não sei o que teria sido de mim se você não tivesse segurado as pontas quando Lissy nasceu e passou todos aqueles dias na UTI. – O coração dela se apertou ao lembrar da imagem daquele bebê pequeno, em uma incubadora. – Lembra quando você a colocava no seu antebraço, para que ela dormisse? Ela era tão pequena. - A morena sorriu, sentindo os olhos ficarem úmidos. Ficou na ponta dos pés, encostando o queixo sobre o ombro do rapaz. - Lembra quando meu pai adoeceu? Você cuidou de Lissy para que eu pudesse ficar com ele nos últimos dias.

Kohako engoliu seco, segurando a mão direita dela e reclinando o rosto na direção da cabeça de Rin, fazendo com que a lateral do rosto forte ficasse encostada nos cabelos castanhos.

— Você fez muito por nós, e eu jamais vou esquecer disso. Tampouco Lissy esquecerá. Ela te ama... e eu também. - Rin murmurou, sentindo a respiração dele ficar ofegante. - Mas... é justamente por isso que quero que você seja feliz. E eu não sou capaz de fazer isso.

Ele avançou um passo, fazendo com que o contato físico entre os dois fosse interrompido. Kohako levou a mão até o queixo, tentando conter o turbilhão de emoções que sentia. - Eu cheguei a acreditar que finalmente conseguiria... que me casaria com você, que eu teria uma família.

Rin sentiu o peito ser partido no meio e as palavras faltaram à boca. Sentia-se muito mal por ouvir aquilo.

— Mas no fim das contas, mesmo que esse cara não tivesse voltado, eu não teria nada disso, não é? - Ele virou-se finalmente, revelando lágrimas nos olhos castanho-claros. - Você passaria o resto da vida usando sua gratidão como desculpa para fingir ser feliz ao meu lado.

— Eu não... - A garganta dela arranhou, e a unidade nos olhos se transformou em lágrimas. Apesar de a mente de Rin estar um turbilhão, não sabia como traduzir tudo aquilo em palavras, e por isso não conseguiu concluir a primeira frase. - Perdão por te magoar. Você não merecia isso.

— Você não precisa de mim para te proteger dos garotos maus, não é? - Ele caminhou alguns passos, ficando ao lado dela, olhando na direção oposta. - Sinta-se livre para seguir seu caminho, Rin. - Kohako murmurou, entrando pela porta da frente outra vez.

Rin achou que fosse perder a força das pernas, mas a única reação possível naquele momento foi a de um choro silencioso. Ficou ali por mais alguns minutos, e quando havia já secado as lágrimas e preparava-se para entrar, Sango saiu pela porta, com um copo de água nas mãos. O olhar complacente da morena fez com que Rin a abraçasse de uma vez, fazendo com que parte do líquido do copo se derramasse no chão de tábuas de imbuia. Sango afagou os cabelos da amiga com a mão livre.

— Tudo vai ficar bem. – Ela sussurrou, sentindo o rosto de Rin balançando em um aceno acima do seu ombro.

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Já era fim de tarde quando Sesshoumaru entrou pela porta da confeitaria, encontrando Lissy sentada em uma das mesas, acompanhada do seu mais novo livro: O Pequeno Príncipe. A cena fez com que um sorriso escapasse dos lábios dele. A menina estava tão absorta na leitura, que sequer percebeu quando o pai entrou pela porta, fazendo a sineta tocar. Sango estava no balcão, arrumando os pães que estavam em exposição na vitrine. Ela apenas acenou com a cabeça para Sesshoumaru uma vez, abrindo uma linha de sorriso. Aquilo fez com que ele lembrasse que ainda não havia agradecido Sango pelo favor da noite anterior. Aproximou-se do balcão, sem que Lissy ainda tivesse percebido sua presença.

— Acho que não consegui te agradecer ontem pelo que fez. Muito obrigado. – A voz suave era quase inaudível, com o mesmo tom de seriedade de sempre.

— Às ordens. – Ela balançou os ombros, expandindo o sorriso.

Ele espiou para dentro da cozinha da confeitaria, reparando que tudo estava apagado. Olhou em volta, vendo que também estava tudo vazio. Não podia evitar, estava buscando por Rin – seu coração fora de compasso denunciava como Sesshoumaru estava ansioso por vê-la. Quando voltou os olhos para Sango, ela tinha um sorriso... perspicaz.

— Rin está na fazenda, parece que houve algum problema com as bombas de irrigação de novo. – Ela comentou, pegando um copo do balcão.

— Como? Não choveu nos últimos dias. – Ele torceu as sobrancelhas, lembrando do dia em que a plantação de trigo havia sido inundada por causa de um problema nas bombas. Também foi o dia em que ele buscou Melissa na escola sem a permissão de Rin, o dia em que Rin destruiu seu carro e o dia em que a filha deles havia fugido de casa. Tudo havia acontecido poucos meses antes, mas parecia fazer uma eternidade.

— Parece que a tubulação que passa pelo rio foi danificada, não sei exatamente o que aconteceu. – Ela terminou de secar o copo comprido de vidro e depositou-o dentro de uma caixa de madeira. – Rin deve estar precisando de ajuda. – Sango sorriu, jogando o pano por cima do ombro direito.

Assim que Sango terminou a frase, Sesshoumaru foi captado pela voz doce de Melissa o chamando. A menina havia finalmente percebido a presença do pai dali e já havia saltado da mesa, correndo para abraçar as pernas fortes dele. Sesshoumaru afagou os cabelos dela, segurando os pequenos ombros.

— Sua mãe está na fazenda? - Ele perguntou.

— Está. Ela foi correndo pra lá agorinha mesmo, e nem quis me levar. – A menina torceu os lábios, em uma expressão contrariada.

— Sua tia me disse que aconteceu algum problema... – Ele comentou, vendo a filha desfazer os traços do rosto.

— É, a mamãe acha que consegue resolver sozinha, mas eu acho que você deveria ajudar. – Lissy levantou o rosto, exibindo agora um sorriso.

— Ela pode ficar com você até voltarmos? - Sesshoumaru virou-se para Sango, encontrando o mesmo sorriso perspicaz de antes.

— Mas é claro, não se preocupe. Hoje devo fechar a confeitaria mais cedo, por causa da chuva que deve cair logo, então vou levar Lissy para a minha casa daqui a pouco.

— Hoje vamos ter noite do pijama! – A menina exclamou, batendo seguidas palmas.

Sesshoumaru não evitou o sorriso outra vez. Despediu-se da filha e de Sango e saiu pela porta da confeitaria, sentindo o vento bater contra o corpo. Olhou para o céu e percebeu que aos poucos o sol forte perdia espaço para as nuvens pesadas de uma chuva que realmente não demoraria a cair.

Entrou no carro e caiu na estrada margeada por infinitos campos e moinhos de vento. O coração dele palpitava, ansioso em saber que em breve encontraria Rin, e que provavelmente estariam a sós outra vez. Será que ela o receberia bem? A presença dele não era esperada, afinal de contas.

O vento forte jogava as folhas secas das árvores contra o para-brisas do carro e as nuvens já começavam a se reunir no céu, escondendo completamente o sol. Ele acelerou, querendo encurtar a distância até a fazenda onde ele e Rin passaram tardes conversando, sentados à grama, anos atrás. Os pensamentos sobre o tempo, sobre como os anos haviam passado voltaram a ocupar a cabeça de Sesshoumaru.

Rin estava certa, nada mais era como antes. Apesar de todo o ressentimento, era como se os dois estivessem se conhecendo outra vez, mesmo tendo um laço tão forte quanto Melissa já estabelecido. O medo de Rin não conseguir superar o ressentimento, ou de ela não se apaixonar por ele outra vez, faziam com que um bolo se formasse na garganta de Sesshoumaru.

Ele chegou à frente da casa solitária, percebendo que a caminhonete de Rin estava ali. Desceu do carro, dando a volta pela varanda, que parecia vazia. Quando passou pelo fundo conseguiu enxergar Rin no meio do campo, fechando o enorme registro do sistema de irrigação.

Ela virou-se naquele exato momento, enxergando a figura de Sesshoumaru no horizonte. Seu coração pulou uma batida, surpreso. O que ele fazia ali, afinal? Aquilo só podia ser obra de Sango. Ele caminhou pelo gramado, em uma cena que pareceu estar em câmera lenta na mente de Rin. O vento balançava os cabelos dele e o tecido da camiseta preta de algodão que ele vestia, marcando as formas do tórax.

— Sango disse que você poderia estar precisando de ajuda. – Ele disse assim que a alcançou, colocando as mãos dentro dos bolsos da calça jeans escura. O nervosismo dele começava a ter um pouco de graça para ela.

— A tubulação que traz e leva a água para o rio parece ter se rompido, ou soltado. A bomba não está funcionando. – Rin colocou as mãos cerradas na lateral dos quadris, desviando o olhar dele. – Não tem muito o que se fazer, desliguei o sistema para que as bombas não queimassem.

— Mas e se chover? A água empoçada não pode estragar as máquinas? - Ele se lembrava da cena de Rin trabalhando para tentar salvar as máquinas na manhã após a última tempestade. Foi naquele dia interminável, em que Melissa fugiu.

— Pode, mas os rapazes que cuidam da tubulação não puderam vir hoje para verificar. – Rin suspirou fundo, secando o suor do rosto com a manga do antebraço da camisa branca. - Não há o que se fazer.

Sesshoumaru olhou o caminho que a tubulação fazia pelo campo até alcançar a margem do rio, que começava a se agitar, por causa da chuva. Seguiu o rumo dos tubos, percebendo que Rin o seguia, intrigada. Assim que chegaram à beira do rio, ele subiu em um pequeno flutuante de madeira, posicionado ao lado dos tubos. Agachou-se à beira da água, tentando enxergar por baixo da água escura e movimentada.

— Tem certeza que problema está embaixo da água? - Ele perguntou.

— Sim, eu já conferi todos os tubos que ficam expostos. Não tem vazamento e nem desencaixe. – Ela cruzou os braços, apoiando o peso na perna esquerda. – Eu já desliguei a bomba, vamos...

— Ligue a bomba. – Sesshoumaru a interrompeu, colocando-se de pé.

— Pra quê? - Rin levantou uma das sobrancelhas.

— Eu vou dar uma olhada. – Ele descalçou o tênis claro que vestia, passando a tirar as meias brancas de algodão.

— Você enlouqueceu? - Ela descruzou os braços, agitada. – Os tubos vão até o fundo. Meu pai fez assim para que as bombas continuem funcionando mesmo se o nível do rio cair. Fora que a água está escura e agitada.

— Eu só vou dar uma olhada. – Sesshoumaru abriu um esboço de sorriso, tirando a camisa por fim. Os olhos dela não conseguiram escapar do tórax nu dele, e lembranças da noite em que ele a beijou na confeitaria e em que eles dormiram juntos invadiram a mente de Rin. Levou um tempo até que ela conseguisse se livrar das memórias e desviar o olhar do corpo dele.

— Só uma olhada. – Ela repetiu, recebendo um aceno dele de volta.

Rin foi até o registro, colocando o sistema de bombeamento para funcionar. Como esperava, nada aconteceu – não havia o som da água passando pelos tubos. Voltou para a beira do rio em uma corrida, encontrando o flutuante já vazio. O coração dela pulsava rápido, em uma sensação que ela não sabia bem definir. Havia sentido aquilo quando não viu Melissa em sua cama, na noite em que a filha sumiu. Era uma mistura de adrenalina e... medo.

Conforme o tempo passava, Rin sentia um bolo sendo formado na garganta. Abaixou-se e pegou a camisa dele, apertando o tecido nas mãos de forma nervosa. Parecia que Sesshoumaru estava embaixo da água há uma eternidade, e Rin se questionava se algo havia acontecido. Para piorar, o vento de chuva se intensificava, agitando ainda mais a corrente do rio. Ela sentia o peito arder, arrependida por ter permitido que ele entrasse na água com aquela tempestade prestes a cair.

Antes que pudesse perceber, Rin já havia tirado os sapatos e já havia se sentado na beira do flutuante. A água fria e agitada bateu contra os calcanhares dela, molhando a calça jeans que ela vestia. O coração fora de controle e a mente nublada nem sequer a lembravam de que nadar definitivamente não era seu forte. Mas aquilo não importava.

Antes que pudesse mergulhar o restante do corpo na água, sentiu um choque quando a mão de Sesshoumaru prendeu-se na perna dela, e logo o rosto dele estava acima da superfície. Rin imediatamente levou as mãos até a borda da calça dele, puxando-o para a beirada do deck.

— Você é maluco! – Ela exclamou, tentando soar irritada. A voz trêmula, no entanto, só demonstrava o quanto Rin estava assustada. – Nunca mais faça isso.

Ele ofegava repetidamente, tentando recompor o fôlego. Logo as puxadas de ar se misturaram com um riso, e Sesshoumaru sentou-se no flutuante, ao lado dela. – Rin, está tudo bem.

— Não está nada bem. Você poderia... – A voz exasperada foi interrompida pelo som do maquinário de irrigação voltando a funcionar e a água passando pela tubulação, em direção ao campo.

— Os tubos só estavam desencaixados. – Ele deitou-se no deck, levando a mão até o tórax. – Deus, estou enferrujado.

— Você quase me matou de preocupação. – Rin levantou-se, sentindo irritação pela tranquilidade dele. Pegou os próprios sapatos nas mãos e jogou a camisa de Sesshoumaru sobre o corpo dele.

Os primeiros pingos grossos de chuva começaram a cair sobre os dois, marcando a madeira do deck flutuante. Rin olhou para o céu, percebendo que o céu estava escuro e que provavelmente a chuva se intensificaria.

— Vou reverter as bombas, pra elas levarem a água da chuva para o rio. Você deveria entrar para tirar a roupa molhada. – Rin sequer esperou a resposta dele e correu para o sistema de registro, percebendo que a chuva estava mesmo se intensificando.

Sesshoumaru colocou-se de pé depressa, recolheu seus sapatos e a camiseta, e caminhou até a casa. Os pingos frios da chuva causavam um choque na pele já úmida dele, e a respiração já estava mais sob controle. Subiu as escadas da varanda ampla e puxou a porta mosqueteiro, percebendo que o acesso ao lado de dentro estava livre. Ficou parado do lado da porta para evitar que as gotas que escorriam da calça jeans molhassem o piso, e vestiu a camisa, sentindo o tecido de algodão se umedecendo conforme entrava em contato com a pele do peito dele.

Não demorou muito até que Rin entrasse pela porta mosqueteiro, acompanhada pelo som de um forte trovão. A chuva havia se transformado em uma tempestade com ventos fortes, que deixava a enorme sala em uma penumbra, embora a noite ainda não tivesse chegado. Ela acendeu a luz amarelada do cômodo e olhou em volta até encontrá-lo encostado ao lado do batente da porta de entrada.

— Funcionou? - Ele perguntou, percebendo que embora a respiração estivesse sob controle, o coração havia voltado a pulsar de forma intensa.

— Perfeitamente. – Rin sorriu, mostrando que a irritação de antes havia desaparecido. – Obrigada por ter consertado a tubulação. Poupou uma enorme dor de cabeça.

— Às ordens. – Sesshoumaru colocou as mãos nos bolsos molhados, repetindo o mesmo gesto nervoso de antes.

(Trilha sonora: Finally // Beautiful Stranger – Halsey)

Os dois ficaram em silêncio, apenas olhando-se por um instante que pareceu uma pequena eternidade. Os olhos dourados estavam fixos nos castanhos, e os dois corações batiam fora de ritmo. O corpo de Sesshoumaru implorava para que ele avançasse e a tomasse para si, mas ele havia prometido que começaria do zero e que não atropelaria os sentimentos dela. Havia prometido dar a ela espaço suficiente para que lidasse com a própria mágoa, havia prometido respeitar a segunda chance que estava sendo construída, havia prometido tempo.

Oh, we're dancing in my living room and up come my fists. And I say I'm only playing, but the truth is this...

Mas foi ela quem não resistiu. Rin avançou um longo passo e reuniu os lábios dos dois, sentindo a camisa úmida dele contra o próprio peito. Sesshoumaru envolveu as costelas dela com os dois braços com pressa, fazendo com que os pés descalços femininos ficassem nas pontas dos dedos. Rin emaranhou os dedos nos cabelos da nuca dele, apertando os fios com gentileza. Sentiu a coxa dele sendo encaixada entre as pernas dela e gemeu, sentindo o frio do tecido da calça molhada dele contrastando com o calor que sentia na região.

That I've never seen a mouth that I would kill to kiss, and I'm terrified, but I can't resist

Ele sentiu um choque de prazer preencher o corpo todo e desapoiou-se da parede. Devagar dessa vez, pensou. Separou os lábios dos dela e roçou a boca pela pele macia do queixo de Rin, passando em seguida para o contorno da mandíbula. Ela fechou os olhos, aproveitando o toque gentil da barba curta passando pelo seu rosto. Ele ajeitou uma mecha do cabelo castanho que caía sobre a testa dela e em seguida passou os dedos pela têmpora dela. Os olhos castanhos e dourados voltaram a se encontrar com intensidade.

And I say beautiful stranger here you are in my arms, and I know that beautiful strangers only come along to do me wrong

Ela esgueirou-se nas pontas dos pés e prendeu as duas pernas em volta do quadril dele. Sesshoumaru segurou as coxas de Rin, sentindo urgência em retomar o beijo. A língua quente dele invadiu a boca dela, fazendo com que dessa vez o choque de prazer passasse pelo corpo de Rin. Ela inclinou o corpo para trás, abrindo espaço para que ele beijasse o pescoço úmido de suor, descendo até o contorno dos seios que escapavam da regata branca que ela usava por baixo da camisa.

And I hope, beautiful stranger, here you are in my arms. But I think it's finally, finally, finally, finally, finally safe… for me to fall

As mãos de Rin foram até a barra da camisa úmida preta que ele vestia, puxando o tecido até que passasse pelos ombros largos dele. Assim que livrou-se da camiseta de algodão, foi a vez de Sesshoumaru de desabotoar a camisa branca dela. Rin inclinou o corpo para trás, fazendo com que os corpos unidos fossem em direção à escada. Sesshoumaru subiu aos degraus e ela assumiu a tarefa de tirar a própria camisa, deixando o tecido no meio do caminho.

O segundo andar estava mergulhado em uma penumbra total, interrompida vez ou outra pelo clarão dos relâmpagos que cortavam o céu na tempestade. Rin desprendeu as pernas do quadril dele e pousou no chão, guiando os dois até o quarto dela, no fim do longo corredor. Ela separou-se do beijo dele apenas para ligar o abajur que repousava sobre a cômoda de madeira escura, no canto do quarto. Sesshoumaru posicionou-se atrás do corpo dela, pressionando o quadril contra o dela. As mãos livraram a nuca da cortina de cabelos escuros, dando espaço para que os lábios dele beijassem a pele exposta.

I've never recognized a purer face. You stopped me in my tracks and put me right in my place

Ela curvou-se, sentindo um arrepio percorrer todo o corpo. Ainda de costas, a mão dela buscou a lateral do rosto dele, e o dedos acariciaram a mandíbula marcada e forte de Sesshoumaru, enroscando-se nos cabelos dele em seguida. Ele guiou-a até a cama, em passos coordenados, e virou-a de frente para si. Curvou-se até deitá-la na cama e deitou o corpo sobre o dela, apoiando o peso do próprio corpo nos dois cotovelos. Retomou os beijos e carícias, fazendo com que a noção de tempo dos dois fosse perdida, como se a vida tivesse parado para que eles ficassem juntos... outra vez.

Used to think that loving meant a painful chase, but you're right here now and I think you'll stay


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Notas finais do capítulo

Oi, gente!

Sei que demorei muito mais do que o prometido, pra variar. Pra tentar me redimir, estou tentando publicar capítulos mais longos, espero que gostem.

Fiquei muito feliz com os reviews que os últimos capítulos receberam. É bom demais ver que vários de vocês não desistiram da história, e também ver gente nova chegando. Muito obrigada por darem esse imenso incentivo.

Se puderem, compartilhem comigo as impressões sobre a história, e o que vocês gostariam de ver daqui pra frente. Acho que estamos chegando na reta final da história, mas ainda tem bastante coisa pra acontecer.

Então é isso. Obrigada mais uma vez, e cuidem-se nesses tempos difíceis. Até o próximo capítulo :*



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