Beyond two Souls escrita por Arizona


Capítulo 46
Chegada




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Katniss

 

Giro o corpo com dificuldade até alcançar o abajur para acende-lo. A dor na ponta do abdômen me deixa sem ar. Movo-me devagar para em fim sentar na lateral da cama. Respiro fundo tentando me concentrar em qualquer coisa que não seja o apertão no ventre. Minha camiseta está molhada de suor colado no peito. Minha nuca, e rosto também estão suados. Suor que desce frio pela pele.

Depois do que parece ser uma eternidade, a dor diminui, mas não passa. Embora seja o suficiente para eu voltar a respirar. Busco o relógio no criado mudo. 2:47 da manhã. Suspiro esfregando os olhos, levantando para ir ao banheiro.

Com quase nove meses completos, estou me sentindo cada dia mais pesada e exausta. Não que minha barriga esteja enorme, como já vi em outras mulheres. Pelo contraio, é até bem pequena. Minha sogra diz que tenho sorte de só ter engordado aqui na frente.

Passei praticamente a gravidez sozinha, mesmo que a família do meu marido tenha vindo para casa comigo. Desde daquele maldito dia em atirei em Coin, o sacrifício de Peeta para me ver segura custou-me muito caro. Digo custou-me, porquê não há uma única noite em que eu durma em paz. Não há um único dia que eu amanheça sem pensar nele, em como ele está. Não há um só por do sol que eu não morra de saudades.

Ninguém me diz nada sobre ele. Não me dão noticias do que pode acontecer. Haymitch era o único entre nós que tinha contato, mas teve que retornar para seu Distrito de origem assim como os outros Vitoriosos.

Quando ele chegou da Capital, veio me contar que Peeta estava consideravelmente bem. Estava sendo medicado e bem alimentado. Paylor – agora recém eleita presidente – iria fazer de tudo para que assim que puder ser julga-lo, sua pena seja o menos rígida possível.

E assim eu espero, pois já perde o suficiente para uma vida inteira. Tudo o que me restou foi Peeta e a nossa filha como herança desse amor.

Prim se foi tão rápido como viveu. O corpo carbonizado da minha irmã só foi identificado depois de um apelo da minha mãe.

Minha mãe!

Ela foi embora no mesmo dia que enterramos Prim. Deixou uma carta em cima da mesinha onde eu fazia as refeições, e simplesmente partiu como se as palavras em um pedaço de papel fossem o suficiente para amenizar a dor.

Eu também estava sofrendo. Eu precisei mais uma vez do apoio dela, como sabia que ela precisava do meu, mas era mais fácil apenas abandonar.

Gale, meu melhor amigo se tornou uma lembrança amarga. As bombas que matam minha irmã e todas aquelas crianças queimadas vieram dos planos arquitetados por ele.

Para ele, eu priorizei o meu adeus.

Acendo a luz do banheiro, olhando-me no reflexo do espelho. Enrolo os cabelos em um coque, desgrudando-os da pele suada. Abro a torneiro enchendo a mão de água para molhar o rosto. Logo que busco a toalha, novamente sinto a pressão no ventre que me faz tremer dos pés a cabeça.

Agarro o mármore da pia trincando os dentes em agonia, esperando para que a dor finalmente passe. Depois de longos minutos, sinto aliviar um pouco mais.

Decido tomar um banho para tirar o suor do corpo. Ponho a banheira para encher enquanto me livro da camiseta ensopada, retirando com certa dificuldade o shortinho de pano que também uso para dormir, entrando na banheira em seguida.

A água morna relaxa meus músculos quase que instantaneamente. Além das fortes dores, minha bebê está agitada, e ela quase não é assim. Tenho para mim que ela será bem calma, e agradeço por isso. Se por ventura puxasse a mim, eu teria que aprender a lhe dar comigo mesma.

Carinhosamente massageio minha barriga, cantarolando para ela como sempre faço. Gabriel diz que é bom conversar com a bebê para que reconheça nossa voz ao nascer. Ele, sempre que pode, está interagindo com a neta, mesmo que ela ainda esteja dentro de mim.

Minha filha se aquieta em pouco minuto, mas mesmo assim, eu continuo a acaricia-la e cantar para ela. Quando a água já está gelada e meus dedos enrugados, percebo que é hora de sair. Pego a toalha enxugando-me lentamente. Meus olhos começam a pesar de novo de sono, e penso em voltar para cama agora que estou relaxada.

Procuro roupas limpas no closet, achando uma das camisas de Peeta que sempre gosto de vestir por caberem perfeitamente no meu corpo convexo.

Ajeito novamente os lençóis da cama, mas quando estou para resfolgar, uma nova onda de dor sobe pelo meu corpo inteiro. A dor é tanta que minhas pernas fraquejam e eu acabo caindo no chão ao lado da cama.

Grito de sofrimento, segurando com toda força a coberta que consigo alcançar. Minhas pernas tremem mesmos sebásticas pela dor. Tudo piora quando sinto literalmente um balão estourar dentro de mim, e um líquido quente escorrer por entre as coxas, mas não era urina.

Arregalo os olhos percebendo em fim que as malditas dores eram contrações, e minha bolsa acaba de estourar. Assim que essa contração passa, eu me levanto com cuidado para não escorregar no fluido que molhou o chão, procurando o telefono para ligar para os meus sogros.

Inferno!

O aparelho não está no criando mudo como me lembrava. Esforço-me mais um pouco, indo para o corredor em direção a sala. Apoio firmemente no corrimão da escada, temendo ter um contração no meio dos degraus.

Consigo descer bem a tempo de ser atingida por um novo espasmo, mas reúno forças para vencer a dor até chagar ao telefone. Abro as chamas recentes – que não são muitas – discando automaticamente para a casa de Peeta, onde meus sogros agora moram.

Chama uma, duas, três, quatro vezes e nada. Eu já estava a ponto de entrar em desespero quando ouço a voz sonolenta de Sony do outro lado da linha.

— Sony, graças a Deus! Onde está sua mãe?

— Katniss, aconteceu algo? Você e a neném estão bem?

— Eu...eu não sei! Por favor, chame sua mãe.

Ele fica mudo por alguns segundos. Suponho eu que indo chamar minha sogra. Enquanto isso sou atingida por uma nova contração. Respiro fundo lembrando-me dos exercícios de respiração nos livros de bebês que supostamente me ajudaria a contornar a dor.

Após alguns segundos, Nora até que enfim fala comigo.

— Katniss, o que foi?

— A bolsa estou. Eu estou tendo contrações. Nora, eu não sei o que fazer!

— Estou indo. – diz encerrando a ligação.

Sento no sofá para espera-la, mas logo ela, Gabriel, e os meus cuinhados entram pela minha porta sem bater. A polidez agora realmente não é importante.

— Já liguei para o Dr. Ruffalo antes de vim, ele está a caminho. – minha sogra avisa enquanto analisa meu rosto – Sasha, vamos leva-la lá para cima.

Ela pede ao filho mais velho que prontamente me pega no colo para carregar-me até meu quarto.

O doutor Ruffalo foi um dos três medico que vieram da Capital para o Distrito 12, tornando-se o meu médico antes mesmo da primeira consulta, já que ele foi designado pela própria Paylor para cuidar de mim.

Nora me ajeita o mais confortável possível na cama, ponde travesseiros nas costas para me dar poio, acariciando minha barriga enquanto conversa comigo me distraindo da dor.

Meu sogro anda de um lado para o outro no quarto, comendo as unhas nervoso. Uma atitude de também de deixa nervosa. Sony está sentado na poltrona no canto, e não para de balançar as pernas. Sasha está estalando os dedos repetidas vezes desnecessariamente.

Meu sangue começa a subir. As expressões corporais dos três me deixam a flor da pele, a ponto de explodir. E é o que acontece.

— GABRIEL, SASHA, E SONY, TODOS VOCÊS SAIO AGORA ANTES QUE EU ME LEVANTE DAQUI E PONHA CADA UM PARA FORA DESTE QUARTO! E ACREDITEM, NÃO VÃO GOSTAR SE ISSO ACONTECER!

Esbravejo a plenos pulmões assustando os três homens que me olham abismados. Se eles se sentem nervosos por eu está em trabalho que parto, não fazem ideia o quanto eu estou, já que sou eu quem vou parir.

Em poucos segundos, um a um saem correndo o quarto. Bom para eles que me levaram a serio. Nora dá uma pequena gargalhado mesmo essa não sendo a hora propícia. Ela sabe que estou com os nervos explodido, e que qualquer coisa me desequilibraria.

Um bando de homens me deixando mais energizada do que já estou, estavam me enlouquecendo.

Uma enxurrada de contrações vão e voltam, aumentando gradativamente meu grau de aborrecimento a cada grito que solto. Não suportando mais ficar deitada, levanto-me e começo a caminhar pelo quarto em mais uma das minhas tentativas de fazer com que isso pare.

— Deus, por que dói tanto?!

Exclamo já não aquentando mais.

Milagrosamente, depois de uma inextinguibilidade de tempo, o Dr. Ruffalo aparece acompanhado de uma enfermeiro que não sei o nome, trazendo consigo um mala enorme com os equipamentos para o parto.

Ele pede para que minha sogra e a enfermeira troquem os lençóis da cama por outros limpos, enquanto ele se prepara e conversa comigo.

— Eu não sei. Duas, três horas talvez. – afirmo após ele perguntar a quanto tempo estou sentindo contrações – Acordei no meio da noite. Minha bolsa só estourou depois.

— Tudo bem, isso é comum de acontecer. Vamos verificar os sinais vitais do bebê, e ver sua dilatação.

Ruffalo faz um rápido exame de ultra som, certificando-se que tanto a neném, quanto eu estávamos com todos os nossos sistemas funcionando na normalidade. As contrações aumentam de intensidade, diminuindo os intervalos, significando que meu corpo estava pronto para dar a luz.

— Certo, Katniss. Você está com sua dilatação completa, até que foi rápido. Estamos prontos para o parto normal – o Dr. pontua – Agora preciso que você respire fundo e comece a empurra esse bebê.

Concentro-me contando até três, e faço o que ele  manda. Empurro com tudo o que posso a bebê para fora. Minha sogra que permanece fiel ao meu lado, segura minha mãe me incentivando a fazer outra vez.

E outra.

E mais outra.

E mais outro.

Até que eu não consigo mais mensurar o tempo em que estou lutando para que minha filha nasça. Estou desfalecendo, meus músculos doem, e eu não consigo ter forças para continuar empurrando.

Começo a chorar e a apelar ao Dr. Ruffalo para que faça alguma coisa porquê eu não consigo mais. Deixo minhas costas caírem bruscamente contra os travesseiros, clamando que alguém me ajude.

— Por favor! – eu peço – Eu não consigo! Não consigo!

— Katniss, vamos, só mais um pouco. – Nora me pede – Você precisa continuar querida. Você já passou por tantas desgraças na sua vida. Já sofreu tanto. Já batalhou tanto. Sua filha é sua grande alegria no meio de todo esse fogo. Não desista dela agora. Só mais um pouco.

É nessa hora que minha sogra se torna para mim a mulher que minha mãe nunca foi. A alguns anos, eu jamais imaginaria que a mesma mulher que me desprezava por vasculhar seu lixo, se tornaria alguém tão importante, que cuidaria tão bem de mim.

Seu arrependimento e perdão se tornaram tudo o que eu precisava.

Confiando em suas palavras, endireito o corpo me esforçando mais uma vez para expulsar a criança. Agarro os lençóis espremendo com tudo o que tenho a bebê.

Mais alguns minutos se passam e eu continuo tentando, brigando, gritando, chorando, mas nada adianta, eu não dou a luz.

Uma movimentação fora do quarto chama a atenção de todos. Vozes exaltadas como se estivessem brigando podem ser ouvidas. Der repente, a porta do quarto é aberta com força, e um Peeta suado e ofegante se projeta na minha frente.

Ele parece analisar a cena em questão, então percebe o que está havendo. não é necessário nem uma aviso, ou explicação, Peeta simplesmente vem para o lado onde sua mãe não está, segurando firme a minha mão.

— Eu estou aqui. – ele diz me encarando nos olhos – Sempre estarei.

Ele não faz ideia do que provoca em mim dizendo aquilo.

Assimilo o que acaba de me falar, e transformo tudo aquilo em combustível. Recolho todo ar que consigo dentro dos pulmões. Minha mão contra a dele, recebendo a plenitude em seus olhos de que eu não preciso temer.

Minha filha desde que era do tamanho que um grão de arroz, luta para sobreviver, e para nascer. E assim como ela, eu não vou desistir que isso aconteça.

Faça força e solto um grito com o folego que ainda me resta.

Folego que entra nos pulmões da minha filha, forte, dolorido, e vital. Preenchendo o ambiente com seu choro. Inundando nossos corações de felicidade.

 

Continua...


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Notas finais do capítulo

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