Eu acordei quase ao amanhecer ouvindo Nico murmurar na minha cama. Esfreguei os olhos e me sentei no colchão que coloquei no chão para dormir e olhei para ele. Ele parecia normal, estava com o rosto sereno e ressonava baixinho. Pensei que era coisa da minha cabeça, bufei e voltei a me deitar.

– Como eu iria esquecê-lo? - O moreno murmurou novamente e eu voltei a me sentar, o observei.

– Se apaixonando por outra pessoa, como eu disse. - Murmurei de volta, idiotamente, ele não deve estar realmente me ouvido.

– E quem seria o felizardo? – Sua voz era rouca e arrastada. Ele se virou para o lado e colocou as mãos como se estivesse rezando em baixo do rosto e soltou o ar. Engatinhei ate ele ficando de frente para seu rosto.

– Alguém que te entenda... Alguém que realmente valha a pena você amar e que te corresponda...

– Onde... Eu acharia alguém assim? – Ele sussurrou e bocejou. – Todos têm medo de mim...

– Nem todos... - Eu disse e ele virou um pouco o rosto, seus cabelos caíram na frente de seus olhos, passei minha mãos por eles e os tirei de seu rosto. Eram macios.

– O único ate agora foi você... Está se oferecendo? - Riu sonolento. Senti meu corpo esquentar, assim como meu rosto. Olhei seu rosto com mais atenção, Nico tinha um rosto angelical, nada extraordinariamente bonito, mas com sua beleza... Acabei respondendo sem pensar direito enquanto passava o dedão sobre a maçã do seu rosto.

– Talvez... – Sussurrei, ele sorriu e se remexeu se colocando de um jeito mais confortável na cama. Continuei ao seu lado mexendo em seu cabelo e observando ele dormir por mais alguns minutos, ele não acordou ou falou mais, ainda não era hora de levantar, então voltei a dormir também.

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–Jason?.... Jason! Acorda! – Senti me chutarem, virei minhas pernas e dei uma rasteira na pessoa que caiu em cima de mim e a agarrei. – Me solta cara! – Abri os olhos e uma luz branca me segou, soltei a pessoa tampando os olhos com a mão. Ela praguejou e me chutou de novo. – Nico, Percy, Piper, qualquer um! Tirem esse idiota da cama! – Finalmente reconheci a voz de Leo.

– Deixe ele dormir Leo!- Gritou Percy de algum lugar, provavelmente o corredor.

– Não Percy!- Era a voz alarmada de Nico. – Me dá essa caneta, Perseu!

– Ah cole! É nosso ultimo dia! Eu tenho que fazer isso!!!- Disse ele, mesmo de olhos fechados posso ver a cena. Nico no batente o encarando, Percy sorrindo cruelmente armado com uma caneta, Leo olhando pra mim com duvida entre ajudar Percy a me rabiscar ou a Nico a me defender.

– Fique longe de mim, peixe. – Eu disse rouco ainda pelo sono, ele bufou.

– Deixe ele dormir, francamente...- Disse Nico sem paciência com a situação.

– Você mesmo não dorme, fique quieto.- Disse Leo. Abri os olhos devagar quando senti as vibrações vindo de Nico. Percy tentou tocá-lo sem muita confiança e Leo deu um passo para traz com medo.

– Me lembre de te contratar, Nico. – Ele me olhou sem entender, sorri para ele. – Com essa sua habilidade de afastar as pessoas com a aura, nunca vou ter de me preocupar com as tietes...- Ele revirou os olhos e a aura desapareceu.

– Levanta daí antes que eu decida fazer algo a respeito. – Ele se virou e saiu andando sem se importar com nada. Me sentei e olhei para Leo.

– Não deve provocá-lo assim. Nico com raiva é perigoso... – Levantei os braços e estiquei o corpo, me sentia bem de alguma forma, relaxado.

– Acho que ele só faz isso para parecer durão. Não pode ser tão perigoso assim. Ele deve só precisar de um abraço. – Percy coçou a nuca e olhou para o lado.

– Definitivamente... Nunca tente fazer isso. – Ele disse. – Ele vai te dar de brinquedo para Cerberus se tentar encostar nele.

– Fala serio gente! – Disse Leo levantando as mãos. – Ele não pode ser tão... – Ele parecia querer ilustrar o que falava com as mãos, as mexendo incessantemente e por fim bufou. – ELE! Algo tem que afetar esse cara!

– Você vai ter ate o por do sol de hoje para saber...- Disse Percy levantando o rosto para ele.

– Como assim? – Perguntei bocejando.

– Vamos sair em casais hoje. Não sabemos o que pode acontecer, então decidimos passar esse ultimo momento com nossas namoradas...

– Em uma relação entre mim e Nico... Quem seria a mulher? – Perguntou Leo batendo o dedo na boca e olhando pensativo para o teto, revirei os olhos. – Afinal, se vamos sobrar e passar o dia de casas juntos, eu deveria pensar nessa possibilidade...

– Você, com toda certeza. – Eu respondi e Percy o analisou de cima abaixo para logo concordar comigo. – E me explique sobre esse dia de namorados. – Me levantei e arranquei a blusa sobre a cabeça a jogando na cama enquanto caminhava ate o guarda roupa, Percy entrou no quarto fechando a porta e Leo se sentou em posição de Buda na cama com os braços cruzados atrás da cabeça.

– Annie acha que devemos passar o dia que temos antes de tudo acontecer junto com a pessoa que amamos. – Disse ele se encostando na porta. Retirei as calças e as joguei na cara de Leo ficando somente com a Box azul.

– Hei! – Disse Leo irritado jogando a roupa para o lado. – Não sou cesta de roupa suja sabia? – O ignorei e tirei uma calça jeans do guarda roupa.

– Não devíamos encontrar o lugar e acabar com o plano antes que ele comece? – Perguntei vestindo a calça. Percy acenou que sim.

– Eu falei isso, mas ela me disse que não encontraríamos nada, eles já devem saber que estamos aqui, então ate o ultimo segundo vão se esconder e nos atrair quando precisarem dos sacrifícios...

– Um menino e uma menina...- Disse Leo. – Bem, devo ficar feliz por passar o dia com Nico, seremos dois meninos e nenhum monstro virá atrás de nos procurando um casal...- Abotoei as calças e tirei uma camisa pólo azul do cabide.

– Mas nenhum mostro vai nos atacar? É perigoso Percy... - Passei a camisa pela cabeça e a estiquei no corpo.

– Annie disse que eles não tem motivos pra isso. Sabem que iremos atrás deles cedo ou tarde, provavelmente eles estão muito preocupados com toda a cerimônia de despertar para se importarem em vir atrás de nós e provavelmente protegidos o bastante para não temerem que os encontremos... – Massageei as têmporas.

– Ela já contou para Piper? – Leo riu e pulou da cama.

– Ela já esta se embonecando toda para passar o dia com você. – Disse ele rindo e se virou para Percy. – Devo por um vestido para agradar a Nico? – Percy revirou os olhos, mas riu.

– Não faça esse tipo de piada quando ele estiver perto...- Eu disse saindo do quarto. – Ele vai te matar. – Leo xingou algumas coisas em espanhol e começou a conversar com Percy.

Passei pelo corredor em direção à cozinha. Esse plano de Annabeth é perigoso e egoísta. Sei que ela não fez por mal, mas ela pensou em como Nico e Leo vão se sentir? Leo deve pensar em Calipso, e que não poderá se despedir e Nico... Praguejei e cerrei os punhos. Nico ficará desconfortável e voltará à melancolia de antes ao pensar em Percy e Annie aproveitando o ultimo dia de suas vidas como um casal feliz e ele permanecer sozinho com seus sentimentos não correspondidos. Entrei na cozinha ainda xingando baixinho, Nico estava debruçado ao lado de Hazel, lhe mostrava algo em um mapa, Hazel sorriu e abraçou o irmão sorrindo, Nico beijou sua bochecha e me encarou.

– Mais cuidado com a boca perto da minha irmã, Grace. – Suspirei e me sentei de frente para eles pegando uma pêra da cornucópia de Piper.

– Desculpe. – Ele voltou a mostrar o mapa, Hazel acenou que estava entendendo e por fim fechou o mapa e o guardou na bolsa. – Você também vai sair com Frank? – Perguntei e ela corou.

– Nico estava me mostrando os lugares mais legais nessa parte da Grécia. –Ela esfregou as mãos. – Vou levar Frank para um passeio turístico...

– Parece um bom plano. Divirtam-se. – Ela acenou que sim e se levantou, Nico se levantou também e lhe beijou a testa sussurrando algo em seu ouvido, ela riu e saiu dali acenando. Ele voltou a se sentar e rodou uma maçã no dedo. – Desde quando você conhece a Grécia? É proibido para semideuses vir para as terras antigas... Perigoso...- Ele sorriu de lado e deu de ombros.

– Para vocês pode te ser, mas não para mim. Eu vou aonde eu quero pelas sombras, e meu pai não segue as regras do Olímpio. De certa forma, temos mais liberdade de ir e vir. – Ele parou a maçã e a mordeu.

– Queria poder viajar assim também... Era meu sonho vir aqui com Reyna antes, conhecer o passado, depois viajar novamente e visitar as relíquias e templos em Roma... – Ele assentiu e engoliu a fruta.

– Eu conheci boa parte do mundo viajando pela sombra, mas na maioria foi ao acaso e acidental, eu estava testando meus poderes. Eu passei a ter mais cuidado para onde ia somente quando os monstros me encontraram e me empurraram para o tártaro. Depois daquilo... Eu passei a controlar e ter certeza de onde eu estava indo, para não cair em uma emboscada. Digamos que eu me achava bastante antes disso acontecer e ia sem medo. Mas agora eu sou mais cuidadoso. – Ele disse aquilo como se não se importasse em ter ido nas profundezas do abismo, mas eu vi em seus olhos, ele tinha horror daquele lugar, ele conhecia o verdadeiro medo e mesmo assim, conseguia se erguer e lutar para continuar seguindo.

Na maioria do tempo eu o via como um cara ante-social e medonho, assim como todos. Só depois do encontro com Eros que eu passei a vê-lo como um menino que precisa de alguém para que cuide dele e lhe de um ombro para chorar as magoas... Mas ninguém parece lembrar que esse menino ante-social já foi sozinho ao tártaro e voltou, que ele é tão, ou mais, poderoso que eu e Percy. Eu tenho que me lembrar disso, que Nico não é frágil como aparenta, nem física, nem sentimentalmente.

– Eu admiro você....- Eu disse ainda perdido nos meus pensamentos. Ele tombou a cabeça um pouco.

– Como assim?

– Sua força. Eu admiro isso. Você foi para o tártaro e voltou, mas ninguém parece admirado ou se importar com esse fato... – Seus olhos escureceram e ele soltou a maçã meio comida na mesa.

– As pessoas não reparam em mim, nem se importam. Provavelmente ninguém dos acampamentos sabe desse fato...

– Ou preferem não acreditar. Você é o mais novo de nós e fez isso ainda anos atrás, quando estava se descobrindo como semideus... É admirável, porem deve assustar as outras pessoas. – Ele balançou a cabeça.

– Todos eles tem vários motivos para não se aproximarem de mim. Medo é um deles. E assim eu prefiro. Não quero atenção voltada para mim, sei do que sou capaz e não preciso de ninguém para me dizer isso. Prefiro me manter distante e que ninguém saiba. Atenção de mais nunca é bom. Desconcentra. O Ego... É o pior inimigo para a força, se for grande de mais a pessoa pode se achar invencível e esquecer que sempre haverá alguém mais forte. Eu já experimentei isso e quase morri. Pessoas assim provavelmente morrem da maneira mais idiota por ter se superestimado. – O olhei mais admirado ainda e sem palavras. Ele voltou a pegar a maçã e a comer. – Aonde vai levar Piper? – Disse ele e eu abaixei a cabeça na mesa. – Você tem que fazer algo legal para ela.

– Eu sei, ok?- Suspirei entre meus braços. – Eu só não estava planejando nada de especial. Na verdade, meu plano era treinar, comer e dormir o dia todo para me preparar. Ter um encontro nem passou pela minha cabeça.

– Seus planos são sempre ótimos, devo dizer. – Disse irônico e eu tive de concordar. Em meu ultimo provável dia eu havia planejado a companhia de minha espada á da minha namorada. Que me dêem o troféu do pior namorado!

– Obrigado por dizer isso, ajudou muito! – Respondi e sei que ele revirou os olhos, levantei o rosto e olhei para ele. – Me ajuda? – Ele levantou uma sobrancelha. – Você conhece algum restaurante? Ou algo assim?

– Você tem dinheiro? – Voltei a abaixar a cabeça e bati a testa no tampo da mesa, não me importei com isso. – Acho que não. Bem, você pode levar ela para conhecer as ruínas do templo de Afrodite, ou para um museu, os parques aqui também são bem bonitos...

– Não quero correr o risco de encontrar a mãe dela. Museu precisa de dinheiro também Nico... – Voltei a me levantar, dessa vez da mesa. – Me sobra os parques. – Ele acenou que sim. – O que você vai fazer o dia todo?

–Não sei, talvez treinar? – Ele coçou a nuca. – Não tem muita coisa que eu possa fazer aqui, talvez eu vá dar uma volta por ai, ver se começo a colocar seu plano em pratica...

– Meu plano?- Levei um segundo para entender e aquilo não me agradou por algum motivo. – Haaaa...- Ele riu.

– Mas não vou fazer... Não teria coragem sem ninguém para me obrigar a isso ou pressionar. Ficarei no navio, provavelmente dormindo...- Balancei a cabeça para ele e o encarei.

– Leve Leo para dar uma volta. – Ele fez uma careta.

– Ele me irrita.

– Leo é legal Nico. Você vai ver. Vocês podem ser grandes amigos...- Ele sorriu cínico. – Tente pelo menos, saiam do navio e tomem um ar. Vão beber ou o que mais se pode fazer aqui. Tente se divertir. – Ele revirou os olhos e bufou.

– Tudo bem. Mas se ele me irritar, o mando de volta para o navio amarrado e amordaçado. – Pensei seriamente no assunto.

– Ninguém ia sair perdendo nessa. – Ele sorriu e Piper me chamou assim como Percy, olhei para Nico e mordi a pêra que eu nem havia tocado ate agora. Ele tinha um resquício de tristeza no olhar. – Não vamos demorar muito.

– Tanto faz. – Ele se levantou e entrou em uma sombra na parede. – Se vocês podem se divertir, vão e se divirtam. – Ele desapareceu, encarei a parede ate terminar a pêra e corri para o banheiro, escovei os dentes e encontrei todos na ponte de desembarque.

– Que demora, Piper é a filha de Afrodite e você é o ultimo a ficar pronto? – Disse Percy irritado.

– Achei ofensivo. – Disse Piper pegando minha mão. – Você está lindo.

– Obrigado. – Ela se colocou nas pontas dos pés e me beijou. – Vamos? – Acenei que sim e todos caminhamos para o porto.

Olhei para o mastro, e como eu esperava, Nico estava la, de costas para nós, parado e com o vento batendo contra seu rosto, seu cabelo ricocheteava ao seu redor. Olhei para a amurada e Leo estava encostado nela e nos olhava melancólico. Mesmo sorrindo abertamente, eu pude ver que ele se sentia mal por estarmos saindo assim, ele estava se sentindo como a sétima vela, a que sempre fica sozinha. Suspirei e me senti mal por deixá-los, mas eu tenho que ser um bom namorado também, apertei a mão de Piper e ela sorriu.

– Hoje vamos nos divertir. – Acenei que sim e beijei sua testa.

– Vamos.