A Única Inocência escrita por Laís Bohrer


Capítulo 6
Nosso primeiro revezamento


Notas iniciais do capítulo

Lay*: E perdão pelo capítulo gigantesco, eu não planejava que ele ficasse tão enorme e eu nem consegui colocar tudo o que eu queria, o que resultou em: Adolescência? Só capítulo oito, é bom que a história fica maior... E eu tenho muitas ideias ainda - eeeee.
Continuando, eu fiquei com uma lerdeza e um bloqueio sério. Mas a minha determinação, meus sonhos, meus amigos e essas coisas ai de protagonista de anime shounen... Enfim, meu compromisso aqui me permitiu continuar.
Obrigada compromisso, eu vou te dar um nome menor ^^
Boa leitura



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Helena Tyler era professora no colégio primário na cidade de Reesetown, considerada o “terror de todos os alunos”.

Naquele dia, a mulher prendia os cabelos escuros em um rabo de cavalo alto, tinha olhos castanhos e cruéis por trás dos óculos retangulares de armação lilás. Aparentemente ninguém diria que aquela mulher teria trinta e seis anos. Suas discretas rugas eram invisíveis por trás da maquiagem, os lábios finos levavam o tom vermelho exageradamente escuro.

Aqueles fedelhos irritantes... Aquele Andersen...

Ah, sim. Do mesmo modo que a professora era o terror das crianças, as crianças eram seu pior pesadelo. Tinha decidido virar professora quando se descobriu grávida de sua primeira filha. Helena lembrava-se de como tinha ficado apavorada e de como sua mãe não a deixou optar pelo aborto. Apesar de odiar crianças, era eternamente grata por não ter tomado aquela decisão.

No entanto, Helena se via amaldiçoada pelo pior “fedelho” que já fora criado. Às vezes acreditava que Noah Andersen era um castigo dos céus por ela ter pensado em abortar a filha.

Helena desceu do carro e adentrou a casa – uma pequena residência de paredes externas amarelas e acabamento branco. Assim que chegou ao hall de entrada, seus ouvidos foram preenchidos por uma tranquilizadora risada de uma menina de onze anos que compensava todas as manhãs infernais.

Kate Tyler era o melhor presente que a vida já tinha lhe dado.

Kate não tinha traços da mãe: Seus olhos eram grandes e perfeitamente redondos, de uma cor prateada radiante, os lábios eram levemente rosados, nem tão cheios e nem tão finos, o rosto era um pouco triangular e as bochechas coradas revelavam covinhas. Os cabelos eram dourados e caiam como em ondas pelos dois lados do rosto.

Mas toda vez que Helena a olhava, não podia evitar a tristeza. Os braços da menina eram finos demais, as pernas eram finas demais, sua cintura fina demais, seus ossos eram frágeis, seu corpo inteiro não a permitia correr tanto quanto as outras crianças, aquele corpo tão frágil não lhe permitia se esforçar tanto. Kate sempre ficava doente com facilidade, principalmente no inverno.

Uma vez, em algum natal, elas visitaram a mãe de Helena. Crianças chamaram Kate para brincar na neve. Helena ficara observando enquanto a filha construía um boneco de neve ao lado de uma das suas primas... Quando começou uma guerra de bolas de neve, a primeira que acertou Kate na barriga a derrubou no chão. A menina vomitou e foi levada ao hospital.

Asma e osteogênese imperfeita – os perseguidores de Kate.

A mulher, aproximando-se da filha, conseguia notar a leve coloração azulada no branco dos olhos de Kate. A menina acariciava um Yorkshire e este lambia as longas e finas mãos da menina, um pouco defeituosas como se a imagem fosse distorcida.

– Kate, estou em casa. – Helena disse antes de se sentar ao lado da filha.

– Bom dia, mamãe – disse a menina sem olhar para Helena.

A mulher acariciou os cabelos dourados da filha.

– Como foi seu dia? – perguntou gentilmente.

Pudim brincou comigo o dia todo – disse Kate com um leve sorriso.

O cachorro latiu. Um presente de aniversário de onze anos de Kate, um Yorkshire que a menina insistira em chamar de “Pudim”, seu doce preferido.

Helena retribuiu o sorriso e abraçou a filha de lado, delicadamente com medo de que sua boneca da mais fina porcelana se quebrasse. A professora se afastou, sem tirar as mãos dos ombros da menina.

– O que quer para almoçar hoje?

Kate pareceu pensar.

– Bolinhos de arroz – disse virando seus olhos cinzentos para a mãe. – Podem ser bolinhos de arroz, mamãe?

Helena sorriu tristemente, assentindo. Kate sorriu feliz enquanto a professora se erguia do sofá.

A mais velha caminhou desviando de alguns brinquedos no chão. Mesmo com o entusiasmo da menina, aquela casa sempre lhe parecia vazia. As paredes tinham as cores favoritas de Kate: amarelo e laranja. No canto da sala havia uma cadeira de rodas usada para quando Kate saísse a passeio, não cansasse as finas e frágeis pernas.

A mulher desviou da cozinha seguindo por um amplo corredor até a última porta para a direita.

Entrou em um cômodo onde havia uma cama de casal com cobertores de veludo preto e branco. Ao lado esquerdo da cama uma luminária branca e uma cabeceira. Em frente à cama um divã, onde Helena deixara sua bolsa e sentara-se para tirar os saltos.

Ela olhou envolta. As paredes de cor bege eram repletas de adesivos de parede – desenhos de árvores e galhos enormes que se espalhavam como se abraçassem o cômodo. Ao lado da porta, no alto da parede havia uma televisão que raramente era ligada e abaixo dela uma estante de livros intocáveis de medicina que Helena recusava desfazer.

Na estante havia também uma foto de família – A própria Helena Tyler em um de seus vestidos preferidos, um de flores azuis e amarelas, decotado, ao seu lado havia um homem alto com óculos grossos de grau, cabelos grisalhos penteados para o lado. Ele usava jeans e uma camiseta verde simples e abotoada.

Em seu colo segurava uma linda menininha, Kate com seus seis anos de idade, os cabelos loiros presos em duas tranças que desciam por seus ombros e a boca suja do grande pirulito azul em uma de suas mãos. Trajava um vestido amarelo de bolinhas brancas, simples, com babados brancos no pescoço, também sujos de corante azul.

Aquela foto foi tirada em frente aquela mesma casa, a família Tyler tinha acabado de se mudar. Cinco anos, fazia. Foi bom, Helena ficava mais perto da escola onde trabalhava e a condição deles havia melhorado significativamente. E pouco menos de um ano depois da mudança, a osteogênese imperfeita surgiu com um diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, a asma de Kate foi piorando.

A menina estava cada vez mais frágil e logo incapaz de se mover. Meses no hospital e aquela linda casa amarela começou a perder a vida. Seu marido falecera. Helena se viu sozinha e sem esperanças. Ela ainda temia que algum dia, sua filha fosse levada de seus braços.

A maioria das noites de Helena Tyler era tomada por esses pesadelos.

Benjamin Tyler se fora. O pai de Kate se fora e ela ainda nem havia percebido. Seu autismo a deixava longe demais daquela realidade triste. Kate não percebera a perda e isso preocupava Helena.

Talvez seja melhor assim... Pensou naquele momento.

A professora piscou, mas uma lágrima silenciosa escorreu pelo seu rosto, lembrou do funeral de Benjamin.

– Mamãe, porque estão todos de preto? – perguntava Kate com sete anos em sua cadeira de rodas, diante do túmulo de Benjamin.

– Hoje é um dia escuro, Kate. – respondeu.

A menina franziu o cenho.

– Por que estão enterrando o papai? – mas Helena não respondeu, tentando conter as lágrimas. Kate atraia olhares penosos. – Papai odeia preto! Ele dizia que era vazio...

– Kate, por favor... – a mãe implorava.

O olhar da garota era vago, como se fosse além da mãe.

– Papai vai ficar triste se a mamãe chorar.


Sacudindo essas lembranças de sua mente, Helena Tyler se ergueu do divã, afinal ainda tinha uma pilha de provas para corrigir.

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Era mais uma tarde quente nas ruas de uma pequena e isolada cidade.

Ryan Cross erguia a cabeça, forçando seus olhos até ficarem menores do que os de Sora. Seu olhar estava fixado em um folheto no vidro da entrada do clube de natação. O moreno parecia realmente frustrado. As letras estavam embaçadas como uma tela manchada dificultando a leitura.

Irritado, o garoto cruzou os braços.

– Desisto! – exclamou exasperado. – Como eles querem que a gente leia essas coisas cheias de falhas...

– Ryan... – Sora chamou timidamente. – Tem certeza de que você não precisa usar óculos?

Ryan bufou.

– Aquela coisa irrita, espero que não. – suspirou. – Mas a Sally vai me levar pra descobrir...

Noah se aproximou do anuncio – um cartaz azul com letras brancas. Não entendia realmente a dificuldade de Ryan para ler, para ele fora ridiculamente simples, a única parte que o deixara confuso foi...

– “Campeonato de natação infantil de Reesetown”? – enfatizou. – O que é Reesetown?

Sora parecia surpreso enquanto Ryan abafava a risada.

– Noah, você não sabe o nome da própria cidade? – Ryan provocou.

Uma veia saltou na testa do loiro.

– Você está mais irritante hoje que o normal. – o garoto virou o rosto, corado. – E claro que sei! – mentiu. – Não sou um idiota.

– Certo, certo... – dizia Ryan.

O mais novo Hayashi sorriu gentilmente:

– Reese é a família que fundou o vilarejo – explicou. - Que chamamos de cidade hoje. Reesetown.

Noah sacudiu a cabeça.

– Que nome complicado – reclamou.

Tudo é complicado pra você – Ryan riu.

O loiro fez uma expressão irritada.

As pessoas são naturalmente complicadas – disse teatralmente. – O Sr. Porter que me disse isso, agora que lembrei...

Sora parou.

– Hã, Noah! Aquela garota ruiva que vem aqui é sua amiga não é? – perguntou o asiático.

– Hum? – perguntou confuso. – Ah, está falando de Jasmine? Eu não sou amigo daquela sardenta irritante...

Ryan apertou o ombro do amigo, dando um sinal de alerta.

– Ei cara, você não deveria falar tão alto...

No entanto, Noah ignorou-o completamente. Suas lembranças estavam na conversa que Jasmine e Noah tiveram na praça. Ele pensou no que a garota havia lhe dito: Você nunca vai arranjar uma namorada! Seu ogro...

Ele rangeu os dentes, cerrando o punho.

– Ela é uma garotinha mimada e estúpida que...

Noah estremeceu. Há alguns metros atrás dele, Jasmine Porter não lhe parecia nem um pouco feliz. A garota tinha os cabelos ruivos presos em um alto rabo de cavalo. Usava short verde e blusa branca. Era estranho vê-la vestida naquelas roupas largas ao invés de seus tradicionais vestidos. Ela tinha um curativo no joelho e segurava uma bola de futebol embaixo do braço.

Noah Andersen – a menina estava tão vermelha quanto seus cabelos. – Eu juro que um dia eu ainda te mato.

– No-No-Noah... Nós vamos entrando! – Ryan gaguejava sem tirar os olhos da tempestade Porter. – Boa sorte, cara.

Sora pousou a mão no ombros de Noah, com um olhar determinado.

– Sobreviva. – e ele entrou no clube logo atrás de Ryan.

Assim que os amigos o deixaram sozinho com Jasmine Porter, Noah riu debochadamente. Como os amigos eram covardes, correndo daquele jeito de uma...

Seus olhos pararam na Porter. Ela estava realmente diferente da menininha irritante de antes, nunca pensou que a veria daquele jeito, por um momento achou que a garota fosse realmente bater nele.

– O que estava dizendo, Noah? – ela enfatizou.

Noah passava distraidamente os dedos entre suas mechas loiras.

– Nada. – ele disse com um olhar desafiador. – Nada que realmente seja da sua conta, sardenta.

A garota suspirou.

– Você não muda mesmo – disse irritada. - Eu só vim desejar boa sorte, já que não vou estar aqui no dia do seu revezamento.

Noah piscou.

– Como você sabe que eu...

Todo mundo sabe. – ela o interrompeu.

– Hm... – ele a encarou. – Você... Está vestida estranha hoje, parece um...

– Um o que? – ela encorajou com um olhar ameaçador que fez Noah recuar.

Aquela definitivamente não parecia com Jasmine Porter, mas uma coisa permanecia: Ela continuava o irritando.

– Um garoto – disse cruzando os braços.

Ele percebeu o quanto aquilo a deixou com raiva.

– E você?! – exclamava ela, apontando o dedo para o rosto de Noah. – Esse cabelo, deveria cortar para se parecer menos com uma garota!

Diferente do esperado, Noah não perdeu a cabeça – se ele visse que seu adversário em uma discussão já o havia feito, ele encarava que se fizesse a mesma coisa seria uma discussão sem fim.

– Eu não me lembro de ter pedido sua opinião... – disse friamente pronto para dar as costas.

– Eu só vim desejar boa sorte... – ela resmungou.

Noah parou antes da entrada do clube, sem virar-se para ela, ele disse:

– Também não me lembro de ter pedido qualquer coisa a você.

Ele disse “você” como se Jasmine fosse algo realmente desprezível. Aquele tom baixo e ameaçador deixou a garota com mais raiva ainda. Ela apenas queria ser gentil, sabia que havia começado com o pé esquerdo, sabia que havia sido grosseira com ele antes, mas do modo que Noah Andersen era cabeça dura, talvez fosse tarde demais para ajeitar qualquer coisa.

Jasmine bateu o pé no chão.

– Você é um idiota, Noah Andersen! – ela gritou com os olhos marejados.

Não importa como ela fosse. Até alguns dias atrás antes de conhecer aqueles meninos na quadra jogando, antes de fazer aqueles novos amigos, Jasmine queria ser reconhecida como menina mesmo que brincar de boneca não fosse seu passatempo preferido.

Mas não importava como que ela parecesse: Menino ou menina. Noah não a reconheceria.

Ela virou-se dando as costas, deixando a bola de futebol cair antes, então ela correu. Noah virou, olhando para a bola no chão. Ele se agachou para apanhá-la.

“Você é um idiota”, repetiu a frase lentamente. Ele normalmente estava acostumado com ofensas daquele calibre. Não havia o ofendido, mas Noah sabia que não tinha agido certo.

Agarrando a bola e adentrando o clube, segurou mais um pensamento: Não é importante, isso sempre acontece.

Então ele pensou novamente na garota desconhecida enquanto caminhava para encontrar os amigos.

O que ela lhe diria? Talvez as mesmas coisas ou talvez ignorasse as ofensas de Noah, mas... Era diferente. A garota desconhecida não irritava Noah, pelo contrário, parecia entendê-lo como ninguém nunca entenderia, seu erro foi perceber isso tarde demais.

Não adianta pensar nisso agora. Foi só um sonho.

Era isso, quanto mais Noah pensava nela, mais distante ela parecia. Como um sonho real demais a ponto de Noah duvidar se era mesmo um sonho ou se era realidade.

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Dois dias parecia muito tempo para Ewan. Não havia frequentado o clube desde que perdeu para Noah Andersen. Estivera nadando apenas na piscina de seu condomínio, convencendo-se de que havia cometido um erro naquele dia em que apostara com Noah.

Noah ser melhor do que Ewan? A ideia parecia ficção demais para o moreno.

Derek ficava sentado na borda da piscina o observando e tentando orientar o irmão:

– Está dobrando os joelhos demais no salto! – gritava Derek.

E Ewan passava horas ali.

Antes da manhã do dia seguinte chegar, o último dia antes do torneio, Ewan estava tão empolgado que não conseguiu dormir direito e se amaldiçoou por isso. Entrou de cabeça no chuveiro e pulou com a água fria. Ao sair, vestiu o uniforme e passou do quarto para o corredor até chegar ao hall de entrada onde apenas o seu irmão mais velho esperava.

Derek sorriu para ele e acenou com a cabeça, erguendo-se do sofá.

Era engraçado como os irmãos na verdade não se pareciam nem um pouco, exceto pelos cabelos escuros. O cabelo de Derek era liso enquanto o de Ewan era extremamente encaracolado, o garoto o mantinha ralo. A pele de Derek era levemente bronzeada e a de Ewan era escura como chocolate. Os olhos eram iguais. As personalidades opostas.

Os irmãos caminharam, passando pelas ruas da pequena cidade de Reesetown. O sol no rosto irritava Ewan. Derek olhou para o rosto do irmão caçula e riu.

– Não dormiu direito hoje, Ewan? – perguntou o mais velho.

Tsc... – Ewan virou o rosto.

Derek, com a mochila sobre os ombros, avistou a escola de Ewan, e antes de se despedir fez questão de lembrar:

– Amanhã é o grande dia, deve estar animado.

A resposta recebida foi diferente do esperado.

Ewan fechou os olhos, meditando e os abriu junto com um sorriso.

– É claro.

Derek deixou o irmão na esquina da rua do colégio e seguiu em frente. Ewan entrou na rua caminhando em direção a um conjunto de prédios branco. A Reesetown High School, Derek já havia estudado lá, mas depois de completar o Ensino Médio apenas acordava junto com Ewan para leva-lo a escola. Depois disso, Derek seguia na direção do clube de natação infantil de Alfred Porter.

Ewan se perguntava o que o irmão faria lá tão cedo.

O moreno atravessou os portões de entrada para dar de cara com um bando de alunos agitados em plena manhã.

Amanhã é o grande dia. Era tudo em que Ewan se concentrava. Nem se quer prestava atenção no que acontecia ao seu redor. Ele seguia pelos corredores tipicamente até sua sala de aula, quando sentiu um impacto contra seu corpo.

Ewan ouviu um grito afinado e foi ao chão.

– Desculpe!

Uma garota de cabelos ruivos molhados e presos em um rabo de cavalo de última hora estava a sua frente. Ela usava o uniforme da escola – um pouco grande para ela. Seu rosto era em formato de coração e a face cheia de sardas e traços fortes.

– Porter?! – exclamou Ewan.

Jasmine Porter olhou para ele.

– Você é... – ela tentava se lembrar. – Espere, eu te vi no clube... Mas seu nome...

Ewan bufou, se levantando e deixou a garota no chão. Sem se importar com o que ela murmurava, dei-lhe as costas e continuou andando pelo corredor, mas Jasmine agarrou em seu tornozelo.

– Ei! Não vai me ajudar? – perguntou ela.

– Você que me derrubou – retrucou com a voz entediada. – Não posso perder tempo com garotinhas como você, vou me atrasar de novo por sua culpa...

– Garotinhas? – repetiu ela se levantando, o rosto vermelho de irritação. – E eu já me desculpei.

– Que ótimo – Ewan parou e olhou para a menina. – Espere, desde quando você estuda aqui?

Uma veia saltou na testa de Jasmine.

– Desde o começo do ano – ela cruzou os braços. – Se você prestasse mais atenção em alguma outra coisa além do próprio nariz...

E ela começou a segui-lo, falando por todo o percurso coisas que Ewan não se deu o trabalho de prestar atenção. Estava com sono, irritado e parcialmente ansioso. Quando finalmente alcançaram a sala de aula deram a sorte de não ter nenhum professor no local. Ewan caminhou pelas fileiras com Jasmine gritando:

– Ei! Ouça quando as pessoas estão falando!

O moreno sentou na última cadeira ao lado da janela até que as exclamações de Jasmine se cessaram. Ele arriscou olhar para o lado, na direção da ruiva, a mesma conversava com um grupo de garotos do outro lado da sala.

Eles são do clube de futebol. Ele lembrou. Estranho, eles não costumam...

Um homem corpulento interrompe na porta, era seu professor de espanhol, cujo nome Ewan fazia questão de esquecer no fim das aulas. Logo, seus pensamentos sobre Jasmine Porter estavam distantes e ele pensava sobre como seria bom ainda estar na sua cama.

Ewan escondeu o rosto entre os braços cruzados em cima da mesa.

Seria um longo dia.

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O dia anterior passou rápido demais para Noah.

Desde que havia aceitado o convite de Ryan, o moreno tinha estado cada vez mais irritante conforme o tão esperado dia chegava. Seria o primeiro torneio de Noah, assim como o primeiro de Sora e o de Ryan.

E o quarto membro do time de revezamento veio à cabeça de Noah mais uma vez. Provavelmente Ewan já tinha participado de outros torneios antes – ele apenas julgou isso. Não tinha falado com o moreno desde que o desafiou há três dias e o derrotou na frente do clube inteiro.

Finalmente, Noah admitiu que houvesse exagerado naquele dia.

De qualquer forma, não queria parar para pensar naquilo agora, afinal de contas, ele queria apenas dormir.

– Noah! Acorda!

– Cinco minutos, tia... – o loiro gemeu.

– O que?! Levanta dai cara, vamos nos atrasar!

E as cobertas foram bruscamente puxadas dele. Noah abriu os olhos e sentou-se rapidamente. Ryan Cross estava ao lado da sua cama com o cobertor azul em suas mãos, o encarando parcialmente irritado.

– Ryan?! Como você entrou aqui? – Noah arregalou os olhos.

– Eu dormi aqui hoje. – lembrou Ryan. – Você tem nove minutos, a primeira aula é com a Srta. Tyler.

Noah estremeceu até a nuca apenas ao pensar naqueles olhos frios e cruéis olhando para ele por trás dos óculos retangulares. Noah colocou as pernas para fora da cama.

– Mas... Como você entrou aqui mesmo? – disse Noah olhando para o chão, onde estava um amontoado de cobertores onde Ryan pisava.

O de olhos claros já vestia o uniforme do colégio. Foi quando Noah se lembrou do dia anterior quando Ryan simplesmente apareceu no seu quarto, alegando ter entrado pela janela. As lembranças de anos antes voltaram para Noah, quando ele tinha sete anos e costumava buscar por brechas, como passagens secretas no jardim da tia que davam para a rua. Noah já tinha se esquecido daquelas passagens, provavelmente Ryan haveria descoberto uma dessas brechas e entrado pela janela aberta.

O garoto havia praticamente invadido sua casa.

Noah levantou-se da cama, esfregando o olho e cambaleando até o banheiro quando Ryan o interrompeu no meio do caminho.

– Apenas se troque, você vai passar bastante tempo na água no torneio hoje. – dizia Ryan apressadamente.

O loiro mudou sua postura repentinamente como se alguém o tivesse ligado na tomada.

– O torneio é hoje?! – exclamou correndo até o guarda-roupa.

– Não acredito que você esqueceu! – gritou Ryan passando pela porta. – Vou esperar na sala.

Alguns minutos depois, os garotos corriam pelas ruas da pequena cidade de Reesetown. Os raios solares eram fracos no rosto de Noah. Ele se amaldiçoava por ter esquecido, afinal esteve pensando naquilo a noite passada inteira, adormecendo com a ansiedade e nervosismo para então acordar no dia seguinte e então esquecer-se simplesmente.

Após um quarteirão percorrido, os meninos dobraram a esquina. Correram até um grupo de alunos que atravessava as grades do colégio e finalmente adentraram no prédio, ofegantes. Avistaram Sora Hayashi com um grupo de garotos do sexto ano. Os garotos o alcançaram.

– O que aconteceu com vocês? – perguntou Sora. – Chegaram em cima da hora...

– Alguém dormiu demais – Ryan olhou de soslaio para Noah. – Sabe se a Srta. Tyler já está na nossa sala?

Sora negou com cabeça.

– Eu ainda não a vi hoje... – Sora segurou as alças da mochila em suas costas. – Enfim, eu tenho que ir, eu os verei mais tarde?

Ryan assentiu e então parou como se lembrasse de algo.

– Ah, espero que não tenha se esquecido de hoje...

Sora se alarmou.

– Esquecer?! – interrompeu. – Estou nervoso com isso, Ryan-san, se eu falhar...

Noah piscou.

– O que? – perguntou o loiro. – Existe a possibilidade de todos nós falharmos alguma hora, se ficar pensando nisso algo ruim pode acontecer.

O de olhos verdes fez uma careta.

– Não precisava falar desse jeito, cara... – então olhou para Sora. – Aliás, você me chamou de que?

Sora sorriu sem graça.

Gomen, gomen... – disse o japonês. – Meu pai é japonês e minha mãe é americana...

– Entendi, entendi – Noah interrompeu. – Mas... Evite falar japonês perto das pessoas.

– Isso foi um pouco rude, Noah – Ryan disse. – Eu acho legal.

O mais novo corou.

Ah...

Foi nesse momento em que Ryan pousou a mão no ombro de Sora e puxou Noah pelo pulso.

– Agora temos que ir pra sala do sétimo – exclamou passando por ele. – Vamos, Noah, você está muito lento! É assim que vai competir hoje?

Noah fez um enorme bico.

– Cala a boca...

Eles deixaram Sora Hayashi e então eles foram mais fundo no labirinto de escadas e corredores. Noah ficou feliz por Ryan estar com ele, por que se estivesse sozinho, se perderia facilmente entre aqueles corredores todos iguais, entrando na sala errada a cada virada.

Finalmente Ryan empurrou uma porta de madeira e deu de cara com uma classe inteira em silêncio.

Helena Tyler estava sentada na mesa do professor. Noah ficou paralisado quando ela o encarou por trás daqueles óculos retangulares. Ele poderia até não ter medo da professora e acha-la até bonita se não parecesse estar com raiva o tempo todo.

Ele ouvia dizer que Helena Tyler tinha uma filha, se perguntou que tipo de tratamento doloroso a menina teria. Era assim quando criança, Noah sempre exagerava em tudo mesmo.

A dupla ficou parada na porta por um tempo quando a professora se pronunciou.

– Por quanto tempo pretendem ficar ai parados? – perguntou ela. – Se apressem e sentem-se

Foi como se alguém tivesse dado um choque e os meninos voltaram à ativa. Os outros alunos olhavam de um jeito estranho para eles dois, Noah notou.

Ryan foi se sentar de um lado da sala e Noah do outro, no meio da sala. Ouvia alguns cochichos no caminho e não se sentiu menor por isso. Algumas semanas antes, se alguém tivesse dito-lhe que Ryan Cross se tornaria seu melhor amigo, Noah provavelmente acharia uma piada de muito mau gosto.

Uma vez Noah perguntou a Ryan se ele não se importava em andar com ele. Ryan seria julgado também, as pessoas se afastariam dele, mas o moreno o surpreendeu simplesmente respondendo-lhe:

Está tudo bem – falou. – Não preciso de amigos falsos.

Noah ficou feliz com aquilo, apesar de que em voz alta nunca admitiria.

O resto da manhã passou bastante lentamente para ele. Cada aula parecia durar uma eternidade. O garoto quase não acreditou quando o sinal de saída tocou. Ele estava dormindo na hora então Ryan o acordou mais uma vez naquele dia.

– Vamos! Vamos!

Noah resmungou, Ryan estava realmente elétrico naquele dia.

Eles seguiram até o portão onde encontraram Sora Hayashi novamente. Os três saíram juntos, Ryan a passos longos e apressados deixando Noah e Sora um pouco para trás. O de olhos claros resmungava coisas que Noah não conseguia entender.

Trocou olhares com o japonês ao seu lado, Sora riu e naturalmente Noah o acompanhou – ato que Noah achou estranho mais tarde.

Eles chegaram à entrada do clube do Sr. Porter onde o torneio seria realizado. Havia garotos de outros clubes por perto. Pelo o que Ryan disse, três clubes diferentes iam participar, haveria outros times de revezamento do mesmo clube, portanto era quem venceria e não que clube ganharia.

Noah não avistou Ewan Thompson em lugar algum.

– Vamos aos vestiários – disse Ryan. – Ele pode estar lá.

Eles passaram pelo longo corredor, mas antes de seguir reto na direção dos vestiários, Noah parou o olhar na parede. Um conjunto de fotos das crianças membros do clube. Mas em um canto, um rosto lhe foi bastante familiar.

Um rapaz de cabelos loiro e olhos azuis bastante claros. Suas feições eram fortes. Diferente dos garotos ao seu redor, o menino loiro não demonstrava expressão de felicidade, parecia estar irritado. Ao todo eram quatro garotos, ao lado do loiro, um menino mais alto de cabelos enrolados e negros segurava um troféu. Todos eles tinham medalhas douradas ao redor do pescoço.

– Noah-san? – Sora disse.

– Noah? O que foi? – Ryan perguntava. – Precisamos nos apressar.

– Esse aqui... – Noah colocou o dedo indicador no rosto do menino de olhos claros.

– Hm? – Ryan se aproximou da foto. – Você o conhece? Eu nunca vi esses rostos aqui...

Sim, estava claro.

Noah já tinha visto várias fotos com aquele mesmo rosto, mais novo e mais velho, até mesmo aquela foto.

– É o meu pai. – murmurou Noah.

– Não se parecem – Sora observou.

Ryan abriu um sorriso irônico.

– O que está dizendo? Olhe essa cara de mau. – ele apontou. – São idênticos nisso.

– Ei! – Noah reclamou virando o rosto para o lado.

– Viu só – Ryan cutucou Sora que riu docemente.

Uma cara emburrada já era sua marca registrada, dizia a tia Agnes quando lhe mostrava aquela foto. O que o surpreendeu na verdade era fato daquela foto estar ali. Ele sabia que seu pai havia frequentado um clube de natação. Sabia que seu pai recebia certo destaque e pelas histórias que a tia Agnes contava, a semelhança terminava ai. Na infância seu pai era popular diferente de Noah.

Quando ele falava nisso, tia Agnes bufava e sorria.

Eles têm inveja de você, Noah. Por que você é especial assim como a sua mãe era.

Tia Agnes sempre contava histórias sobre seus pais e Noah sempre adorou ouvir.

– Espere... Essa é a nossa piscina! – Sora exclamou.

Ryan riu.

– Deve ser antes mesmo do Sr. Porter – deduziu animando-se. – Ei, Noah, agora faz sentido o porquê você é tão bom! Está no seu sangue!

– É. – concordou Noah olhando para a foto, o loiro sacudiu a cabeça tentando afastar as lembranças. – Temos que ir agora, a próxima foto vai ser a nossa.

Os meninos assentiram e seguiram em frente até o vestiário.

Diferente do que apontavam as suspeitas, Ewan não estava em lugar nenhum dos vestiários o que deixou Ryan ansioso – para Noah isso significava mais irritante, mas no momento estava preocupado com o estranho frio na barriga que sentia naquele momento nos vestiários.

Os meninos estavam rodeados de armários de metal tingido de azul. Ryan saltitando enquanto tentava em vão parecer confiante, Sora roendo as unhas e olhando para a entrada do vestiário de segundo em segundo e por último Noah Andersen, este com a face voltada para dentro de um dos armários. Ele estava com a toca cobrindo os cabelos cor de palha e os óculos de natação por cima deste. Suas mãos suavam e ele tremia apesar de não estar frio.

– Ele vai vir... Ele não nos deixou na mão – Ryan caminhava de um lado para o outro. – Ele não poderia fazer isso, não é? Noah o venceu, Ewan perdeu a aposta.

– Ryan-san, você fará um buraco no chão. – Sora dizia.

Noah respirou fundo, finalmente fechando o armário com um banque irritante.

– Vamos – disse o loiro. – Não podemos ficar aqui esperando.

Ryan parou.

– Mas o time não pode ficar incompleto – insistiu.

– O que você quer fazer? – perguntou Noah contra-atacando. – Ir embora? Tudo bem, mas eu vou nadar antes de quebrar aquele cara...

O silêncio começou a invadir os vestiários. As outras crianças batendo em retirada enquanto Ryan e Noah se encaravam como em uma conversa muda. Sora cerrou os punhos.

– Eu... - ele gaguejou. – Acho que dessa vez Noah está certo.

– Dessa vez? – repetiu Noah.

Sora ignorou.

– Ainda tem tempo até ele chegar... E se ele não chegar...

– Nós vamos lá e quebramos a cara dele – completou Noah.

O asiático suspirou.

– Ou isso.

Ryan se permitiu sorrir, mesmo nervoso.

– Noah, você é cruel. – comentou.

– Cale a boca – Noah virou o rosto, emburrado.

Os outros dois abafaram risadas e antes que Noah pudesse reagir, ele sentiu uma mão tocando em seu ombro. Sora sorriu para ele.

– Então, vamos nadar?


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Notas finais do capítulo

Capítulo é do tamanho que precisa ser e.e
Sem "mas"...

Helena Tyler, professora de matemática.
Kate Tyler, filha da professora de matemática.
Osteogênese imperfeita, acho que eu posso resumir em ossos frágeis, alongados, curvados... Não sei se é essa a doença que chamam de "Ossos de vidro", mas é algo parecido com isso.
Eu só coloquei asma também, mas a Kate é meio maluquinha das ideias também...

Espero que tenham gostado :3
Próximo capítulo:
— Finalmente o revezamento... Espere, mas onde está Ewan?
— Um pequeno pulo no tempo e sobre a foto do pai de Noah.
— O fim da infância... Ah, eles crescem tão rápido.

Parei .-. isso foi divertido
Beijos Azuis e até!
LOVE
Noah Andersen
Ryan Cross
Sora Hayashi
Ewan Thompson (?)