Regis um menino no espaço escrita por Celso Innocente
Notas iniciais do capítulo
Este capítulo foi editado e separado em dois devido a pedidos por estar muito longo.
Aproximadamente oito horas terráqueas depois, acordei assustado, ouvindo uma voz forte:
— Garoto Regis, hora de acordar!
Acordei me esticando todo, espreguiçando sobre a cama e me surpreendendo com um verdadeiro robô à minha frente: Não era muito diferente daqueles em que a gente vê nos filmes. Semelhante a uma figura humana; pouca coisa maior do que eu; dourado, feito de aço e quando falava, com sua voz metálica, ascendia várias luzinhas, das cores do arco Iris em seus olhos e peito. Amedrontado, saltei da cama, perguntando forte:
— Quem é você?
— Um robô susteriano! Como pode ver!
— Um robô? E o que você está fazendo aqui?
— Como todo mundo, vim fazer amizade com o garoto da Terra!
— Mas o garoto da Terra sou eu!
— Não disse o contrário!
— Quem fez você? — Vesti camiseta.
— Não fui gerado como você!
— Eu sei que não! Você acha que sou bobo?
— Pelo contrário: é muito inteligente! Quase igual a mim!
— Quase igual? — Duvidei. — Sou muito mais inteligente do que você!
— Ninguém pode ser mais inteligente do que um robô susteriano!
— Eu posso! E posso provar!
— Como um filhote de gente, cabelo espetado, pré-tende provar que é mais sábio do que um robô susteriano?
— Não tenho cabelo espetado! — Retruquei, esfregando as mãos na cabeça.
— Parece arame farpado!
— É que acabei de levantar!
— Como vai provar ser mais inteligente do que um robô avançado?
— Tenho uma idéia: eu lhe faço uma pergunta e você me responde! Depois você faz uma pergunta pra mim!
— De acordo! Pode começar!
— Deixe-me ver... — Pensei um pouco. — Qual é a minha idade?
— Em anos, dias, horas, minutos, segundos ou décimos?
— Sei lá! Minha verdadeira idade!
— Quatorze anos, trinta e nove dias, oito horas, quarenta e um minutos e sessenta e nove segundos.
— Mas que confusão é essa?
— Sua idade real!
— Quero minha idade, como se fosse na Terra!
— Nove anos, noventa dias, dez horas, vinte e cinco minutos e treze segundos.
— Acredito em você! — Dei de ombros. — Como posso duvidar? Agora pode fazer sua pergunta!
— Bem fácil. — Insinuou o robô. — Qual à distância da rota criada entre nossos dois planetas?
— Fácil mesmo! — Me exibi. — Oitenta e sete anos-luz!
— É preciso dar a resposta em quilômetros!
— Isso é impossível!
— Não para mim!
— Muito bem seu engraçadinho! Prove melhor sua inteligência! Qual é a distância?
— Oitocentos e vinte e três trilhões, sessenta e seis bilhões, seiscentos e trinta e dois milhões, setecentos e oitenta mil e quatrocentos e quarenta e sete quilômetros de distância.
— Quê! — Me espantei.
— Sabe essa magnitude numérica?
— Mag... O quê?
— Analfabeto!
— Idiota! — Retruquei.
— Magnitude! O tamanho do número! O analfabeto garoto da Terra conseguiria escrever tal ordem numérica?
Pensei um pouco e balançando os ombros insinuei um tanto duvidoso:
— Posso provar!
Levantei-me, seguindo até o tal armário, apanhando com certa dificuldade, devido a altura em que fôra colocada, a minha bolsa escolar; joguei-a sobre a cama, apanhei um caderno e um lápis preto, ajoelhei-me no chão e pedi:
— Repita o número.
— Oitocentos e vinte e três trilhões, sessenta e seis bilhões... Basta até aí.
Na folha do caderno, anotei:
82366000000
Mostrei a ele, franzindo o nariz.
— Burrinho! — Ironizou o robô.
823660000000
— Volte para a escola! — Insinuou cantado com a voz eletrônica.
82366000000000
— Experimente separar com pontos.
823.66.000.000.000
— Não consigo decifrar esta grandeza!
Observei o caderno, apanhei uma borracha, apagan-do, corrigindo os pontos e acrescentando novo zero.
823.660.000.000.000
— O número apresentado não confere!
— Como não! — Reclamei.
— Leia-o, por favor!
— Oitocentos e vinte e três milh... Não! Bilhões, Seiscentos e sessenta bilhões...
— Bilhões de bilhões?! Fugiu da escola!
— Não fugi da escola! — Neguei bravo. — Ainda não aprendi tudo isso!
— Escreva conforme eu dito! Oito... Dois... Três... Zero... Seis... Seis...
823066
— Acrescente a sequência de nove zeros, separado por pontos.
823066.000.000.000
— Quase certo! Só faltou os pontos!
— Como você consegue ler? — Especulei-o. — Quer dizer: Seus olhos podem enxergar minhas letras e sua cabeça entender elas!
— Meus olhos com sistema foto acoplador, podem ver e distinguir detalhes, melhor do que os seus e meu cérebro com o mesmo tamanho de sua massa encefálica processam em um segundo o que o seu levará toda sua existência quase imortal para decifrar.
— O que significa a palavra planeta, em grego? — Me exibi, aproveitando trecho que ouvi em um documentário pela tevê.
— Viajante do espaço! O que é Grego? — Emendou-me a uma pergunta complicada, para meus nove anos de idade.
— Sei lá! — Balancei os ombros. — A linguagem falada na Grécia antiga. Eu acho!
— Uma etnia criada a partir de vários grupos: gregos micênicos, surgiram mil e duzentos anos antes de seu Cristo; gregos bizantinos...
— Ei chega! — Interrompi-o. — O que menos quero agora é uma aula de história. Ainda mais sobre gregos!
— Quem é o mais inteligente?
— Eu! — Brinquei. — Sou o único gente aqui! Você só pode ser intelirobô!
Pensei um pouco e perguntei-lhe:
— Como você consegue saber tudo?
— Possuo um micro processador interno!
— Assim não vale! Você é tudo máquina!
— E muito bem construído!
— Quem te criou?
— Essa pergunta já foi formulada!
— Mas não foi respondida corretamente!
— Fui construído em uma fábrica de computadores, em Merlin.
— O que é Merlin?
— Uma cidade, localizada ao lado oeste de Suster.
— Qual é seu nome? Só robô?
— Ainda não fui batizado!
— Pois então vou te batizar agora! Você passa a se chamar... — Pensei um pouco. — Luecy!
— Nome de mulher!
— Esse nome é masculino e feminino! — Insinuei. — Te dou esse nome, que é igual ao de um amigo meu metido a sábio, como você!
— Agradeço!
— Mas me diga uma coisa: Quem te adquiriu?
— O Senhor Frene.
— Desde quando?
— Acabei de chegar! Vim direto conhecer meu dono!
— Seu dono! Quem?
— Você, Regis!
— Quer dizer que você é um presente do senhor Frene... pra mim?
— Estou programado para lhe atender! Farei e responderei tudo o que você quiser!
— Mas eu não quero ser seu dono! Quero ser seu amigo!
— Já é!
A porta se abriu e entrou Leandra, dizendo:
— Regis, hora do banho! Vamos?
— Muito obrigado Leandra! Agora eu já aprendi a tomar banho sozinho e vou usar o banheiro do quarto! Não precisa me ajudar!
— Acontece que é minha tarefa, levá-lo ao banho! — Insistiu ela.
— Ela pensa que você é nenê! — Alegou o robô.
— Eu sei! — Afirmei rindo. — Mas não sou!
— Ela vai insistir pra lhe dar banho!
— Cale a boca seu robô hipócrita! — Reclamou ela.
— Leandra, pode deixar que eu tome banho sozinho!
— Já que insiste: — Concordou ela. — Vou cuidar de minhas obrigações!
— Vai tarde! — Caçoou Luecy.
A mulher se retirou. Comecei a rir, insinuando:
— Coitada Luecy! Ela é muito gentil!
— Gosta muito de você!
— É verdade! Ela e todos desse planeta gostam muito de mim!
— Garoto especial!
— Vamos tomar banho?
— Robô não toma banho! — Negou ele.
— Mas pode vir comigo!
— Não sentirás vergonha de mim?
— Por que deveria sentir? — Ri. — Você é homem!
— Sou uma máquina!
— Melhor assim! Vamos!
Seguimos para o banho. Acabei de me despir e entrei no chuveiro. Assim que começou a cair água, Luecy se afastou alegando:
— Detesto água!
— Por quê? Ela te dá arrepio?
— Não! Dá ferrugens!
Ao ouvir aquilo, desliguei o chuveiro apressado, corri pegando a toalha e enxugando apressadamente os respingos de água que caíra sobre o robô, dizendo:
— Como sou burro, meu amigo! Não tinha pensado nisso! Você é feito de aço!
— Sou feito de metal muito bem trabalhado!
— Então a água não te dá ferrugens!
— Danificam meus circuitos eletrônicos!
Acabei de enxugá-lo bem, coloquei a toalha sobre o cabide e retornei ao banho.
— Você sem cascas é uma gracinha! — Caçoou ele. — Leandra tem bom gosto!
— O que é cascas? — Não entendi a metáfora.
— Acessórios! Roupas!
Terminado o banho, fui me trocar no quarto, onde deixara as roupas. Luecy me acompanhava sempre e sempre fazendo suas gracinhas.
Enquanto me vestia, a porta se abriu e entrou o senhor Frene:
— Espero que esteja se divertindo com Mark Três!
— Quem é Mark três? — Perguntei admirado. — Luecy?
— Quem é Luecy? — Perguntou o homem.
— Luecy sou eu! — Afirmou o robô.
— Quem te deu esse nome besta?
— Nome besta, quem me chama! — Caçoou o robô.
— Eu o batizei! — Disse-lhe.
— Esse nome que você deu a ele é de mulher!
— Mentira! Tenho um amigo que se chama Luecy!
— Acontece que ele já tem nome: Mark Três!
— Não gosto desse nome besta! — Negou o robô.
— Pra mim ele continua sendo Luecy!
— Já que vocês insistem: não seja por isso! Nem vamos discutir!
— Senhor Frene: — Chamei triste. — Sei que o senhor me ama e que todos me querem muito bem. Mas não posso ficar aqui!
— Você se acostumará! — O alegou.
— Não me acostumarei! — Neguei. — Já estou com muitas saudades da Terra! Estou sofrendo!
— Te ajudarei a não sentir saudades!
— Mas como? Isso vem do coração!
— Por isso que robô não sente saudades! — Interferiu Luecy.
— Faremos uma pequena cirurgia em você.
— Cirurgia?! Por quê?
— Fazer você esquecer pra sempre da Terra!
— Esquecer da Terra? Não quero!
— Pra que você não sofra mais! E o mais importante: Fará com que você passe a gostar daqui!
— O senhor pretende tirar meu coração? — Perguntei trêmulo.
— Claro que não! Se um louco fizer isto, você morrerá na hora!
— Ninguém vive sem coração! — Interferiu Luecy. — Nem eu!
— Que cirurgia é essa?
— Em seu cérebro! Nosso sistema é muito avançado em relação ao seu. Você não sofrerá nada! Nem um corte! Nem uma dor e nem uma gota de sangue sairá de você!
— Não haverá faca e nem injeção na bunda! — Caçoou Luecy.
— E eu vou me esquecer da Terra? Papai, mamãe, a escola e todos de lá?
— É pro seu bem!
— Não! Nunca vou me esquecer de lá!
— Você é quem sabe! — Afirmou o senhor Frene. — Nós só queremos o seu bem!
— Isso não é meu bem!
Ele se retirou um pouco nervoso. Sentei-me na poltrona e Luecy me disse:
— Você terá que fazer a cirurgia. Terás vida eterna em Suster! Não retornarás à Terra jamais!
Ouvindo estas palavras sem sentimentos, só me restava chorar e foi o que fiz.
O robô caçoava:
— Chorar não faz parte da vida de um homem!
— Não sou homem! E tenho saudades de casa!
— Não sabia que você era mulher!
— Sou menino! Você sabe disso!
— Menino homem, ou vira-latas?
— Cale a boca, sua peste enlatada! — Gritei nervoso.
— Peste enlatada, mas não molho a cama com urina!
— Não faço xixi na cama, seu enferrujado!
— Enferrujada é sua cara molhada de lágrimas!
— Chega de conversa fiada.
Fui me deitar.
— Pelo menos, se esqueceu de chorar. — Alegou ainda ele.
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Como saberei se este capítulo foi realmente lido até seu final se o leitor se tornar um fantasma?
Mesmo que seja uma palavrinha.