A Lenda da Lua escrita por Paola_B_B


Capítulo 3
II. Aprendendo a Assoviar


Notas iniciais do capítulo

Olá! Como foram de natal e ano novo? Espero que muito bem e que curtam o capítulo ;) Estou viajando no momento, mas assim que retornar postarei um novo cap ;)



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II. Aprendendo a Assoviar

Louis ergueu os braços para cima em sinal de paz ao escutar o feroz rosnado.

– Ei! Estou em paz! Não precisa me ameaçar. – virou-se lentamente.

Anita acompanhou o movimento e então saltou ficando há alguns metros dele. Seu corpo ainda estava um tanto agachado prestes a dar o bote.

Louis a observou surpreso. A suas costas um arco e flechas os quais usava para caçar, em sua cintura a espada de seu avô. Os cabelos bagunçados, as roupas remendadas e o olhar perigoso. Definitivamente ela era selvagem. E mesmo sabendo que ela queria arrancar a sua cabeça não pode evitar ficar completamente encantado com aquela criatura.

Um pequeno sorriso apareceu nos lábios de Louis enquanto ele observava os traços delicados de Anita, o corpo alto e esguio. Mas o que realmente o fascinou foram os olhos profundamente azuis, havia um leve rosado em torno da íris da jovem, eles mostravam tudo o que o rosto lutava tanto para não mostrar.

Louis percebeu que por mais que a expressão da garota fosse selvagem e ameaçadora, seus olhos deixavam claro o sofrimento. Ela sofreu muito, constatou. Mas também percebeu que ela não era tão velha, notou inocência e curiosidade em seu olhar.

– De qual vila você é?

Anna não respondeu. Apenas ficou alerta a qualquer tentativa de ataque. Aquele homem transmitia uma sensação de confiança que ela nunca sentira antes, nem mesmo quando sua família era viva.

– Você foi atacada? – perguntou tentando entender o silêncio da mulher.

Ela continuou com a boca fechada observando com cautela cada gesto de Louis que suspirou ao perceber que não conseguiria ter uma conversa civilizada com ela.

– Você está com fome? – Anita ajeitou a postura completamente confusa com aquela pergunta.

Nunca, ninguém se preocupou com ela a ponto de perguntar se ela estava com fome. Nunca.

Já Louis sorriu ao ver a mulher abandonar a postura do ataque.

– Temos mais comida em nossa vila. Você não quer vir comigo? Hoje à noite teremos uma fogueira com peixes frescos. Será divertido.

Anita franziu o cenho. Aquele homem estava sendo delicado oferecendo abrigo e comida. Mas por quê?! Ainda confusa ela negou mexendo a cabeça. Louis sorriu largamente ao obter sua primeira resposta.

– Bem, eu preciso colher algumas mangas para levar à vila. Elas são deliciosas nessa época do ano. Mas não posso demorar muito para pegá-las, pois os pássaros as devoram. – tagarelava olhando para a copa das árvores em busca das frutas mais vermelhas. – Será a sobremesa de hoje, você tem certeza que não quer ir? – Louis voltou seu olhar para Anita.

Ela apenas assentiu. Louis ficou um pouco desapontado, mas então sorriu.

– Quando você estiver pronta então. É só dizer que é amiga do Louis. – bateu em seu próprio peito.

Anna piscou rapidamente. Aquela situação era completamente nova para ela. Não estava acostumada a conversar com qualquer outra criatura que não fosse sua irmã. Apesar de que naquele momento Louis era o único a falar.

Então ele deu alguns passos observando as árvores e começou a assoviar. Anita arregalou os olhos e sem mesmo pensar no que estava fazendo correu como um raio até Louis e tocou-lhe os lábios com os dedos.

Louis sentiu o coração acelerar e sua respiração ficar presa. Ela era rápida, quase tanto quanto ele! Soltou a respiração lentamente observando o rosto inocente a sua frente. Ele sentia-se estranho, tinha vontade de tocar o rosto da garota, puxar seu corpo pequeno contra o seu. Mas se refreou quando ela ergueu seus profundos e azuis olhos de encontro aos seus em uma dúvida muda.

Louis ficou confuso por alguns segundos. Anita ainda tinha seus dedos sobre a boca do homem, então imitou o que ele estava fazendo com a boca. Tudo o que saiu de seus lábios foi o ar, sem som algum, deixando-a imediatamente frustrada.

O homem sorriu encantado e segurou a mão de Anita que estava em sua boca e deslizou-a lentamente para sua bochecha a mantendo ali.

– Quer que eu a ensine a assoviar? – a resposta foi uma expressão confusa.

Então Louis assoviou e a expressão da mulher não pode ser mais fascinada. Os olhos brilhavam enquanto ela os arregalava com a nova descoberta.

– Quer que eu te ensine? Isso se chama assoviar. Desse jeito podemos imitar os pássaros. – Anita assentiu avidamente.

Louis sorriu.

– Você tem que dobrar a língua assim. – abriu a boca para mostrar a curiosa mulher que não reparou nas afiadas e perigosas longas presas. – Depois você junta os lábios deixando um espaço para o ar. Então você assopra. – Louis concluiu o movimento e Anita tratou de imitar, mas não era tão fácil quanto parecia.

Mais uma vez a expressão frustrada apareceu em seu rosto. Louis riu levemente.

– Não é tão simples, você precisa treinar. Venha. – Louis com a mão que ainda estava sobre a de Anita, a prendendo em sua bochecha, a tirou do rosto e segurou-a entrelaçando seus dedos aos dela. – Vamos sentar aqui e eu te ajudo.

Puxou-a até a beira do rio e sentaram-se ao chão um de frente ao outro. Anita soprou sem resultado.

– Você está soprando muito forte, tem que ser um pouco mais suave. – orientou e então sorriu. – Agora foi fraco demais.

Anita fechou a cara.

– Hei! Não desista, você está indo bem. – ela lhe lançou um olhar incrédulo. – É sério! Vamos lá! Tente mais uma vez!

E ela o fez. O som saiu por seus lábios, ainda um tanto falho e sem melodia, mas ela havia conseguido.

– Viu só?! – sorriu Louis deslumbrado com o sorriso largo de sua mais nova amiga.

Era a primeira vez que ela sorria para ele. Era a primeira vez que ela sorria em muito tempo.

– Qual é o seu nome? – perguntou suavemente.

Por um momento Anna havia esquecido quem ela realmente era. Seu sorriso morreu em seguida. Sentiu-se estranha, uma tristeza sem tamanho apossou-se de seu coração. Levantou-se rapidamente largando a mão de Louis e se pôs a andar em direção a floresta.

– Espera! Não precisa ir embora só porque não quer dizer seu nome.

Anita parou. Fechou os olhos com força tentando clarear sua mente. Ela sempre se apresentou como Caos, gostava de analisar as expressões quando descobriam quem ela era. Contudo, naquele momento, sentiu vergonha de ser Caos. Ela não queria ser Caos, não para o estranho e gentil Louis.

– Anna, meu nome é Anna. Minha família me chamava de Anita. – disse sem virar-se para Louis e então correu como nunca antes.

***

Anita corria a toda sua velocidade. Sua mente estava confusa. Foi tratada com tanta polidez por aquele estranho que o ato fez uma antiga memória, obscurecida por sua mente perturbada, se fazer presente. Lembrou-se do modo como era tratada por sua família em sua infância. De como seus pais, avós e irmãos mais velhos eram carinhosos entre si e principalmente com ela. Todos sorriam mesmo nas piores adversidades.

E pela primeira vez em 50 anos Caos se perguntou se o que estava fazendo era mesmo o certo.

– Ah! Eu sabia que você não levaria três dias para julgar a vila!

Anna observou a irmã como nunca antes. A mais nova estava empolgada, pulava animadamente na frente de Caos. Poderia facilmente ser confundida com apenas uma criança prestes a entrar em uma brincadeira se não fosse pela sombra encobrindo seus olhos igualmente, azuis com o contorno avermelhado, aos da mais velha. Não estava certo, percebeu Anna. Ela não deveria estar tão entusiasmada para invadir e destruir uma vila, muito menos acabar com tantas vidas.

– Não iremos atacar a Vila dos Pescadores. - informou seriamente.

A agitação de Aline se transformou em decepção.

– Porque não? - choramingou. - Nunca deixamos nenhuma vila escapar. É nosso dever acabar com essa epidemia.

– Eu já disse que não iremos atacar a Vila dos Pescadores! - rugiu mostrando os seus dentes.

A mais nova não se abalou pela notória postura perigosa. Porém sabia que não adiantava discutir, teria que acatar a decisão de sua irmã mesmo a contragosto.

– E para onde vamos então?

– Vamos para sudoeste. – respondeu altiva.

***

O por do Sol já era presente nos céus quando Louis retornou a sua vila. O caminho inteiro passou-se despercebido por ele, pois sua mente estava perdida na misteriosa Anita. Ela não deveria ter mais de cinco séculos, apesar das marcas de expressão havia um brilho jovial escondido em sua alma. Confusa, assustada e completamente perdida. Seu coração apertava apenas em lembrar-se de seu olhar. Ela precisava de ajuda, porém nada poderia fazer se ela não quisesse ser ajudada.

A mente retornou ao corpo quando os responsáveis pelo preparo da comida se aproximaram o cumprimentando e pegando os peixes e as frutas para a fogueira de mais tarde.

Todos os que viviam na Vila dos Pescadores tinham algo muito incomum em suas faces, se comparados a praticamente todas as outras vilas. Havia serenidade. A felicidade transmitida pelos seus olhos era acolhedora. Agiam com muito respeito pelos anciões e apesar de Louis ainda ser criança quando muitos deles chegaram à vila, tinham grande apreço pelo jovem justiceiro responsável por manter a paz entre os moradores que às vezes se desentendiam entre si. Nada mais normal entre pessoas que há muito vivem juntas.

Louis avistou os novos moradores olhando com espanto para a quantidade de comida que ele trazia. Os recém-chegados não estavam mais em suas roupas maltrapilhas, provavelmente sua mãe havia apresentado-os à costureira da vila que lhes entregou algumas peças limpas. Encheu-se de compaixão pelos olhares famintos, porém sua condolência teve que ser posta de lado quando um dos homens avançou em sua direção.

O olhar era sem vida, mas a expressão furiosa. Seus companheiros de viagem foram pegos de surpresa pela reação inesperada de modo que nenhum o impediu daquela loucura. Os pacíficos cozinheiros assustaram-se com o ataque abrupto e se juntaram para se proteger.

O filho de Michaella fechou o cenho para aquela selvageria e no momento certo em que o homem estava perto o suficiente Louis espalmou as duas mãos no peito da pobre criatura que voou alguns metros para cair de costas no chão.

O jovem observou o insistente homem levantar-se para atacá-lo novamente, porém antes que ele realmente pudesse fazê-lo Louis rugiu. Os pássaros voaram para longe assustados com o estrondo, alguns animais também correram intimidados. Já na vila reinava o absoluto silêncio. Os moradores paralisaram observando a pequena confusão. Os estrangeiros tremeram com a força que vinha do jovem. E o brigão caiu de joelhos com os olhos arregalados.

– Ninguém aqui briga por comida. - falou seriamente Louis impondo um respeito que nem ele mesmo tinha noção que podia. - Todos têm sua parcela. Então se quer continuar entre nós terá que respeitar a divisão e os horários das refeições.

Sem escutar uma resposta inquiriu com um leve rosnar.

– Eu fui claro?

O homem assentiu lentamente. Sentia vergonha por ter se descontrolado, mas também sentia medo daquele milenar a sua frente. Lendo o rosto do homem Louis suavizou a sua própria expressão.

– Não quero que me tema, só quero que respeite nossa vila e as pessoas que moram nela. E que tenha em mente que sempre haverá alguém impedindo que nos tornemos animais sem sentimentos brigando por uma comida que pode muito bem ser dividida.

– Me desculpe. - murmurou por fim envergonhado.

Louis assentiu e deu as costas seguindo até seu amigo Maximiliano que observava de longe o modo como o amigo colocava ordem na vila. Max era quase tão alto quanto Louis, tinha a pele mais clara e cabelos dourados um pouco longos que terminavam ao final de sua orelha. Seus olhos eram âmbar e combinavam perfeitamente com a feição quase sempre descontraída.

– Você acha que isso vai dar certo?

– Não sei Max... Nunca vi olhares tão sem esperança como neles. Eles veem que aqui tem comida e abrigo, mas é como se eles não acreditassem nisso.

– Receio que as coisas estão cada vez piores pelo mundo. Talvez esteja na hora de irmos atrás dos elementares.

Louis ficou em silêncio diante das palavras do amigo. Já havia conversado com sua mãe a esse respeito e estranhamente ela o desencorajou. Michaella andava estranha ultimamente demonstrando um nervosismo exagerado. Sem contar com as falhas tentativas de esconder o choro durante a noite. Entendia que ela se preocupava com o que estava acontecendo pelo mundo, ele também se preocupava, mas sua mãe agia como se... Como se sentisse culpada e não havia como ela ter culpa de alguma coisa.

– Porque demorou tanto a voltar? Você não costuma fazer isso. – observou Maximiliano curiosamente.

– Encontrei uma garota perdida. – respondeu franzindo o cenho ao lembrar-se de Anna.

Max observou atentamente a expressão do amigo e não pode evitar sorrir maliciosamente.

– Garota perdida hã? E você mostrou o caminho de volta para casa? – ergueu as sobrancelhas sugestivamente.

Louis o fitou com incredulidade, mas por fim revirou os olhos. Mais de um milênio de amizade, ele deveria estar acostumado com as besteiras ditas pelo mais novo.

– Não imagine o que não deve Max. Ela parecia perdida, mas não sobre o ambiente, ela parecia perdida dentro dela mesma. Assustada sabe? Parecia frágil, mas ao mesmo tempo forte...

– E você reparou tudo isso em apenas algumas horas? – sorriu o loiro.

– Estou tentando uma conversa séria aqui. – reclamou exasperado.

Max riu erguendo seus braços em paz.

– Me desculpe meu amigo, mas faz tempo que não te vejo tão interessado em alguém.

– Não é interesse... Só estou preocupado com as coisas que estão acontecendo pelo mundo. Parece que as pessoas estão perdendo sua racionalidade, parece que estão virando animais novamente. E eu temo pelas coisas que essa garota perdida pode encontrar em seu caminho solitário.

Finalmente o mais novo deixou o ar brincalhão de lado e analisou as palavras do amigo. Era óbvio o interesse de Louis pela misteriosa garota, mas suas palavras estavam corretas, os habitantes do planeta estavam em decadência e qualquer um a vagar solitariamente estava sujeito ao perigo.

– Quer ir atrás dela? – Louis notou a mudança no humor do amigo e respondeu com sinceridade.

– Não sei se conseguirei dormir a noite sabendo que Anna vaga sozinha por um planeta cada vez mais perigoso.

Max prendeu o sorriso não querendo irritar Louis.

– Irei com você.

– Não é sua obrigação.

– Nem sua. Mas não irei deixá-lo vagar sozinho. O mundo está perigoso até mesmo para nós meu amigo.


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Notas finais do capítulo

Então gostaram? Amores, por favor comentem. Essa é uma história original e preciso muito mais de seus comentários aqui do que nas minhas fics.



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