Facilis Densensus Averno escrita por Heosphoros


Capítulo 8
Despedidas


Notas iniciais do capítulo

"Cantei sobre o caos e a noite eterna,
Ensinado pela musa divina a me aventurar
No declínio sombrio, e subir para reascender..."

John Milton



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Quando Jace e Valentim se foram, Clary pensou seriamente em colocar tudo para fora e falar a verdade. O pior que poderia acontecer era o pai expulsá-la de casa e separá-la de Jace para sempre... O que, no final das contas, não importaria. Os dois poderiam se encontrar mais tarde e viver uma vida feliz que ninguém ficaria sabendo ou se preocuparia em saber.

Pode ser fantasia demais, mas qualquer coisa parecia melhor que ficar sozinha em casa com Sebastian.

Claro, tinha os empregados e Jocelyn, mas isso era o mesmo que nada.

Sentada na escada do jardim, Clary observou a paisagem verde adiante e questionou a si o quão doloroso seria ficar eternamente afastada de Jace. O silêncio total ajudava para os pensamentos fluírem, mas ela ainda não fora testada de verdade. Não sabia como seria.

– Clary.

Ao invés de virar o rosto, ou olhar para o céu particularmente azul daquele dia (que até poderia ajuda-la a se acalmar), Clary resolveu fechar os olhos. A escuridão doída de suas pálpebras ajudou na concentração, e luzes pequenas se misturaram em seus olhos.

– Oi, Jace – disse, já sabendo quem estava atrás dela. Ouviu alguns passos e sentiu uma presença próxima a ela. Jace havia se sentado a seu lado, como raramente costumava fazer quando ela decidia sentar-se ali para observar os morros.

– Estamos indo – ele disse – papai está colocando as malas na carruagem.

– Quanto tempo? – ela perguntou baixinho.

– Duas semanas.

Conseguiria ficar longe dele?

– Vamos nos ver em Londres? – ela tornou a perguntar, sabendo que (provavelmente) Sebastian não a deixaria sair para ver quem mais amava... Mas, sinceramente, ela não dava a mínima.

Mas Jace simplesmente respondeu:

– Acho que não.

Duas semanas...

Pouco tempo comparando a quanto tempo ficaria caso falasse toda a verdade.

Mas seria mesmo?

– Vai passar rápido – Jace garantiu – só algumas conversas mesquinhas entre ricos, aristocratas e burgueses e, num piscar de olhos, estaremos de volta para a velha rotina infernal de sempre!

Ela não riu.

Abriu os olhos, sendo surpreendida pela quantidade exagerada de luz solar que preencheu sua visão rapidamente, e então virou o rosto para encarar o irmão adotivo.

Jace vestia um traje preto, caindo para cinza, e os cabelos loiros estavam jogados para trás. Seus olhos cor de âmbar estavam fixos nela, e pareciam o espelho da dor. Seu meio sorriso, porém, mascarava essa dor com um sarcasmo cruel.

– É – foi o que ela disse, encarando-o como se pudesse ver dentro de sua mente – semanas costumam passar bem rápido.

Ele olhou para baixo, onde a grama verde como os olhos de Clary alcançava as escadas de madeira, e suspirou. Ela imaginou como conseguia ficar tão próxima dele, ouvindo sua respiração e sentindo seu cheiro, e não tocar um dedo sequer em sua pele.

Sinceramente, não conseguia.

Clary voltou a encarar os morros, verdes contra o dourado do sol. Se olhos dela e os de Jace pudessem se fundir, ficariam com aquela tonalidade... Harmoniosa, natural, perfeita.

Sem se controlar, ela agarrou a mão dele com força. Ele apertou sua mão de volta, e os dois ficaram daquele jeito, sem se olhar e segurando a mão um do outro como se pudessem fazer tudo desaparecer caso impusessem uma força correta.

Ela não conseguia afrouxar o aperto nem um pouco.

– Jace, eu tenho que falar algo sobre Sebas...

– JONATHAN! – urrou a voz irritada de Valentim lá de dentro – DÊ LOGO ADEUS À CLARISSA E VAMOS EMBORA!

Jace olhou para ela e, sorrindo como tudo estivesse bem, soltou sua mão.

– Honestamente, acho que ele é capaz de ir embora se você demorar mais um segundo – ela disse, tentando parecer com bom humor, mas sua voz saiu mais fraca e melancólica que a de um defunto (se os mortos falassem).

– Creio que ele tenha amor ao próprio Ego – Jace falou, sendo bem sucedido no exercício “esconder suas emoções angustiantes com ironia” – aparecer no noivado de William Herondale sem minha presença seria desastroso para toda a festa de noivado.

– Claro que seria – ela murmurou, então olhou nos olhos deles – Até logo, Jace.

Ele se levantou e sorriu para ela.

– Até logo, Clarissa.

E se foi.

Enquanto observava os cabelos dourados como os de um anjo esvoaçando-se com o vento, e o andar arrogante e ao mesmo tempo delicado de Jace ao se afastar, Clary chegou a uma conclusão:

Não. Não conseguia ficar nem um minuto longe dele.

_

Valentim já estava dentro da carruagem, a postura ereta e o olhar superior como de um verdadeiro nobre inglês. Sebastian não se preocupou em seguir o exemplo dele enquanto esperava Jonathan encostado na árvore mais próxima, com os cabelos loiros caindo pelo rosto e os ombros curvados.

– Oh! Aí vem ele – Valentim disse com seu deboche habitual – estou apresentado, Sebastian?

Sebastian nem teve o trabalho de analisar a aparência do pai com atenção.

– Ótimo como sempre, pai – respondeu.

Só tirou os olhos dos próprios pés, porque a figura totalmente desagradável de Jonathan se tornou próxima o suficiente para que Sebastian tivesse que encará-lo para um “adeus” aliviado e feliz por se ver livre do mauricinho.

Jonathan estava com os cabelos amarelos jogados para trás, e seu traje fazia com que ele se parecesse com Valentim na atitude arrogante que todos os seus filhos haviam herdado (com exceção de Clary, como sempre).

– Olá, Sebastian – saudou sério, porém com um ar totalmente entretido.

– Suponho que seja “adeus”, Jonathan.

Ele ajeitou o paletó preto, aproveitando para dar de ombros logo depois.

– Não sabia que estava assim tão ansioso para se livrar de mim – algo em seus olhos dourados brilhou ao encarar o rosto entediado de Sebastian – quase ficou convincente se oferecendo para vir aqui... Cansou de jogar xadrez?

Sebastian trincou os dentes de forma imperceptível.

– Na verdade vim dar “boa sorte”. Mas você não precisa, precisa Herondale?

Os olhos de Jace pararam de brilhar, mas ele sorriu num ato óbvio para disfarçar.

– Quem tem talento e boa postura geralmente não precisa – falou, piscando um dos olhos – acho que não posso dizer o mesmo de você, Sebastian.

– Vamos logo, Jonathan – reclamou Valentim – estou cansado dessas brigas desnecessárias de vocês dois.

– Não estamos brigando, pai – Jace falou com um sorriso mais largo – apenas tendo um pouco de diversão – fez uma pausa – até logo, Sebastian.

– Até logo – Sebastian respondeu sem alterar a expressão.

Jace entrou na carruagem, que partiu rapidamente.

_

Pelo resto do dia, Clary ficou trancada no quarto, aguardando alguma ordem psicótica de Sebastian como se um prego tivesse sido martelado em seu peito.

Só de noite, porém, ele teve notícias ou qualquer indício de que seu irmão existia. Alguém colocou um bilhete por debaixo da porta e, levantando da cama pela primeira vez durante todas aquelas horas, ela foi buscar à passos pesados e dolorosos.

O bilhete continha apenas quatro palavras:

Arrume-se. Vamos à Londres.


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Notas finais do capítulo

Desculpe por demoraaar, gente!!! :'( Esse fim de semana foi postar bastante para compensar, okay?

Meu tempo está MUUUITO apertado. :/