Diamond

Meses depois

— Pai, é sério, quando nós vamos poder caçar? — Nix perguntou, visivelmente frustrada, enquanto voltávamos para casa.

Já estávamos tendo aulas há um bom tempo, mas acho que papai ainda não sentia confiança o suficiente em nós, então continuava nos treinando.

— Quando estiverem prontos. — ele respondeu.

— E quando vamos estar prontos?! — ela insistiu.

— Vocês saberão. Que tal se ficássemos em silêncio? Ajuda a absorver o aprendizado. — ele suspirou.

Apesar da necessidade estranha e quase insaciável de fazer mais e mais perguntas, todos ficamos quietos e simplesmente continuamos caminhando calmamente.

Com um sorriso, lembrei-me de que iria me encontrar com Radius hoje.  Andávamos nos vendo bastante, se formos analisar as condições, e isso me fazia feliz. Ele era um ótimo amigo para mim, mesmo que eu já tivesse certeza de que havia desenvolvido certos sentimentos por ele... Mas não tinha coragem de o dizer. Ainda. Ele disse que tinha algo muito importante para me contar. Isso foi ontem pela manhã, e eu estou muito curiosa desde então.

— Por que diabos você está tão risonha? — Mike sussurrou ao pé do meu ouvido, o que me assustou um pouco, pois estava distraída.

— Estou apenas feliz. — dei de ombros, fitando o céu sem nuvens.

Ele franziu o cenho como se dissesse “Falamos sobre isso depois...”, mas, na verdade, não falaríamos. Apesar de ter uma grande consideração por Mike, contar tudo o que está acontecendo entre mim e Radius para ele poderia ser perigoso. Não que ele fosse contar, ele nunca faria isso, mas poderia deixar alguma informação sair de sua boca sem querer. Às vezes é bom não saber de certas coisas... Nos poupa de problemas.

 ***

— E então, como foi? — Midnight perguntou à Nix, assim que chegamos em casa.

Midnight está se sentindo mal já fazem alguns dias. Ontem mesmo ela vomitou um pouco de sangue. Mamãe e papai estão muito preocupados e fazem o possível para que ela se recupere logo. De qualquer forma, acho que ela está melhorando, pois sua aparência está bem melhor.

— Divertido, mas acho que ainda vai demorar para que realmente cacemos alguma coisa. — Nix lambeu o focinho de Midnight.

— Meh...

De relance, pude ver os olhos amarelos brilhantes de Midnight me encarando, e rapidamente desviei o olhar. Resolvi ficar um tempo fora da caverna antes de sair para a floresta.

— Como está se sentindo, querida? — ouvi papai falar com Midnight.

— Melhor... — ela pigarreou. — Talvez amanhã eu já possa correr um pouco pelo território.

— Assim espero. — ele concluiu e saiu da caverna.

Papai parecia um pouco surpreso ao me ver do lado de fora, mas eu não tinha certeza. É sempre bem difícil tentar descobrir o que ele está sentindo.

— O que está fazendo? — ele perguntou calmamente.

— Nada. — suspirei. — Uhmm... Eu vou ficar um pouco na floresta das violetas, se não se importa.

— Por quê?

— Huh? — fiquei confusa. Ele não havia questionado minhas saídas. Até hoje.

— O que vai fazer lá? — ele se sentou ao meu lado.

— Ah... nada demais, eu acho. Só acho aquela floresta acolhedora e divertida. — ri. — E cheirosa. Gosto das violetas.

Papai ficou me observando por alguns segundos, que pareceram décadas.

— Está certo. Aquela floresta é realmente... especial. — ele deu um longo suspiro. Parecia estar se lembrando de algo.

— Você conhece aquela floresta? O que a faz especial? — fiquei curiosa. Na verdade, não. Eu não fiquei. Eu sou curiosa, naturalmente.

— Foi lá onde, bem... Eu e sua mãe nos conhecemos. — ele sorriu enquanto olhava para o céu.

— Verdade? — sorri com ele. Aquilo era muito fofo! — Como aconteceu? Digo, como se conheceram? Nunca contaram isso para nós.

— E não vai ser agora que irei contar. — ele deu uma piscadela enquanto se levantava. — Pode ir. Mas tome cuidado. Eu te amo.

— Sempre. Obrigada, pai. Eu também te amo. — disse e lambi seu focinho.

Sorridente como nunca, comecei minha caminhada até a floresta, que acabara de se tornar ainda mais especial para mim.

***

— Radius? — chamei-o por entre as árvores.

O Sol estava à pino no céu — exatamente o horário que havíamos marcado. Caminhei para mais perto das violetas, e lá estava ele, com toda sua graciosidade e beleza em forma lupina.

Por algum motivo, Radius parecia um pouco... nervoso? Comecei a ficar assustada pelo o que eu iria ouvir dele. Estávamos nos dando tão bem! Teria algo dado errado e eu não percebi?

— Hey! — cumprimentei-o e esfreguei meu focinho em sua bochecha e ele retribuiu.

— Ah, oi! Nem te vi chegando, huh.

— Eu percebi. Está nervoso?

— Nervoso? — sua voz deu um leve falsete e ele limpou a garganta. —Não estou nervoso. Por que estaria?

— Não sei. Me diga logo! O que é tão importante para que você precisasse esperar um dia inteiro para me contar? — fiz meu melhor olhar pidão, cujo não deve estar muito convincente, já que não o pratico já faz um bom tempo.

Ele respirou fundo e arrancou uma violeta do chão de terra. Delicadamente, Radius pôs a flor por fora de minha orelha.

— Sente-se. Por favor...

Fiquei preocupada. Comecei a pensar com mais intensidade na possibilidade de ter feito algo que o deixasse irritado ou chateado.

— Radius... Eu fiz algo errado? Está chateado comigo? — encolhi as orelhas e pude notar que os pelos de sua nuca se arrepiaram.

— O quê? Não, claro que não, princesa! — ele me abraçou, transmitindo tranquilidade. — Talvez eu esteja mesmo nervoso.

— Por quê? Sabe que pode dizer o que quiser para mim. Aconteceu algo com sua antiga alcateia?

— Não. É o que eu vou dizer não é algo lá muito simples.

Ficamos nos olhando por um certo tempo. Eu estava ansiosa e minha cauda se agitava involuntariamente.

Ele respirou fundo novamente, dessa vez com os olhos fechados. Quando finalmente os abriu, eles tremiam um pouco.

— Diamond, queria saber se... — Radius parou de falar momentaneamente, buscando as palavras talvez? Não sei, só sabia que estava ficando mais nervosa. — Se você aceita se tornar minha... companheira.

Eu arregalei os olhos. Meu coração estava transbordando de felicidade. E meu estômago? Totalmente cheio de borboletas. Quer dizer, eu sabia que isso não significava que iríamos nos tornar companheiros oficialmente, com cerimônias e tudo mais, ainda estávamos longe disso. Mas já era um passo para que isso acontecesse. Quem sabe, num futuro... 

— Me desculpe se perguntei isso cedo demais... — ele pareceu murmurar para si mesmo, porém eu pude ouvir.

— Na verdade, eu pensei que você nunca iria perguntar!— exclamei e o derrubei no chão.

— Espera... então isso é um sim?! — ele parecia feliz. Muito feliz.

— Claro! — ri e esfreguei meu focinho no dele. — Mas teremos que manter segredo...

— Por mim, tudo bem. Desde que fiquemos juntos. — ele sorriu.

— Iremos ficar. Vai dar tuuudo certo. — disse e saí de cima dele, para que pudéssemos nos abraçar.

Nosso primeiro abraço como companheiros. E estava muito longe de ser o último.