Regis um menino no espaço escrita por Celso Innocente


Capítulo 10
Os mistérios da Lua.


Notas iniciais do capítulo

Este capítulo é a continuação do capítulo anterior (ele foi dividido em dois por ser muito longo)



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Nos primeiros dias, naquele planeta, diferente da Terra em muitas coisas, mas igual em várias outras, fui à televisão por várias vezes e conheci a cidade inteira. Porém, a saudade de casa, não me deixava em paz e chorava praticamente todos os dias. De vez em quando, encontrava alguma alegria e até sorria. Passeava bastante e participava de eventos com muitas pessoas daquele mundo, que queriam e gostavam de simplesmente estar a meu lado, como se eu fosse uma espécie de Michael Jackson. A diferença, era que tal astro pop, era o melhor e mais premiado cantor e dançarino coreógrafo em toda a Terra, enquanto eu, não cantava nem no chuveiro; muito menos dançava, pois minha timidez não me deixava rebolar.

Ao tomar banho, o robô Luecy, sempre me acompanhava; mas devido às gozações que ele sempre fazia, principalmente em relação a meu corpo nu, chegou um dia em que resolvi proibi-lo de ir comigo ao chuveiro.

Porem, estando me enxugando antes de me vestir, em meu quarto, ele, já que não ia mais ao banheiro, aproveitou para a gozação:

— Fazia doze dias que não o via despido!

— E qual é a graça nisso? — Perguntei.

— Você é muito bonito!

— Robô não tem sentimentos! — Neguei.

— Você nem parece ser um menino!

— E o que eu pareço?

— Símbolo de beleza masculina com quatorze anos de idade.

— Pare com idiotice!

— Não é ofensa! É elogio!

— Olha aqui: — Aleguei bravo. — A partir de hoje, vou te proibir de me ver trocar de roupa, não só no banheiro, mas aqui também!

— Muito bem: — Disse ele, me segurando pela mão direita e me arrastando para fora do quarto. — Aqui fora não me proibiste de vê-lo desnudo!

Por má sorte, o senhor Frene, Tony, Rud e Leandra, passavam juntos pelo corredor.

Ao verem a cena, Rud me perguntou:

— O que está acontecendo?

— Desfile de bottomless! — Caçoou o robô.

Escapando do robô, retornei correndo a meu quarto, me enrolando no cobertor. Atrás entrou os demais.

— O que está havendo, Regis? — Perguntou-me o senhor Frene.

— Ele me proibiu de vê-lo trocar de roupa aqui dentro! — Insinuou o robô. — Então fomos lá fora!

— Por favor: Querem me deixar vestir roupa!

Todos se retiraram menos Luecy.

— É pra você sair também! — Ordenei.

— Que garoto chato! — Exclamou ele, saindo.

Abandonei o cobertor, vesti cueca, short e camiseta; deitei-me e comecei a rir sozinho, pensando no acontecido.

Eu era assim, considerado um menino muito bonito. Na realidade eu sabia que era comum como qualquer outro. Na Terra, sendo menino pobre, costumava brincar na rua, com outros garotos e garotas, descalço, maltrapilho, sujo e se mamãe não pegasse em meu pé, iria para a cama ou para a escola, até mesmo sem tomar banho. Tinha um amigo, adulto, senhor Luciano e esposa, que me consideravam um príncipe e me comparavam a um francesinho; mas eles também não contavam, pois me amavam como a um filho e dizem que pai não pode pintar o retrato do filho. Quem conhece a estória da águia e da coruja?[1] Mas ali em Suster, eu era mimado e admirado, como disse o robô: símbolo de beleza. O mais belo de todos os meninos do mundo. Mas que todos? Eu era único!

Dois segundos depois, Luecy tornou a entrar como um cachorrinho desobediente, insinuando:

— Já guardou o fazedor de xixi?

Levantei-me apressado, ameaçando espancá-lo.

— Que medo dele! — Caçoou o robô.

— Que diabo é bottom... Less?

— Sem fundo! — Ironizou ele me deixando na mesma. — Pode ser sem roupa.

* * * *

Poucas horas mais tarde, caminhava sobre o campo de pouso, com o senhor Frene. Enquanto ele me mostrava às belezas de seu mundo, conversávamos assuntos geralmente de mimo.

Após longa caminhada, resolvi perguntar-lhe:

— Ainda acho impossível em acreditar que o senhor me via na Terra, a hora que quisesse.

— Pois é! Parece impossível, mas eu via!

— É tão longe! Quando um repórter do Brasil vai falar com outro no Japão, pela televisão, a gente vê que a voz demora muito pra chegar. E olha que aquela distância não é nada!

— Mistérios do universo! — Brincou ele.

— Se nossa viagem demora setenta dias, a voz e imagem não pode chegar no momento em que se passa!

— Não acha muita coisa pra sua cabecinha infantil?

— É! Mas se eu não entendo, fico mais confuso!

— Por que um menininho tão jovem se preocuparia com isto?

Apenas balancei os ombros. Acho que me preocupa-va, por estar envolvido nisso.

— Vou lhe explicar um pouquinho. — Concordou ele. — O universo é muito extenso, eu sei! Nossas naves, assim como as galáxias, conseguem atingir velocidades muito além da que o seu povo chama de limite máximo, ou seja: a velocidade da luz. Agora, transmitir imagens e voz suas, através deste mesmo espaço em tempo zero, seria impossível para qualquer um, a menos que nós, susterianos, criássemos um pequeno atalho, fazendo um furo nesse espaço e tempo, por onde consigamos vê-lo e ouvi-lo, no momento em que você estivesse falando.

— O senhor criou este atalho?

— Como conseguiríamos vê-lo e ouvi-lo em tempo zero?

— Já que é assim, por que não conseguimos fazer também a tal viagem de setenta dias, em tempo zero?

— Porque o atalho daqui até os satélites dispostos na Terra é apenas um caminho virtual.

— O que é um caminho virtual?

— Por que não se dedica a aprender dentro de seu tempo! Seja apenas uma criança! É o que esperamos de sua permanência conosco!

— Parece impossível até que eu esteja aqui! Parece um longo sonho, que teima em não terminar.

— Mas é tudo verdade! Quer que eu lhe dê mais provas, de que eu lhe via na Terra?

— Não precisa! Já vi muito! Quero que o senhor apague aquelas coisas.

— São meras recordações de uma infância... feliz.

— Feliz?! — Admirei, não acreditando na tal infância feliz.

— Todas, ou pelo menos, a maioria das crianças tem uma infância feliz e só vai descobrir isso, depois que ficam adultas.

— O senhor acha que na Terra eu tinha uma infância feliz?

— Muito feliz! Como a maioria das crianças tem e não sabem!

Pensei um pouco, depois perguntei:

— Suster não tem luas?

— Tem! Duas!

— Nunca ví!

— Na Terra sua lua é visível devido às noites. Aqui como não há noites, elas ficam quase invisíveis. Mas elas estão lá, é só olhar com atenção. Sempre opostas uma da outra a uma altura de quinhentos e cinquenta e seiscentos e trinta mil quilômetros, girando na órbita de Suster.

Olhei para todo lado no espaço, em busca de uma das luas, mas não consegui encontra-la, até que o senhor Frene me apontou uma pequena bola branca, achatada, quase desaparecida no infinito espaço susteriano.

— Viu? — Sorriu ele. — Quase igual a sua. Qualquer dia te levo lá!

— Jura?

— Por que não? Tão perto!

— Na Terra, os homens dos Estados Unidos e acho que também Rússia, planejam dezenas de anos, pra poder levar uma pessoa à lua. Aqui o senhor diz: Qualquer dia te levo lá! — Falei com jeitinho caçoador, ou sarcasmo.

— Temos cinco mil anos de experiência no assunto! Sua NASA, que você diz homens americanos, tem apenas vinte e dois!

— É verdade que a lua interfere na vida do planeta?

— Com certeza! Você já foi ao mar?

— O que o senhor acha? — Especulei-o, sabendo que ele sabia. Quem me via na Terra, até na hora do banho?

— Não mesmo! Mas um dia vou te levar!

— Aqui tem mar?

— O Universo é infestado de cloreto de sódio. Portanto, água salgada tem em qualquer galáxia deste pequeno mundo.

— Pequeno!?

— Mas não temos mar aqui em Malderran! Isto é privilégio de quem está ao norte e ao sul.

Pensou um pouco:

— Do que falávamos mesmo?

— Sobre a lua!

— Se nas primeiras horas do dia de meu mundo, ou de manhã, na sua Terra, você se acomodar, sentado a cerca de dez metros da água, na areia da praia, vai perceber que uma hora depois, a água terá se aproximado alguns centímetros; algumas horas depois, a água já terá avançado alguns metros. Se ficar o dia todo, com certeza, no final do dia, a água terá lhe encobrido. Por que você acha que isto vai acontecer? Será que a água do mar aumentou?

— Se for na Terra, pode ser! — Dei de ombros.

— Por quê? — Insistiu ele.

— Devido o calor do dia inteiro, nos polos o gelo derrete e aumenta a água!

— Na verdade, a água deveria diminuir. Por quê? Devido o calor do dia inteiro, a água evapora e com isto diminui. O que acontece é um processo chamado maré da lua.

— O que é isso?

— A lua gira em torno da Terra, ou mesmo de Suster, como se fosse um anel. O que acontece é que ela tem uma força enorme sobre nossos dois planetas, como se fosse um grande imã e por onde passa vai tentando sugar o planeta pra si. Por isso que a água do mar parece aumentar de quantidade no decorrer das horas. Quando a lua sai daquele caminho, a Terra que fôra esticada, tende a voltar ao estado normal, fazendo com que a maré baixe novamente.

— Quer dizer que a Terra se move, mudando constant...const... mudando de tamanho?

— Mudando de forma! — O exemplificou com as mãos. — Na passagem da lua, sua Terra deixa de ser redonda e se torna oval. É devido a esse efeito também que existe grandes ondas no mar.

— As ondas não são formadas pelo vento?

— Também! A lua também ajuda na plantação de alimentos!

— Nunca vou aprender sobre isso!

— Você tem cinco mil anos pra isto. — Riu ele. — Por isso que lhe peço, queremos que seja apenas uma criança! Mudando de assunto: Como anda seu amigo robô?

— O Luecy? Ele está muito bem! Cada dia mais gozador!

— Faz trinta e cinco dias que você chegou aqui! Já está na hora de começar a conhecer o planeta. Não digo ir pra lua! Não por enquanto! Mas daqui a dois dias iremos fazer uma viagem até Orington. Quem sabe até o litoral.

— Orington? Imagino que seja outra cidade! — Afirmei.

— E é! Está ao norte, a sete mil e oitocentos quilôme-tros daqui.

— Vai ser divertido. — Ri. — Pois desde que cheguei aqui, só falamos sobre mim, meu passado e quase nada sobre vocês e seu planeta.

— Vai ser importante! Nessa viagem você conhecerá coisas extraordinárias.

— Quero conhecer o mar! Poderei entrar na água?

Mostrou-me o disco voador. Aliás: o mesmo em que cheguei ali, quando sequestrado na Terra. A seguir, me mostrou a nave que usaríamos para fazer a tal viagem a Orington. Era do formato de uma esfera gigantesca, um pouco achatada nas partes superior e inferior. Totalmente construída em cobre ou aço avermelhado.

Apertou um botão e a porta se abriu. Entramos e ele me mostrou as vinte acomodações estofadas, para passa-geiros. As estofadas, feitas em um luxo interplanetário, com distância entre elas, suficiente para se transformarem em verdadeiras camas, fazendo com que a viagem se torne muito confortável. A cabine, separada dos passageiros, muito luxuosa, dando vontade de ficar morando lá dentro; o para-brisa, com ótima visão em todos os ângulos; os controles, todos em teclas transparentes que se ascendiam em cores variadas.

— Quando eu estiver sem nada pra fazer, posso brincar aqui? — Pedi.

— Quando quiser! — Riu o homem, acreditando ter me cativado.

Dali retornamos à grande residência, aonde eu vivia com os demais.

Chegando ao quarto, como já se tornara hábito, me despi, ficando apenas de cueca e me deitei. Aproveitando a insônia e a saudade, minha mente começou a funcionar e assim, como as engrenagens de relógios despertadores, girando sem parar, meus neurônios passaram a planejar uma maneira de retornar à Terra.

Após muitos planos, sempre no positivo (nunca no negativo), encontrei um que achava ideal e resolvi colocá-lo em prática.

Com certeza, nada daria errado, então imediatamen-te, me levantei, tornei a me vestir e saí de mansinho, seguindo ao campo de pouso.

Poucos minutos depois, estava diante do disco voador: abri sua porta e entrei; tornei a fechá-la e me dirigi à cabine. Sua porta se abriu automaticamente; entrei e ela se fechou da mesma forma. Sentei-me na poltrona do piloto e pensei:

— Espero ainda saber como se dirige este bicho.

Apertei o botão ligar e aguardei. Depois apertei o botão acionar e logo após, o botão decolar. O disco começou a subir lentamente e eu estava sorrindo, com o coração batendo muito forte. “Finalmente, depois de setenta e cinco dias susterianos, mais de cento e setenta e sete dias terráqueos longe de casa, eu retornaria agora e em mais trinta dias, perfazendo um total de duzentos e quarenta e oito dias terráqueos, eu estaria novamente ao lado de mamãe, papai, meus irmãos, amigos, colegas de escolas e todos mais”.

Mas infelizmente aconteceu o inesperado: O disco se desgovernou e balançando como um pião tonto caiu de uma altura de aproximadamente duzentos metros, batendo com grande impacto no solo, começando a se incendiar rapidamente. Tentei sair, mas a porta principal estava travada e não se abria. Meu rosto e meu tórax estavam sangrando e o fogo se aproximava. Na porta, muitas pessoas que chegaram correndo apressadamente, começaram a bater para arrombá-la.

Após uns cinco minutos tentando, consegui abrir a porta; as pessoas me retiraram e percebendo-me um tanto intoxicado pela fumaça nociva, levaram-me a meus aposentos, na grande residência.

O Senhor Frene e Leandra me despiram daquelas vestes exangue e suja de fuligem, cuidaram dos ferimentos em meu tórax e rosto, me vestiram apenas com um pequeno short de pijama, feito de algodão, me colocaram na cama. Tudo isto sem condenar minha tentativa de fuga. Tudo sem mencionarem uma única palavra.

Os dois saíram, me deixando com o robô, que se aproximou e disse zombeteiro:

— Pensei que fosse inteligente!

— Não sabia que robô pensasse!

— Sigo a lógica a qual fui programado.

— Eu sou inteligente! O motivo do disco ter caído foi um erro de cálculo!

— Se conseguisse fugir, se perderia no espaço sideral!

— Fique sabendo que eu sei o caminho de volta pra Terra!

— Duvido!

— Quer saber de uma coisa: Eu não quero saber de conversa fiada!

— Robô não conversa fiado!

— Imagine se conversasse! — Caçoei.

— Tudo que menciono, é verdade!

— Por favor, Luecy, me deixe em paz!

— Você é quem manda!

E se retirou, me deixando sozinho.

Talvez devido a adrenalina causada pelo pavor daquela queda grave, acabei dormindo rapidamente.

[1] A águia e a coruja viviam em guerra: uma sempre devorava os filhotes da outra. Certo dia se reuniram pra tentar fazer as pazes. Dona coruja pediu: comadre águia, precisamos parar com nossas brigas, ninguém nunca sai ganhando e nossos filhotes sempre acabam devorados. A águia concordou dizendo: Tudo bem, a partir de agora seremos unidas e não devoraremos mais os filhotes uma da outra, já que existe tantos outros bichos para nos servir de refeição; só tem um pequeno problema: como reconhecerei seus filhotes. Ah, isso é fácil! Exclamou dona coruja. Quando encontrar os mais belos filhotes do mundo, com certeza são os meus. Um dia a águia estava caçando e encontrou um ninho com três filhotes horrendos e devorou-os. Quando dona coruja viu tal cena, ficou brava dizendo: Comadre águia, como pode ser traidora? Não havíamos feito um acordo de paz? Sim dona coruja. Disse a águia. Quando vi aqueles filhotes horríveis pensei: não devem ser filhotes da dona coruja...


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Notas finais do capítulo

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