Nothing Else Matters escrita por Miss Vanderwaal


Capítulo 4
O herói de Emily Fields




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Emily parou em frente ao seu armário no vestiário feminino e tirou os brincos – singelas florzinhas cor-de-rosa que pendiam de suas orelhas – , se preparando para começar o treino de natação.

O relógio de pulso marcava precisamente 3:15 da tarde e a maioria dos alunos de Rosewood Day começava a ir para casa. As meninas não costumavam chegar antes das três e meia para se trocar, e era justamente por isso que Emily gostava de se adiantar. Mesmo que ela soubesse que as garotas não achariam imperfeições significativas se olhassem para ela (a natação era a principal responsável por isso), ela odiava, supremamente, a ideia de ter que ficar nua na frente de qualquer pessoa.

Antes que pudesse colocar as mãos na parte de baixo da regata, para tirá-la, Emily sentiu dois braços musculosos agarrando-lhe forte e desconfortavelmente pela cintura. Em seguida, lábios beijavam a pele de seu pescoço como em uma invasão de privacidade.

Ben.

Assim que sentiu sua presença, Emily ficou surpresa em constatar como Ben raramente ocupava sua mente quando ele de fato não estava com ela.

As pessoas achavam que Ben era o cara com quem Emily devia namorar. Bonito, atlético, parecido com ela, tanto fisicamente – o garoto tinha a pele bronzeada, quase do mesmo tom que a dela, talvez um pouquinho mais clara, e cabelos escuros – quanto psicologicamente – ele era extremamente competitivo e sempre tentava bater os próprios tempos na piscina. Um casal perfeito, sua mãe dizia.

Era como se Emily não precisasse pensar nele ou sentir falta dele. Ele sempre estaria lá, pronto para ela.

Emily tentou se lembrar de como tudo aquilo começara. Ben entrara para Rosewood Day no começo do oitavo ano, e já no primeiro dia de aula, a técnica Lauren o admitira na equipe de natação, o que fora no mínimo estranho. Eles geralmente esperavam algumas semanas depois do começo das aulas para admitir alguém novo na equipe e em tais o aluno fazia os chamados testes físicos. Porém Ben não fizera testes e passara direto. Lauren dissera qualquer coisa a ela sobre ele ter estado em excelentes posições na equipe de sua antiga escola, em Connecticut, mas Emily não se importara, em um primeiro momento.

Ben, desde o primeiro dia, a olhara com olhos que diziam eu quero te devorar. Emily achava aquilo muito... estranho. Ela nunca fora olhada daquela maneira antes e isso a assustava. Mas, ao longo dos meses, tais olhares lhe deram mais autoconfiança e ela pensara por que não? Ela nunca havia namorado antes e estava de fato curiosa, então começou a responder sutilmente algumas das investidas de Ben. E a última coisa da qual ela se lembrava claramente depois disso, era de os dois estarem se beijando avidamente ao pé das arquibancadas da piscina olímpica.

Emily, por muitas vezes, se imaginara observando aquele momento em terceira pessoa. Daria uma boa cena para um filme, até, pensava. Ela se lembrava de tudo em detalhes.

Em um dia, depois das férias de inverno, Ben resolvera surpreendê-la depois de seu treino. Ela já estava seca e vestida, porém resolvera sair pelos fundos do vestiário e passar pela piscina novamente para ir para casa. Ele já esperava por ela. Estavam apenas os dois naquele lugar enorme. A água parada e o cheiro de cloro – que Emily sempre adorara – davam-na uma incrível sensação de calmaria.

Ele andou lentamente até ela e cumprimentou-a, lascivamente, com as mãos em sua cintura. Emily respondera no mesmo tom. Ela sentia que algo estava para acontecer, então o beijo fora bastante previsível. Talvez por isso ela estivesse tão calma.

Foi no mínimo inusual o jeito como tudo ocorrera. Seu coração estava minimamente acelerado e ela mantivera as duas mãos anatomicamente apoiadas no rosto de Ben. Era como se... ela soubesse exatamente o que fazer. Ela respondia aos movimentos dele com cautela, porém ele estava agitado. Emily podia sentir o coração dele batendo descompensadamente.

Ela abrira os olhos quando eles se afastaram e pôde notar que ele era o único que estava realmente ofegante.

Fora uma experiência memorável, de fato, e ela sentira orgulho de si mesma por ter se mantido tão calma. Porém, fora inevitável para Emily não comparar aquele com o dia em que ela beijara Alison. Como era possível que em menos de um ano as coisas mudassem tão drasticamente?

Ela se lembrava também claramente de que não conseguia respirar direito quando os lábios de Ali tocaram delicadamente os seus. O sutil aroma de baunilha que os envolvia era totalmente inebriante, tanto que deixava suas pernas bambas. Emily tinha quase certeza de que não correspondera ao beijo, ou pelo menos não como deveria/queria. Porém tal contato fizera com que uma corrente elétrica percorresse Emily por inteiro. Emily se surpreendeu com o fato de não ter se jogado aos pés de Ali, depois daquilo, implorando-a para que ficasse.

Refletindo sobre isso, agora, com os braços fortes de Ben ao seu redor, parecendo amarrá-la, de certa maneira, Emily concluía que não, ela nunca havia admitido para si mesma estar apaixonada por ele, assim como admitira ter estado por Ali.

Ela colocou as duas mãos sobre os pulsos de Ben, no objetivo de se desvencilhar. Ele agora a apertava ainda mais forte, causando uma leve mas desconfortável pressão em seu estômago.

– Ben – Emily se contorceu sutilmente, conseguindo finalmente ficar de frente para ele, de costas para seu armário – Sabe que não devia estar aqui.

– Ah, qual é? – protestou ele em voz baixa, beijando a clavícula de Emily. Suas mãos ainda na cintura dela.

– É sério – ela olhou nervosamente para a porta do vestiário fechada - , e se a técnica nos flagra aqui?

– Emily, eu sei que ela te conhece há séculos – ele finalmente olhou para ela – Você a chama pelo primeiro nome. Tenho certeza de que ela não vai te dar uma suspensão se te vir tendo um momento a sós com seu namorado. Além do mais – ele mordiscou o lábio inferior de Emily – , eu senti sua falta.

O jeito como Ben mantinha o olhar baixo, nos lábios e no pescoço de Emily, dizia que ele não havia sentido falta dela, mas sim do corpo dela. E, pensando bem, não havia sempre sido assim? Emily nunca conseguira captar um olhar sequer de doçura vindo de Ben. Diferentemente de Ali, de Toby, ou mesmo de qualquer pessoa decente, ele nunca olhara para ela querendo saber o que ela pensava ou sentia.

Concluir tal coisa fez Emily se sentir enojada.

– Ben, por favor, pare com isso – ela tinha as duas mãos sobre os ombros largos de Ben.

– Por quê? – perguntou ele, em uma voz diferenciada, maliciosamente irônica, ela diria – Eu sei que você gosta.

Ben deslizou suas duas mãos espalmadas por debaixo da regata de Emily, pressionando seu corpo contra o dela. Pavor cruzou o rosto de Emily quando o sentiu desabotoar seu sutiã em um movimento rápido. Ela queria simplesmente gritar ou dar um tapa em Ben para que ele parasse, mas estava simplesmente sem reação.

O peso do corpo de Ben contra o seu fez os armários atrás de Emily chacoalharem. Agora ele tinha a mão esquerda sobre a coxa direita de Emily.

Ela engoliu em seco. Evitava de qualquer maneira pensar que ele poderia dirigir a mão direita para o botão da própria calça jeans.

– Por favor – suplicou Emily, a voz quase nula – Se você me ama, não faça isso.

Mas ela sabia da verdade. Era óbvio que ele não a amava.

– Não seja boba – replicou ele, mordiscando sua orelha – Estou fazendo isso justamente porque te amo.

Uma lágrima escapou pelo olho esquerdo de Emily. Em seguida, ela viu uma menina de cabelos molhados sair detrás do vestiário, provavelmente de um dos chuveiros. Ela tinha uma toalha sobre o ombro e headphones vermelhos sobre as orelhas, olhava fixamente para seu celular e não parecia notar nada de estranho ao redor.

Isso não pode estar acontecendo, pensou Emily, tentando se encolher o máximo possível enquanto via a garota se afastar. Não. Não, não, não, não, não, não, não! O mundo parecia chacoalhar diante dela.

– Saia de cima de mim! – gritou, em um último recurso – Eu não quero!

Foi então que alguém fez Ben dar um passo para trás, com uma mão em seu ombro. Emily finalmente conseguiu respirar.

– Ei, cara. Não ouviu a garota dizer que não está a fim?

Era Toby. Graças a Deus!

Assim que Ben se virou para fitá-lo, Emily instantaneamente abotoou novamente seu sutiã.

Ben deu um empurrão com as duas mãos no peito de Toby.

– E quem você pensa que é para se meter nisto aqui?

– Alguém com bom senso – Toby se mostrou impassível, mantendo o equilíbrio – O que você pensava em fazer com ela?

Ben colocou as duas mãos na cintura e soltou uma leve risada, primeiramente com o olhar baixo.

– Eu só acho que isso não diz respeito a você.

– Bem, eu acho que diz – Toby se aproximou cautelosamente, parecendo agora tão enojado quanto Emily – Deus, apenas alguém com o mais alto nível de covardia faria o que você estava prestes a fazer.

Ben levantou o braço direito mas, em um movimento rápido – talvez o mais rápido que Emily já vira – , Toby desviou de seu soco, prendendo firmemente suas mãos nos pulsos de Ben e empurrando-o contra os armários. Emily se afastou, ainda completamente abismada.

O antebraço direito de Toby agora estava pressionado contra o pescoço de Ben.

– Agora me escute bem – Toby proferiu, pausadamente, entre dentes - Eu não quero brigar. Apenas quero... que deixe... a garota... em paz.

Ben não respondeu, apenas debateu-se, tentando se desvencilhar. Toby pressionou ainda mais o antebraço contra o pescoço dele.

– Você não quer que ela te denuncie por estupro, quer?

Ben olhou para Emily, que agora estava quase do outro lado do vestiário. Ele parecia apreensivo.

Estupro.

Tal palavra abriu um buraco no estômago de Emily. Ela cobriu o peito com os dois braços embora ainda estivesse completamente vestida.

Toby soltou-o e Ben ia em direção a porta, sem dizer nada, porém Emily correu até ele, pegando-o pela gola da camisa com as duas mãos. Seus olhos brilhavam devido à tamanha fúria.

– Se você ousar tocar em mim mais uma vez, eu juro por Deus que chamo a polícia.

A mandíbula de Ben estava travada, o que indicava que ele estava furioso também. Porém saiu em silêncio. O som da porta batendo com violência fez as pernas de Emily vacilarem. Ela sentou-se no banco de madeira, no centro do vestiário, e apoiou a cabeça nas mãos, que tremiam.

Toby se sentou ao lado dela.

– Você está bem? Ele chegou a te machucar?

Emily levantou a cabeça, indo de encontro aos olhos de Toby. Grandes olhos de um prateado quase transparente que só mostravam compaixão. Por um momento, ela sentiu que poderia ficar horas contando os cristais que aparentavam existir dentro daqueles olhos.

Ela deixou que a primeira pergunta dele ressoasse em sua mente. Você está bem? Ela não ouvia tal pergunta feita com tamanha sinceridade desde... Alison.

Os olhos de Emily se encheram de lágrimas e ela balançou a cabeça incisivamente, querendo responder não para as duas perguntas. Toby acariciou suas mãos e Emily abruptamente o abraçou.

– Obrigada! – disse ela, deixando que as lágrimas finalmente rolassem – Se não fosse por você, Deus, eu nem sei!

– Não precisa me agradecer – Toby olhava para ela com uma expressão tranquila – Eu estou feliz que você esteja bem. Quer dizer... dentro das circunstâncias.

Emily riu nervosamente e passou uma mão pelo queixo, no qual pendiam algumas lágrimas.

– Se não for abuso, posso pedir mais uma coisa?

– É claro. Qualquer coisa – ele ainda a fitava gentilmente.

Emily ainda se sentia um pouco tonta, a voz saia um tanto fraca.

– Eu tenho treino de natação daqui a – ela olhou seu pequeno e discreto relógio de pulso preto e distinguiu a hora com dificuldade – cinco minutos. Mas eu sinceramente não estou com saco para ficar, então... pode me acompanhar até em casa? Se minha mãe perguntar eu vou simplesmente dizer que alguém da equipe morreu e o treino foi cancelado por motivo de luto. Ei, talvez eu até vá atrás do Ben, mate-o e ela não vai desconfiar – ela olhava para um ponto fixo no chão branco e frio do vestiário. Falava como se o verbo “matar” tivesse perdido todo o seu significado literal.

O jeito sarcástico como Emily falava, como se, do nada, ela tivesse ingerido meia garrafa de vodka, fez Toby dar risada.

– Parece ligeiramente um bom plano.


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Notas finais do capítulo

Eu realmente gostei de escrever este capítulo :)

Despejei nele todo o ódio que tenho do neandertal do Ben!