Além Do Fraternal escrita por Gey Scodelario


Capítulo 7
Quando há amor...


Notas iniciais do capítulo

Oie! novamente muito obrigada pelos Reviews do capitulo anterior, divos como sempre! Eu ia postar esse capitulo ontem mas minha Net bugou e não deu... Mas enfim, espero que gostem do capitulo :) Boa Leitura!



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No dia seguinte, quando abriram os olhos e se depararam um com o outro, coraram. Estavam deitados um de frente para o outro. Karina sorriu e disse:

—Bom dia.

—Bom... Não.

Ele se sentou e a ficou observando com a cara emburrada. Karina o olhou intrigada e perguntou:

—O que foi?

—Quero saber o que realmente aconteceu ontem.

—Eu já falei.

—Não acredito.

Ela se sentou também e os dois ficaram em silêncio. Até que a porta do quarto se abriu e Dandara entrou com um sorriso no rosto:

—É tão bom ver vocês dois juntos novamente! Fiquei tão feliz quando acordei de madrugada e fui ao seu quarto _ ela apontou para Karina, que tinha um sorriso amarelo no rosto._ ver como você estava e você não estava lá. De imediato percebi onde você estava.

Os dois sorriram para ela, que se sentou na beirada da cama. Dandara era a melhor mãe do mundo! Compreensiva e amorosa, dosava muito bem os sentimentos que nutria pelos dois, mas ninguém imaginava como aquilo era difícil para ela. Karina era sua filha de sangue, ela a tinha gerado durante nove e deliciosos meses, ao lado do grande amor da sua vida. Pedro era o filho da alma, ela o tinha criado com tanto amor que nunca imaginara poder sentir um dia, ao lado do homem que escolhera para viver pela eternidade. Vendo os dois ali, unidos, ela pensava no quão se sentia realizada.

—Eu detesto ver vocês dois brigando e peço, por favor, que não façam mais isso._ ela disse, com o olhar piedoso.

Os dois se entreolharam e decidiram dar uma trégua. Dandara ficou satisfeita e saiu do quarto. Assim que ela saiu, Karina colocou-se de pé.

—Obrigado por ter me deixado dormir aqui.

—Disponha._ ele disse, espreguiçando-se.

Somente naquele momento, ela percebeu que ele estava sem camisa. Corou ao ver aquele peitoral definido. “Credo! Ele é meu irmão!”, ela pensou desviando o olhar.

Sem mais, ela saiu do quarto, deixando Pedro sozinho com seus pensamentos e decisões. Antes que desistisse, ele pegou o celular e discou o número de Jade. Do outro lado, ela atendeu com uma voz um pouco sonolenta, mas ao perceber quem era, mudou completamente o tom.

—Eu queria remarcar o nosso encontro para hoje... Pode ser?_ ele perguntou.

—Claro! Diga-me o local e estarei lá.

—Ontem passamos por um bar bem legal, posso te passar o endereço?

Ela aceitou e ele lhe ditou o endereço. Quando desligou o celular, se pegou olhando para sua imagem no espelho. Ele não poderia fazer aquilo com ela... Mas era preciso. Seus pensamentos estavam atordoados e seus sentimentos o confundiam. Céus! Estava mesmo enlouquecendo! Pensou em Karina e no quanto vê-la beijando outro o afetara. Por quê? “Por que Senhor? Por quê?”. Ultimamente ele sentia coisas que nunca tinha sentido antes, uma necessidade desesperadora de procurar respostas para seus sentimentos.

A tarde chegou rapidamente. Pedro passou pela sala, onde Karina digitava algo no notebook e Dandara e Gael assistiam TV, simplesmente dizendo:

—Estou de saída, volto logo.

E partiu. Dandara olhou para Karina procurando respostas, mas esta simplesmente disse:

—Nem sempre ele me conta os passos dele, mãe.

*-*-*-*-*-*

Pedro caminhava pensativo pelas ruas do Rio. O tempo estava nublado e ameaçava cair mais um temporal como o da noite anterior.

A noite anterior... Não podia falar nela sem se lembrar de Karina, de como a presença dela na sua cama o afetara e como ele mal conseguiu dormir sentindo o cheiro de flores que emanava do cabelo sedoso dela. Ela parecia tão desprotegida no momento em que apareceu na porta do quarto dele e um instinto protetor praticamente gritou dentro dele assim que ela se deitou ao seu lado, uma vontade de abraçá-la e nunca mais deixá-la ir embora.

A cada dia que passava tinha mais certeza de estava ficando louco. Já havia ouvido histórias de incesto, de amor entre irmãos, mas nunca esperava que isso pudesse acontecer com ele, nunca! Foi criado segundo os ensinamentos de Deus e sabia que incesto estava entre os piores pecados que o ser humano poderia cometer. Ela era sangue do seu sangue, dividiram o mesmo espaço durante nove meses! Deus! Ele tinha que conversar com alguém, tinha que dividir esse sentimento com alguém... Ou tinha que fingir que nada estava acontecendo e que tudo não passava de um amor fraternal muito forte. Escolheu a segunda opção e estava indo, naquele momento, colocá-la em prática.

Chegou ao bar cedo, o que foi bom, por que deu tempo para tomar um café e pensar no que iria dizer. Jade chegou vinte minutos depois, usando um sobre tudo na cor creme e botas. Ele a recebeu com um sorriso e levantou-se para ajudá-la a se sentar.

Pediram chocolates quentes e ficaram comentando sobre como o lugar era aconchegante até os pedidos chegarem e a conversa mudar de rumo totalmente.

—Fiquei surpresa com a sua ligação._ ela disse, provando a bebida.

—Por quê?_ ele não tinha vontade de beber nada naquele momento.

—Ah... Não sei, talvez porque você não faz muito o estilo “te ligo!”... Sei lá.

—Que péssima imagem você tem de mim, então.

Os dois riram e ficaram em silêncio, em seguida. Jade o observava com curiosidade, o que ele queria com ela? Não importava, o foco era que ela tinha, finalmente, a oportunidade de ficar sozinha com ele.

—Eu sinto muito não ter encontrado você ontem.

—Tudo bem, está se desculpando muito bem, aliás._ ela sorriu por cima da xícara e tomou mais um gole do chocolate.

Pedro pensou que já era o momento de ir além. Por isso, segurou a mão dela, que repousava sobre a mesa e disse:

—Ainda não conversamos sobre o que houve na sexta.

O rosto de Jade iluminou-se com o belo sorriso que ela abriu. Pedro sentiu-se culpado, mas seguiu em frente.

—Foi maravilhoso Jade... Não paro de pensar naquele beijo.

—Eu também não. Na verdade fiquei um pouco preocupada, pensando se você me achou muito atirada, não sei...

—De maneira alguma, se você foi eu também o fui, não?

—Não. Você foi muito educado e amoroso... Eu que praticamente te ataquei!

Pedro riu, enquanto Jade se encantava com a beleza do rapaz a sua frente. Estava perdidamente apaixonada por ele e não aguentava aquela mesa os separando. Mas seguiu firme. Se rolasse algo, a iniciativa partiria dele.

—Enfim, eu não tenho palavras para descrever como você me faz falta como...

Ele parou de falar instantaneamente. À sua frente, estava Karina, sorrindo e corada. Seu cabelo curto lhe caia a testa e seu perfume doce preenchia a atmosfera. Ela o observava com seus olhos azuis, como se tentasse ler a mente dele, ela sempre fazia isso. Ele apertou a mão dela e disse:

—Eu te quero, eu preciso de você, eu não sei mais viver longe de você! Por favor, não me deixe, deixe-me cuidar de você, deixe-me te mostrar que você não precisa de mais ninguém para estar ao seu lado, apenas eu!

Ele levou a mão dela aos lábios e depositou ali um beijo. Depois ergueu seus olhos e a encontrou com lágrimas nos olhos. Ele sorriu para ela e de repente ela havia sumido. Agora, ele encarava Jade, que chorava de alegria.

Pedro tentou disfarçar o susto com outro sorriso amarelo e continuou:

—Quer ser minha namorada?

Jade parecia estar diante da coisa mais bela do mundo, pois o olhava encantada. Imediatamente ela respondeu que sim e correu para se sentar na cadeira ao lado dele. Não esperou um segundo para beijá-lo.

Por mais que tentasse se concentrar no beijo, Pedro simplesmente não estava conseguindo. Como podia pensar na irmã naquele momento?

Jade se afastou um pouco e disse:

—Eu gosto muito de você Pedro, acho que me apaixonei assim que vi você entrando no colégio com a Karina.

Pedro não disse nada, em vez disso acariciou o rosto dela com o polegar, até este parar no lábio inferior dela. Ele a encarou novamente e viu Karina mais uma vez ali, sorrindo e o encarando de forma sedutora. Os lábios dela pronunciaram de forma sensual:

—Acho que formamos um belo casal.

Ele não resistiu ao som sensual que ela emitiu e a beijou com paixão, ignorando o fato dela ser sua irmã, daquilo ser errado. Quando abriu os olhos novamente, lá estava Jade. Ele a afastou assustado.

—O que foi?_ ela perguntou.

—Nada... Uma pontada na cabeça, só isso.

Pedro tocou sua testa, tentando fingir que estava com dor de cabeça. Jade se compadeceu dele e lhe deu um beijinho no rosto.

O resto da tarde foi bastante agradável, exceto pelo momento em que Karina vinha à mente dele de tal maneira que parecia uma praga.

Quando deu a hora de Jade ir embora, Pedro insistiu em levá-la até em casa, mas ela recusou:

—Você não conhece bem a cidade, depois como voltará para sua casa hein? Não quero meu namorado perdido por aí. Fica tranquilo, vou sozinha... Me liga mais tarde?

—Claro._ ele respondeu.

Os dois se despediram e cada um seguiu seu caminho, Pedro sentindo-se um monstro e Jade, mais feliz do que nunca!

Ele chegou em casa por volta das 19h. Karina estava na cozinha, lavando as louças e o resto da casa parecia vazio. Ele foi até lá e encostou-se no batente da porta, olhando-a em sua tarefa.

—Perdeu alguma coisa?_ ela perguntou, de costas para ele.

—Não. Onde estão...

—Saíram faz uma hora, acho que voltam logo._ ela o interrompeu friamente.

Pedro preferiu não perguntar mais nada, mas não saiu do lugar onde estava. Ela, por sua vez, estava se sentindo muito incomodada sabendo que ele a observava.

—Não que me interesse, mas aonde você foi?_ ela perguntou relutantemente.

—Fui me encontrar com a Jade.

Karina deixou o copo, que ensaboava, cair dentro da pia e quebrar. Pedro correu para ajudá-la, mas ela não deixou.

—Eu me viro.

E começou a juntar os cacos com as mãos trêmulas. Pedro desistiu de ajudá-la e sentou-se à mesa.

—E... Como foi o encontro?_ ela continuou no assunto.

—Foi bom... Eu a pedi em namoro.

—Ai!

Karina se assustou ao ouvir o que ele disse e se descuidou com um dos cacos, cortando a palma da mão. Agora não teve como recusar a ajuda dele, que imediatamente a mandou lavar a mão, mas o sangue não parava de sair.

—Eu vou pegar a caixinha com os primeiros socorros, mantenha a mão embaixo da água corrente, volto logo.

Quando se viu sozinha, Karina não conseguiu deter as lágrimas. Não, não estava chorando por causa do corte, mas sim por causa da bomba que Pedro havia soltado. “Vaca!” ela pensou com ódio.

Quando ele voltou e a viu chorando, pensou que era por causa do corte.

—Vai ficar tudo bem K. Mas acho que vamos ter que ir para o hospital para dar alguns pontos, para facilitar a cicatri... Karina eu ainda não acabei!

Pedro tentava estancar o sangue com ataduras, mas Karina simplesmente afastou a mão e retirou-se da cozinha.

O resto do domingo foi anormal para a família Duarte, que costumava jantar unida na sala, ao redor da mesa. Karina estava no quarto e toda vez que alguém ia até lá e perguntava se estava tudo bem, ela respondia um “Sim” com a voz abafada. Pedro, por sua vez, estava na sala assistindo TV, mas sem prestar realmente a atenção. Queria correr até o quarto de Karina e perguntar o que estava acontecendo, mas não teve coragem. Por algum motivo desconhecido, sentia que tinha feito algo muito ruim para ela e que não merecia seu perdão.

No dia seguinte, Karina evitou ficar perto dele em qualquer momento, enquanto iam de ônibus para escola, e chegando lá não foi diferente.

Como ela esperava, Jade veio correndo ao encontro do namorado, tratando de lhe dar um beijo nada tímido, para deixar claro a todos que quisessem saber que aquele já tinha dona.

Karina lançou um olhar enojado para os dois e seguiu seu caminho, só parando quando se viu longe o bastante de todo mundo. Estava no campo, onde alguns garotos já praticavam exercícios. Avistou um banco ao redor deste e se sentou, não tinha vontade de ir para aula. Seu olhar vagava entre os garotos jogando bola, um pássaro voando e garotas sentadas na arquibancada, dando risadinhas afetadas.

—Seu irmão e a fêmea Gardel formam um casal nojento.

Karina se assustou ao ouvir a afirmação e imediatamente olhou para seu lado. Cobra estava sentado ali e tinha o olhar fixo na arquibancada.

—O... O que está fazendo aqui?_ ela balbuciou.

—Eu estudo aqui!_ ele respondeu como se fosse a coisa mais óbvia do mundo.

Ela não acreditou inicialmente, mas ao ver uma mochila no colo dele resolveu dar o crédito.

—Ok... Agora que acredita, me diga o que aconteceu com sua mão?_ ele perguntou, ainda olhando a arquibancada.

—O que?_ ela continuava impressionada.

—Sua mão._ ele a olhou e apontou para a mão enfaixada.

—Ah, eu me cortei com alguns cacos, nada de mais.

Ele deu um meio sorriso e a encarou, o que fez o sangue da jovem ferver sob o olhar dele.

—Então..._ ela disfarçou a reação._ Está em qual ano?

—Terceiro.

—Estranho... Não vi você nas aulas semana passada..._ ela disse, pensativa.

—Pois é, minhas férias foram muito curtas e eu fui obrigado a prolongá-las para fazer tudo o que eu havia planejado._ ele respondeu, passando a mão no cabelo.

—Tipo?

—Escalada no Everest, mergulho com tubarões, Disney World, essas coisas básicas.

Karina começou a rir. O detestava, mas ele era o oposto de todos os meninos pelos quais ela já tinha se interessado e isso estava deixando-a maravilhada. Não estava sendo a previsível Karina, que saía com os rapazes que todos esperavam. Estava sendo ela mesma.

—Me responda uma pergunta?_ ela disse, após se recompor.

—Depende.

—Por que chamou a Jade de “fêmea Gardel”? Algo contra ela?

Cobra pareceu extremamente incomodado com a pergunta. Desviou seu olhar para a mochila em seu colo e pareceu pensativo por um momento, até que resolveu falar:

—Tenho Karina, mas não é algo que interesse a você.

—Interessa sim, ela é minha amiga e namorada do meu irmão.

Cobra permaneceu em silêncio e isso incomodava Karina que insistiu:

—Por favor...

—Nós tivemos um caso e quando eu quis terminar ela inventou um teatrinho no qual eu saí como vilão.

A frase foi dita de maneira tão rápida pelo garoto, que Karina mal conseguiu formular as ideias. Quando entendeu o ocorrido tentou saber mais, mas Cobra estava inflexível.

No fim das contas, passaram o resto do primeiro horário conversando sobre banalidades, como séries de TV, filmes da temporada e músicas no IPOD.

Quando deram por si, já estava na hora do intervalo e, juntos, rumaram para o refeitório, se separando quando chegaram à entrada do local. Jade avistou a jovem que olhava para as mesas, segurando seu lanche, procurando um lugar para se acomodar.

—K!_ ela chamou, indicando a mesa onde estavam.

Karina não foi imediatamente para lá, pensava em fingir que não a tinha visto e ir para outro lugar, mas já era tarde: Pedro já tinha vindo ao encontro dela e estava furioso:

—Onde você estava?_ ele perguntou, pegando a bandeja que ela carregava, para ajudá-la (ou impedi-la de sumir novamente).

—Estava conversando com um amigo e perdi a hora._ ela respondeu calmamente, enquanto se sentava de frente para Jade.

—Que amigo?_ Pedro prosseguiu, sentando-se ao lado dela.

Karina não respondeu de imediato. Antes, tomou um gole de suco de uva e finalmente respondeu:

—Não sei se você se lembra, você o conheceu sábado, na festa... o Cobra.

Ela não entendeu o porquê, mas a menção daquele nome fez muita gente se sobressaltar e olhá-la espantados. Karina sorriu desconcertada e disse:

—Ok... O que eu fiz de... Errado?

—Nada. _ foi Jade quem respondeu._ Digamos que o Cobra não seja uma boa companhia para uma moça direita.

Karina a olhou com duvida e retrucou:

—E por que diz isso? Já esteve na companhia dele e te julgaram?

Jade sentiu o ressentimento na voz da moça, mas fingiu-se de rogada quando respondeu:

—K, eu só quero seu bem.

—Por que você não conta para ela o que aconteceu Jade?

Apenas naquele instante Karina reparou na presença de Lírio sentado ao lado da irmã. Jade lançou um olhar inocente para ele quando disse:

—Ah não, não quero ferir os sentimentos dela, talvez ele tenha mudado Lírio.

Naquele momento, Karina detestou Jade com cada centímetro do seu ser. O tom da voz dela era de falsa pena e o olhar que ela lhe lançara quando disse isso foi de pura caridade. Falsa caridade.

—O que aconteceu Jade?_ Pedro perguntou, passando um braço pelo ombro de Karina, de forma possessiva.

—Amor, não quero comentar sobre isso._ ela olhava para os dois, piedosa.

—Se você não fala, eu falo._ disse Lírio._ A questão é que Jade e Cobra tiveram um caso, assim que ela entrou na escola. e como de praxe, houve o baile de inverno e Cobra convidou minha irmã para ir, claro. Porém, ela estava pensando em terminar com ele e, no dia do baile...

—Lírio..._ Jade o interrompeu._ Talvez seja melhor eu continuar._ ela voltou seu olhar para Karina._ No dia do baile, K, eu estava decidida a terminar com ele, não queria mais, Cobra era muito obsessivo. Enfim, quando nos encontramos na porta do salão, eu disse para ele que tudo estava acabado. Ele não agiu de forma estranha sabe? Simplesmente aceitou e me convidou para tomarmos uma bebida. Eu fui achando que realmente estava tudo bem...

Jade fez uma pausa e respirou fundo. Durante a pausa, Karina reparou que todos na mesa olhavam para a garota com cara de pena. Depois, ela continuou:

—Tudo o que eu me lembro é de ter acordado no dia seguinte em um galpão que fica atrás da escola, com ele apagado ao meu lado, dormindo profundamente e eu... Nua.

—Nossa!_ Pedro exclamou apavorado.

—Jade apareceu em casa muito assustada, com as roupas rasgadas e arranhões pelo braço e pernas._ Lírio disse.

—E por que vocês não o denunciaram?_ Karina estava desconfiada da história.

—Eu não queria ter meu nome envolvido em... Assédio sabe? nossas familías são famílias tradicionais aqui no Rio. Iria sujar nosso nome mais que o deles. Eu preferi deixar quieto e me afastar dele. Por isso amiga, estou te alertando. _ ela pegou a mão de Karina que repousava sobre a mesa._ Sei que ele parece ser uma pessoa boa, e não estou dizendo que não é, talvez tenha mudado; mas tome cuidado!

—Quero você longe dele K, ouviu bem?_ Pedro advertiu, tocando o rosto de Karina.

—Ouvi. Eu vou para a sala, perdi a fome.

Ela se retirou da mesa, deixando todos os presentes espantados. Jade fingiu estar ofendida e disse:

—Eu só quis alertá-la!

Karina voltou para a casa sozinha naquele dia, porque Pedro ia levar a namorada em casa. Cobra tinha razão: os dois formavam um casal nojento. Lírio insistiu em acompanhá-la, mas ela recusou, dizendo que não era uma boa companhia àquela hora.

Assim que entrou em casa, Dandara a chamou, estava na cozinha.

—Espero que gostem de suflê... Ou da imitação... Onde está seu irmão?_ ela perguntou, servindo o almoço na mesa da sala de jantar, coisa não muito comum.

—Foi levar a namorada em casa.

—Namorada?_ Dandara não sabia da novidade.

—Sim, minha colega, Jade. Posso me servir? Está com uma cara ótima o suflê.

Dandara disse que sim e se sentou na cadeira na ponta da mesa. Observava a filha se servindo e não resistiu:

—Quando esse namoro começou?

—Ontem.

—Então foi por isso que ele saiu daquela maneira?

Karina confirmou a suspeita da mãe e continuou comendo. Minutos depois, Pedro entrou na cozinha sorridente. Deu um beijinho na mãe e disse, se juntando às duas:

—Descobri que a casa da Jade é aqui perto, não é ótimo?

—Iupii!_ Karina rodou o indicador no ar, como se estivesse comemorando, mas imediatamente voltou a fechar a cara e comer.

—Ok, quer me falar sobre esse namoro? _ Dandara dirigiu-se à ele.

—Bom, como a senhora já sabe, eu e Jade ficamos aquele dia, na boate e eu gostei dela. Então, por que não namorá-la?

Karina já não estava aguentando mais aquele assunto. Jade não a deixava em paz nem no almoço?

—Então é sério?_Dandara continuou.

—Sim, aliás, que tal eu trazê-la aqui no próximo domingo, para apresentá-la à vocês?

Karina engasgou-se com a comida, chamando a atenção para si. Pedro a olhou divertido e disse:

—Come devagar meu bem.

—Vá se fu...

—KARINA!

Dandara não estava nada contente com o palavreado da filha e a repreendeu, enquanto Pedro ria da situação. Mas Karina perguntou, mesmo querendo que todos tivessem uma amnésia e se esquecessem que um dia conheceram Jade.

—Você não acha muito cedo para trazê-la aqui? Você nem conheceu os pais dela!

—Ah sim, essa era a notícia que eu queria dar também._ ele respondeu._ Vou à casa dela no sábado, para oficializar o namoro.

—Isso mesmo, me deixe orgulhosa e seja um príncipe!

Dandara parecia satisfeita com o namoro, para desespero de Karina, que se retirou da mesa sentindo enjôos.

Pouco mais tarde, Gael ficou sabendo da novidade e chamou o filho para terem “aquela conversa sobre as mulheres”. Na verdade foi uma desculpa para saírem em plena segunda, sentarem em um bar e jogarem conversa fora.

Karina e Dandara ficaram em casa assistindo filmes, que no momento não atraíam a atenção da jovem. A mãe reparou isso e disse:

—E você meu bem? Como vai o lance com o irmão da sua cunhada?... Engraçado isso._ Dandara riu.

—Não tem lance mãe._Karina respondeu mal humorada.

—Hum... E o que você acha desse namoro do Pedro? Mais uma vez uma amiga sua caiu nas garras dele.

—Não, dessa vez foi o contrário.

Dizendo isso, a jovem se levantou, deu boa noite e foi para o quarto com a intenção de dormir. Mas seus pensamentos maquinaram a noite toda.

“Não, dessa vez foi o contrário.” E realmente foi. Jade não tinha caído nas garras de Pedro, como as outras, mas pareceu ter arquitetado tudo muito bem, a conquista perfeita! Ele estava completamente apaixonado por ela, isso era fato.

Karina deu um suspiro longo e fechou seus olhos. O sorriso dele veio à sua mente, seu jeito infantil, seu olhar carinhoso, suas palavras doces... E agora isso tudo era de Jade. Todo o carinho, todo o afeto, todo o amor... Cada toque, cada abraço, sem limites, sem barreiras. Sem sangue.

*-*-*-*-*

O domingo pareceu chegar voando, para desespero de Karina. Ela acordou um pouco tarde naquele dia, pensando em uma maneira de fugir naquele dia e só voltar quando todo aquele circo tivesse acabado. Mas, para sua tristeza, não conseguiu pensar em nada antes que Dandara a visse descendo as escadas:

—Venha me ajudar com o almoço querida.

Ela parecia realmente atarefada o que mexeu com o lado piedoso de Karina.

Pedro desceu tempos depois. Seu perfume encheu a cozinha e desestabilizou Karina por um tempo, fazendo-a parar de ralar as cenouras da salada para se recompor. Ele estava tão lindo!

—Vou buscar a Jade._ ele anunciou, passando as mãos no cabelo em um puro sinal de nervosismo.

—Não demore!_ Dandara disse, com a atenção voltada ao frango grelhado.

Quando ele saiu, Karina sentiu que podia respirar novamente. Sentiu-se um pouco tonta e se sentou na cadeira ao seu lado.

—O que foi Karina?_ Dandara percebeu o mal repentino da filha.

—Uma tonteira, nada de mais._ ela sorriu para a mãe, deixando-a mais aliviada.

Gael voltou das compras, carregando várias sacolas. Karina e Dandara o olharam intrigadas e foi a esposa que perguntou:

—Você não ia comprar apenas algumas bebidas?

—È, mas aí eu passei em frente a uma banca de frutas, elas estavam tão fresquinhas, não resisti.

Karina deixou o que estava fazendo de lado, para ajudá-lo a descarregar as compras.

—Obrigado meu bem._ ele disse dando um beijo na testa dela. Depois olhou-a preocupado._ Você está um pouco pálida, tá tudo bem?

—Sim, foi apenas uma tonteira, mas já passou.

Gael tocou o rosto dela e ficou observando-a guardar as frutas e colocar algumas na fruteira sobre a mesa onde seria servido o almoço. Como ela tinha crescido! Como era linda, como a mãe. Ele ficava pensando quais traços ela tinha do falecido pai... Mas depois percebia que via seu caráter nela, via seus ensinamentos em cada gesto da filha e isso valia mais que os traços físicos.

—Para de babar._ Dandara sussurrou no ouvido dele.

—Ela não é linda?_ ele disse, no mesmo tom.

—Claro, é nossa filha!

A conversa foi interrompida por Karina que percebeu os olhares que os dois lançavam para ela. Ela se olhou de cima a baixo e disse:

—Tem algo errado em mim?

—Não!_ eles responderam, mudando de assunto.


O almoço já estava pronto. Karina se sentou no sofá da sala, olhando algumas vezes pela janela para ver se o casal ternurinha estava chegando. Quando finalmente os viu se aproximando da casa, ela subiu para seu quarto, não queria ver a bajulação da parte dos pais para com Jade.

Minutos depois, ela ouviu o chamado da mãe e foi até a sala. Jade estava lá no centro, arrumada demais para um almoço de domingo. Assim que viu Karina descendo as escadas ela sorriu e disse:

—Amiga! Por que não veio me receber?

—Desculpe Jade eu estava um pouco ocupada lá em cima.

Jade deu um abraço na moça e disse depois:

—Não é o máximo? Além de amigas somos... Parentes?

—É...

Karina não terminou a frase, pois Dandara já chamava todos para a sala de jantar.

A mesa estava caprichada, como só ela poderia arrumar. Gael se sentou em uma ponta, Dandara na outra. Pedro e Jade do lado esquerdo da mesa e Karina do direito. Por um momento, o atrito dos talheres com as louças de porcelana foi o único som emitido. Pedro às vezes olhava a irmã preocupado, tentando descobrir por que ela estava tão pálida e comendo tão pouco. Quando seus olhares se encontravam, ambos ficavam vermelhos e imediatamente voltavam sua atenção para o próprio prato.

­_Então... Jade._ Gael tentou começar um diálogo._ Nos fale de você, sua família.

—Bom, _ Jade parecia um pouco desconcertada._ Somos uma família tradicional aqui no Rio. Papai administra a Gardel Construções, uma loja de material de construção que foi fundada pelo vovô há 20 anos. Temos filiais em vários pontos da cidade e estamos tentando expandir para outras cidades.

—Ah que bom!_ Dandara se pronunciou._ E você acha que vai dar certo?

—Acho que sim Sra. Dandara, temos excelentes contatos lá, segundo o papai.

—E você pretende seguir a carreira do seu pai?_ Gael perguntou.

—Sim, é um negócio de família e todos nós temos alguma função lá. O meu irmão, Lírio, por exemplo, cuida da parte financeira junto com minha irmã Joaquina. Já minha mãe, cuida da parte administrativa junto com meu pai. Meu primo João é encarregado de manter contatos para as filiais e cuida do estoque, dos pedidos. Eu sou uma secretária do meu pai.

—Que ótimo._ Dandara elogiou.

Karina não estava prestando real atenção à conversa. Seu olhar ia de Pedro para o próprio prato repetidas vezes. Sentia que se não saísse dali imediatamente iria passar mal.

—Mãe, pai, vocês me dão licença?_ ela perguntou.

—Claro querida. Mas me diga Jade...

A voz de Dandara foi sumindo à medida que Karina subia as escadas. Agora era oficial: Jade estava namorando Pedro.

Seu quarto parecia tão pequeno e sufocante agora. Suas lágrimas escorriam quentes e quase queimavam seu rosto. Por que estava chorando? Deveria estar feliz por ver seu irmão feliz.

—Eu não estou feliz.

Uma voz vinda da porta de seu quarto a alertou para a presença de Pedro. Ele entrou e fechou a porta, mas não adentrou muito no local. Karina limpou as lágrimas que escorriam com agressividade, não queria chorar perto dele.

—Não está feliz com o que?_ ela perguntou, de costas para ele.

—Com isso Karina. Você não entende, não é?

Karina permaneceu imóvel, olhando o sol que brilhava em seus últimos instantes, fazendo desenhos vermelhos no céu um pouco nublado.

—Você deixou sua namorada lá embaixo sozinha?_ ela disse.

—Eu disse que iria ao banheiro... Karina olha para mim.

O pedido dele a fez gelar, mas ela permaneceu na mesma posição, em frente à sua janela.

—Pedro eu não quero a Jade invadindo meu quarto, por tanto...

—Por favor, não finja que não se importa com o que está acontecendo, por que me machuca muito ver você assim.

Ela o sentiu se aproximando, sentiu o quão próximo ele estava agora, o quão próximo suas costas estavam do peito dele, o quão próximo a respiração dele estava da sua nuca.

—Pedro..._ ela tentou formular algo para falar, mas o hálito quente dele tocava sua pele, provocando pequenos arrepios.

—Eu fiquei pensando durante todos esses dias o que me impedia de namorar outras garotas, o que me impedia de me apaixonar, por que eu não conseguia ser como os outros caras e simplesmente sair e ficar com cada uma por noite. Sabe a que conclusão cheguei?

—Não._ ela sussurrou, fechando os olhos.

—Você. Você Karina.

Ela se virou de frente para ele assustada. Ele ergueu o polegar e enxugou uma lágrima que escorria pelo rosto dela. Karina fechou os olhos e, Deus, ele adorou ver aquela reação vindo dela! Em um impulso ele se curvou e correu os lábios pelo rosto dela, fazendo o mesmo caminho que as lágrimas, que escorriam dos olhos para o canto dos lábios. Ela apertou o braço dele, tentando impedi-lo de fazer aquela loucura, mas não foi necessário.

Como se estivesse acordando de um transe, Pedro a empurrou. A olhava como se não a conhecesse e tocava seus próprios lábios como se eles tivessem criado vontade própria de uma hora para outra.

Sem dizer nada e visivelmente atordoado, ele saiu do quarto e bateu a porta como se, com aquele gesto, trancasse qualquer sentimento sujo junto com Karina para sempre.

Karina ficou estática, era impossível se mover com toda aquela carga de excitação correndo pelas suas veias. Não estava mais suportando aquilo! Estava apaixonada pelo seu irmão!

—SENHOR ME AJUDE!

Em uma súplica desesperada, ela se ajoelhou no chão, chorando compulsivamente.


A chuva começava a cair forte. O silêncio reinava na casa. Em cada quarto, como se tivessem combinado, Pedro e Karina estavam ajoelhados, implorando para que Deus não os castigasse, para que seus pais não descobrissem... Para que aquela vontade de se matarem acabasse logo.


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