Fui para casa e me joguei na cama. Já tinha contado sobre Josh para Kylie. Ela chegaria em poucos minutos. Passaríamos o resto do dia juntos.

– Trevor? – uma voz trêmula falou, abrindo a porta do meu quarto.

Abri os olhos e olhei. Era a Kylie.

– Oi mana – eu a chamava assim. Isso fez Kylie se deprimir um pouco – Ei, não fique assim, Josh não iria gostar de vê-la triste.

A garota sorriu.

– Eu sei que não. Mas aí, o que vamos fazer?

– Besteira – respondi, abrindo um sorriso – Tive uma ideia ótima.

Kylie riu, e se sentou na cama ao meu lado.

– Que ideia?

– Acho que não sou vândalo de mais. Vou fazer alguma besteira. Tipo...

– Coisas de adolescentes – Kylie interrompeu – Ficar bêbado, fazer amor, pichar paredes, etecetera.

Fiz uma careta, depois ri.

– Topa?

– Tirando a parte de fazer amor, sim.

Nós rimos. Pode parecer muito estranho, mas não sou mais virgem por causa da Kylie. Minha primeira vez foi com ela.

Descemos para a Terra, e por vício da garota compramos três garrafas de vodca, e uma de vinho. Poderíamos ter feito isso no Mundo Negro, mas achamos melhor não. Enfim, compramos algumas latas de tinta spray e pichamos numa parede, ao lado de um prédio: “FUCK SOCIETY”. Voltamos para a minha casa, pichamos a minha própria parede – sei lá o porquê – e descemos para a cozinha. Ligamos o som no máximo, e começamos a beber. Lembro de cair no chão, e bater a cabeça.

***

Abri os olhos. A música ainda tocava. Olhei em volta, e vi Kylie no sofá, com a garrafa de vodca vazia na mão. Me esforcei para levantar; minha cabeça latejava. Levantei do chão, meio tonto. Desliguei o som, e olhei no relógio que horas eram. Duas... da tarde. Nossa. É, vodca com vinho não é uma mistura muito boa.

Sorri ao me lembrar do dia anterior. Na verdade, eu tinha sonhado com ele. Foi interessante, divertido. Me fez lembrar um pouco do Josh, ele gostaria de ter uma noite assim. Dessa vez não me deprimi. Os anjos, quando morrem, tem a escolha de renascer, ou ficar no lugar onde chamamos de Além. Josh estaria bem, onde quer que estivesse.

Uma mão tocou meu ombro, e me puxou para trás, me fazendo cair no chão. Fechei os olhos, não querendo ver quem ali estava. Senti a respiração mais próxima do meu rosto.

– Tá vivo ainda? Eu vim falar oi, não te levar junto comigo para o Além.

Reconheci a voz. Uma lágrima escapou dos meus olhos, um sorriso besta brotou no meu rosto.

– Trevor, saiba que eu posso ficar com você até morrer. Indo e voltando, mas posso.

Não consegui me segurar, e ri. Abri os olhos, e me deparei com olhos negros, como os de Kylie. Um sorriso travesso estampado no rosto, junto com cabelos castanhos caídos na testa.

– Me diz que não estou sonhando – falei.

– Não, o efeito da vodca já passou – disse ele.

Me sentei no chão.

– Josh – murmurei – Não era de se esperar você tão feliz assim.

Josh riu.

– O Além não é ruim. Ah, soube da farra de vocês dois ontem – ele tentou ficar sério, mas não conseguiu – Queria ter participado.

Kylie se remexeu um pouco no sofá. Josh foi até ela, e se sentou no chão. Mesmo ele sendo uma alma, estava ali, junto conosco. Tecnicamente estava vivo.

Instantaneamente lembrei do Eduard e da Mackenzie. Fazia um tempo que não a via, e fiquei meio mal pelo Eduard. Eu não troquei uma palavra com ele depois que Josh foi morto, e isso foi meio grosseiro. Também o dispensei quando quis me ajudar a superar.

Ignorei os pensamentos e deixei Kylie com Josh na sala. Subi para o meu quarto, tomei um banho, vesti meu pijama e olhei pela janela. Estava chovendo. Por mais que tivesse acabado de acordar, minha cabeça ainda doía, e não conseguia escutar direito por conta da música alta. Me deitei na cama, e me cobri. Fechei os olhos, e pensei, numa visão que tive da guerra. Josh ainda estava vivo nela, o que queria dizer que, agora que ele não está, o futuro poderia ser alterado. Eu poderia ficar vivo, e Mackenzie também. Mas existiam várias possibilidades, como, Mackenzie poderia ter sido morta por outro anjo negro, ou... Ah meu Deus. Josh, naquela visão, estava com uma lança nas mãos, conversando com a Mackenzie, que chorava. Na última visão, ela estava morta, com uma lança enfiada nas costas. Não, não seria possível. Josh não faria isso. Mas... bem, o futuro teria que mudar agora, certo? Josh não estava mais vivo.

Outra possibilidade invadiu minha mente. Percebi que, a lança que Josh tinha, era a minha. E se a Mackenzie na verdade estivesse chorando em cima de outro corpo? E se o Eduard fosse aquele corpo?

E se...

Eu a tivesse matado?