Avatar: A Lenda de Zara - Livro 1: Água escrita por Evangeline


Capítulo 2
Capítulo 1: Explicações e Despedidas


Notas iniciais do capítulo

Atualizado em 09/01/2019



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Cercado por paredes de gelo, o lago de águas cristalinas brilhava brevemente, no centro dele uma porção de terra repleta de grama comportada repousava , com poucas pedras cobertas de musgo e duas pontes em suas extremidades, conexões com o iceberg pelo qual a Tribo inteira era formada.

No centro da grama, uma poça brilhante, com poucos centímetros de profundidade, onde dois peixes nadavam em círculos, um ao redor do outro. Um Negro com um círculo branco brilhante na cabeça emanando luz nas águas transparentes. O outro, tinha a cor dos olhos do Negro, brilhava como um fogo branco, deixando um leve rastro de luz conforme nadava calmamente, e tinha um círculo negro na cabeça, contrastando perfeitamente o outro.

A menina já estava acostumada com toda a luz que os peixes emanavam no local, mas ainda ficava encantada com a beleza das águas se movendo e brilhando.

— Zara? – Perguntou uma voz feminina e dócil, num chamado calmo. A menina se aproximou da beira da pequena poça e ajoelhou-se, observando assim com mais claresa os dois peixes. A voz nao vinha do lago, ela ecoava pelo ar, sem fonte clara.

— Sim, sou eu. – Disse a menina cumprimentando o espírito.

— Eu sabia que viria. – Respondeu com um tom quase orgulhoso na voz, fazendo a menina abrir um pequeno sorriso de canto.

— Eu... – Começou, hesitante. – Vim porque Tuí me chamou. – Disse, baixinho, desviando o olhar do peixe branco.

— Fale. – Ecoou a voz o espírito da Lua. A menina estremeceu.

— Amanhã partirei para encontrá-lo no mundo real. – Começou a explicar. - Mas não sei como chegar ao Oásis Espiritual, e nem ao menos tenho lugar para dormir durante a noite, no meio do caminho para lá. - Disse meio hesitante, aguardando a voz masculina e potente se fazer ouvir.

— Não seja tola. Não há razão para se preocupar. – Ressoou o espírito. – Nós estaremos como você por todo o tempo. – Completou. Apesar da voz firme e ameaçadora, aquelas palavras tranquilizavam a menina.

Zara sentou-se mais confortavelmente, de pernas cruzadas, perdida em seus pensamentos. Nunca havia ido mais de dois bairros além da sua casa, e morava próxima ao muro. Para chegar ao seu destino precisaria cruzar toda a Tribo.

— Em quê tanto pensa, menina Zara? – Perguntou La com sua doce voz. A pequena prendeu o olhar no peixe negro e sorriu melancolicamente.

— Em papai e mamãe. – Respondeu.

— Qual pai, e qual mãe? – Rebateu Tuí, quase num sussurro.

— Os que eu conheço... - Respondeu a menina deixando que o silêncio reverberasse entre os três presentes. Em sua consciência, a menina podia ouvir a voz de Tera chamando-a, tentando acordá-la.

— Você é o resultado de quatro pessoas boas, Zara. – Tranquilizou-lhe a voz gentil do espírito do mar. – Você conhece os quatro, mesmo que não saiba muito sobre os dois primeiros. – Concluiu.

Após perceber a voz de sua mãe chamar, a menina levantou-se.

— La... Não consigo acordar, mamãe está me chamando. – Falou olhando para os dois belos peixes.

— Feche os olhos e concentre-se na voz dela, menina Zara. – Disse a voz profunda de Tuí. A menina obedeceu, sentando-se e fechando os olhos. Geralmente para acordar, a menina apenas se deixava dormir ali mesmo, e acordava em sua cama. Mas sabia que precisava aprender a sair e entrar daquele sonho bonito sempre que precisasse.

 

— Zara... Zara... – Uma voz abafada dizia aos ouvidos da menina, balançando-a para que acordasse.

Após alguns segundos, Zara sentiu-se sendo puxada, e de repente estava pesada e completa novamente. À sua mãe dirigiu um sorriso sonolento e sentou-se na cama, abraçando-a.

Seu quarto era pequeno, tinha poucos móveis, de madeira, e um pequeno espelho atrás da porta. Gostava dele, achava aconchegante, não imaginava poder dormir em nenhum outro lugar além dali.

— Você me pediu pra te acordar cedo. – Lembrou a mãe, fazendo a menina sorrir encabulada.

— É mesmo, obrigada! – Disse, dando um beijo na bochecha da mãe e correndo para tomar um banho.

Já fazia alguns dias que os espíritos requisitavam a sua presença, e eles mesmos marcaram aquele dia como a data daquela jornada. A menina teria que viajar a cidade inteira, dos muros ao palácio, e dar um jeito de entrar no Oásis Espiritual para conhecer os verdadeiros Tuí e La.

Eles já haviam lhe ensinado um pouco sobre o mundo espiritual, e sobre como tinham aberto mão da imortalidade para estar em suas formas físicas ali, no mundo encarnado, para guiar, proteger e manter o equilíbrio entre as tribos e os dobradores de água. Suas formas espirituais eram como sombras, frágeis e efêmeras, que eles mantinham para que pudessem ter contato com o mundo desencarnado.

Após o banho, a menina correu para se arrumar. Era um pouco vaidosa, a danada, e queria viajar limpa, cheirosa e bonita. Havia herdado a pele alva de sua mãe, os olhos claros e hipnotizantes de seu pai. Tinha a estatura baixa, magra, porém forte e de postura correta. Os olhos grandes e cílios volumosos, boca delineada com o lábio inferior mais carnudo. Era uma menina extremamente graciosa. Os fios negros como a noite, herdados de sua mãe, caíam-lhe até abaixo das ancas infantis da menina.

Estava entrando na puberdade, mas ainda parecia uma menininha de dez anos.

— É hoje... – Sussurrou animada e ansiosa para si mesma, sendo pega por Tera, sempre preocupada e cautelosa.

— Vai finalmente nos contar o que tem hoje? – Perguntou colocando uma mecha dos fios castanhos atrás da orelha, para então apoiar as mãos nos quadris.

— É claro! – Respondeu a menina, como se fosse algo extremamente óbvio.

A mãe suspirou e seguiu sua menina até a cozinha onde Gaibo alimentava Leuh, o pequeno irmão de Zara. Leuh havia sido adotado há pouco mais de um ano, ele tinha menos de dois de vida, e provavelmente, como Zara, nunca se lembraria que era adotado. A própria só sabia porque os espíritos do Mas e da Lua haviam contado.

Ela havia vestido sua roupa favorita. Um vestido azul simples que descia até seus joelhos, com uma faixa branca ao redor da cintura. O vestido tinha as barras felpudas, feitas de um pelo branco muito comum na Tribo. Suas botas curtas, acinzentadas, amarradas com um cordão branco, e mitenes brancas que subiam até seus cotovelos. Sentia-se muito bonita, mas ainda faltava um toque. Segurou seus fios puxando-os para trás, e virou de costas para a mãe.

— Por favorzinho? – Pediu, fazendo a mulher rir baixo e o pai dar uma breve risada gostosa que a filha tanto amava ouvir.

— Parece que quer ficar bem bonita hoje, filha? – Perguntou o homem, conforme alimentava o bebê numa pequena cesta em cima da mesa. A menina sorriu para o pai em resposta, conforme Tera trançava as laterais dos fios da filha, unindo as tranças ao resto do cabelo para prendê-lo num nó alto que deixava a maior parte do comprimento caída, porém acumulada, pelas costas.

Era o penteado preferido da menina.

— Pronto. – Concluiu a mãe, vendo a menina correr para se olhar no espelho e logo voltar.

Zara beijou a testa do seu irmão e então virou-se séria para os pais.

— Papai, Mamãe... – Começou Zara com um sorriso melancólico. – Hoje eu vou ao Oásis Espiritual. – Revelou a menina. Seus pais a olharam surpresos e confusos. Nunca haviam a ouvido falar sobre nada do tipo, nenhuma espécie de interesse ou conhecimento sobre o lugar.

— Para quê, Zara? – Perguntou Gaibo relutante. A menina sorriu-lhe docemente, entendia que os pais ficassem surpresos, Tuí a havia instruído sobre qualquer reação que poderiam ter. Era crucial que a menina fosse ao palácio, e seus pais não seriam os últimos obstáculos para as coisas que a menina teria que fazer.

— Tuí está me chamando. – Ela disse simplesmente. Levantando uma sobrancelha, o pai ficara a imaginar o que o espirito do mar iria querer com uma menina de onze anos, mas a seriedade no olhar da menina preocupava os dois. Não parecia ser invenção dela, Zara sempre fora verdadeira e confiável.

— Como assim, filha, está te chamando? – Perguntou rapidamente sua mãe.

— Sim mamãe. – Confirmou, suspirando brevemente antes de começar a se explicar, como já sabia que precisaria fazer. – Há alguns meses eu tenho encontrado com Tuí e La em meus sonhos, e há algumas semanas eles me avisaram que eu precisaria ir para lá fisicamente. Que eu precisava conhecê-los... Para... hm... – Se confundia com as palavras, conforme via seus pais se entreolharem confusos. – Para me ensinarem. – Concluiu.

— Ensinarem o quê? – Perguntaram os dois ao mesmo tempo. Gaibo, num tom compreensivo, e Tera com a voz hesitante.

— Bem... Eu não sei exatamente. – Confessou a filha, um pouco desanimada ao ver a expressão descrente da mãe. – Mas me garantiram que estariam comigo durante o caminho, e que a Rainha Yara me receberia com certeza! – Tentou tranquilizar a mãe, mas sem muito sucesso.

Os pais se entreolharam com certa relutância, para então voltarem o olhar para a menina. Era uma situação estranha.

— Mamãe, papai... Eu preciso ir. – Disse segurando uma mão na outra, na frente de seu corpo. Sempre olhando para seus pais nos olhos. Não temia levar uma bronca. Nunca foi de desobedecer.

Era uma novidade para o casal ter a filha resolvendo algo por si mesma. Sempre fora muito obediente. Nunca reprimida, mas muito esperta e educada, e aquela decisão repentina parecia muito suspeita. Tinham medo que alguém estivesse manipulando-a para atraí-la, talvez por ser muito bonita ou algo do tipo.

Zara sabia que teria que provar sua conexão com os espíritos uma hora ou outra, e não gostava de esconder nada dos seus pais.

— Zara, o Oásis Espiritual é muito longe, filha. – Disse Gaibo antes de qualquer coisa. A menina assentiu, imaginando o que contaria, como contaria.

— E por que precisa ir hoje? Podemos preparar uma viajem mais organizada, vamos todos juntos. – Tentou a mãe, procurando uma alternativa que não desestimulasse a filha a tomar suas próprias iniciativas.

— Eu sei que fica difícil vocês acreditarem em mim. – Começou a filha, falando pausadamente para poder ser clara e pensar em como poderia ser objetiva. – Eu preciso chegar lá amanhã, é o dia em que eu deveria ser oficialmente testada, de acordo com Tuí, mas que a Tribo demoraria muito para me convocar, por causa do lugar onde moramos. – Explicou, confundindo ainda mais o pais.

— Amanhã é o meu aniversário de verdade... – Falou baixinho, surpreendendo os maiores em todos os aspectos. Gaibo olhava estupefato para a menina, havia até mesmo parado de dar as colheradas na boca do bebê. – Por favor, não se desesperem, já faz tempo que eu sei. – Pediu, principalmente para a mãe que aprecia numa espécie de transe. Os olhos da mulher marejavam, e Zara sabia como era difícil fazê-la chorar.

— Zara... – Começou, antes de ser interrompida prontamente pela filha.

— Mamãe, eu te amo. – Disse, fazendo a mãe sentar-se sem reação numa cadeira próxima e fazer uma expressão de dor. – Por favor, não se preocupe. Não se preocupem nenhum dos dois. Eu os amo demais, vocês são a minha família e eu não tenho nenhum interesse em saber quem são as pessoas que me deram a vida. Vocês são a minha vida! – Insistiu, fazendo os dois derramarem lágrimas.

Os pais correram na direção da menina, Gaibo ajoelhou-se abraçando-a com força, e Tera abraçando os dois com força, encostando a cabeça da menina em sua barriga.

— Minha menina... – Sussurrou o homem, fazendo Zara sorrir de canto. Sentia todo o amor que vinha deles, não os trocaria por nada no mundo.

— Nunca lhe contamos porque...

— Não precisavam. – Disse a menina interrompendo a mãe. – Olha... – Falou baixinho, dando um passo para trás olhando para os dois enquanto segurava nas mãos deles. – Eu não estou abandonando vocês, nem fugindo de casa, nem arrumando desculpas, não é nada disso. Mas eles disseram que precisam de mim lá, que não há mais tempo. – Explicou novamente, finalmente obtendo a atenção e a confiança dos dois.

Durante o resto da manhã, Zara explicou para os pais tudo o que sabia sobre seus pais biológicos, o que não era muito, e todos juntos organizaram uma bolsa com comida para que a menina levasse em sua jornada. Tera, sempre forte e firme, estava derretida e emocional, não imaginava que teria que deixar sua pequena menina partir nem tão cedo. Gaibo via sua princesinha com orgulho, a força dela lembrava-lhe sua amada esposa, e confiava plenamente em na filha.

Zara não sabia quando voltaria. Mas lhes prometeu que voltaria com certeza.

 

Com a cabeça erguida e os olhinhos verdes no horizonte, Zara começou a subir as escadarias da gigante Tribo da Água do Norte. Não sabia exatamente onde ficava o Oásis Espiritual, mas sabia que o encontraria, bastava olhar para cima que via o palácio, mesmo há tantos quilômetros de distância. E naquela direção ela foi, afastando-se cada vez mais dos muros e chamando a atenção de muitos por sua beleza e por estar desacompanhada.

Estava insegura, e ao mesmo tempo confiante de que os encontraria. Sempre que assumia um desafio, o concluía cedo ou tarde, a única diferença é que agora não era um desafio, era uma missão.


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Notas finais do capítulo

Mais um atualizado!