Avatar: A Lenda de Yan escrita por Leonardo Pimentel


Capítulo 15
A Invasão da Areia


Notas iniciais do capítulo

Taabar seu canalha, filho da mãe!



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O som de estática é o único que preenche todo o andar de baixo. Sei que estou tremendo, pois sinto minhas mãos sem controle, suando frias, o medo tomando conta de mim, como um vento frio que sai de dentro para fora. A voz de Jaya ecoa em minha mente, avisando-me, desafiando-me a enfrentá-lo. “Avatar, você e seus amigos lutaram bravamente... Enfrente-me.” A imagem de Aang sendo apunhalado pela estaca de gelo marcam minhas retinas e eu cambaleio para trás, assustado. Azsa dá um grito agudo, estendendo a mão para mim. Recuo.

─ Yan! ─ fala Hora, transtornada. ─ Por favor, acalme-se.

Recuo, como um animal amedrontado. Saofu se ergue da cadeira, indo na minha direção. Olho para ele, assustado e ergo-me veloz, correndo na direção da porta. Ela se escancara, e entro na escuridão da noite, correndo nas folhas molhadas, estendidas pelo caminho. Os olhos estão fechados, guio-me pelas vibrações da terra. Os sons da cidade morrem atrás de mim, abafados. Minha respiração fica diferente, mais veloz e pesada e o ar frio da noite pesa dentro de meus pulmões. O cheiro de pinheiros e eucaliptos preenche o ar. Esbarro num tronco de árvore.

Abro meus olhos.

Honre o sacrifício deles, tolo Avatar.

A unidade dos Avatares vai ruir.

Olho ao meu redor. As árvores formam sombras escuras, dançantes ao meu redor, conforme o vento sopra em todas as direções. Estou na floresta, atrás da casa de Hora e sei que estou distante o suficiente, pois nenhum som e nenhuma luz são capazes de serem ouvidos ou vistos dali. Encosto minha mão no tronco de um grosso pinheiro. Parece que consigo senti-lo respirar e vibrar na terra. Balanço a cabeça. O medo não é tão grande agora, como o cansaço é, mas eu temo.

Ouço um barulho: farfalhar de folhas. Quando ergo meu olhar pelo mesmo caminho que vim, acendo uma labareda de fogo na palma da mão. Há uma bola de pelos dourados e brancos, parada, me encarando com olhos azuis desbotados, como quem está querendo entender. É o gato-coelho que fugiu conosco da Cidade da República. Olho um instante para ele, balanço a mão, fazendo o fogo se dissipar no ar. E o gato-coelho segue na minha direção, andando rebolando, preguiçosamente, como se estivesse me testando, avaliando se sou ou não ameaçador. Sorrio levemente.

Procuro alguns gravetos mais secos e os arrumo como Saofu me ensinou, para montar uma fogueira. Se fosse antigamente, eu iria acender, esfregando pau em pau. Mas agora acendo com o fogo da dobra. Em pouco instantes a pilha de madeira crepita com vivacidade, iluminando o pequeno espaço na floresta o qual escolhi como esconderijo. Movo a mão com suavidade e a pouca água que umedece o chão se desprende. Lanço-a com outro movimento para o lado oposto de fogueira e sento. O gato-coelho corre e se acomoda em meu colo, ronronando alto. Acaricio seus pelos.

─ Qual seu nome, pequeno? ─ pergunto, dando um espaço de tempo, imaginando que a criaturinha fosse responder. Sorrio. ─ Que acha de Floco de Neve?

O gato-coelho miou, como se eu houvesse pisado em sua patinha. Dei risada.

─ Snowball?

Ele miou novamente, dessa vez ameaçando enterrar as unhas afiadas em minha mão. Sorri brevemente.

─ Ok, ok, calma ai... ─ parei por um instante, pensei, pensei e por fim disse. ─ Gisau. O que acha de Gisau?

O gato-coelho ergueu o olhar demoradamente, como se estivéssemos mergulhados numa conversa um tanto quanto séria. Por fim ele ronronou alto e deitou a cabeça sobre a patinha direita e não se moveu mais, talvez satisfeito com o nome. Gisau. Sorri brevemente, grato pela companhia dele.

─ Gisau, agora você me ajuda: O que eu faço?

Os dias na ilha parecem passar rápidos demais, e Hora me explicou que essa sensação tinha um fundo de verdade, graças à localização da ilha. Conforme os dias passaram, deixe-me confiar em Hora e ela me deu aulas de História Local, explicando a vida da Kyoshi logo após ela fundar a ilha. Explicou as cerimônias que existiam até hoje e que eram obrigatórias em homenagem à fundadora e padroeira da Ilha. E eu não me entediava; poderia passar o resto da minha vida enaltecendo Kyoshi, minha inspiradora. Não seria maçante. Ainda mais eu, que já a vi pessoalmente e a tinha dentro de mim. Sorria toda vez, que Hora mencionava Kyoshi e os olhos brilhavam de orgulho e paixão.

Hora me levava para o centro da Ilha, onde eu aprendi o comércio local e os produtos que eram feitos na ilha, nas pequenas casas ao leste, como os próprios famosos doces que eram feitos manualmente e enviados para o mundo todo. Aprendi sobre economia, manufatura, agricultura avançada e por fim, quando todos os assuntos haviam acabado, Hora me fez uma pergunta. Estávamos no centro da ilha, afastados dos comerciantes que estavam amando conversar comigo. Ela tocou meu ombro. Seus anéis de madeira cintilavam na luz do sol do meio dia, a túnica verde e leve ondulava preguiçosamente ao vento. Gisau a fitou.

─ Yan, você sabe que seus amigos estão sofrendo, não sabe? ─ Hora sabia o que estava acontecendo conosco. Afinal de contas era evidente que eu não trocava uma palavra com nenhum deles, há quase três semanas. ─ Azsa sofre todos os dias, querido. Você não pode deixar-se dominar pelo medo que Jaya quer impor em você.

─ Desculpe Hora. ─ digo, assustado com a dor em minha própria voz. ─ Mas creio que eu saiba o que eu estou fazendo.

A culpa decaiu sobre mim como uma onda fria, depois que as palavras abandonaram minha boca. Hora mudou de expressão no mesmo instante, num segundo: de seriedade para tristeza pura. Aquilo pareceu um tapa na minha cara. Suspirei lentamente, virei as costas e caminhei na direção da floresta, deixando Hora para trás. Eu tenho consciência de que Gisau me segue, pois ele é tagarela, mexendo com os pássaros pousados no pátio da praça, roçando nas pernas de alguns cidadãos da ilha.

A caminha é curta, agora que já tenho noção do caminho. Sempre treino todos os dias na mesma clareira, meditando, dobra de água e aperfeiçoando algumas técnicas de dobra de terra. Se você está se perguntando a respeito de alguma subdobra, desculpe, eu não possuo habilidade em nenhuma. E isso me frustra, de verdade, afinal de contas, eu sei tão bem da história de Korra e do Aang, e sei que eles dobravam subdobras com maestria. Mas cá estou eu: Avatar da minha época, que dobra razoavelmente bem a terra e o fogo e capenga com a água. Parabéns para mim.

Quando por fim estou no centro da clareira, deixo a luz do sol iluminar meu rosto, essa luz filtrada pelas altas copas das árvores. O vento sopra lentamente contra a floresta, incitando um barulho gostoso, de farfalhar, relaxante. Gisau me observa, sentado nas patas traseiras, me analisando. Aquela pequena criatura não me teme, e sempre está comigo.

─ Gisau. Vem aqui, garoto, fica perto de mim. ─ chamo, com um aceno de mão. Ele obedece se prontidão e se senta entre minhas pernas, abertas. ─ Fica quietinho, ok?

O gato-coelho ronrona alto, como quem assente e fica imóvel, olhando meu rosto de baixo. Sorrio brevemente. Abro meus braços e posso sentir cada gota de orvalho nos troncos das árvores, nas folhas e no ar. As gotas pairam no ar, como se houvessem sido filmadas e o filme houvesse sido pausado. Giro meus braços ao redor de minha cabeça e as gotas obedecem, juntando-se e formando um jato de água, que gira ao meu redor. Continuo a mover os meus braços, imitando o ritmo da água e por fim, eu os abro e o jato de água se transforma em diversas estacas de gelo, que voam e se fincam em diversos pontos da clareira. As árvores que foram acertadas pelas estacas tremem, tamanho o impacto.

─ Quase acertou minha cabeça, Yan. ─ uma voz soa à minha direita. Sou pego de sobressalto e olho.

Parado, com uma estaca fincada há poucos centímetros da cabeça está Tou. Ainda é o mesmo homem gordinho com nariz de batata e que traja o quimono verde claro. Os olhos são bondosos, mas no fundo deles, consigo detectar uma sabedoria antiga, como se ele fosse mais velho do que realmente aparenta ser. Atrás dele, um disco de prata paira, ou melhor... uma bandeja. Um aparelho de chá está suspenso acima do disco, onde uma fumaça densa e volumosa se desprende. Logo a floresta já está impregnada com cheiro de chá. Jasmim.

─ Desculpe...

─ Não tem que se desculpar. ─ determina Tou. ─ Chá?

Assinto suavemente. Ergo meu punho e deslizo o pé na terra, para que de prontidão uma mesa e dois bancos se ergam velozes. O barulho da terra sendo dobrada é música para meus ouvidos. Tou move a mão direita com a palma voltada para cima, a bandeja contorna ele e se deposita na pequena mesa de terra. Ele se senta lentamente, esperando que eu faça o mesmo. Ele em paciente e calmo como o pó que paira sobre uma superfície suja.

─ Diga-me, jovem Yan: o que aflige sua mente? ─ a voz dele é suave, grave, como veludo.

A pergunta me pega desprevenido. Quando me questiono da mesma maneira, há uma enxurrada de imagens que fustigam meus pensamentos: minha casa incendiada, a Cidade da República em chamas, explodida... Azsa sendo capturada, Saofu desacordado no chão, com várias rochas ao redor. Kyle com braços e pernas amarrados, enquanto eletrocutam-no. Jaya. Balanço minha cabeça, a fim de fazer as imagens sumirem. Ofego pesadamente.

─ Eu estou com medo, Tou. Eu sou fraco! ─ a voz sai esganiçada.

─ Seria um tolo se não estivesse com medo, Avatar! Um tolo! O medo não necessariamente no torna fracos, mas sim prudentes. Ele é um marcador que nos coloca nos nossos limites e sentir medo o faz tão normal quanto eu, até o Gisau tem medo! ─ Tou falava com fluidez, com uma dicção e oralidade impecáveis. Como um verdadeiro mestre.

Olho para ele, mas não sei que expressão estou fazendo. Remexo minha trança.

─ Temo pelos meus amigos... ─ Tou está nos servindo chá. As xícaras brancas e de bordas douradas parecem ser de porcelana cara. ─ Não quero vê-los morrer pela minha causa. Eu não quero que Jaya os fira... Eu não sei o que eu faria. Onde quer que eu vá, tudo o que deixo é um rastro de... destruição.

Os olhos de Tou parecem refletir minha dor. Por detrás dos óculos que ele usa, que mais parecem molduras para seus olhos bonitos, consigo enxergar a dor.

─ Olhe as árvores, Yan.

Olho para cima, no instante que um vento um pouco mais forte açoita a copa das árvores. Ao meu redor, as árvores se dobram, dançando ao ritmo constante do vento que sopra contra elas. As folhas dançam ─ douradas, vermelhas, verdes ─ aos nossos pés e Gisau pula contra elas. O sabor do vento me apetece. Recebo minha xícara.

─ O vento é uma provação para as árvores. Ele é poderoso, sopra sem piedade, fazendo as coitadas envergarem. Ai delas se sentissem dor! ─ Tou sorri bondoso para mim, e depois continua bebericando o chá. ─ Não importa o quão forte o vento sopre, o quão poderoso ele seja, Yan. As árvores entrelaçam suas raízes no fundo da terra, como mãos e elas suportam umas às outras, não permitindo que suas companheiras caíam. As árvores, elas são um time formidável de superação e comprometimento. Seus amigos não são diferentes. Eles querem suportar um pouco da sua dor, eles estão constantemente gritando: Yan, divida sua carga conosco. ─ Tou tomou mais um gole de seu chá quente. Eu o imito. O gosto e a quentura do líquido lançam em mim uma onda intensa de prazer. ─ Não subestime eles. Você possui aliados poderosos. E eles sabem e entendem a responsabilidade de integrar o seu time. Permita segurar as mãos deles... Fará bem a você. E... Ah! Eu tenho um bilhete para você.

Tou afagou os bolsos e encontrou um papel delicadamente dobrado. Estendeu-o sobre a mesa para mim e eu o abri lentamente. A caligrafia delicada, decidida e bonita era de Azsa, minha namorada e amada companheira. Sinto um ardor no fundo de meus olhos, quando leio as palavras.

Sinto sua falta. Todos os dias, desde o nascer do sol, ao nascer da lua.

─ A.

Seguro na minha xícara com força e bebo o restante do chá. Não adianta tentar mascarar a dor ou o medo. Talvez se eu permitir que eles se desdobrem em mim, talvez me façam mais forte. Talvez meus amigos corram perigos se eu me mantiver longe, sem poder protegê-los.

─ Yan, duas outras coisas, que esse velho pode lhe oferecer como sabedoria... O poder do metal se debate em você. É fácil um dobrador de metal reconhecer outro. E eu sinto: você é capaz! Quando estiver de frente ao metal, concentre-se na terra que existe nele, nas impurezas. Sei que conseguirá. ─ Tou sorriu e limpou a boca com um pedaço de pano. ─ Encare seus defeitos como uma arma a mais. As coisas são como são, não por acaso, meu jovem. Os detalhes que serpenteiam essa vida e as outras são decididamente o que define muita coisa. Eu sempre serei por você, nessa e em outras vidas, Avatar Yan.

Ergui-me lentamente. Eu iria dar um abraço em Tou e agradece-lo pelos conselhos. Mas ouvi um zumbido no ar.

─ Tou, o senhor está ouvindo isso? ─ pergunto.

─ Sim... Parece um avião, Yan...

A explosão aconteceu num átimo de instante. Eu não precisava vê-la, para saber que ela ocorreu, pois no instante que a bomba caiu na Ilha, o chão tremeu como se fosse feito de borracha. Nossos joelhos fraquejaram, mas como bons dobradores de terra, ficamos em pé. Tou estreitou os olhos e removeu os óculos rapidamente. Olhei para Gisau e gritei para que ele se escondesse.

Corri na direção da cortina de poeira que se espalhava pela ilha. O grito de pavor e o som da madeira se partindo inundou meus ouvidos no instante que sai da clareira e alcancei a borda da floresta. As pessoas corriam descontroladamente em todas as direções. Disparos de fogo azul começaram a surgir do meio da multidão, em tentativas doentias de acertar o avião que lançaram a bomba. A fumaça se erguia em espirais, que se desprendiam do fogo que lambia as casas de madeira. Animais corriam pelas ruas, com as pessoas. Ao longe, eu podia ver a estátua de Kyoshi me encarando, como se estivesse me intimando: Cuida da minha ilha!

No céu, o avião descrevia um looping no ar, pronto para mais um disparo. Eu não iria permitir. O poder do Estado Avatar se alastrou pelo meu corpo, com uma força avassaladora e eu girei no mesmo lugar e o fogo explodiu na minha mão, numa labareda quente, poderosa e gigante: uma serpente de fogo que voou na direção do avião. A máquina voadora explodiu no ar, com um impulso gigante. O barulho se alastrou abafado. Quando pisquei, vi duas pessoas flutuando no ar, de pára-quedas, tão boas naquilo, que cheguei a sentir raiva.

Elas estavam se dirigindo ao mar, onde eu vi.

As lanchas estavam cortando a superfície da água como navalhas. Eu não podia ouvi-las, mas sabia a quem pertenciam, graças às cores e os entalhes, visíveis mesmo de longe. Corri na direção do centro da Ilha Kyoshi e já reconheci os cabelos negros de Azsa, ondulando ao redor da cabeça dela, conforme ela olhava para a praia.

─ O que os dobradores de areia estão fazendo, atacando a ilha? ─ gritou ela.

Eu não me importei com o eminente ataque à porta da ilha. Corri na direção de Azsa, estendendo os meus braços para ela. Ela, obviamente, não entendeu e eu a peguei em meus braços e beijei-a. Os lábios cálidos e quentes, o coração batendo contra o meu e os corpos se encaixando de uma maneira indescritível. A respiração ofegou e por fim, Azsa estava totalmente entregue em meus braços. O fogo queimava ao nosso redor, mas tudo o que existia para mim naquele instante era o toque, o cheiro, a sensação de ter Azsa para mim. Larguei-a, com as maçãs do rosto vermelhas. E sorri.

─ Eu te amo, não importa que caminho iremos tomar ou o que aconteça. Te amarei nessa e em todas as vidas seguintes. Eu...

─ Yan... ─ Azsa me olhou por um longo instante, enquanto as pessoas corriam ao nosso redor e se debatiam loucamente. A cena caótica foi o fundo daquela cena, enquanto o fogo consumia lentamente a madeira das cabanas. O crepitar das chamas e os gritos desesperados estavam ecoando em minha mente, mas tudo o que importava, era o brilho no olhar de Azsa, que cintilava. ─ Eu te amo.

O chão tremeu novamente. Alguns dobradores de terra sincronizavam os movimentos mecânicos e estavam tentando atacar as lanchas que cortavam o mar. Mas era em vão. Os que pilotavam as lanchas, eram igualmente dotados de dobra de terra. As enormes rochas que voavam na direção deles, desintegravam, viravam pó e caíam no mar. Agora eu ouvia com mais clareza o som das máquinas.

As lanchas eram de última geração. O metal cintilava na cor de pergaminho velho, bege e exibia um simbolo: parecia com o do Reino da Terra, mas tinha o formato de um tronco de árvore. Aquele simbolo... Eu já o havia visto em algum lugar...

A fumaça negra espiralava na direção do céu azul, como veneno tóxico. A voz de Hora surgiu de repente, ordenando, gritando ordens claras de calma. Ela estava conduzindo o fluxo para a grande casa dela, e aos poucos os números de cidadãos da Ilha Kyoshi foram lentamente desaparecendo. Quando as lanchas aportaram na praia, enxerguei os invasores: trajavam ternos (tanto as mulheres quanto os homens) de cores claras: bege, amarelo claro, até cinza claro. O que parecia ser o líder: um homem alto e imponente, moveu os braços de fora para dentro, como se estivesse tentando capturar uma mosca em câmera lenta. A areia da praia se moveu como uma onda do mar e eu lembrei da onde eu havia visto aquele símbolo. Dobradores de Areia do Deserto.

A areia começou a flutuar ao redor do grupo, como se ela não obedecesse à gravidade. Ouvi som de água e Kyle e Saofu estavam do nosso lado. O vento soprava do mar, trazendo o cheiro salgado de maresia. Eu adorava aquela sensação, porém, não podia aproveitar. Meus olhos foram atraídos pela estátua da Avatar Kyoshi e em silêncio, numa prece respeitosa, pedi sabedoria.

Ao meu lado, uma casa cedeu ao fogo e desabou, lançando flocos de fogo ao nosso redor. Os dobradores de areia começaram a andar na direção do centro da cidade, a areia flutuando como tentáculos ao redor de um polvo-lula. Olhei para Azsa. Os punhos estavam na altura do rosto, prontos para lutar. Kyle olhava a cena sério, a água ao redor dele como um anel. Parecia demais com Korra, sua mãe. E Saofu era meu Saofu, meu mestre, meu professor, meu querido amigo... O louco de sempre. O olhar transmitia uma sensação de que ele iria fazer algo grande.

E Hora.

Ela estava atrás de nós, os óculos dourados na ponta do nariz; não havia bondade em seu rosto, ela apenas ostentava um semblante de desgosto... Ou nojo. Os cabelos ondulavam ao redor dela, afinal de contas, era uma missão difícil ser uma senhora linda e ao mesmo tempo salvar a própria casa.

─ Como um time? ─ perguntou Kyle, olhando para mim. Azsa também o fez.

─ Como um time. ─ afirmei, permitindo que o aperto em meu coração se tornasse minha inspiração.

Entrei no Estado Avatar e o vento aumentou ao meu redor, levantando uma cortina de poeira no instante que os dobradores de areia venceram um pequeno morro e chegaram na rua em que estávamos. Hora ficou rígida atrás de nós, senti a energia dela pulsando loucamente. O líder dos dobradores de areia riu. A voz era áspera, como se ele fumasse muito. A pele era morena... Bronzeada! Provavelmente por estar sempre debaixo do sol no deserto. Ele tinha óculos nos olhos, armações brancas, que contrastavam de modo gritante com seu rosto. Trajava um sobretudo de tecido leve, que ondulava ao menor dos ventos e contrastava com os músculos duros. O sorriso era naturalmente asqueroso, do tipo fácil de ler. De imediato, eu sabia que ele não era bom. Ele primeiro me encarou e olhou aos meus amigos, com escárnio. Trinquei os dentes. Mas ele riu, quando olhou para Hora.

─ Saia da minha ilha, porco do deserto! ─ vocifera Hora.

Imaginei um estalo ecoando... Ou deve ter acontecido, eu não sei.

─ Ora, creio eu, que esses não são modos aceitáveis de uma líder de uma nação, para com outro líder. ─ falou calmamente o dobrador de areia líder. A voz parecia o ronco de uma nave velha. Velha demais.

─ Para mim, você não é nada, além de um bandido!

Azsa olhou de relance para Hora e por fim manteve seu olhar fixo dos dobradores de areia.

─ Senhora Hora, quem é esse homem?

─ Hora, não acredito que não falou de mim... ─ o homem fingiu genuíno desapontamento, mas depois riu gostosamente. ─ Deveria ter adivinhado desde sempre... Acho que você se esqueceu de muita coisa, Hora. ─ o homem deu um passo a frente, destacando-se de seu grupo. Sorriu sem exibir os dentes e por fim abriu os braços, como se fosse nos abraçar. ─ Sou Taabar, jovem princesa do fogo, líder dos Dobradores de Areia do Deserto. E Hora, líder da ilha Kyoshi... É a minha irmã.


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