Nove Meses escrita por Teddie


Capítulo 10
Arrependimentos


Notas iniciais do capítulo

Capítulo dedicado a Ludy Lynch, que foi uma fofa ao ser a primeira a recomendar 9M! OBRIGADA MESMO!

Façam como Ludy, recomendem! (: (ou não, só se quiserem mesmo).

Aproveitem!



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Arqueio uma das sobrancelhas e faço um biquinho enquanto Dez, com a câmera focada em mim prende o riso inexplicavelmente. Hoje ele está com a calça de bolinhas coloridas e uma camisa branca com um pug vestido com um cachecol dourado e vermelho e óculos redondos. Harry Pugger, dizia.

Franzo o cenho, já cansada de fazer biquinho e Dez continua prendendo a risada. Reviro os olhos.

— É um vídeo, não é?

Ele não aguenta mais e explode em risadas, tremendo a cara e desfocando de mim. Solto uma risadinha, mas não deixo de achar bobo da parte dele. Quando ele finalmente parou, voltou a focar em mim, incentivando que eu fizesse algo. Apenas movi as sobrancelhas rápido e dei um sorriso.

— Por que você está me filmando, Dez?

— Estou fazendo vídeos de todos os meses da sua gravidez, colherei alguns depoimentos e quando Noah fizer dezesseis anos, vamos mostrar a ela na festa de Sweet Sixteen.

— Eu ainda não me decidi se ela vai se chamar Noah — eu nem vou ficar com ela.

— O mundo decidiu por você. Ela vai nascer com cara de Noah, assim como eu nasci com cara de Josh.

Abro a boca algumas vezes, tentando achar as palavras certas.

— Você não se chama Josh.

Ele piscou um dos olhos e apontou para mim, enquanto equilibrava a câmera com uma mão só.

— Exatamente — nego levemente, desacreditando do que ele fala e ele volta a segurar a câmera com as duas mãos — Então, o que você tem a dizer para Noah Dawson-barra-Moon-barra-Centineo-barra-Ainda Não Entendemos Direito Como Vai Acontecer?

— Dez, isso é indelicado. — repreendo-o como uma mãe faria. — Mas Noah, quero que você seja muito feliz e que sempre saiba que você tem uma escolha. Que mesmo que não escolha o certo, tire o maior proveito da situação e dê a volta por cima. E me desculpe se alguma escolha que eu fiz te magoou algum dia. Fiz o que acreditei ser o melhor para você. — falo, olhando para a câmera.

Percebo na hora que vai muito além de um discurso de aniversário. É um pedido de desculpas por dá-la, por acreditar que Angie seria uma mãe muito melhor do que eu poderia ser em qualquer dia.

Eu espero do fundo do meu coração que ela não cresça amargurada com minhas escolhas. Na verdade, Angie é tão amorosa que descarto essa possibilidade na mesma hora. Essa criança vai ser criada com o máximo de amor que vai conseguir suportar.

Sei que tomei a decisão certa.

Queria que algum dia Noah-barra-Elizabeth-barra-Qualquer que seja o nome que ela tenha visse esse vídeo.

— Viu, Noah — Dez virou a câmera para ele — É assim que uma mãe de verdade fala, não?

— Dez, isso é um pouco idiota.

— Não é não — Trish aparece na entrada da Sonic Boom com o uniforme do John’s. Uma semana. Acho que é alguma espécie de recorde dela. — Adivinha quem acabou de comprar a primeira roupinha da minha sobrinha?

— Você não deveria estar trabalhando, Trish? — pergunto assim que termino de dar o troco a um cliente.

— Estou no meu horário de almoço.

— São cinco da tarde, Trish — Dez aponta, ainda filmando-a.

Trish apenas revira os olhos e coloca a sacola da loja na minha frente. Sinceramente não quero ver. Quero me manter o mais longe possível de tudo relacionado a bebês. Não quero sentir a empolgação de escolher roupas, nomes, montar enxoval.

Não quero sentir porque essas são as partes boas da gravidez, as partes que me fariam cometer a burrada de ficar com a menina. Ser mãe não é isso. Isso é brincar de casinha. Ser mãe era saber aconselhar, criar com respeito e caráter, consolar e cuidar.

Eu ainda não estava pronta para isso.

Ainda assim, a cara contente de Trish me quebra e eu pego o presente empacotado dentro da sacola. Rasgo com cuidado, e tiro de dentro um vestidinho rosa bebê com uma faixa de oncinha e um lacinho de oncinha em cada ombro.

Quis chorar. Odeio estar grávida, é desagradável, para ser sincera. Principalmente essa coisa de hormônios que oscilam tanto que em uma hora eu quero rir, oura chorar e outra depois que eu quero esganar um.

De fato, o vestido era adorável e tão a cara de Trish. Acho que Angie gostaria. Faço uma nota mental de mandar uma foto para ela depois.

— É... lindo, Trish — sorrio sem graça, minha voz falhando e embargando. Coloco o vestido com cuidado em cima do pacote onde ele estava e seco o marejo dos meus olhos.

— Imaginei que fosse gostar, Ally. Noah, Ally está uma manteiga derretida. Espero que até seus dezesseis anos ela pare de chorar. Na verdade, sei que ela está chorando nesse exato momento. Por favor, abrace-a e diga que nunca vai sair do ninho. Ela te ama.

Sinto um comichão estranho no estômago, enjoada metaforicamente dessas gravações de Dez. Não quero que mais nada seja gravado. Não quero meus amigos fazendo planos para uma criança que eles não conheceriam, nem teriam chance de cuidar, criar e amar.

Viro-me para que eles não vejam minha careta e atendo uma senhora que busca por um determinado CD. Depois de passar quase cinco minutos explicando a diferença entre boy bands, das qual Dez estranhamente parecia conhecer muito bem, volto para eles, e quase pulo de susto ao ver Austin ali.

Meu coração saltou de alegria, meu estômago saltou de nervoso. A bebê fez um loop completo que me deixou com vontade de fazer xixi. Meu cérebro entrou em uma espécie de transe. Austin é lindo. Seus cabelos estão um pouco rebeldes demais, mas de certa forma é adorável, até a mexida que parecia um bicho preguiça é adorável agora. Ele tem um sorriso lindo, apesar de quase não mostrar os dentes e só dar um sorriso fechado.

Ele está usando o uniforme da loja dos pais, porque está juntando dinheiro para ir para Nova York em setembro. A camisa pólo vermelha marcava bem os músculos de Austin, que não eram muitos, já que ele era magro, mas não menos definidos. Os anos como capitão do time de basquete fizeram bem para o físico dele.

Austin me olha, e seus olhos castanhos são calorosos, cheios de vida, com um brilho que eu nunca vi em nenhum lugar e que eu poderia compor sobre a qualquer hora.

Percebo que só tenho olhos para Austin, e isso é ao mesmo tempo assustador e maravilhoso. Não entendo direito porque nunca nos permitimos criar essa bolha mágica onde só cabemos nós dois, ou porque não estamos juntos como um casal, ou porque não quero começar uma família com ele. Na verdade, até entendo, só que prefiro ignorar, porque assim como eu só tenho olhos para ele agora, ele também só tem olhos para mim.

E é melhor que tudo que eu poderia um dia querer.

— Trish, eles estão fazendo aquilo de novo — ouço Dez falar e a bolha se quebra.

Sacudo a cabeça, espantando os pensamentos sobre Austin e sorrio delicadamente para ele, ignorando o comentário de Dez.

— Vocês não têm nada melhor para fazer do que vir perturbar minha loja?

— Não — os três disseram juntos e riram. Limitei-me a negar e revirar os olhos, mas achando engraçado também.

— Olhe o que Trish comprou para Noah, Austin — Dez indicou para Austin o vestido em cima do pacote, que o pegou e soltou uma risada boba, mas genuína, ao ver o tamanho do vestido.

— É adorável. — ele pôs o vestido no lugar — Então, amigos, quais os planos para hoje?

— Fazer dieta, minha pressão não está colaborando muito — murmuro, soando mais como um resmungo chato.

— Ainda com problemas de pressão? — Trish pergunta preocupadamente e eu assinto.

— Não é como se eu conseguisse me acalmar muito. O ioga ajuda, só que ainda tenho muitos problemas — dito isto, meu pai passou pela gente desejando boa tarde baixinho e se enfiou no escritório — Falando em problemas, está na hora de resolver mais um. — suspiro, pegando a sacolinha com o vestido — Tentem não destruir a Sonic Boom. Ouviu, Dez?

Meus amigos riem e Dez franze o cenho, confuso com a afirmação. Por fim, ele dá de ombros e começa a colher o depoimento de Austin ou qualquer coisa assim.

O escritório do meu pai é bem simples. É todo pintado de branco e uma das paredes é totalmente dedicada às pinturas de girafas que meu pai faz no tempo livre dele. Sempre achei que ele pintava girafas para manter viva a lembrança de Penny, mal sabia eu que ela estava mais que viva na vida dele.

Outra parede tinha uma foto minha emoldurada de quando tinha uns doze anos, no primeiro recital de piano que participei depois que Penny foi embora. Na mesma parede tinha o código de conduta do shopping e o código de defesa do consumidor.

No canto da sala tinha uma mesa de mogno antiga lotada de papeis variados e duas cadeiras desconfortáveis na frente. Atrás dela, em uma cadeira de couro, mas quase igualmente desconfortável, estava meu pai, assinando alguns documentos e não me olhando diretamente.

— Posso entrar? — sussurro.

— Já entrou, não é? — ele não soa rude, mas o tom frio dele é um balde de gelo em cima de mim.

Eu me sinto minúscula. Sinto-me tão errada por tudo que eu disse a ele. Tão arrependida.

Queria tanto que ele me perdoasse.

— Hm. Ok. — digo, me aproximando da mesa dele, não sabendo, no entanto, como começar o assunto — Olhe o que Trish comprou. É para a menina.

Logo no dia da ultra, semana passada, eu contara para ele, que retribuíra com um “legal” e fora para o quarto.

Sei que magoei meu pai e me arrependo muito. Isso não significa que pedir perdão seja fácil. É ainda mais difícil, porque é verdadeiro. Um perdão vazio é fácil de ser pedido, uma vez que não significa nada. Agora o verdadeiro arrependimento, aquele que machuca o coração de tão intenso, é imensamente mais difícil de pedir perdão. O medo de nos sentirmos vulneráveis, de não sermos perdoados, faz tudo ser mais complicado.

Minha dica seria: nunca cometa erros. Sendo que isso é um pouco utópico, não? Você pode cometer seus erros, eles são super necessários para você aprender o que é certo, eles formam caráter. Se você for se arrepender de tê-los cometido, pelo menos se arrependa de coração.

Se for perdoado, a satisfação vai ser muito maior e mais feliz.

— Muito bonito — voltou a assinar os papéis.

— Hm. Sim. É a cara de Trish — ri sem graça.

— Ally, o que você quer? — voltou a me olhar, firmemente.

E simples assim, eu comecei a chorar.

Não era um choro calmo, arrependido. Era barulhento, nojento, desesperado. Eu soluçava como nunca. Não sabia de onde tinha vindo tudo isso, já que eu estava relativamente bem até aquela hora. Só que agora eu chorava como se alguém tivesse morrido, ou como se o mundo fosse acabar.

E simples assim, meu pai correu e me abraçou.

Lembro que a última vez que chorei tão desesperadamente assim foi quando minha mãe foi embora. Eu arranhava a porta, batia, esperando que ela fosse entrar e dizer que tudo ficaria bem. Ela não fez isso. Quem me abraçou e me consolou, mesmo estando despedaçado, fora meu pai.

Assim como agora. Eu o machucara intensamente, e mesmo assim ele estava ali, me fazendo sentir como se tivesse oito anos novamente.

— Eu faço tudo errado — me acuso, fungando e a voz saindo frágil demais — Eu magôo todos que estão próximos a mim. Eu magoei você. Eu me sinto o pior ser humano do mundo, porque você é a pessoa mais maravilhosa e gentil que eu conheço. E o que eu faço? Eu pego sua bondade e massacro com a minha raiva amargura. Eu sinto tanto pelas coisas que eu falei, eu...

Não consigo mais falar nada e ele me aperta mais em seus braços. Eu choro tanto que molho sua camisa inteira.

— Tudo vai ficar bem, querida. Eu entendo. Tudo está bem agora.

Finalmente fui me acalmando, apesar de ainda tremer bastante. Eu acreditava que tudo ficaria bem.

Ele me soltou e foi até o bebedouro dele, pegando um copo de água para mim. Bebi devagar e tremulamente, apreciando a calma que só meu pai conseguia me dar.

Lester sorriu para mim e eu retribuí como consegui, mas era tão verdadeiro quanto o dele. Só mais feio.

— Então... — começo. O clima não é mais pesado. Era leve e contente. Ele tinha me perdoado mesmo — Penny ainda está vindo?

Acho que eu tinha que aceitar que ela viria. Não iria aceitar que ela mandasse em mim, ou que quisesse ter qualquer tipo de direito sobre minha menina.

Lester deu de ombros e eu o encarei confusa.

— Ela não me falou mais nada. Acho que desistiu.

— Espero que sim — é tudo que eu falo.

Ainda assim, tenho um pressentimento ruim, um aperto no meu coração que não me deixa relaxar sobre a vinda – ou a não vinda – de Penny.

— Sinceramente, também espero que sim. — eu o olho surpresa. Na minha cabeça, no momento que minha mãe pisasse em casa, meu pai ajoelharia a seus pés e a idolatraria novamente — Não me olhe assim, Ally. Eu não amo mais Penny há muitos anos. Acho que a vinda dela vai trazer muita dor de cabeça desnecessária.

— Então por que não a proibiu? — pergunto de cara fechada.

— Porque se eu tivesse que a proibir de alguma coisa, teria a proibido de ir embora. — ele voltou a olhar uns papéis e eu assumi aquilo como o fim da nossa conversa — Vá para casa, Ally. Precisa descansar um pouco.

(...)

Austin estaciona o carro na frente da minha casa e o deixa em ponto morto, soltando o cinto de segurança, e eu o imito, me sentindo aliviada. Minha barriga ainda não está grande, mas o cinto – e algumas das minhas roupas já incomodam bastante.

— Está entregue.

— Obrigada, Austin — agradeço, mas continuo ignorando a sensação ruim que ainda sentia. Não digo para ele que queria estar em qualquer lugar menos em casa. — Não precisava me trazer em casa.

Mas papai estava certo, eu precisava descansar. Minha pressão precisava abaixar ou eu ia acabar tendo que tomar remédios.

— Tudo por você. — ele sorri, aquele sorriso lindo que me desestabiliza completamente.

Eu não me importo que ele ainda esteja saindo com Piper, ou que eu ainda não tenha certeza dos meus sentimentos por ele. Eu posso estar o usando, mas ele também não parece se importar.

Eu o beijo levemente, apreciando a maciez de seus lábios e a delicadeza e dedicação que ele dedicava a mim. Eu me sentia a pessoa mais importante.

Finalmente eu entendia porque tantas garotas brigavam por Austin. Ele se dedicava completamente aos beijos, fazendo toda garota se sentir tão amada que pensasse que nunca mais se sentiria assim com mais ninguém.

Separo-me dele, sorrindo delicadamente.

— Converse com Piper, Austin.

Ele assente e eu saio do carro, não me virando para ver Austin dar a partida e seguir pela minha rua.

Coloco a chave na porta, assustando-me por ela estar aberta. A sensação ruim me atinge com tanta força que eu ofego e preciso de um tempo para me acalmar.

E eu entendo porque. Ela não mudou muita coisa. A mesma pele branca, os mesmos cabelos ruivos pintados. Os mesmos olhos azuis. Fazia tanto tempo, mas eu não esquecera seu rosto. Ele ainda estava tão vivo e tão presente em minha cabeça como se eu tivesse visto ainda pela manhã.

Ela está usando um vestido rosa frente única que bate nos joelhos. Está sentada no sofá digitando algo no notebook. Ela finalmente me olha, dando um meio sorriso.

— Olá, Ally.

Era Penny.


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Notas finais do capítulo

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E ai, o que acharam?