A Faísca: 70° Jogos Vorazes - Interativa escrita por Tiago Pereira


Capítulo 2
Capítulo 2 - Distrito Doze


Notas iniciais do capítulo

Primeiros tributos, Distrito 12, aloha! Boa leitura.



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Leven Styles

Rolo para o lado da cama, péssima opção. Sou empurrada Zora, que é golpeada pelas pernas de Allexe. Nós três dividíamos a antiga cama de casal do papai e da mamãe. Eu tinha uma cama própria, até a morte da minha genitora no parto delas. Foi uma tragédia, realmente, uma perda irreparável. O papai trabalhava nas minas, porém, entrou em depressão e morreu um ano depois da mãe.

Não tive outra opção, já pensei em entregá-las, dar para alguém que quisesse cuidar delas, mas eu não podia. Vendi roupas, móveis - entre eles minha cama - e pensei em vender minha própria vida. Bem, eu pensei em ser voluntária nos Jogos. É um absurdo, eu sei, mas era para que elas conseguissem alguma coisa.

Claro, depois de tantas perdas, só me restou trabalhar. Lavo roupas das pessoas pelo Distrito 12. É legal, mas trabalhoso, minha frequência nas aulas são mínimas - mas eu tenho inteligência, não sou negligente a ponto de falar a primeira coisa que me vem a cabeça.

A luz é emanada por dentro do cômodo sinistro, iluminando parte do quarto. Tento não abrir os olhos, porém sou forçada quando alguém - ou Zora ou Allexe - me acerta em cheio no cóccix. Respiro fundo, mordo os lábios para não gritar, abro os olhos de ímpeto e então anuncio da forma mais gentil possível.

– Vamos acordar, meninas.

Há alguns resmungos, mas nada que algumas cócegas nos pés não resolvam. Nós trocamos os antigos pijamas verdes, elas se arrumam para o café-da manhã. Vasculho os armários da cozinha: poeira, pães mordidos por ratos e mais poeira. Em uma das portas uma teia e um inseto enorme e peludo pronto para atacar sua presa - eu. Solto um grito agudo, e ouço passinhos descerem a escada. Me viro e minhas irmãs alteram a aparência de estupor para gargalhadas.

– É só uma aranhazinha! - diz Zora, em intervalos para risadas. Ela se dá o esforço de matá-la para mim.

– Obrigado, não temos nada - percebo a preocupação em seus rostos - quase nada. Vou na senhorita Toureen, já venho.

Caminho até a saída, assegurando-me de que as duas estejam quietas em seus lugares na mesa. Acho que elas irão me obedecer, cuidei delas sem precisar apelar para a violência. Apenas com simpatia, paciência e honestidade, embora precisasse mentir a elas algumas vezes. Por exemplo, tinha que esconder que Cray, o Pacificador-Chefe do 12 dorme com mulheres e dá comida.

Bato na porta da casa vizinha. Ela se abre com um ranger e a senhora de cabelos loiros, olhos âmbar, ligeiramente corcunda aparece. Creio que ela acordou recentemente, como eu.

– Bom dia! - saudo-a, simpática.

– Ah, o que faz aqui tão cedo? - ela diz, rude.

– Eu só queria...

– ... tá, tá, já sei... - ela atropela minha fala.

– Não precisa de muita coisa, tem as tésseras. - Digo, e ela para de ímpeto. Então começa a encher uma bolsa, percebo que ela tem bastante comida.

– Tome isso, filha - a senhora Toureen me entrega a bolsa, com um tom curioso de dó. Nem tenho tempo de agradecer e ela fecha a porta. Claro que ela está farta, mas não deixa de nos ajudar.

É claro, amanhã é dia da Colheita, a primeira das minhas irmãs. É claro que nenhuma será selecionada. Quando volto, as duas estão em seus devidos lugares, Zora acaricia os cabelos escuros de Allexe, herdada da mãe. Nós três possuímos cabelos pretos iguais da mãe, porém, o que me difere delas são os olhos azuis do papai.

Despejo a comida sobre a mesa. Repartimos uma maçã, comemos com xarope de milho e eu raspo o mofo do queijo. Após a refeição, elas se ajeitam e vão para a escola. Certo, agora é a minha vez de se preparar.

Subo até o banheiro e encho a pequena banheira de água morna. Com um balde, lavo meu corpo, e visto um vestido verde. Vou até a frente do espelho rachado e passo a escova sobre as madeixas. Sorrio para meu reflexo e observo que a cama permanece desajeitada.

Apressada, apenas cubro a cama com a coberta e saio de casa. Levo apenas o material necessário: esponja, produtos e um balde. Sigo para a primeira casa, perto da sapataria, na praça do Distrito 12.

Dimitrius Clackerman

Ultrapasso a cerca que divide a Costura da Campina. Ninguém me observa, sou invisível neste momento. Dou uma leve corrida pela floresta. As folhas caídas formam um som crocante. Escondido perto de uma pedra, o meu arco, coberta por folhas. Subo o tronco da árvore e puxo, do galho parrudo, a bainha com flechas. Esta é uma das únicas formas de sobrevivência no Distrito 12, embora a caça seja ilícita.

Só que não é apenas forma de sobrevivência, é um lazer. Mas caso eu vá para os Jogos, seria mais uma arte de sobrevivência. Os Jogos Vorazes, o "entretenimento" mais inútil que poderiam ter inventado. Principalmente no Distrito 12. Ser selecionado para os Jogos, significa morte. Morte significa que minha família não vive sem mim. Não quero me gabar, mas minha mãe não consegue nos sustentar sendo professora na escola. Ela não ganha absolutamente nada, mas por sorte só tem dois filhos. Eu e Gaintel, o mais novo.

Digamos que nós somos sobreviventes. Ele está no segundo ano para seleção dos Jogos, e eu estou indo para o penúltimo. Sim, sou um sobrevivente, embora já tenha trocado a quantidade do meu nome por grãos e óleos. As tésseras, uma forma que não me prejudicou até hoje. Meu nome está lá trinta e seis vezes, não fui escolhido nenhuma vez.

Andejo pela floresta, sorrateiro, apenas precisando de minha perspicácia para conseguir algo para comer. Ouço rápidos passos leves correrem sobre minha cabeça. Ajeito a flecha no cordel em busca do animalzinho e aponto para o galo. Ele dá uma pequena corrida e minha flecha corta o ar até seu corpo. Ele cai de lado e eu o deixo de lado, escondendo de presas.

O que foi e não foi uma boa ideia ao mesmo tempo. Quando eu voltei, um peru selvagem e um frango cercavam o esquilo. Eu já estava com outros três, quando os ergui. Os animais vieram na direção dos esquilos. Ajeito as iscas em cima de uma rocha.

Fácil, as duas flechas acertam os corpos magros das aves. Hoje irei lucrar, pensei. Finalizo minha caça, escondo meu "arsenal" e volto para o Distrito 12.

Vou ao Prego, onde troco um peru por várias frutas e algumas carnes. Greasy Sae me oferece um ensopado grátis, eu não hesito e aceito. O ensopado é de ervilha, e muito saboroso.

– Pronto para a Colheita? - Greasy pergunta.

– É o meu penúltimo ano, e agora eu estou muito perto de ser excluído desse troço, então estou preparado. Só fico imaginando se o Gaintel for escolhido - respondo.

– Ele é um bom garoto e também tem potencial. Como você - ela tenta me agradar. Quer dizer, eu não sei realmente se tenho grandes chances, embora seja ligeiramente alto e forte. Beleza não é lá um ponto forte meu, nunca perdi meu tempo sabendo se sou belo ou não. As meninas cochicham quando eu passo, mas acho que é para me zombar, uma vez que sempre vou com mordidas de animais, ou sujo.

– Obrigado - termino a sopa. - Preciso ir à sapataria.

– Ver aquela garota? - ela pergunta, com um sorriso dócil no rosto.

Ela se referia à Vibia, a filha do sapateiro e melhor amiga minha. Ela é o oposto meu. Loira, olhos azuis, baixa, magra. Eu sou bi-racial, de olhos cinzas, igual a todos na Costura - a parte mais pobre do Distrito 12.

– Não... - digo constrangido - preciso trocar estes esquilos por sapatos novos, pra amanhã, acho que você me entende. Até mais!

A caminhada é um pouco longa, e quando chego lá ela está empilhando as caixas, seu rosto sujo de graxa.

– Precisando de ajuda? - indago.

– Oi, Dimitrius. Isso aqui é moleza. - Ela coloca as caixas em um estofado - O que faz aqui?

– Negociar com seu pai.

– Você vai trocar estes esquilos por minha mão em casamento? Que lindo...! - ela diz, em um tom irritante. Ela sabe que eu jamais irei me casar.

– Não seja boba, você é um ano mais nova e eu preciso de botas novas para amanhã.

– Ugh, fica tranquilo, a Capital nem vai filmar você, porque não será chamado.

– Assim espero. Chame seu pai, por favor.

– Pare de ser egocêntrico, qual o seu tamanho?

– Ah, qual é, você não vai escolher minhas botas.

– Diz aí - ela insiste, eu abro o jogo.

– Quarenta e dois - digo. Ela puxa uma caixa e me entrega. Eu retribuo com os esquilos. - Então... é bom que elas não grudem no chão.

– Ah, não venha com essa. Até amanhã?

– Até amanhã.

– Bom Jogos Vorazes, que a sorte esteja sempre a seu favor - dizemos em coro, imitando Effie Trinket e seu sotaque da Capital.

Terceira Pessoa

Enfim chegara o dia da Colheita. Todos se uniam neste dia, cobravam menos nas trocas. Era um dia completamente diferente. Na fase da tarde, um palco foi montado em frente do Edifício da Justiça, todos os funcionários da Capital estavam lá. A praça estava decorada para esse dia, e se enchia aos poucos.

Após todo o processo de identificação, coleta de sangue e separação de meninas e meninos, uma mulher sai do interior do prédio. Com seu casual vestido laranja e peruca rosa, Effie Trinket era a representante da Capital e estava sorrindo, empolgada. Junto dela, Haymitch Abernaty, mentor e único que venceu os Jogos Vorazes pelo Distrito 12, aparentemente sóbrio.

– Bem-vindos, bem-vindos. Chegou a hora de escolher um jovem e uma jovem corajosos para a honra de representar o Distrito Doze na Septuagésima edição dos Jogos Vorazes! Mas antes, eu trouxe um vídeo da Capital.

O hino começa. "Guerra, uma terrível guerra". Leven estava cansada de ouvir a mesma frase todo ano. Com um vestido verde franzido e laço combinando, a garota estava no miolo de garotas. As gêmeas estavam mais a frente, com o estômago embrulhado. As cenas de mortes, glória, ambas misturadas eram repugnantes.

Dimitrius praticamente repetia todas as frases em tom baixo. Nada diferente de Effie, que aplaudia sozinha. Ela torna a falar após o fim do vídeo.

– Eu sempre me emociono... Agora, vamos escolher. Primeiro as damas. - Ela segue na direção esquerda com um enorme pote circular de vidro. Haymitch desperta de um sono que chegara. Algumas garotas torciam para seus nomes não serem escolhidos, outras mal respiravam. Não era o caso de Leven, ela tinha quase certeza de que seu nome não estaria lá. Ela nunca pediu tésseras, e suas irmãs estariam com o nome uma vez. Era s única confiante em meio aos rostos apreensivos.

Effie apanha um papel, vai até o microfone e rompe o lacre. Ela lê o nome, e como esperado não foram as gêmeas.

– Leven Styles! - anuncia Effie, sorridente.

Leven sente o intestino revirar. Está a ponto de cuspir as tripas. As suas irmãs choram inconsoladas, e ela tem de seguir lentamente ao lado da representante.

– Agora os homens - e repete a cerimônia. Puxa um nome, rompe o lacre e anuncia.

Para azar do próprio, ela chama Dimitrius Clackerman.

Estupefato, Dimitrius vai até o palco, com as juntas duras. Leven fica preocupada, pois Dimitrius era filho da dona da casa que ela fora lavar roupa pela primeira vez aos doze anos. Ela se recordava muito bem que ele roubou dois vestidos de sua mãe e ofereceu à ela. Segundo ele, esses vestidos lembravam o pai dele, que morreu na explosão das minas.

O jovem estica a mão para ela, e ela retribui.

– Ótimo, ótimo, estes são os tributos da Septuagésima edição: Leven Styles e Dimitrius Clackerman!


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Notas finais do capítulo

Leven = Alexandra Daddario;
Dimitrius = Taylor Lautner.