Por Verônica

Ainda pensava na minha última conversa com Jonas... Jonas! Jonas! Jonas! Eu não parava de pensar nele. Nem me reconhecia. Ele era casado, não podia me deixar envolver, era tão errado... Mas ele era um homem fascinante em todos os sentidos, eu estava deslumbrada, e Jonas sempre agia de modo sedutor comigo, parecia tão interessado. O certo seria me afastar, mas toda vez que tentava, algo nos aproximava, principalmente o fato da minha carreira depender dele. Por causa de Jonas Marra, eu começava a ser reconhecida como jornalista, até tinha recebido um novo aumento.

E como a vida gostava de brincar comigo. Havia mais essa nos aproximando, o meu Vicente tinha se classificado para o “Geração Brasil”. Pelo o que soubera, todos os candidatos morariam alguns dias na Marra, seria no período de férias, mas não estava tão certa que um menino, um menino de apenas 14 anos devia e podia ficar longe de casa durante tanto tempo... Meu filho era só um garoto, não seria seguro e se ele precisasse de mim? Sem contar que os outros candidatos poderiam querer prejudicá-lo por ser tão jovem. O que deu na cabeça de Jonas Marra quando colocou a idade mínima de 14 anos para um concurso que poderia se tornar algo selvagem? Minha imaginação corria solta e eu pensava em cada coisa horrível. Precisava me acalmar.

Também tinha algo além disso que ainda me deixava encucada. A insinuação de Jonas sobre minha família está lhe causando problemas. Será que referia apenas à entrada do Vicente? O fato de ele me conhecer, seria um problema grande assim? Ele disse que havia mais... E minha intuição me dizia que era verdade, por isso, cheguei em casa, ansiosa para descobrir. Ao abrir a porta escutei uma conversa entre Davi e Vicente:

– Não vou participar do concurso– Davi falou.

– Davi, você conseguiu o mais difícil, e agora que Golias entrou não acredito que vai amarelar ...- meu filho argumentou.

– Só coloquei o nome de Golias lá para mostrar que eu podia – Davi continuou.

Meus ouvidos não podiam acreditar no que escutava... Não consegui me conter e interrompi a conversa dos dois:

– Golias? Davi, você é o Golias?

– Ve-rô-ni-ca- ele gaguejava, mas depois assumiu com voz firme – Sim, eu sou o Golias.

– E você me diz assim? – estava tendo um ataque de “mãe”, e talvez também me sentisse desgostosa por ser a última a saber- Não pensava isso de você, Davi... Que fazia essas coisas... que invadia sistemas, que ficava arrumando encrenca por isso. E agora entendi aquele vídeo do Golias, a desmoralização de Jonas Marra era uma vingança por ele ter apresentado a palestra no seu lugar!

– Eu não falei nenhuma mentira! –ele disse acima do seu tom.

– Mas foi uma atitude infantil com uma motivação mesquinha e penso que até escolheu o alvo errado. Jonas nem sabia que tiraram a sua palestra. Se quisesse atingir alguém, mirasse os organizadores da Tecnow, esses sim agiram de maneira errada com você.

– Já vai você defender Jonas Marra de novo. Agora só fala nele. É Jonas Marra aquilo. Jonas Marra isso. Por tudo que ele já fez, ele mereceu aquele vídeo... ahhh... Mais uma que caiu de amores por ele nessa casa. Esse homem é um manipulador, Verônica. Você não sabe ... – ele estava nervoso, e quando escutei as palavras “caiu de amores”, senti certa culpa, de uma maneira, meu irmão tinha razão, eu sentia algo diferente por Jonas e talvez já estivesse demonstrando isso para a minha família.

– Jonas é sim um homem fascinante, Davi – admiti – Mas sei que ele não é nenhum santo. Só não me agrada, você agir assim. Não esperava isso de você, meu irmão. Foi errado da sua parte, a sua motivação, e também você se arriscou muito por uma bobagem. Sei que se quisessem podiam te perseguir, quem sabe até abrir um processo na justiça.

– Fica calma, Verônica. Eu nem vou participar do concurso.

– Agora que já fez tudo isso, devia participar! Mostrar a sua cara, falar das suas ideias. Seria uma atitude corajosa, e não algo escondido e covarde como a sua ação anterior- encerrei muito nervosa e fui para o meu quarto, eu tinha passado dos limites, a verdade é que eu não era mãe do Davi e nem deveria ter discutido assim com ele na frente do Vicente.

Algum tempo depois, eu ainda estava no quarto quando Davi apareceu, ele carregava um prato com um sanduiche e um copo de suco:

– Achei que você podia estar com fome – Davi ostentava um sorriso amarelo no rosto.

– Você sabe, eu sempre estou com fome – sorri e ele veio até a mim mais aliviado.

Ele colocou o prato em cima da cama, e eu o abracei:

– Estava pensando quem ia roer a corda primeiro! – falei durante o abraço – Eu detesto ficar brigada com você, Davi. Me desculpa, eu exagerei! Não tinha o direito de fazer isso, nem discutir na frente do Vicente... Só fiquei preocupada, e tem tanta coisa na minha cabeça ultimamente. Até mesmo o fato do meu filho entrar nesse concurso – terminei olhando nos olhos do meu irmão.

– Verônica, eu entendo... E você tem esse direito sim. Depois que nossa mãe e nosso pai morreram, meio que você se tornou a matriarca da família. Pode dar broncas em mim, ainda mais quando mereço.

– Matriarca? Assim você me faz sentir uma idosa!- brinquei.

– O que eu posso fazer se você é a minha irmã mais velha – ele zombou.

– Um pouco mais velha!

– Mais de 10 anos mais velha.

– Não fala em números... – sorri- senão você acaba comigo, Davi! – comecei a atacar o sanduiche que ele trouxera – Hum, está uma delícia!

– Novidade!- ele disse irônico.

– Convencido – o cutuquei.

– Você gosta e come qualquer coisa, Verônica! Até uma pedra seria deliciosa para você.... Hum, que delícia de rocha- ele afinou a voz me imitando, sorriu, mas voltou a falar num tom mais sério – Eu não sinto orgulho daquele vídeo. Na verdade, Jonas Marra representa tudo o que eu sou contra, e acho que merecia...Mas você tem razão, eu não agi da maneira correta, meus motivos... Era para ter sido na Tecnow e depois do ataque me senti tão desconfortável. Talvez por que sei que “Seu Vicente” não me apoiaria. – ele se referiu a nosso pai.

– Nem “Dona Heloísa”- referi a nossa mãe, e dei mais uma mordida no sanduiche.

– Claro, ela também. Falando em família, o que você acha da participação do Vicente?

– Não sei, Davi. Ele é muito menino.

– Vicente é o garoto mais maduro que eu conheço. Vai se da bem...

–Talvez ele não devesse ir.

– Se você não deixar. Ele nunca te perdoará, Verônica. É uma chance incrível para ele.

– Eu sei... Vou ter que deixar, senão ... – coloquei a mão no rosto, não me sentia bem com isso, mas não havia alternativa. Continuei pensando, tomei um gole do suco e voltei a falar – Sabe que eu vou me sentir mais segura com você lá.

– Mas eu não vou.

– É claro que vai. É uma chance incrível, Davi. – sorri, usava as mesmas palavras que ele.

– Duvido que Jonas permita a participação de Golias. E não quero desiludir o Vicente, mas é um jogo de cartas marcadas. Até a patricinha mimada e prepotente da filha dele vai participar... Quem será que vai ganhar? Para mim é óbvio.

– Tenho certeza que Jonas vai permitir, ele até já sabe que você é o Golias. Você se engana ao achar que o conhece.... Não penso que as coisas estão decididas, Davi, Jonas está possesso com a participação da filha.

– É tudo fingimento.

– Não... Ele tem um argumento muito bom, Jonas Marra não é burro, a filha não seria uma boa sucessora, não tem as habilidades necessárias, mas se ele realmente a quisesse a frente da Marra, como maior acionista, era só colocar, não precisava do concurso, desse espetáculo todo, nem voltar ao Brasil. Parece que Megan Lilly entrou só para provocá-lo.

– Não sei...

– Mas de qualquer forma, pense. Mesmo não ganhando, participar do “Geração Brasil” poderá te ajudar bastante, até mesmo em relação ao Junior.

– Eu sei...

– Davi – estava pensando em algo - Já que é inevitável, e todos logo saberão a identidade do Golias, mas não sabem ainda... Será que .... Eu poderia colocar isso numa matéria?

– Claro, Verônica, você não pode perder esse furo! – ele disse sorridente.

Pouco depois, eu escrevi sobre aquele dia na Marra usando todas as informações confidencias que possuía, e publiquei a matéria logo em seguida. O fato de estar tão perto de Jonas Marra era um problema constante para os meus sentimentos e minhas ações, pois muitas vezes agia como outra pessoa, mas por outro lado, era sensacional para a minha carreira, pois eu já ganhara e ainda ia ganhar muitos pontos com a minha chefe, além de respeito e da repercussão do meu nome como jornalista.

Por Jonas

Fazia muitos anos que eu não entrava naquela casa. Tinha tantas lembranças algumas boas e muitas ruins... Mas travei qualquer tipo de sentimento, não podia me lembrar ou sentir, se alguém me visse abalado, principalmente ela, as coisas se complicariam para mim. Queria ser curto e grosso. Eu tinha um objetivo e tentava alcançá-lo:

– O bom filho a casa ... – falou D. Gláucia Beatriz cheia de ironia e a interrompi.

– Bom, não... Ruim... Muito ruim. E o que eu vim falar não vai agradar a senhora.

– Não seja mesquinho, filho. Eu posso...

– Dona Gláucia, Vou ser direto! A senhora me ameaçou, mas esse é um jogo de quem pode mais, quem é mais perigoso. Eu sou Jonas Marra e a senhora é quem?- falei com desprezo- Não tem ideia do que eu posso fazer! Eu sei que a senhora ainda frequenta as lojas e sempre sai com uma “lembrancinha” sem pagar, o que me diria se alguém a colocasse na cadeia por isso? Boa parte do dinheiro que mantém essa casa é meu! Se eu quiser, num estalar de dedos, ele acaba, além da pensão do papai, e de qualquer economia que o Sílvio ou a senhora possui. Vocês ficariam sem dinheiro para nada... Se chegar perto da minha família ou dos jornalistas, espere o meu contra-ataque, ele vai ser no nível de Jonas Marra e não no de Gláucia Beatriz!

– Você não teria coragem ... – ela parecia preocupada.

– Não teria? Fique satisfeita que eu vou permitir a sua neta no concurso, poderia excluí-la agora. Talvez com ela no “Geração Brasil”, a senhora consiga aumentar os seus “ganhos”, aposto que não vai se fazer de rogada em explorá-la. Posso dificultar as coisas para Danusa, mas a tratarei como qualquer outro candidato.

– Por ser sua sobrinha ela devia ter uma vantagem... Ou essa vai toda para sua filhinha loira?

– Vantagem? – preferi ignorar a menção a Megan - Tô sendo generoso demais em permitir que Danusa participe. Fique satisfeita com isso, pois se a senhora aprontar, as coisas serão bem difíceis para ela e para a senhora, é claro. –disse em tom de ameaça.

Saí daquele lugar, mas não do prédio, na verdade continuei no mesmo andar. Fui para o lado oposto do corredor que me lembrava um Z e por isso não dava para ser visto diretamente do apartamento dos meus parentes “renegados”... Ainda tinha que me encontrar com mais uma pessoa.

Por Davi

Já eram mais de 10 horas da manhã, eu havia perdido a hora. Também com tudo que acontecia, fora difícil pegar no sono na noite anterior. Assim me levantei, bêbado de sono. E quase me arrastando em pé, passei pela sala, em direção à cozinha, quando o vi sentado no sofá como se fosse a coisa mais natural do mundo. Esfreguei os meus olhos, talvez ainda estivesse dormindo, e aquilo fosse um sonho. Jonas Marra não podia estar na minha casa!

– Então, você é Davi Monteiro, irmão da Verônica, e por um jogo do destino o grande Golias. – escutei a voz dele.

– Jonas Marra!!! Mas não trocarei o elogio, não acho que você seja nada grande – aquilo me “acordou”, me sentei à frente dele, ainda me recuperava do susto, mas tentei demonstrar naturalidade.

– Eu imaginei... Afinal você me detesta, não é? Não me conhece, mas me detesta! Estou curioso, por que você me detesta tanto? - ele ria, devia ser para me provocar.

– Você é um empresário ambicioso e inescrupuloso...

– O que há de errado em ser ambicioso? Se não fosse a humanidade querendo mais, creio que ainda viveríamos nas cavernas e nem o fogo...

– Você tem tanto e poderia fazer tanto pelo mundo, ajudar as pessoas, mas só as explora e destrói quem tenta ajudar ...

– Aí eu não concordo com você. Eu já ajudei muita gente, a Marra ajuda muita gente. O fato de cobrar ...- ele disse de maneira calma.

– Você não vai me convencer – comentei- Eu não vou te convencer. Então vamos ao que interessa...

– Parece que você tirou as palavras da minha boca, adoro ir direto ao ponto – ele me interrompeu, e não sei, havia algo no seu jeito que me irritava, queria confrontá-lo, mas também existia algo além que me dava vontade de ouvi-lo.

– O que você veio fazer aqui? Quer me convencer a sair do concurso? – continuei.

– Por incrível que pareça não, Davi. Eu quero o Golias no “Geração Brasil”- aquilo me surpreendeu.- Acho que você tem muito a agregar a Marra, e a Marra tem muito a agregar a você. Claro que haverá regras, você terá que concordar com elas, assinar um contrato!

– Sabia que haveria um mas. – estava bom demais para ser verdade.

– Todos terão que assinar o mesmo contrato, e o fato de eu estar aqui pessoalmente, te explicando tudo e tentando te convencer, pode ser considerado uma preferência indevida, espero que ninguém saiba que eu passei aqui.

– Estou entendendo. Você quer controlar tudo, e conhecer seu opositor... –sorri irônico- A preferência indevida é por sua filha, não me engane.

– Acredite, todos terão a mesma chance, não tenho preferência por Megan, ao contrário... Tudo vai ser televisionado e documentado... Haverá transparência e quem quiser poderá ver todas as informações no próprio site da Marra... Quanto ao controle, quero sim. É assim que se fazem concursos, senão a coisa desanda... Davi, percebi que você é um jovem idealista. E se quer mesmo ser ouvido, se quer mesmo mudar o mundo... Aparecer na televisão, ter nas suas mãos uma empresa como a Marra de alcance mundial, a possibilidade de mudá-la e ao resto do planeta, é uma chance incrível. Talvez você seja avesso a regras rígidas, mas o concurso é o primeiro passo para essa oportunidade. Vou deixar os documentos aí. Você só precisa assiná-los e enviá-los para a Marra.

Por Megan

Eu lia os termos do “Geração Brasil”, Murphy havia me entregado o contrato que eu deveria assinar para participar. Era cheio de regras so boring ( para mim regra era chata só por ser regra, detestava ter que me submeter a elas). Nós seríamos filmados o tempo todo (a não ser no banho), seja por câmeras fixas ou em drones, e fugir delas, estragá-las, a tentativa de ludibriar, alterar as câmeras ou suas imagens, poderia trazer punições “drásticas” como a expulsão do concurso (claro que não era mandatório, já que cada caso seria analisado). O contato não autorizado com gente de fora também poderia ocasionar isso (não usaríamos os nossos próprios celulares, tablets ou notebooks, a Marra nos forneceria todo material necessário). Ahh, meu Dad, achava que isso iria me segurar, mas ele estava muito enganado.

Até havia uma norma especial, uma que imaginei que meu dad fizera especialmente para mim, provavelmente para evitar que eu seduzisse qualquer candidato ou funcionário da Marra. Era proibido qualquer relacionamento amoroso durante o concurso, seja entre candidatos ou com a equipe de apoio. Beijos, abraços, carícias, sexo não eram permitidos e como a outra regra, poderia desclassificar o candidato ou candidatos... Ri enquanto lia, nisso aquele concurso era diferente do “Big Brother”.

A verdade é que tal regra poderia ter me deixado a little bit worried antes. Não entrei no concurso com a intenção de me esfregar em ninguém, mas considerando as minhas conversas no chat com Golias, talvez eu desenvolvesse uma quedinha por ele. Ele era so sweet. Só que descobrira pela internet que ele era aquele asshole, aquele nerdizinho que eu achara cute, mas que se mostrara um verdadeiro Shrek ( de do mal) ao brigar comigo na Marra. Como o Golias podia ser legal no chat e um otário pessoalmente? Dessa forma, isso já não me preocupava nem um pouco.

Por Davi

Já havia anoitecido quando eu finalmente decidi ler os papeis que Jonas Marra deixara em minha casa. Tinha escutado tanta coisa desde que Golias entrara no concurso, e achava que já estava na hora de tomar a minha decisão definitiva. Verônica, Vicente e até o dono da Marra queriam que eu participasse. Só mesmo Herval fora contra. Eu o entendia, ele achava que a experiência na Marra e com Jonas poderia me mudar. Mas sabia que não era influenciável a esse ponto, eu tinha as minhas próprias ideias e personalidade. Se entrasse naquele concurso, continuaria sendo o mesmo Davi Monteiro.

Li as regras, elas eram muitas, e algumas me chamaram a atenção, como a proibição de relacionamentos amorosos, como se meu propósito ao entrar fosse arrumar uma transa, claro que eu tinha os meus desejos e poderia ser tentado... Mas quem iria me tentar? Me lembrei de Megan Lilly, ela era linda, e eu me sentira atraído por ela na inauguração da Marra, mas ela se mostrara uma patricinha insuportável e com certeza já não teria o mesmo poder sobre mim...

Havia outras normas, os candidatos poderiam discutir entre si, mas não ultrapassar disso, levando a uma agressão física, ou uma briga. Se acontecesse, ambos poderiam ser expulsos... Boicotar outro candidato ou atrapalhar de propósito também era motivo para ocasionar uma desclassificação... E claro havia uma regra especial para o Golias, invadir o sistema da Marra ou de qualquer outro lugar não era permitido a menos se fizesse parte de uma prova.

Ainda não sabia se estava agindo da maneira correta, mas no final da noite comecei a assinar os documentos. É, Golias, ou melhor, Davi Monteiro ia participar mesmo do “Geração Brasil”.