Quando amanheceu eu tinha conseguido cochilar por apenas quinze minutos. Levantei me sentindo exausta e fui acordar Danilo.

Fomos para nosso dormitório colocar nossa farda para mais um dia. Eric estava lá, dormindo ainda. Parecia um pouco melhor, mas seu rosto estava inchado e vermelho. Provavelmente eu não era a única que tinha passado a madrugada me revirando na cama.

Fui para o palácio do governo, e logo que tive a oportunidade, quando Margareth foi para seu escritório, me fiz de sonsa e tentei descobrir mais alguma coisa sobre a prisão de Júlio:

– Excelentíssima? - perguntei, usando a voz mais doce que eu tinha e tentando fazer minha melhor cara de coitadinha.

Margareth virou-se de sua mesa e olhou para mim:

– Sim, querida?

– Ontem meu na-namorado foi preso – eu olhei pro chão e gaguejei um pouco, tentando parecer ao máximo envergonhada, triste e confusa com aquilo – O sargento Anthoni. A senhora conhece, ele já esteve aqui.

– Sim. Lembro-me muito bem dele – ela fechou a cara. Provavelmente lembrando-se também do fora que ele tinha dado nela.

– Disseram que ele foi preso por traição. Mas eu não entendi. O que ele fez? Júlio sempre foi completamente leal ao exército e aos seus deveres.

– Não fui eu quem recebeu a denúncia sobre ele. Foi Milton. Mas pelo que fui informada, seu namorado foi acusado de tramar contra o governo, tendo planejado que eu e os outros dois governantes fossemos a óbito, por suas próprias mãos. Ele pretendia assumir o poder e o governo do país, depois que falecêssemos. - isso não tinha muito a ver com o verdadeiro plano da missão. Fiquei contente.

– Oh! - fiz cara de surpresa – Os senhores têm certeza? Ele não parecia ser capaz de alguma coisa como essa.

Margareth parecia se deliciar com as minhas reações. Ela gostava de ver os outros sofrendo. Ainda mais uma menina sofrendo por descobrir que seu namorado não era o cara que imaginava.

– Temos absoluta certeza, minha cara. - ela confirmou.

– Mas como? Como Júlio pode ser assim? Como eu pude ter sido enganada. - eu estava exagerando na minha encenação, mas Margareth parecia acreditar em tudo, então resolvi continuar. - Não acredito que eu tenha namorado com ele. Um assassino. Ele queria matar a senhora. Eu não acredito! Logo a senhora, que eu daria a minha vida para salvar. - algumas lágrimas começaram a escorrer do meu rosto.

Quando vi que ela tinha percebido as lágrimas, escondi o rosto nas mãos, como se estivesse envergonhada por ela me ver chorando. Depois de alguns minutos continuei com a minha encenação, olhando cabisbaixa para ela:

– A senhora acha que ele me usou? Que estava comigo só por interesse? Só porque sou sua guarda pessoal? - não permiti que ela respondesse. Não queria ouvi-la falando mal dele – Eu sou uma idiota! É claro que ele estava me usando! E eu fui tão boba em cair na lábia dele.

– Eu lhe disse para não se deixar levar pelos homens e se deixar apaixonar – Margareth jogou na minha cara – Fui sua amiga e lhe aconselhei para que você usasse e abusasse dos homens antes que eles fizessem isso com você. Eu conheço eles. São todos iguais. Principalmente os militares.

– Eu sinto tanto por não ter escutado a senhora. A senhora me alertou mesmo, mas eu,uma imbecil, não a escutei. Me perdoe. Farei o possível para recompensar esse meu grande erro. E mais uma vez desculpe, por ter sido fraca, e ter abaixado a guarda nesses instantes. Voltarei ao trabalho – limpei meu rosto, secando as lágrimas.

Margareth deu de ombros e se virou para a frente novamente. Começando sua seção diária de invasão de privacidade alheia.

Quando ela estava distraída demais para perceber qualquer coisa sobre mim, não pude deixar de sorrir. Eu a havia enganado. Tinha sido uma ótima atriz.

À tarde, um guarda entrou no escritório de Margareth trazendo um telefonema a ela. Ela pegou e conversou algumas poucas palavras muito formalmente. Quando desligou e o guarda saiu, se virou para mim:

– Era o sargento Thomas no telefone. - falou – Ele quis me informar que ontem a noite você o acusou de ter inventado calúnias sobre Júlio e ter o denunciado para que fosse detido.

Porque Thomas havia feito aquilo? Para acabar comigo também?

– Sim. - concordei, pensando em como me defender – Eu realmente fiz aquilo, mas foi porque não estava entendendo nada. Pensei que ele tivesse denunciado Júlio por qualquer coisa. Não sabia que Júlio realmente estava traindo o governo. Me desculpe.

– Desculpas aceitas, soldado. Ele não ligou para lhe condenar. Apenas queria que eu soubesse sobre essa sua reação, e soubesse que ele havia tentado lhe acalmar ontem a noite, mas que você havia insistido que ele era o culpado pela prisão de seu namorado. E tinha saído do seu quarto com muita raiva dele.

Talvez Thomas não quisesse me ferrar. Ele devia estar interessado em limpar sua barra e ter certeza que não pensariam nada sobre terem visto nós dois juntos, depois que Júlio foi preso.

– Desculpe mais uma vez. Eu realmente achei que fosse Thomas. Porque Júlio e ele sempre se odiaram. Mas vejo que estava errada. Talvez Thomas já tivesse percebido as verdadeiras intenções de Júlio e por isso o odiava tanto. - voltei a atuar.

– Não acuse mais ninguém sem provas – foi a única coisa que Margareth disse, voltando a seus afazeres.

Quando voltei para o quartel, dediquei minha noite ao treinamento. Era uma tarefa que eu e Júlio estávamos fazendo juntos a alguns dias, mas agora eu tinha que prosseguir sozinha. Mais que nunca precisaria estar muito bem nas habilidades até o dia de descanso.

No dormitório perto da hora do toque de recolher, fiquei com Danilo e Eric conversando sobre assuntos diversos. Danilo parecia estar normal como sempre, não ficando abatido com nada. Eric ainda estava magoado e triste, mas tentava superar.

Não tocamos no assunto sobre a sua crise de ontem, e ele pareceu querer esquecer aquilo também. A solução para ele seria o tempo. Com o tempo seu coração partido se curaria e ele voltaria a ficar bem e feliz novamente.