Valentino‏ escrita por TM


Capítulo 16
Peccato




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– O quê? - As palavras que Anjou dissera parecia que tinham ficado presas em minha garganta com a promessa de nunca mais saírem de lá.

– É isso mesmo que você ouviu, mocinha. Eu te comprei, e por direito, você me pertence. Não vá pensar que só por que eu fui bonzinho cinco anos atrás que serei agora. Os tempos mudam, pessoas crescem, afinal, a água que passa por baixo da ponte nem sempre é a mesma, não é? - Pedro Luís Anjou me fuzilava com o olhar. - O que nunca vai mudar é minhas riquezas e minha influência sobre tua família, e creio que tu já sabes disso, minha cara.

– Não adianta exibir opulenta¹ se tu não passaste de um magano²! - As palavras brotaram de minha boca como uma chuva de verão. - Agora, se o senhor me der licença, irei para o confessionário.

– Quero você no jantar. - Disse ele com uma voz autoritária enquanto eu virava de costas e dava meus primeiros passos.

– Você não tem de querer nada, Anjou. - E saí em busca de um confessionário mais próximo.

Naquele momento, a Basílica de São Pedro parecia aterrorizante, ameaçando me sufocar a qualquer momento caso algum segredo saísse de suas grossas e arcaicas paredes. Finalmente, achei um confessionário e me joguei lá dentro. As lágrimas tomaram posse de meus olhos, como um duque faz com suas terras, e como se fosse uma pobre camponesa, assim deixei-me por estar.

Com a visão embaçada, não pude enxergar quem era o clérigo que estava ao outro lado, e com a ajuda da tela de madeira, foi difícil deduzir quem era. Desisti da tola ideia, e pensei que seria melhor não conhecer o Santo Padre que ia tirar-me o peso brutal de minhas costas.

– Santo padre, saiba que não tenho orgulho de falar-te isto, mas, assim como todos os fracos e pobres homens, sois uma pecadora.

– Todos nós somos, minha filha. Estou aqui pra lhe escutar, fique com o tempo que precisar. Eu e nosso Senhor Todo Poderoso estamos aqui pra lhe confortar e lhe dar o amor que mereces. - Sua voz era rouca, quase falha. - Mas, diferente dos homens fracos, tu vieste até mim com tamanha sabedoria para renunciar á tais pecados mortais. Pois bem, quando quiser começar, estarei lhe ouvindo com toda a calma e atenção do mundo.

– Santo padre, eu pequei. Senti desejos de carne por um clérigo, que no momento, escolheu outra mulher em sua vida, me deixando á margem da dele. Como se não fosse o suficiente para tamanha infelicidade, hoje descubro que fui prometida á um homem que não quer nada mais do que deitar na cama comigo, e que além de tudo, deixa-me tão envergonhada de ser uma Machiavelli. - Respirei fundo. - Sinto que as vezes Deus quer que eu cometa o pecado que me condenará as dores e gritos eternos, onde Lúcifer repousa. Só de pensar em tal ato, fico tentada ao realizá-lo.

– Mas por que jogar uma vida tão jovem nas chamas do Inferno, minha jovem? Se sente tão infeliz e desprovida da graça de Deus assim? - Ele me perguntou com uma voz mansa, me fazendo repensar nas razões que deram origem ao pensamento doentio que tinha.

– Santo padre, sinto que Deus me abandonou no momento em que nasci. Minha mãe era uma pobre cortesã, e meu pai jamais ligara para o bem-estar de sua única filha, mas agora que estou prestes a me casar, ele acha que pode recompensar todo o tempo perdido e felicidade que um dia esquecera de me dar com a dádiva da vida: Descobri que terei um irmão. - Minha voz estava cada vez mais trêmula, queria terminar o mais rápido antes que eu desabasse como uma jovem criança tola. - Mesmo assim, padre, não é que eu queira acabar com a minha vida. Não, pelo contrário, acho que a vida é maravilhosa e encantadora o suficiente para todos. Eu só quero acabar com o sofrimento que estou passando, eu só quero que tudo isso acabe, eu já não aguento mais. Se irei pro Inferno ou não, não me importa mais, os Borgia fazem com que Roma pareça o Inferno verdadeiro, no qual o papa Alexandre VI é o próprio diabo.

– Não deverias falar isso, menina! Seu pai não lhe deu educação? - Ele me disse, com tom de repreensão.

– Desculpe, padre, estou nervosa com tudo o que vem acontecendo na minha vida. O que acha sobre meu casamento? O que devo fazer? Você deve me ajudar, já que serve á Jesus Cristo, Nosso Senhor e ninguém mais. - Limpei minhas lágrimas com as costas das mãos. - O que o senhor me diz?

– Te digo que Deus, em breve, enviará um sinal. Não posso falar nada á respeito disso, mas se Ele quiser que seja assim, não há Borgia que interceda em seu mandado. Não se esqueça: Nos tempos de crises é que você aprende a ter mais fé e esperança, e é isso que a faz mais forte. Nada é para sempre, minha jovem, por que sua tristeza e infelicidade seriam? Assim como eu, aposto que Ele está abrandado com sua atitude. Você certamente é um dos anjos que um dia ele prometeu á Terra Santa. - O padre cochichou baixinho, e depois voltou a falar. - Reze dez Ave Marias e não coma só por esta noite, o jejum limpará sua alma junto á sua mente. Que Deus esteja contigo hoje e sempre, minha jovem. Em nome do Pai, do filho, do Espírito Santo, amém.


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Notas finais do capítulo

¹ Opulenta - Riquezas
² Magano - Malandro
[Me desculpe pelas palavras, mas quero que isso pareça o mais século XXV possível. Espero que estejam gostando!]



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