Espera(nça) escrita por Lalye


Capítulo 8
Suas implicações físicas


Notas iniciais do capítulo

Espero não desapontar com esse capítulo grandinho e cheio de gracinhas sem graça da Sakura. IHASDIUHASD



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Hoje de manhã eu reorganizei todo o meu quarto, de novo. Acho que eu já devo ter feito isso umas cinco vezes nesse curto intervalo de tempo entre eu decidir começar a te escrever até agora. Se essa carta é a minha preparação psicológica para o nosso fim, meu quarto é a preparação física/espacial. Estou me acostumando a construir um universo que não seja baseado nas minhas memórias de você.

Mas dessa vez, tive uma motivação diferente. Eu confesso que estava muito nervosa nos últimos dias, e é por isso também que demorei a conseguir me concentrar nessa carta de novo. A culpa é sua dessa vez, sabia? É claro que sabia. Porque você não está conseguindo seguir minhas (explícitas, claras, transparentes) recomendações e está me fazendo perder a bendita linha de raciocínio. Truque sujo, aquele, Syaoran. Você sabia que a mãe dele está doente, não sabia? Incomodar e pedir ajuda do Yamazaki, sendo que ele está em uma situação tão difícil! Eu pensei que tinha acontecido alguma coisa para ele me ligar!!! E eu quase tive um ataque cardíaco quando te vi na chamada.

Eu já disse que não vou conversar com você até terminar isso. Por que você é tão teimoso? Tem ideia de quanto eu estou me esforçando para não mandar meu amor próprio pro inferno por causa desse seu rosto? E VOCÊ AINDA DECIDE ESFREGAR ELE NO MEU COMPUTADOR! Como se já não fosse difícil o bastante! Eu preciso de espaço, Syaoran! Espaço não significa mandar mensagens por todas as vias possíveis e imagináveis. Só de pensar naquilo eu já volto a ficar nervosa. Vou tomar uma água.

Tá bom. Recomeçando. Limpei meu quarto, arrumei minhas coisas, fiquei mais calma, e agora tá tudo limpo e infantil por aqui. Sim, infantil. Eu acabei adotando uma decoração pré-Syaoran enquanto não tenho tanto dinheiro sobrando para uma decoração pós-Syaoran e você me deu muitas coisas ao longo desses anos que eu precisei encaixotar. E se você está pensando que foi fácil jogar tudo no fundo do armário (aparentemente você não está tendo uma noção muito precisa de quanto tá difícil), é muito complicado lidar com as suas memórias físicas. Meu coração aperta tanto! Eu queria, Syaroan, que as coisas tivessem acontecido de maneira diferente. Eu queria que você tivesse me visitado mais vezes, que eu tivesse conseguido ir para a China. Hoje em dia eu vejo que tudo isso não aconteceu por bobeira nossa e me deixa magoada, lá no fundo. Porque daquela vez foi tão… bonito.

Você pensou que eu ia ignorar pelo resto da minha existência o fato de você ter, efetivamente, conseguido me visitar uma vez, não é? Errado. Eu me lembro bem demais daquela vez, até. Sabe porque eu desconsiderei ela até agora? Por causa do Touya. Foi a única vez em longos anos em que você veio, nós andamos de mãos dadas, fomos namorados, eu pude te tocar, você pode me beijar, mas meu irmão não deixou que ficássemos sozinhos um minuto se quer. Tá, éramos adolescentes, mas hoje, parando para pensar, talvez… Syaoran, eu acho que faltou na nossa relação intimidade. Não criamos quase vínculo físico, por mais mágico que fosse sentir sua mão na minha, te abraçar apertado, receber carinho. Somos jovens, temos hormônios e tudo mais. Sei que parece estupidez e eu estou bem envergonhada de falar sobre esse tipo de coisa (o que não deveria acontecer, já que namoramos há anos, prova de que falta intimidade aqui), mas eu disse que ia falar sobre todos os motivos pelos quais a gente está terminando, não é?

E a questão física também é um deles. E por mais antipoético que seja dizer isso, nós crescemos e precisamos ter uma vida física também porque nosso amor não é platônico e eu nunca pretendi que fosse (sem entrar em questões biológicas, hormonais e etc). E talvez as lacunas entre eu e você, que permitiram uma série de coisas, não fossem tão grandes se essa barreira física tivesse sido vencida. Talvez eu não tivesse dado corda pro Yoshiro se nosso relacionamento não estivesse há tanto tempo preso na minha adolescência - quando as coisas não eram tão complicadas.

Parece contraditório falar entre barreiras físicas enquanto 1 - eu vivo repetindo que não é questão de tempo/espaço, que são grandezas Físicas (sei que isso foi ruim, próximo), 2 - é um relacionamento a distância. Mas vamos combinar que, barreiras físicas significam também a tranquilidade em que poderíamos falar sobre esse tipo de coisa se tivéssemos tido algo de verdade naqueles dias em que você esteve aqui, ou se você tivesse me visitado mais vezes, ou se tivéssemos avançado nesse tipo de coisa mesmo que… bem. Realmente não consigo falar desse tipo de coisa com você, desculpa.

Enfim, você é lindo. Isso dói. Eu tenho (e estou dispensando, que coisa) um namorado lindo e que por anos repetiu que me amava e me deu esperanças de uma vida linda. Mas não te parece estranho que eu só tenha dado alguns beijos nele? Eu já estou na casa dos vinte e poucos e nunca pude... E eu juro para você que tento não pensar em como você lida com isso, porque essa é DEFINITIVAMENTE uma resposta que eu não espero. Até porque, eu sei como esse tipo de coisa incomoda. Sorte sua que meu caráter só permitiu um beijo no Yoshiro e punição mental eterna depois disso.

Você consegue entender porque me deixa tão aflita te ver nas redes sociais e falar com você por chamadas de vídeo e, ainda, depois de ter te evitado por algumas semanas, te ver de novo daquela maneira estranha? Eu queria demais que as coisas não tivessem acontecido assim. Eu percebi que você está preocupado. Não queria pensar sobre isso mas percebi. Eu vi que você estava com olheiras. E eu ando me odiando um pouco por sentir esse frio na barriga por conta disso. Me faz sentir culpa e ter algum fio de esperança e…

Vamos falar de outra coisa dentro desse assunto. Vou bancar a engraçadinha mesmo estando nervosa, porque está sendo minha maneira de lidar com essa parte que não deveria estar sendo tão constrangedora quanto está sendo. Apesar de ser bem provável que você não ache graça, mas que seja. Bem, a Tomoyo tem uma nota gigantesca no celular dela sobre nós dois.

Antes que você comece a ter medo, na verdade é uma lista onde todos os itens começam assim: “O Syaoran é lindo, mas…”. Isso começou antes do celular dela, na verdade. Eram notas adesivas no mural dela, mas eram muitos itens e os smartphones permitiram um novo método para essa lista. De tempos em tempos eu ficava triste por você estar longe e tudo mais, e eu acabava falando que você era lindo tantas vezes, que a Tomoyo resolveu começar a lista.

A tal lista conta com 274 itens, sendo que alguns fazem sentido e outros não - acabou virando mais uma piada nossa, no fim das contas. Essa semana a Tomoyo adicionou “272 - O Syaoran é lindo, mas o Yamazaki é mais.”, eu roubei o celular da mão dela e escrevi o 273 “O Syaoran é lindo, mas o Yamazaki merece uma surra”. O último ela escreveu hoje, algo sobre eu estar desenvolvendo TOC ou algo do tipo. Você pegou a ideia, né?

Bem, essa lista não teve nenhuma influência direta no nosso término, antes que você vá atrás da Tomoyo tirar satisfações. No começo foi pra aliviar minha tristeza, fazendo algo engraçadinho. Sabe, você é realmente lindo (eu disse isso mais vezes do que deveria nessa carta toda), mas nossa relação não se sustentou como deveria, por todos os motivos que estou te contando, e a questão física também foi um deles. A lista serve, nesse momento, como uma boa ilustração disso. Um dos itens mais incessantemente citados pela Tomoyo é o 16, e eu MORRO de vergonha dele.

“16 - O Syaoran é lindo, mas a Sakura está subindo pelas paredes”. O que é um grande exagero por parte da Tomoyo. Por isso que “17 - O Syaoran é lindo, mas ele tem namorada e a Tomoyo está encalhada” foi minha vingancinha infantil na época. Por mais caricato que tudo isso seja, ainda reflete um pouco da nossa relação, Syaoran. Ela se tornou distante, psicológica e fisicamente. Não sei dizer qual o grau de relevância disso para o nosso término, em comparação com os outros motivos - mas ainda é relevante, pois esse afastamento também gerou lacunas que me fizeram, em muitos momentos, querer ter uma vida diferente, onde eu pudesse ser livre como a Tomoyo. Eu acho que, de alguma forma, é isso o que eu estou buscando, já que você nunca - ou quase nunca - esteve aqui.

Sem contar que, nesse ponto, meu corpo já não conhece mais o seu. Crescemos depois do nosso último encontro. Nos tornamos adultos, amadurecemos de diversas maneiras. Viramos, no aspecto físico, estranhos.


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Notas finais do capítulo

E, finalmente, Syaoran aparece! [Fic acabando, gente. Planejando as próximas, já.]