Carlos Daniel narrando:

Passei a noite em claro pensando no que deveria fazer, sem conseguir deixar, lógico, de recordar o gosto dos lábios de Paulina.

Havia muita coisa em jogo, porém depois de muito refletir e colocar em uma balança os prós e contras, finalmente cheguei à uma conclusão: É hora de buscar minha felicidade.

Os primeiros raios de sol da manhã começavam a invadir meu quarto. Seria em vão ainda tentar dormir, e ainda mais agora que estou tão decidido.

O relógio marcava 5:30. Tomei um banho e fui em busca do bispo em sua casa, era a ele que deveria me dirigir.

Um pouco nervoso e receoso sobre o que o mesmo me diria, contei-lhe sobre Paulina e meus sentimentos, omitindo apenas o beijo, por não ter coragem de admitir frente a ele meu pecado. Após isso, manifestei meu desejo de deixar o sacerdócio.

Então, sem receber qualquer julgamento ou "bronca" de meu superior, fui informado que, pelas regras da igreja católica, primeiramente receberia uma licença de dois meses, durante a qual poderia levar uma vida "normal", para que nesse tempo pudesse me certificar se realmente era essa minha decisão, embora eu já tivesse essa certeza. Depois disso, deveria procurá-lo novamente e informar minha resposta final, e esta sim seria definitiva.

Por um lado, fiquei triste comigo mesmo por ter fracassado como padre. Por outro, estava aliviado, pois não tinha mais que me sentir culpado por estar apaixonado.

Sabia que quando contasse tudo isso para minha mãe, ela se decepcionaria, mas já tinha feito sua vontade por tanto tempo, agora mereço viver do meu jeito. Uma coisa aprendi: não se pode ser perfeito aos olhos de todos. E foi exatamente essa lição que me fez ficar seguro quanto ao que estava fazendo.

Voltei para a paróquia e fui até os fundos, onde fica meu quarto. Entrei e analisei cada canto daquele lugar, apesar de estar vivendo ali há menos de um ano, com certeza marcou uma grande fase da minha vida. Tirei a batina que vestia e guardei-a na mala, juntamente com minhas outras coisas.

Depois, fui até a igreja, não poderia deixar de fazer isso. Ajoelhei-me frente ao altar, baixei a cabeça e pedi perdão a Deus, por não ter desistido do seminário enquanto havia tempo e acabar cometendo um pecado. Rezei com toda minha fé, pedindo a ele que me abençoasse durante a nova vida que estaria prestes a ter, e que permitisse que pudesse ser feliz ao lado de minha amada.

Fiz o sinal da cruz e saí de cabeça erguida, contente, apesar de tudo.

Chamei um táxi e parti rumo a minha casa, somente lá explicaria tudo aos meus pais. Mas assim que cheguei, tive uma surpresa nada agradável.

– O que houve, Maria? Diga-me! - perguntei ao perceber o quão nervosa estava uma das empregadas que me recebeu

– É que... que... sua mãe acabou de ligar para avisar que aconteceu um acidente!

– Que tipo de acidente? Ela está bem? E onde está? - confuso, enchi Maria de perguntas

– A dona Cristina está bem, quem se machucou foi o senhor Maurício! - tentou explicar

– O que aconteceu com meu pai?!

– Bem, é que os senhores foram passar uns dias de férias em Acapulco, e no caminho houve um acidente de carro. Não sei bem o que aconteceu, desculpe! - respondeu-me, chorando devido ao nervosismo

– Tudo bem, Maria. Acalme-se, estou indo para lá.

Tantos acontecimentos em poucos dias, como isso é possível? Perguntei-me, já a caminho do aeroporto.

Por sorte, consegui um voo que saía em vinte minutos. Enquanto aguardava na sala de embarque, tentei ligar para minha mãe, em busca de notícias, mas a ligação caiu na secretária eletrônica.

Logo, chegou a hora do voo e embarquei pensativo, torcendo para que nada grave tivesse acontecido.

Senti uma sensação estranha, como se algo me aguardasse em Acapulco. No entanto, o que poderia ser?