O pequeno Set se encolheu no canto da cama ao dar de cara com os olhos esverdeados da prima, que sorria abertamente ao ver o quanto estavam próximos.

— Seti, Seti. Vamos namorar? – Ela propôs pela milésima vez e novamente o menino balançou negativamente a cabeça, fazendo o sorriso da morena diminuir. — Por que não Seti? Eu quero namorar com você.

Set abriu a boca para protestar, mas a menina foi mais rápida e colou os lábios nos dele, dando-lhe um pequeno selinho, ele arregalou os olhos e escondeu o rosto com o travesseiro.

— Aha! – Juan gritou quando entrou no quarto, surpreendendo os dois, o menino correu até eles e subiu na cama, encarando a irmã com os olhos marejados. — Sua feia, não vai namorar com ele. – Resmungou empurrando a mais nova para trás, ela, por sua vez, começou a estapear Juan sem parar.

— Nem você, você não pode. – Ela retrucou, puxando o cabelo do irmão e tentando chuta-lo, Set observava tudo em silencio, desejando apenas que os primos fossem menos esquisitos, o ruivo lentamente começou a se arrastar até o fim da cama, na intensão de fugir sem ser visto.

— Posso sim. – Juan continuava a resmungar, enquanto empurrava Julia para longe.

— Não pode você é menino.

— E você é feia. – Ele a derrubou do outro lado da cama e correu até Set, que já abria a porta para fugir, em vão, o primo o puxou pelo braço e fechou a porta, rindo da cara de medo do menino e o abraçando enquanto encarava a menina, Set se sentia um troféu nas mãos deles. Juan puxou o primo para mais perto de si e o encarou. — Namora comigo? Namora? Namora? Namora?

Set ainda se mantinha em silencio, com medo do que poderia vir daquela guerra, Juan o puxou o primo mais pra perto como se fosse beija-lo, mas Julia tacou o travesseiro na cabeça do irmão. — Você não pode... Mamãe disse que não pode mais beijar meninos. – Juan deu de ombros, ainda segurando Set a força, o ruivo se xingava por ser tão pequeno e não conseguir fugir, mesmo que os três tivessem a mesma idade.

— Me solta Juan, não quero namorar ninguém. Quero ir brincar lá fora, SOZINHO. – Set reclamou.

— Só se me deixar beija-lo. Você deixou a Julia, deixa eu também, ai eu te deixo em paz, e você decide qual foi melhor. – Juan propôs sorrindo travessamente.

— Não deixa Set, ele é um menino, não deixa. – Julia insistia em enfatizar aquele detalhe, mas o que ela não sabia era que Set sempre achou Juan muito bonito e sempre quis beija-lo, mas nunca teve coragem por ele ser um menino, isso até claro, o primo começar a correr atrás dele.

— E dai? E se ele gostar? – Juan riu e encarou Set. — Então, quer ou não um beijo?

Set encarou o primo, sentindo as bochechas ficarem quentes e o coração acelerar um pouco, mordeu os lábios e baixou os olhos, tentando não sorrir como um bobo. — Bem... – Começou sem jeito. — Se com isso você for me deixar em paz, tudo bem... Pode me beijar.

~ ~ # ~ ~

Set encarava o mecânico com desanimo, o carro ainda não estava totalmente arrumado, faltava pouco pelo que o homem havia dito, mas o ruivo sentia falta do companheiro de quatro rodas, se sentia tão bem quando dirigia.

Agradeceu ao homem por cuidar de seu bebê, e saiu da oficina a passos lentos, encarou o relógio de pulso, já eram nove e dez, tinha que andar rápido se quisesse chegar na hora marcada com Harry.

Enquanto caminhava para o ponto de ônibus mais perto, discou o numero do noivo, por algum motivo não confiava naquele papo dele de seguir em frente, porque o Cris nunca esquecia nada que lhe aconteceu, muito pelo contrário, ele sempre guardava cada coisa para si mesmo, e isso o tornava um tanto amargurado. Set estava tentando torna-lo mais alegre desde que se conheceram, mas a melancolia era algo que Cris não largava, sempre dava um jeito de se lembrar do passado e sofrer, e isso quase lhe causou uma séria depressão.

“Alô, querido?” Cris atendeu, com a voz – falsamente- animada, o que fez com que Set suspirasse cansado.

“Cris, menos purpurina de um e noventa e nove e mais verdade” Resmungou, ouvindo a risada abafada do noivo. “Não seja tão falso assim, você não me engana, o que aconteceu? Ainda pensando no Lucas?”

“Ah, é, acho que é isso sim”

“Sério?”

“Cheguei no trabalho um pouco atrasado, mas deu tempo de acumular bastante coisa para fazer” Cris riu. “To precisando”

“Hey amor, o que houve?”

“Minha mãe ligou, não dá pra explicar tudo agora, depois ok? Eu saio daqui meio dia, a coordenadora vai ficar responsável por tudo a tarde, pode almoçar em casa hoje?”

“Claro, já estou esperando um ônibus para ira para reunião, até meio dia e meia eu já cheguei em casa.”

“Então até, beijos”

“Beijos”

Set desligou o telefone, sentindo o desanimo piorar, detestava ver Cris deprimido, mas sabia que o noivo precisava de um momento de paz. Ouviu o som do ônibus e deu graças ao ver que era o que esperava, assim chegaria mais rápido a casa de Lucas.

# #

Quando finalmente chegou, sentiu o coração se aliviar ao ver Harry sentado em frente a porta, o observando com um sorriso. — Então, está bêbado?

O homem riu e se levantou rapidamente, estava usando uma blusa branca e uma calça preta, o cabelo menos bagunçado e nada de cheiro de bebida nenhuma. — Não, e Lucas está para a escola. Cumpri minha promessa viu?

— Sim. Embora eu não saiba como. – Set murmurou, seguindo o homem para dentro da casa.

Harry se sentou no sofá e respirou fundo. — Eu também não sei como e, sinceramente, não sei vai durar, mas... Ontem, quando eu vi Lucas chorar por se preocupar comigo eu... Acho que perdi a coragem de beber naquela hora. – Ele riu de si mesmo, mas de modo um pouco triste. — Mas vamos ao que interessa. Meu filho parece gostar de vocês. Aquele menino se apega fácil.

— Vou dizer o que vim aqui preparado a dizer. – O ruivo se sentou ao lado de Harry, que o encarava sem expressão alguma. — Lucas apareceu na minha casa quase uma hora da madrugada, havia dormido na rua, por sorte nós o encontramos. Ele estava com um pouco de febre e as roupas estavam molhadas, por que havia chovido afinal. Sabe o que isso significa? Sabe os riscos que ele correu?

— Sim, e sinto por isso, não estava pensando por mim.

— Ele disse que passa o dia arrumando dinheiro pra você. É verdade?

— Sim, infelizmente eu perco o controle quando vejo que gastei todo dinheiro, ás vezes eu faço um trabalho ou outro como eletricista entende? Mas o dinheiro não rende, então quando começo a beber eu meio que enlouqueço.

— Ele vai frequentemente a escola?

— Na verdade não, eu bebo muito durante a semana e, ou acabo mandando ele conseguir dinheiro, ou ele empaca em casa por não querer me deixar sozinho.

Set ouvia tudo atentamente, surpreso com o modo que Harry parecia diferente, realmente a bebida o transformava.

— Não querer te deixar sozinho? – Questionou, e recebeu um sorriso do outro, que abriu a boca para responder, mas o som de batida na porta o atrapalhou.

— Oh! Não, vou ignorar. – Harry resmungou, colocando as mãos no rosto, Set se levantou e caminhou até a porta, encontrando um rapaz de cabelos castanhos e olhos azuis, que sorria nervosamente.

— Olá, sou Alex, trabalho para prefeitura e... Vim trazer um cartaz de conscientização contra a epidemia que tanto temos ouvido falar. – Alex riu sem jeito. — Se importa se eu colar lá dentro? É... Norma.

— Norma?

— É... Si... Sim.

Set encarou Harry que murmurou um tanto faz, e o rapaz entrou rapidamente, se encaminhando para os fundos da casa, por algum motivo Alex não parecia de todo estranho, tinha impressão que já o viu em algum lugar.

— Como dizíamos... – O ruivo retornou ao que lhe interessava mais, se sentando novamente com Harry. — O que realmente quer com isso?

— Eu quero que me ajude.

— Ajudar?

— Sim, olha não me importa se seu namorado-

— Noivo. – Set corrigiu calmamente, recebendo um “Tanto faz” como resposta, o que o matou de raiva. — Mas prossiga.

— Como eu dizia, não importa se vocês me odeiam e se seu noivo me deu um soco na cara sem eu saber o motivo.

— Você o zombou, chamando de veado.

— Ah... Entendo. Então foi isso. – Harry baixou os olhos, claramente envergonhado.

— Mas continue de onde parou, hoje é um dia ocupado para mim.

Harry bufou. — Quero que me ajudem, porque quero o melhor para Lucas, mas não quero isso sobrando só pra mim. Quer dizer, eu sou um péssimo pai, não quero que o futuro dele dependa de mim, e também...

— Também? - O rapaz, Alex, surgiu novamente, agradecendo aos dois e correndo até a porta. – Cara estranho.

— Sim, mas não tanto quanto eu. – Set conseguiu sorrir, ainda surpreso com a capacidade de Harry de ser sociável as vezes. — Como eu dizia, quero que me ajudem a cuidar de Lucas, quero que me ajudem de forma pacifica, uma hora ou outra alguém vai tirá-lo de mim de alguma forma injusta e isso só vai faze-lo sofrer.

— Está dizendo...

— Set quero dizer que Lucas precisa de vocês, mas eu não vou abandona-lo assim, sei que não vou me livrar desse vício tão cedo e sei que todos desejam que eu morra de uma vez, mas Lucas me ama apesar de tudo e por isso não posso me separar dele de forma dura ou cruel, eu sei que com vocês eu posso contar para isso.

— Olha não precisa disso, não é como se precisasse se afastar dele, é seu filho afinal.

— Oh Set, não entende a minha situação? Não estou me fazendo de vitima, eu vou lutar para melhorar, mas estou mal.- O ruivo contemplava o sorriso melancólico de Harry com confusão, não sabia o que pensar e o homem apenas seguiu com o que dizia. — Estou doente de verdade e sei que não vou durar muito, antes eu achava que era mergulhando a cara em cachaça que eu esqueceria tudo, mas ontem...

Harry deixou as lágrimas saírem sem se preocupar, Set o amparou e o deixou chorar. — Sabe ele... Meu pequeno filho... Eu quero que cuide dele, mas não quero que ele vá embora agora. Por isso eu imploro, não o tire de mim, eu tenho muito a me redimir.

— Tudo bem, explicarei tudo a Cris. Vou tentar ajudar.

— Obrigado mesmo Set.

Set sorriu e sentiu o celular vibrar em seu bolso, o pegou rapidamente, esperando ser um sinal de Cris, mas eram apenas duas mensagens de Juan.

Abriu a primeira mensagem:

“Cadê vc? To com sdds, Setii ” ‘Julia’, pensou, com um sorriso torto no rosto e abriu a outra mensagem:

“Foi mal a Julia pegou meu celular, mas vem logo primo, quero te ver, to com saudasjaskd, Júh é um linda uhhuu Setii é lindo e o Juan é um viadinho, (sem ofenças)”

— É, perece que é bom eu ir. Mas... Pensando bem, se queremos resolver as coisas é bom que seja de uma vez.

— Como assim?

Set puxou Harry, forçando-o a se levantar. — Você vem comigo, vamos para minha casa, Cris vai te ouvir se estivermos lá e você tem muito o que dizer, além disso, Lucas precisa ver que todos queremos o bem dele e isso inclui você.

. ~ ~ ~ # ~ ~ ~

Do lado de fora, Alex andava nervosamente de um lado para o outro, um pouco distante da casa para não levantar suspeitas.

“Lembre-me tia, por que estou nessa mesmo? ” Perguntou aflito, sabia que se Set o descobrisse estaria muito encrencado, mas a mulher do outro lado da linha apenas suspirou.

“É pelo bem de seu primo, tem certeza de que viu o Set lá? ”

”Siiim tia, ele estava conversando com o cara de cuidar de um tal de Lucas, parece que o cara quer que tudo aconteça calmamente e, SERÁ QUE EU JÁ POSSO IR EMBORA?”

“Não. Não pode ir, não se importa com o futuro do meu doce Cris?”

“Eu não, ele que faça o que quer da vida, eu só quero saber o que eu ganho com isso?”

“Cala a boca e vigia ai, assim que Set sair você já sabe né? Tenta descobrir tudo o que pode sobre o pai do menino”

“Não sei pra que isso serve, só vai torturar a criancinha, não acha maldade o tirar do pai assim de repente?”

“Maldade é você ser tão burro, o menino vai viver melhor longe desse lugar e longe desse maldito Oliver que roubou meu inocente Cris de mim”

Alex riu, será que a tia nunca acordaria para a vida? Todos já sabiam que Cris apenas se fazia de santinho por que sofria bullying na escola e porque não queria apanhar em casa, mas de coitadinho ele não tinha nada. “Ah, mas até que é lucro né, o Cris que sempre foi um rebelde sem causa até que se deu bem, se casar com o filho de Michael Oliver não é pra qualquer um.”

“Ai você também em, fica quieto e só me avisa quando Set sair.”