Dois anos após a primeira e bem-sucedida confraternização com os Harunos, o patriarca Uchiha desfrutava calmamente de mais um lacônico café da manhã ao lado de sua família. Sua esposa estava quieta, como de costume, comia calada e com seu semblante de sempre no rosto. Mikoto, apesar de extremamente forte, não possuía voz.

Enquanto isso, os três Uchihas mais novos haviam acabado de chegar à sala. Madara, Itachi e, por fim, o jovem moreno de 17 anos, Sasuke Uchiha. Itachi era o irmão mais velho e sucessor da empresa. Tinha a personalidade da mãe, felizmente, mas era igualmente recluso. Já Madara não era um dos mais queridos da família. Por pura conveniência, estava passando alguns dias na residência de seus primos. Possuía um sorriso irônico nos lábios, o que não era apenas o gesto característico do sexo masculino de sua família. Ele era o ovelha-negra.

“A viagem está marcada para hoje, não é mesmo?" Perguntou com falso interesse, apenas para dar o ar da graça de iniciar uma conversa naquela monótona manhã de sábado.

"Sim, Madara. Você sabe disso" A voz ríspida e autoritária de Fugaku soou, ao mesmo tempo que o homem repousou seus talheres sobre o prato. Iria começar o falatório. "Foi até bom ter tocado no assunto, pois preciso esclarecer algumas coisas, principalmente a você, Sasuke"

O mais novo parou de comer e encarou um pai com a impaciência já crescente em seu olhar. Sabia o que estava por vir.

"Sim?" Sasuke respondeu com uma voz ligeiramente cansada, repousando os talheres no prato assim como o pai fez,

"Enquanto eu e sua mãe estivermos fora, seu irmão cuidará de você e Madara, mesmo seu primo sendo maior de idade. Algo em comum entre vocês dois é o fato de que a cabeça de ambos parece não estar no lugar, ainda” Madara suspirou alto, evidenciando sua insatisfação com o comentário do tio. No entanto, o seu ‘ainda’, pareceu para Sasuke, uma singela indireta. Indireta essa que possuía um significando ofuscado, de que tudo iria piorar a partir daquele dia. “Portanto, eu preciso de um responsável" Fugaku retomou sua fala após a zombaria de seu sobrinho. “De acordo, Itachi?”

Itachi apenas confirmou com sua cabeça. Fugaku voltou a falar.

“ Não quero que nenhum dos três convidem pessoas de modo desnecessário para esta casa. Teremos uma hóspede e eu não quero que essa pessoa se sinta desconfortável na nossa residência. Também necessito que vocês dois, nesse caso tendo Sasuke como prioridade, cheguem em casa até ás dez horas da noite. Depois disso, eu serei avisado. Nada de bebida, fumo...”

"Chegue logo ao ponto, Fugaku" Sasuke murmurou, impaciente. Toda essa conversa do pai possuía um objetivo.

"Sua noiva ficará alguns dias aqui, conosco. Inclusive, ela já deve estar a caminho de Konoha.”

Um breve silêncio se instalou na sala, e a surpresa tomou conta até mesmo do rosto de Mikoto, que obviamente não estava sabendo das intenções do marido. Ela sempre estava lá, consentindo, submissa. De qualquer forma, sentia-se culpada, pois seu filho mais novo recebeu a notícia como um rápido e doloroso soco no estômago, tendo que recuperar o fôlego para pronunciar algo em resposta.

" O quê?"

"A senhorita Uzumaki passará algum tempo aqui. Ela é sua noiva apesar de tudo, faça as coisas ficarem mais fáceis."

" Você enlouqueceu?" O moreno levantou mais um pouco seu tom se voz, adquirindo um semblante de raiva em seu rosto.

"Sasuke, por favor. Seu pai, ele só quer seu bem" Mikoto tentou, calmamente, mas Sasuke não ligava mais.

"Meu bem? Eu não quero ter que me casar com alguém que mal conheço. Imagine o infortúnio para mim e para a garota! Eu tenho 17 anos, pelo amor de Deus. Primeiro o anel.... Você é doente, Fugaku!"

"Sasuke!" O patriarca levantou-se, batendo a mão com força na mesa à sua frente. "O que eu digo nessa casa é lei. E você obedecerá." Um breve silêncio persistiu. A respiração pesada de Sasuke era audível.

"Não se preocupe, Fugaku. Eu cuido do moleque e dos ‘pombinhos’ ” Madara resolveu se pronunciar, o que não foi sua melhor decisão desde que chegara à mansão. "Provavelmente ele quer fugir para a doentinha, a filha única dos Harunos. Mas não vai conseguir...”

Sasuke levantou-se abruptamente, direcionando um forte e impulsivo soco em direção a Madara, que por sua vez, desviou a tempo, dando uma cotovelada no rosto do mais novo.

"Nervosinho, Sasuke?" O sorriso maléfico novamente surgiu em seus lábios "Ela é até gostosa, mas não precisa de tanto. ”

O impacto do grande corpo pertencente ao moreno mais velho na parede mais próxima levou a um grunhido de dor vindo de seus lábios. Sasuke possuía uma única mão envolta de seu colarinho, puxando-o para cima com uma força incontrolável. O corpo de Madara estava espremido contra a parede. Os olhos arregalados, a gola apertando em seu pescoço e um jovem furioso encarando-o de volta.

“No dia em que você repetir ou sequer ousar falar dela dessa maneira, eu juro, Madara, que dessa casa você sai no mesmo segundo” O mais velho quase esboçou mais um de seus ‘sorrisos’, mas, pela primeira vez, se assustou com o tom do primo “E sairá em condições não muito boas. ”

[...]

Com uma rapidez quase que desesperada, Sasuke guardava alguns pares de roupa, itens de higiene e outras coisas necessárias que estavam indo à sua mente após a recente ligação deixada por uma certa menina, sua menina. A velha mochila estava sendo preparada para uma fuga, uma fuga de todos os problemas e preocupações que rondavam aquela casa.

Sem que ele percebesse, Mikoto entrou no quarto com um olhar preocupado em seu rosto. Tomou as mãos inquietas do filho, que denotavam o nervosismo ainda presente em seu corpo, e olhou-o bem nos olhos.

“Sasuke, meu amor...” Ele parou por um momento, prestando atenção na mãe que tanto carecia de sua atenção naquele momento. “O que você está fazendo, filho? ”

“Eu preciso vê-la, mãe. Ela me ligou, ela precisa de mim” O moreno falou com convicção. Assim que chegou ao quarto após a discussão com Madara, recebeu um telefonema da rosada que tanto ocupada sua mente. Ela parecia desolada, cansada, quase a ponto do desespero, e não falou o porquê. Seu maior anjo precisava de ajuda.

“Sasuke, me escute, por favor.” Mikoto segurou com mais firmeza as mãos frias do filho, ele estava suando por tanto nervosismo. “Eu estou lutando, filho. Eu sei o quanto você ama a Sakura, sei como ela tem o ajudado.... Mas está cada vez mais difícil. Seu pai, ele... Ele não se controla ás vezes. Simplesmente perde a cabeça. É algo que eu não consigo suportar mais, Sasuke.” Lágrimas chegaram aos seus olhos no término de sua frase. Os hematomas doíam por baixo do fino casaco que cobriam a pele ferida de Mikoto. Seu marido era violento, deliberadamente.

As crianças recebiam punições desde pequenas, desde tapas simples até surras, por isso, Sasuke repudiava qualquer tipo de agressão desnecessária. E por mais que seu gênio falasse mais alto, ele nunca seria capaz de agredir alguém incapaz, que não possui culpa. Ao contrário de Fugaku, que não conservava a piedade ou a empatia em seu coração. Era autoritário, controlador. Mal sabia o mais novo que a situação iria se repetir em poucos anos, e ele não poderia impedir.

“Mãe... Ele tem feito isso com você? De novo? Deixe-me ver! ” A matriarca afastou-se do filho, limpando qualquer lágrima restante do seu rosto com a manga de seu casaco e recuperou o fôlego:

“Não se preocupe comigo agora, Sasuke...” Levou as mãos ao peito, em um movimento de defesa afastando-se do filho, e logo enrolou mais uma vez o casaco ao seu corpo. Tinha de ser forte o suficiente e sincera com seu filho, não queria vê-lo sofrer. “Fique mais um pouco em casa, por favor, pelo menos até todos irem dormir, assim você não será pego por ninguém. Após isso, fuja, fique ao lado dela enquanto pode, meu filho, pois estou certa que seu pai adiantará o casamento. ”