Facilis Densensus Averno escrita por Heosphoros


Capítulo 14
Instrumentos Mortais


Notas iniciais do capítulo

"Eu não dormi
Entre a execução de algo temeroso
E o primeiro ato, todo ínterim é como um fantasma ou um sonho terrível;
O gênio e os instrumentos mortais
Então em concílio; e o estado do homem,
Como para um pequeno reino sofre, então
A natureza de uma insurreição".

William Shakespeare



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Sebastian parou no meio do jardim. A espada afiada como dentes de um tubarão estava presa em sua bainha, a adaga kindjal (gêmea da que entregou à Clary) também estava segura e pronta para ser sacada. Ele dispensou escudos e armas de fogo. Iria encarar aquilo como sempre encarava. Um jogo de movimentos.

Não sabia quantos iriam procura-lo. Mas estaria pronto.

E o pai? O mesmo covarde de sempre. Sebastian não se surpreendeu ao saber que ele estava foragido e que tinha desaparecido depois da notícia do assassinato de Hodge... Pangborn também não se surpreendera.

Valentim sentia nojo da previsibilidade, quando ele mesmo era o maios dos previsíveis.

Cavalos se aproximaram, no horizonte colorido da planície esverdeada. Sebastian viu a quantidade - cerca de quatro - mas não se intimidou, não se arrepiou. Sentia apenas uma leve percepção das coisas; a brisa de verão balançando seus cabelos, o céu azul acima de sua cabeça e a leve sensação de liberdade nos braços e pernas.

Cruzou os braços. E esperou.

Aproximaram à galopes despreocupados. O Homens da Scottland sempre tiveram todo o tempo do mundo; como se a Eternidade estivesse diante deles de joelhos. Sebastian também tinha tempo. Sua irmã estava a salvo. Ele não tinha nada a perder.

– Sebastian Morgestern - um deles o saldou, vestindo seu traje azul-marinho e com uma pistola negra visível no cinto - o senhor está preso por cometer traição à Coroa Inglesa e para com a própria Rainha Imogen.

Um deles desceu do cavalo.

– E também é acusado pelo assassinato de Sir Hodge Starkweather - disse este - cuja punição é a forca.

Os outros três também desceram de seus cavalos; as armas carregadas, os olhares preparados. Sebastian respirou fundo, a brisa entrando nos seus pulmões e depois saindo.

Ergueu os olhos negros para eles.

– Posso dizer algo em minha defesa? - indagou.

– Não creio de que valerá de muita coisa - disse o que desceu do cavalo primeiro, pegando uma algema prateada - mas isso não lhe é negado.

O rosto branco como mármore de Sebastian rasgou-se num meio sorriso demoníaco.

– Bons sonhos - sussurrou.

Num giro perfeito ele sacou a espada e golpeou o soldado mais próximo na barriga, deixando um rastro e um linha rubra pelo caminho. Os outros pegaram suas armas e dispararam; mas não existia pessoa mais rápida que Sebastian Morgestern. Ele arrancou a mão de um com a adaga e cortou o pescoço de outro com a kindjal, até sobrar mais nenhum.

Com as roupas sujas de um líquido escarlate que não lhe pertencia, Sebastian ficou imóvel enquanto a sensação de adrenalina ia se esvaindo. Não achou que seria tão fácil e gostaria de ficar ali, esperando que o resto deles chegasse.

Então um grito.

Tudo aconteceu rápido demais.

Num minuto, ele se virava para ver o que estava acontecendo.

No outro, viu Clary. Seus cabelos vermelhos como sangue voando como vento enquanto ela corria no meio daquela grama, da cor de seus olhos.

Então viu um guarda - o que havia golpeado primeiro - erguer a mão trêmula que segurava a pistola na direção dele e recarrega-la.

Havia tempo de correr, se esquivar ou até interceptar a bala com a adaga.

Mas a irmã se aproximava como um cavalo de corrida.

Clary corria rápido demais, quase na mesma velocidade com que ele se movia em batalha, e quando ela estava perto o suficiente para levar um tiro no lugar dele, Sebastian a empurrou para longe com toda a sua força.

O som de um tiro.

Ele sentiu ser atingido, na lateral do corpo, e a dor começou a puxá-lo para baixo. Para o chão. Seu sangue misturou-se ao sangue dos homens que matara. E ele foi sentindo o corpo pender como um saco cheio de chumbo suspenso por uma corda fraca.

Caiu.

Com a visão turva e borrada, ele viu Clary se levantar. Algo prateado brilhava nas mãos dela, um borrão de prata e outro borrão vermelho. Ela foi caminhando como se fogo ardesse no olhar e, num lançamento perfeito, a adaga deixou suas mãos para atingir a testa do Homem de Azul restante.

Ela se virou. Parecia um anjo aos olhos dele. Um anjo da cor do pôr-do-sol.

Clary ajoelhou-se ao lado dele, segurando sua cabeça com cuidado. Ele olhou bem no fundo de seus olhos. Verdes. Como uma manhã de primavera. Ela virou o rosto. Gritou alguma coisa. Mas o quê? Para quem?

Então olhou para ele novamente.

– Você vai ficar bem, Sebby - falou com a voz suave - eu prometo.

– Clary, eu falei para você fugir sua garota teimosa!

Ela riu. Um som angelical.

Ele não conseguiu evitar em curvar os lábios para cima. Com ela, aquilo acabava se tornando um hábito.

– Não podia deixar você aqui. Não consegue se virar sem mim.

– Tem razão - ele disse, mais sério - eu não consigo.

Ela inclinou levemente o rosto. Ele sentiu que ela iria beijá-lo, queria que ela beijasse. Depois de todo aquele tempo, vendo-a como sua pequena e frágil tábua de salvação, ela finalmente parecia sentir o mesmo por ele. Uma coisa errada. Pecaminosa.

Mas nada em Clary parecia ser errado.

– Clarissa - uma outra voz surgiu. Sebastian franziu o cenho; a confusão fez seu ferimento doer e sua visão ficar mais embaçada. Tudo se tornou um borrão dourado e azul; e quando o foco retornou, ele estava encarando o irmão mais novo.

Jace pairava em pé, diante dos dois. Os cabelos dourados pareciam os mesmos, os olhos da cor de âmbar pareciam irritantes e indiferentes como sempre pareceram. Vestia algo branco e a postura estava curvada para encarar o rosto do irmão mais velho.

– Não posso sair por duas semanas e olha o caos que acontece - falou.

– Sua preocupação me lisonjeia, Jonathan - Sebastian grunhiu, numa mistura entre dor e irritação.

– Eu lisonjeio a todos - então olhou para Clary, mais sério. Perfeito! Tudo voltará a ser o que era antes. E Sebastian ainda estava seriamente ferido, para tornar tudo mais legal - temos que leva-lo a um curandeiro que mantenha a boca fechada. Toda Inglaterra está procurando por ele.

– Bane - Sebastian grunhiu, se levantando com dificuldade - Pode fazer tudo com o pagamento certo... Me levem até ele.

Um brilho de reconhecimento e esperança cruzou os olhos de Clary.

– Sim, eu o conheço - virou-se para o irmão adotivo - pode dar certo, Jace.

O rosto de Jonathan era duro e dourado como ouro bruto. Ele olhou para a irmã por um tempo, depois para o buraco feito pela bala na lateral do corpo do irmão, e deu de ombros.

– Se ele pode resolver o problema, então vamos até ele.

– Ótimo - Clary passou o braço de Sebastian pelo pescoço dela - vamos levá-lo.

Ergueram-no. E o mundo inteiro virou um borrão de cores esquisitas. Sebastian sentiu uma pontada fina e gélida de dor, antes de tudo se tornar um breu total.


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Notas finais do capítulo

Genteeee, chegamos a 100 comentários! *u* queria agradecer a todos vocês, divos, lindos, maravilhosos, por serem leitores tão dedicados e perfeitos!!!!

Também quero agradecer especialmente à NanysAraujo por sua linda recomendação! Muito obrigadaaaaa, mil vezes obrigada *-*