Contador de Histórias escrita por Darth


Capítulo 7
Lâmina Juramentada




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Depois dos eventos em Brishock, o bardo se viu tendo de aceitar transporte até sua próxima parada: Turallion. A cidade se situava no centro do continente de Ornea, a leste de Clarke, norte da capital do reino, Porto-Capital, e a oeste de Brishock. Foi levado a Turallion de carruagem, junto com um mercador de Brishock.

O mercador em questão era pai do garoto que teria sido sacrificado ao Abissal e que foi salvo desse terrível destino graças a Galeth. Durante o caminho, o antes aflito pai não parou de agradecer o bardo por sua ajuda:

– Você deve ter sido enviado pelo próprio Thuriel, para ter chego em um momento tão oportuno. E graças às bênçãos dele foi capaz de vencer o Abissal. – Thuriel era o deus da justiça, cultuado em toda parte de Ornea. Havia pelo menos um clérigo de Thuriel em cada cidade, que atuava como juiz e mediava disputas.

E assim o tempo passou e a carruagem chegou a Turallion.

Após se despedir do mercador, que fez questão de recompensar Galeth por sua coragem com várias moedas de ouro, o bardo se dirigiu a taverna Marco Central. Esta taverna era conhecida por ficar exatamente no centro do continente, ou assim seu proprietário afirmava. Após uma rápida negociação e uma troca sutil de moedas de prata e cobre, Galeth tinha um quarto para se hospedar e uma janta para se servir. Banhou-se para se livrar da poeira da viagem e desceu para comer.

Assim que terminou de comer, tirou o alaúde do estojo. Aos poucos a taverna se reuniu no palco ao redor de Galeth, ao notarem que afinava o instrumento. E o bardo, cumprindo as expectativas, tocou. Os presentes cantaram, dançaram, riram, se embriagaram e se divertiram enquanto o bardo cantante dedilhava com tranquilidade os acordes variados.

A noite se estendeu e quando Galeth parou de tocar, a lua já estava ao alto do céu. Enquanto o bardo guardava o instrumento novamente no estojo, o único barulho audível era o crepitar da lareira. “Como sempre, eles sabem que vou contar uma história.” Pensou o bardo, satisfeito:

– Esta noite acabamos nos empolgando um pouco. – alguns risos – Mas não tem problema, pois essa empolgação é perfeita para a história que escolhi hoje. A história que vou lhes contar é sobre quando Albion Norad, o maior dos paladinos de Thuriel, enfrentou Garra-Voraz, o terrível dragão infernal de Molochel, deus maligno dos demônios.

“Isso aconteceu há seis anos. O reino ainda estava se recuperando das baixas causadas por Kelvor Flagetonte nas Guerras Justas. Albion havia lutado ao lado dos grandes heróis da guerra, como Hyan Iustalux, o sumo sacerdote de Thuriel. O paladino de Thuriel havia sido promovido ao posto de justicar, o posto mais alto que um paladino da justiça pode alcançar. Como seu novo posto exigia, Albion morava em Eldritch supervisionando os acólitos em treinamento para se tornarem novos paladinos.

Eldritch era uma cidade situada no extremo leste de Ornea. Ficava no litoral e era onde ficava a sede da ordem de Thuriel, com o assento do justicar, do sumo sacerdote e da oráculo. E foi num dia nublado em que o justicar foi posto a prova.

Os sinos de alarme soaram durante o entardecer, fazendo a guarde se mobilizar e se postar na muralha. O que os surpreendeu é que não havia exército nenhum nos portões da cidade como esperavam pelo alarme. Mas foram logo informados do que se tratava quando uma das torres de vigia que ficava fora da cidade, a uns vinte metros de distância, explodiu em chamas.

Foi possível sentir o calor da explosão mesmo da distância em que estavam. E ouvir os gritos de morte dos soldados que lá estavam. Quando enfim a guarda recuperou-se do choque e começaram a se reorganizar, outra explosão incendiou uma das casas na praça comercial. Os gritos foram inúmeros, mas entre eles era perfeitamente possível distinguir uma palavra:

– DRAGÃO! DRAGÃO!

Mas não era um dragão qualquer, era uma das crias de Molochel. Um dragão infernal, negro como a noite. Da sua pele brotavam veios de fogo e seus olhos eram lava. O monstro era tão grande quando o templo de Thuriel, com seus seis metros de altura e sua envergadura era o triplo de seu próprio tamanho. O leviatã negro abriu a bocarra e disparou uma bola de fogo que encobriu mais uma construção em chamas e morte.

A guarda não tinha como deter um dragão. Isso era papel de um aventureiro, de um herói. Esse era o papel de Albion Norad. O capitão da guarda gritou as ordens:

– Todos os homens que não se feriram, dividam-se em dois grupos. Um irá resgatar os feridos e leva-los para a ala subterrânea das barracas. – A ala subterrânea era uma área do forte da cidade que fora criada para servir de abrigo no caso de um ataque com armas de cerco, como catapultas. – Os outros, venham comigo que vamos controlar o incêndio como pudermos. Norman, Jeremy.

– Sim, senhor – disseram os guardas chamados.

– Norman, vá avisar o justicar da situação. Corra como um demônio perseguido por um santo. – e o guarda correu.

– Jeremy, reúna os magos de batalha. Atrasem o dragão enquanto os paladinos não chegam e depois venham ajudar com as chamas.

– Agora mesmo, capitão!

Norman correu como nunca correra na vida, saltando por vigas caídas tomadas pelas chamas e desviando de telhas que caíam dos telhados destroçados das casas. Assim que chegou ao templo, encontrou o justicar completamente equipado com sua armadura de placas. E os paladinos e clérigos de Thuriel estavam atrás dele. Alegrou-se:

– Lorde justicar, o dragão está destruindo toda a área da praça comercial!

– Entendido. Homens, avante comigo! – bradou para o pequeno exército. Que urrou em resposta um sonoro “Sim, senhor”.”

– E onde Hyan Iustalux estava nessa batalha? – perguntou um dos presentes, fazendo Galeth sorrir.

– Ele estava em uma conferência com o rei, em Porto-Capital. Junto dele estava a oráculo e os sumos sacerdotes dos outros deuses bondosos.

“Quando os paladinos e clérigos chegaram à praça, ela estava devastada. Os únicos edifícios em pé eram a torre da guarda que ficava na praça e os dois prédios onde o monstro estava de pé. O dragão infernal estava agora atacando os magos, que se protegiam com magias de escudos protetores. Mas mesmo assim vários jaziam mortos ao chão. Ver tanta destruição e morte fez Albion tomar uma decisão:

– Todos os paladinos e clérigos: deem apoio à guarda da cidade como puderem.

– Mas e o dragão, lorde justicar?

– Eu o enfrentarei.

– Mas o senhor irá morrer!

– Muitos já morreram hoje. Minha vida não vale mais do que a de ninguém. E por isso vou enfrenta-lo, pois se apenas eu morrer para impedi-lo nenhum outro precisará morrer. – Os homens e mulheres que eram clérigos e paladinos e estavam presentes choraram, pois além de Albion ser o justicar da ordem ele era muito querido por seu forte senso de justiça.

– Como quiser, lorde justicar. Que a mão de Thuriel o guie nesta batalha. – disse uma clériga, com a voz embargada.

Assim, os paladinos, os clérigos e os magos foram com Norman para ajudar o resto da guarda e Albion Norad ficou na praça para enfrentar a besta de Molochel. O paladino de cabelos loiros na altura dos ombros desembainhou sua espada, Gume Sagrado, e preparou seu escudo com a balança e a espada em prata em sua fronte, o símbolo sagrado de Thuriel. Retirou seu manto e bradou:

– BESTA NEFASTA, SINTO SUA MALDADE APENAS DE POUSAR MEU OLHAR SOBRE VOCÊ! PREPARE-SE PARA CAIR PERANTE O SAGRADO PODER DE THURIEL! – O dragão infernal virou a cabeça gargantuana para o paladino e disse com uma voz cavernosa:

– Você, um inseto, acha que pode me deter sozinho? Aqueles outros insetos não conseguiram nem me arranhar! O que você tem de diferente, paladino? O que você tem que pode matar Garra-Voraz?

– Eu tenho minha fé e minha vontade. Mas se para você isso não é razão suficiente, tenho também esta espada. E será ela que cravarei em seu coração negro, Garra-Voraz.

Assim que Albion terminou de falar, o dragão rugiu uma terrível bola de fogo em sua direção. O paladino levantou o escudo e fez uma oração a Thuriel. “Que seu instrumento de justiça não pereça perante o calor do mal.” E com um brilho dourado, o escudo recebeu a bola de fogo em cheio. As chamas explodiram ao redor do paladino, mas não puderam tocá-lo. Era como se houvesse um campo ao redor de Albion e seu escudo.

– MALDITO! ENTÃO PRETENDE SE ESCONDER ATRÁS DESTAS ORAÇÕES PATÉTICAS? – urrou o terrível dragão, logo em seguida saltando do prédio em chamas onde estivera para cima do paladino.

O justicar recebeu um impacto tremendo sobre o escudo e só não o soltou por pura força de vontade. Mas não teve tempo de se recuperar, pois Garra-Voraz logo o golpeou com uma poderosa patada, arremessando o homem contra a torre de guarda. Albion se segurou por pouco no topo da torre após se chocar violentamente contra o telhado da mesma.

Apoiado sobre um dos joelhos, sentiu que o braço do escudo estava quebrado. “Não posso me limitar pela dor de meu corpo. Não quando tudo depende de que eu detenha esse monstro.” Desviou-se da rasante que Garra-Voraz deu em sua direção, arriscando um golpe com Gume Sagrado sem efeito. Ao desviar de mais rasantes, notou que o dragão estava apenas brincando com ele para fazê-lo ter esperança de vencer e no final tomar essa esperança.

Depois da sexta rasante, o justicar se ergueu com um grunhido de dor. Posicionou o escudo em postura de combate embora seu braço queimasse em dor. “Thuriel, conceda ao seu servo fiel um último pedido. Dê-me a força para enfrentar Garra-Voraz e acabar com sua violência, terror e destruição.” Albion sentiu-se mais forte. Saltou da torre para esquivar-se da rasante fatal do dragão e pousou sobre o telhado destruído de uma das casas em chamas. Virou-se para Gume Sagrado, sua fiel lâmina:

– Lâmina com quem vivi, lâmina com quem agora perecerei, sirva o bem e a justiça uma vez mais, crave um último coração mal, uma última vida de dor, corte bem velha amiga, e por fim adeus.

Com essas palavras, Albion fechou os olhos e deixou sua mente vagar para as incontáveis orações que fizera a Thuriel ao longo da vida. Sentiu todas elas convergirem em seu corpo, ressoando em sua alma. Ouviu Garra-Voraz se aproximar com um rugido de triunfo. Abriu os olhos.

Segurou o golpe do dragão com seu escudo. Seus pés rasparam no chão enquanto era empurrado pelo impacto, mas não sentiu dor. Ao contrário, sentiu as garras se quebrarem em seu escudo. O monstro urrou de ódio e dor e recuou com um bater de asas para a torre. O justicar agora emanava uma aura dourada. Mas o mais impressionante eram as belíssimas asas que saíam de suas costas. Asas emplumadas, como as de um anjo.

– IMPOSSÍVEL! COMO UM HUMANO PODE SER TÃO PODEROSO?

– Você realmente não conhece os paladinos, não é mesmo? Esse é o verdadeiro poder de um paladino, e a razão de sermos tão poucos em comparação com outras vocações. O sacrifício de um herói não é algo que qualquer um está disposto a fazer. Prepare-se, Garra-Voraz! O próximo corte será o último! – E o paladino angelical disparou pelo ar na direção do dragão.

– VOCÊ NÃO PODE ME MATAR! – berrou o monstro enquanto cuspia bolas e bolas de fogo.

Albion se esquivou com facilidade das chamas terríveis e pairou acima da cabeça do monstro por um instante, olhando-o nos olhos. Em seguida, mergulhou com Gume Sagrado e o estocou no coração. Quando viu que fora atingido, Garra-Voraz fechou as patas em um abraço mortal contra o paladino, impedindo-o de se afastar quando seu corpo explodiu em chamas infernais.

Horas depois, encontraram o corpo carbonizado de Albion Norad e a espada Gume Sagrado, que estava intacta a não ser por uma mancha vermelha na lâmina. Enquanto se perguntavam o que ocorrera, um homem de manto de viagem saiu de onde se escondera e contou tudo o que viu e como se abrigara em um beco quando viu o dragão lutando com os magos.

E assim o justicar mais poderoso fez o maior ato de bravura. E embora o agradeceram imensamente por contar como Albion lutara bravamente, os paladinos e os clérigos não se lembraram do rosto do homem que tivera a coragem de assistir ao embate.”


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