Ignored escrita por The Corsarian


Capítulo 3
A Nova "Princesinha" da Capital


Notas iniciais do capítulo

Desculpem a demora D: Mas aí está



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–E aí, quem está pronto para os Jogos?

Viro-me para trás e vejo uma mulher sorrindo na nossa direção.

Ela tinha cabelos negros e olhos tão negros quanto os mesmos.Também tinha um pelo corpo, com cintura fina, pernas torneadas e um grande busto, mas tudo parecia ser falso.O rosto era muito bonito, quase angelical, se não fosse pelo olhar duro.Andrea Finni, a mentora dos Jogos.

Ela sorriu para nós ainda mais quando chegou perto.Agarrou a garrafa de bebida das mãos de Aank, e virou-a de cabeça para baixo, derramando o líquido no chão do trem.Aank a olhou surpreso, mas Andrea simplesmente lançou-lhe um sorriso irônico.

–Nada de beber perto de crianças, Banks.-Ela disse gentilmente, como se estivesse dizendo palavras de conforto.

Andrea andou até a mesa e se sentou em uma das cadeiras, apanhando um pequeno pedaço de pão e espalhando com a faca um pouco de geleia por cima.Aank fez careta e se sentou em uma poltrona suspirando.Andrea fitou meu prato cheio de bolinhos e abriu um sorriso.

–Se eu fosse você, docinho, comeria menos.-Comentou ela ainda sorrindo, dando uma dentada no pedaço de pão que estava em suas mãos.-Na Arena não haverá todos esses bolinhos que você está comendo.Na verdade, duvido que irá ter algo além de pães feitos de grãos e óleo, barras de cereais para manter a energia e carne seca.

Andrea disse tudo aquilo com um sorriso amigável no rosto, e uma voz macia como seda.Era como se ela estivesse dizendo algo reconfortante e alegre.Mas não me incomodei, eu conhecia bem Andrea.

Ela é nossa vizinha na Aldeia dos Vitoriosos, e sempre duvidei que ela fizesse algo além de nos xingar e jogar pedras em nossas janelas.Andrea era uma mulher fria, que usava aquela cara de anjo e aquele corpo cirurgicamente modificado para tentar disfarçar o ódio em suas palavras.

Ela era uma mulher amarga e boa com mentiras, e foi assim que ela conseguiu vencer os Jogos Vorazes.Andrea fingiu-se de santa e inocente durante todo o tempo que ficou na Capital, mas tornou-se perigosa no momento em que tirou um 12 na apresentação individual.

Ela se aliou ao Carreiristas, matou várias pessoas, e no meio dos Jogos, enquanto seus aliados dormiam, ela matou um a um, para logo depois caçar os outros tributos até a morte.Mas mesmo depois disso, Andrea ainda conseguia convencer várias pessoas com suas mentiras bem criadas.

–Bem, se não vou poder comer esse tipo de coisa na Arena, prefiro aproveitar agora.-Digo indiferente.Ela sorri na minha direção.

–Querida, se eu fosse você, me preocuparia em achar alguma coisa para ser boa, além de gritar comigo pela janela.-Falou Andrea gentilmente.Sim, eu brigava com Andrea pela janela do meu quarto.

–Você não me conhece.-Digo simplesmente, enfiando mais bolinhos na boca.Andrea riu de leve e mordeu mais um pedaço do seu pão.

–Uma magrelinha metida como você não saberia nem ao menos atirar uma faca.-Ela falou com a voz melosa.Respirei fundo.

–Melhor uma magrelinha metida, do que uma vadia feia.-Digo me levantando e saindo dali, mas não sem antes escutar sua gargalhada.

–Não sou eu que preciso vencer os Jogos, querida.-Ouço a voz de Andrea.

Entro em meu quarto e me jogo sobre a cama, com raiva.Mas no fundo eu sabia que Andrea tinha razão.Ela podia saber mentir quando queria, mas era sincera na maior parte do tempo.E havia acertado quando disse que eu não sabia fazer nada, nem ao menos atirar uma faca.

Mas logo eu esqueci aquilo e caí num sono profundo e sem sonhos.Acordei com Affinie batendo em minha porta e pedindo me eu me arrumar, porque estávamos chegando na Capital.

Eu ia começar a tirar minha roupa quando a porta é aberta e Andrea entra.Ela me olha de cima a baixo e vai até a cômoda onde se encontram minhas roupas, e revira todas as peças delicadamente dobradas dentro das gavetas.Então ela atira um vestido cor-de-rosa para mim, a uma sandália branca com um pequeno salto.

–Você precisa de uma imagem, e eu, como sua mentora, digo que você vai se tornar a princesinha da Capital.-Diz Andrea decidida.

Eu sabia do que ela estava falando.Todos os tributos precisam de uma imagem, algo que faça as pessoas se lembrarem deles.Na época em que Andrea jogou, ela era a garotinha pura e inocente.Agora, que iria jogar era eu, e se Andrea diz que eu vou ser a princesinha da Capital, a princesinha da Capital vou ser.

Coloco o vestido, e Andrea penteia meus cabelos amarrando-os em uma trança lateral, colocando uma fitinha delicada na ponta da trança.Saímos do quarto e logo estávamos no vagão-restaurante.Eu sentia que a velocidade do trem diminuía e conseguia ver o mar.Finalmente o mar!

Me arrastei até a janela, espalmando as mãos sobre o vidro e desejando me jogar na água, nadar até a terra firme e fugir dos Jogos, fugir de tudo.Mas antes mesmo de eu tentar alguma loucura, tudo escureceu, e eu não conseguia ver nada.Estávamos em um túnel.

Logo saímos do túnel e eu não conseguia mais ver o mar, pelo menos não o mar normal.O único mar que eu conseguia ver, era o das pessoas estranhas em roupas mais estranhas ainda, gritando e acenando para nós.Me forcei a lembrar que eu seria a princesa da Capital e então comecei a acenar também, sorrindo, como se eu não estivesse caminhando para o que poderia ser a minha morte.

O trem parou, e então saímos.Foi tudo um borrão, e logo estávamos em um elevador que nos levaria para o nosso andar no Centro de Treinamento, o quarto andar.Ali iríamos esperar até amanhã a tarde, quando todos os tributos iriam desfilar em carruagens para serem apresentados ao público.

Assim que entramos no nosso andar, Affinie nos empurrou para a sala, obrigando-nos a assistir a reprise das colheitas.Ninguém me chamou atenção, exceto talvez pelo enorme tributo do Distrito 1, que era voluntário e poderia muito bem me esmagar entre as mãos.

Meu plano, logo após de ver aquela reprise, era me enfiar no quarto e dormir, até tudo passar e acordar só depois de os Jogos terem terminado.Mas entes mesmo de a reprise de fato terminar, alguém me puxou pelo braço em me arrastou até o que eu suspeitava ser meu quarto.

Percebi que esse alguém era Andrea.

–No que você é boa?-Ela indagou sem rodeios.Pensei um pouco.

–Sou boa atriz.-Digo, ligeiramente hesitante.Andrea negou com a cabeça.

–Sua imagem eu já defini.-Ela disse dura.-Quero saber da sua ação, do jeito que você age quando está tomada por adrenalina.Com que arma você é boa!

Penso um pouco.Tenho que me esforçar muito até lembrar da minha época dos doze anos, quando eu iria entrar pela primeira vez na colheita.Antes disso, meu pai me levou para o Centro de Treinamento local da cidade, onde os Carreiristas treinam a vida toda para os Jogos.

Meu pai queria me transformar numa vencedora, e me levou até lá na esperança de eu conseguir manusear alguma arma.Lá tinha de tudo, desde armas letais, até livros com tudo o que se precisa saber sobre os Jogos Vorazes.

Meu pai me apresentou para as armas.Facas, espadas, tridentes, lanças, arcos, machados, clavas, adagas, escudos e tudo mais que eu conseguisse imaginar.Mas nada daquelas coisas havia me atraído.Mas meu pai me obrigou a experimentar tudo, e logo foi confirmado que eu não seria uma vencedora.

Mas eu voltei ao Centro, determinada a deixar meu pai orgulhoso.E então, quando eu estava quase desistindo de tentar achar a arma certa para mim, eu vi.

Escondido bem lá no canto estava uma arma que ninguém dava bola.Tinha um cabo de couro com encaixes para os dedos, e da ponta do cabo, surgia uma corda longa, revestida de cobre.Um chicote.Um par deles na verdade.

Encantei-me por eles só de olhar.Fiquei horas treinando com aquilo e no fim do dia eu me senti realizada.Passei semanas e mais semanas treinando com os chicotes e logo eu os manuseava com facilidade e naturalidade, era quase como se a arma fizesse parte de meu corpo.

Então chamei meu pai e mostrei tudo o que eu conseguia fazer.Mas ele gritou comigo e disse que ninguém iria conseguir matar com um par de cordas inúteis.Aquilo murchou meu ego, e nunca mais voltei ao Centro de Treinamento, praticamente admitindo a minha derrota.

Olhei para Andrea, e então as palavras escaparam de minha boca:

–Eu era boa com chicotes.

Andrea me avalia por um tempo.Por um momento pensei que ela diria o mesmo que o meu pai “Ninguém consegue matar com chicotes”, mas ela apenas abana a cabeça e diz:

–É, dá pra trabalhar com isso.

E então ela sai do quarto, me deixando em paz para finalmente dormir e ficar bem comigo mesma.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado ;)



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