45% escrita por SobPoesia


Capítulo 13
Inferno




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O som da minha máquina de dormir entrou em minha mente, naquele ciclo infinito que fazia um barulho mecânico ao encher e esvaziar meus pulmões.

Tinha perdido a consciência de novo? Aquilo já estava ficando extremamente irritante.

Fiquei um pouco parada, dentro da minha cabeça, sem abrir os olhos, repassando tudo que havia acontecido, mas não conseguia entender. Aquela dor era nova, diferente de todas as coisas que já havia sentido, desde as embolias, dores de amores e meu atropelamento que levou a uma bolsa de gordura ser estourada em meu peito.

O que estava acontecendo?

Abri meus olhos, fiquei observando o teto durante algum tempo. Havia várias pessoas em meu quarto pelo barulho e movimentação das sombras. Tentei sentar-me com dificuldade e cuidado.

Meu pai, minha mãe, minha irmã, Evans e 45% pularam juntos em minha cama, tomando cada um, um posto diferente ao meu redor, abafando o ar que eu não estava utilizando para respirar. Ficaram todos quietos e parados me observando como se eu fosse algum tipo de alienígena que acaba de cair dos céus.

—Se isso não é o inferno, eu não sei o que é. –suspirei, ainda me ajeitando na cama.

—Vai continuar com a mesma piada sem graça da outra vez? – minha mãe fechou o cenho, o que me abriu um sorriso.

—Tem muita graça. – o loiro segurou minha mão com um sorriso no rosto.

—O que poderia ter acontecido de tão sério que todos vocês tiveram de vir observar este pequeno babuíno no zoológico? – apertei a mão de Evans, precisava dele ali.

—Você retornou um estagio, não pode ficar mais sem a Hazel. – minha irmã cruzou os braços me olhando com aquele ar que só ela tinha quando falava algo sério demais comigo, mesmo que sorrisse.

—Parece que mesmo com seus pulmões funcionando muito bem eles não conseguem puxar todo o oxigênio necessário para que você sobreviva. Isso não ficou claro por que em curto prazo, essa diferença não importa, mas em longo prazo sim. A única solução é Hazel. – os olhos de minha mãe acharam os meus e me penetraram, buscando tirar qualquer emoção que pudesse nos aproximar deles.

—Ok. – sorri e observei os olhos de mamãe se encherem de fúria.

—Você entendeu que a sua condição piorou, não entendeu? – meu pai, ainda que longe, estava insatisfeito, como sempre estava. Então com sua grossa voz me infernizou.

De todas as pessoas da minha família, a que eu mais detestava, com certeza, era meu pai.

Nunca tive uma boa relação com eles. Meus pais eram distantes, primeiro porque meu pai era um homem ruim, segundo porque a minha mãe não aceitava que desde criança eu já sabia que os meninos não eram tão interessantes assim. Já eu e minha irmã éramos a mesma pessoa quando criança, mas isso tudo acabou quando ela ganhou peitos, quase 3 anos antes que eu chegasse perto da puberdade. Ela ainda era a única que eu confiava para trazer meus cigarros escondidos para dentro do hospital, mas não tínhamos a mesma relação.

Aquela forma paterna de lidar com as notícias era tão típica que foi quase involuntário responder rispidamente.

—Estive mal a minha vida inteira, você realmente acredita que agora vou começar a me importar? Pra quem já está molhado, um pingo não faz diferença. – suspirei, ainda sorrindo.

Seus olhos se encheram com uma raiva inexplicável e ele saiu do quarto, marchando.

—Você deveria ser uma pessoa melhor com seu pai, sabe muito bem que ele está se matando nos empregos para pagar a sua estada aqui. – os olhos de mamãe me fuzilaram.

Preparei para responder a altura, mas não precisei falar nada.

—E ele ia fazer o que? Com a Violet doente do jeito que está, ia continuar a machucando pelo resto da vida dela? Se ele não estivesse se matando nos empregos, ou a doença dela ou ele, já teriam a matado. Você deveria agradecer todos os dias que o seu bebê está a salvo, porque se não fosse por isso ela estaria passando fome comigo.

Pela primeira vez em muito tempo estava sendo protegida pela minha irmã. A forma como ela estava irritada fazia seus olhos flamejarem, segurar a mão da minha mãe, levantar o tom de voz e juntar as sobrancelhas.

Estava feliz e orgulhosa, mas mamãe não. Irritada, ela saiu do quarto causando uma troca de olhares violentos.

—Só acho que eles esqueceram quem criaram. – retirei a máscara do meu rosto.

—Vou trazer mais cigarros na sexta e te apresentar uma pessoa, trate de não morrer ou fazer algo estúpido até lá. – minha irmã sorriu e saiu.

Evans trouxe Hazel e eu abri o regulador, respirando novamente com aquele gosto e cheiro de ferro. Estava aliviada, toda a minha segurança estava de volta.

Fui dominada por uma calma e uma face despreocupada e alegre.

—Sua família é estranha. – Bruni se deitou em minha cama.

—Podemos não falar sobre eles também, como eu venho fazendo desde que te conheci. – soltei os cabos de Hazel e me levantei em direção ao guarda-roupa.

—Porque não? – ela retrucou rapidamente.

—Porque o pai dela é um homem ruim que faz coisas ruins e agora toda a família dela se estranha todo o tempo que estão juntos. – o loiro respondeu por mim indo em direção a sua cama.

Joguei uma calça jeans escura na cama e me virei com duas blusas na mão, em cabides, uma de alças vermelha e uma azul escura, então os dois disseram em uníssono: “vermelha”.

—Eu tenho pais separados que só se juntam e se suportam para poder virem me ver. – Bruni se sentou.

—Meu pai traí a minha mãe desde que ela ficou grávida. – Evans disse aquilo com uma normalidade estranha.

—E eu preciso de pulmões novos, alguém mais quer ter uma conversa profunda sobre problemas familiares ou já podemos ir para o que realmente importa? – esbravejei.

—Ah, eu entendi, você não fala sobre seus pais. – 45% respondeu com ironia em sua voz, aquilo me irritou, mas resolvi não retrucar.

—Por quanto tempo eu fiquei apagada?

—Pouco mais de uma hora, te deram dois ou três remédios na veia e em minutos você já estava em seu quarto. Então fizeram alguns exames, mas nada que demorasse. – Bruni sorriu.

—E a Julieta? – virei-me para o loiro.

—Está em paz. – ele sorriu.

Não perguntaria mais, sabia que em seu devido tempo ele iria até mim, pois sua dor seria diminuída e recuperada mais rapidamente se fosse dividida comigo.

Ia entrar para o chuveiro quando Evans segurou a minha mão.

As nossas camas eram uma ao lado da outra, separadas apenas pela porta do nosso estreito, mas comprido, banheiro.

—Vocês não estão mais juntas. – sua mão apertou meu pulso – O que aconteceu?

—Ela quer algo de mim que eu não posso dar.

—E o que vai fazer a respeito?

—Podiam não falar como se eu não estivesse aqui. – 45% bufou.

—Semana que vem são as provas e o garoto da sala de informática já me disse que os gabaritos chegaram. – suspirei, aquele era o melhor jeito de se lidar com um término.

—Finalmente vamos fazer algo de interessante. – Bruni sorria e eu podia saber disso pela sua voz.


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