A Lenda da Lua escrita por Paola_B_B


Capítulo 2
I. Vila dos Pescadores


Notas iniciais do capítulo

Segue o primeiro capítulo, espero que gostem ^^



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I. Vila dos Pescadores

Os passos eram silenciosos pelo longo corredor do castelo. O homem que nele andava passava a sensação de soberania. Mesmo que ninguém mais ali estivesse Argos exalava poder e sensatez. Não podia evitar, era a genética dos pertencentes à família real.

As paredes pintadas de cor clara contrastavam com os quadros de moldura mogno, as pinturas retratavam as gerações passadas de sua família. Cada retrato mostrando de olhares suaves até os mais perigosos, sorrisos verdadeiros até os mais falsos. Como qualquer família os integrantes possuíam diferentes caracteres e mesmo que seus postos na realeza significassem acima de tudo o melhor para o povo a realidade não era bem essa.

Tempos de escuridão foram aqueles governados por três diferentes gerações passadas. Muito sangue inocente fora derramado em lutas contra rebeldes lunares. Um desperdício de vida pensava Argos. Afinal as guerras começaram a partir do orgulho de um rei que não aceitou opiniões diferentes de um grupo de lunares. Tudo o que eles queriam era continuar sua vida na Terra, o planeta de sua origem, porém a ideia não foi bem aceita pelo rei da época que iniciou uma chacina. O fato revoltou aqueles que não se importavam em viver na Lua iniciando um movimento rebelde contra o rei. Foi preciso que mais dois reis assumissem o trono para que as batalhas infundadas acabassem.

A paz finalmente reinou quando Argos assumiu o poder após matar o pai de sua amada esposa Isis. A jovem princesa demorou a aceitar Argos, afinal ele matara seu pai que apesar de possuir caráter duvidoso ainda era seu pai. Condenava a si mesma por estar apaixonada pelo assassino de seu gerador e responsável pelo sumiço de sua mãe que não aguentou a perda de seu marido. Mas Isis não conseguiu negar seus próprios sentimentos e assumiu seu posto de rainha ao casar-se com Argos.

Dois milênios se passaram antes que a rainha engravidasse de uma linda menina. O povo recebeu a pequena princesa de braços abertos rezando para que a mesma tivesse a bondade de seu pai, a doçura de sua mãe e que a maldade de seu avô não envenenasse seu inocente coração.

Era para o quarto da filha que Argos ia. Como amava aquela pequena criatura de sorriso largo e olhos brilhantes. Ela encantava a todos com seus cachinhos negros e olhos escuros como os do seu pai. Puxara a pele alva como a Lua de sua mãe e demonstrava muita doçura assim como ela. A alegria puxara do pai, distribuía sorrisos para todos que encontrava. Os súditos costumavam brincar que mesmo que a pequenina não fosse faladeira ela transmitia suas mensagens com lindos sorrisos que mostravam todos os seus dentes para qualquer um que quisesse ver.

Neste momento ela estava ansiosa ao lado de sua mãe. As duas estavam deitadas na cama da princesa. Isis escutava sorrindo sua filha contar das traquinagens que fizera ao longo do dia. As duas gargalhavam do susto que a pequena dera em seu guarda-costas que quase surtara ao perdê-la de vista após distrair-se com sua companheira.

A rainha repreendeu a filha por se esconder de Isaac, mas não pode esconder o sorriso ao escutar a explicação da criança.

– Eu só não queria atrapalhar o namoro do Isaac, mamãe. – fez um biquinho chateado.

– Não era hora de ele estar namorando princesa. Então não fuja mais dele está bem?

A pequenina assentiu um tanto contrariada, mas não iria discutir com sua mãe. A rainha também não iria brigar com Isaac por ele estar namorando enquanto deveria cuidar da segurança de sua filha. Sabia muito bem do amor que ele possuía pela princesa e que não se descuidaria por qualquer coisa. Acima de tudo conhecia a própria filha, sabia o quão rápida ela poderia ser para aprontar das suas.

O rei logo chegou ao quarto da princesa abrindo a porta lentamente ao escutar os risos que vinham de dentro. Sorriu ao ver a filha no meio da enorme cama rindo com sua esposa. Não conseguia evitar o olhar apaixonado para Isis. Os longos e lisos cabelos loiros caíam por suas costas e os olhos azuis brilhavam risonhos em conjunto com o sorriso de seus lábios.

– Do que as duas tanto riem? – perguntou sem deixar o sorriso desaparecer.

– Coisas de meninas, papai. – disse a pequena fazendo sua mãe gargalhar.

– Sei... – murmurou o rei com os olhos estreitos.

Isis sorriu para o marido e então beijou a testa de sua filha lhe desejando boa noite. Em seguida levantou-se da cama e dirigiu-se até o marido que era poucos centímetros mais alto do que ela.

– Te espero na cama. – sussurrou depositando um beijo casto nos lábios do homem de cabelos e olhos negros como a noite.

Argos tinha traços fortes e marcas de expressões que denunciavam sua vasta experiência de vida. Já Isis continuava com a pele jovial, seu rosto era delicado e suave, seus olhos tinham um brilho de leveza muito diferente de como era quando seu pai ainda era vivo. Antes o medo e a tristeza imperavam no profundo mar azul.

A rainha se retirou do quarto da filha e foi em direção aos seus aposentos. Enquanto isso o rei caminhou até a cama da filha e deitou-se ao seu lado. Assim como todas as noites ele contaria uma história para ela dormir.

– Que história vai querer ouvir hoje minha pequena? – perguntou afetuoso.

Ela ficou pensativa, um pequeno bico formou-se em seus lábios. Então com seus grandes olhos fitou o pai.

– A professora falou hoje que a gente nasceu na Terra. É verdade? – perguntou confusa.

A princesa frequentava a escola perto do palácio assim como as outras crianças do reino. Argos e Isis não queriam que sua filha se sentisse diferente só por que era princesa, nem que ela agisse de forma arrogante pelo mesmo motivo.

O rei olhou pensativo para a filha, não sabia como tornar a história da origem do povo lunar em algo sutil para a filha.

– Sim é verdade. – respondeu simplesmente.

– E porque temos que viver aqui? A Terra é tão bonita! – sorriu sonhadora.

Argos lhe sorriu. A filha era apaixonada pelo planeta azul, ficava obervando o céu por horas e mal via o tempo passar.

– Sim, ela é linda querida. Mas viver aqui não é um castigo e sim o símbolo de uma segunda chance. Além do mais podemos visitar a Terra em qualquer momento. Não gosta da Lua? Não a acha bonita também?

– É claro que sim papai! Não quero ir embora daqui! É que a Terra é tão... Azul e tão... Verde!

O rei não pode evitar rir com o comentário da filha. Entendia o seu encanto com as cores vibrantes. Na Lua também existia o azul nos lagos e o verde na vegetação. Porém quando o Sol iluminava as folhas um brilho prateado refletia e o mesmo acontecia com a água cristalina dos rios e lagos.

– Prometo que quando você estiver maior poderá visitar o planeta azul.

– Verdade? – a garotinha de apenas 8 anos pulou da cama com um sorriso mais largo que o próprio rosto.

Argos riu colocando suas mãos nos ombros da criança e a colocando novamente deitada embaixo das cobertas.

– Verdade meu bem. Agora fique quietinha, você não quer escutar a história da nossa origem?

A princesa apenas assentiu concentrada no rosto de seu pai. Quando o entardecer chegava tudo o que ela queria era que o tempo passasse mais rápido para que sua mãe ou seu pai lhe contasse uma história. Algo na voz de seus pais fazia com que ela não perdesse um detalhe sequer. E durante toda a narrativa seu mais forte desejo era que a história não se acabasse.

O rei olhou para o teto por alguns segundos lembrando-se de quando seu pai lhe contara a mesma história. Tinha a mesma idade que sua filha tem agora de modo que não teve desculpas para não iniciar finalmente sua narrativa.

– Tudo aconteceu há muito tempo atrás, antes mesmo do surgimento dos humanos... Acho que nosso criador só os fez depois de perceber o que nós havíamos nos tornado. Mas com sua infinita bondade e amor não nos puniu, apenas manteve a esperança de que um dia aprenderíamos. E nós aprendemos, na verdade estamos continuamente aprendendo. Se hoje vivemos na Lua é porque não soubemos cuidar daquele imenso e lindo planeta, e se hoje as mulheres só podem dar a luz a uma criança sabemos que é o melhor para a nossa sobrevivência...

Argos observou com contentamento os olhos atentos da pequena.

– Preciso apenas de uma ajuda para contar essa história, querida.

– De quem, papai?

– Sua. – sorriu carinhoso. – Infelizmente ninguém nunca soube os verdadeiros nomes dos nossos personagens principais. A história apenas passou por gerações chamando a mulher de Caos e o homem de Guerreiro. Quer nomeá-los?

A princesa animada bateu palmas e logo contou ao pai seus nomes preferidos. A nós não importa o seu gosto, pois os nomes verdadeiros de Caos e Guerreiro são Anna e Louis.

Todas as pessoas que viviam na Terra eram como os moradores da Lua. Eternamente presos em sua física juventude, mais rápidos que leopardos, e mais fortes que elefantes. Os sentidos extremamente sensíveis conforme a concentração de cada um. Inteligentes e racionais. Guerreiros por natureza.

Voltemos então há milhões de anos em uma pequena vila, cheia de cabanas simples assim como seus moradores. Em uma época em que os humanos ainda não existiam. Em um lugar onde a fome ainda não atingira, porém a preocupação era eminente.

Os mais velhos se reuniam com frequência buscando uma alternativa perante as tantas novas bocas para alimentar que chegavam a Vila dos Pescadores. Eram estrangeiros vindos de vilarejos distantes, todos muito cansados depois da longa viagem em busca de melhores condições de vida. Quando finalmente encontravam um dos poucos lugares ainda pacíficos no planeta não queriam mais sair e os moradores não tinham coragem de mandá-los embora após escutarem as trágicas histórias dos antigos lares.

***

Os ânimos estavam exaltados. Os cinco fundadores da Vila dos Pescadores estavam reunidos no centro da humilde vila. Eles eram os mais velhos de suas famílias, cada um possuía mais de 7 mil anos. Eram muito respeitados por todos os moradores devida a vasta experiência de vida.

– Não podemos deixá-los a mercê da vida nômade. – insistiu Michaella controlando o tom de sua voz.

– Também não quero ignorá-los Michaella, mas entenda que se eles começarem a viver conosco em muito pouco tempo não teremos mais comida. – argumentou sua amiga Sandra.

Michaella a olhou com a feição irritada. Os três homens do grupo observavam perdidos em pensamentos, buscando um argumento para convencer Michaella.

– Vocês não estão me escutando. – reclamou ela. – Eu sei que estão preocupados com a comida, mas não podemos deixá-los com fome e sem abrigo. É cruel! Além do mais podemos buscar mais comida, ensinaremos aos viajantes nossos métodos de pesca, caça e colheita. Talvez no começo as coisas realmente sejam difíceis, teremos que economizar alimentos, mas depois tudo vai se equilibrar. Ainda há esperança que tudo volte ao normal.

Após horas de discussão, finalmente, ela tinha sido convincente e os outros quatro anciões concordaram em ajudar os estrangeiros. Quando eles se retiraram para dar a notícia aos novos moradores Michaella suspirou com um pouco de alívio, porém seu coração ainda estava apertado pela culpa. Ela tinha certeza que o mundo estava uma bagunça por sua causa.

– Você não vem? – perguntou Sandra há alguns metros de distância.

Michaella obsevou a velha amiga. Sandra tinha os cabelos enrolados na altura dos ombros, eram da cor mel. Seus olhos verdes e bondosos. Era uma mulher pequena e enérgica. Michaella nunca se esqueceria de como Sandra lhe ajudou quando estava perdida em sua própria dor.

Sandra também estava com problemas naquela época, talvez não fossem tão grandes quanto os da morena de longos cabelos negros e olhos acinzentados, mas as duas estavam perdidas na Floresta Escura e se apoiaram mutuamente para sair daquele lugar que mexia com a mente das pessoas.

Tornaram-se amigas e resolveram recomeçar suas vidas longe de seus passados. Seguiram para oeste e quando encontraram uma clareira perto do Rio Dois Caminhos resolveram fixar moradia. Ainda estavam montando suas cabanas quando quatro forasteiros chegaram à clareira. Os quatro eram muito parecidos fisicamente, porém suas personalidades completamente diferentes. Eram jovens, unidos e aprontaram horrores com seus antigos vizinhos, acabaram causando tamanha confusão que foram expulsos da vila em que antes moravam com a promessa de que se um dia voltassem seriam mortos.

O mais novo deles, Malaki, acabou se apaixonando por Sandra. Não querendo separar o grupo, os quatro homens resolveram se juntar com as duas amigas e assim nasceu a Vila dos Pescadores.

Foi uma grande surpresa para todos quando o ventre de Michaella começou a crescer, nenhum dos cinco sabia que ela tinha tido um parceiro em seu passado. A verdade é que nenhum deles falava muito sobre o passado, pois todos eram fugitivos de suas antigas vidas. Alguns meses depois Louis veio ao mundo trazendo alegria à sempre tristonha Michaella. Dois anos depois foi a vez de Sandra engravidar e dar a luz a Maximiliano.

O tempo foi passando e em viagens a outras vilas os três homens solteiros encontraram suas parceiras. A Vila dos Pescadores começou a crescer, as famílias tornaram-se unidas e harmônicas. Algo muito diferente acontecia naquele lugar, foi um visitante quem percebeu.

Não havia exageros como havia nas outras vilas. Não havia inveja ou brigas feias. Quando um desentendimento acontecia Louis resolvia com apenas algumas palavras. Era incrível a paz do lugar. Não era a toa que muitas outras famílias se juntavam ao vilarejo.

Mas os tempos eram difíceis no mundo e os moradores da vila não estavam inertes as desgraças a sua volta. O caso mais recente era o dos 7 estrangeiros que chegaram a pouco na vila e pediam abrigo levando os anciões a se reunir e decidir sobre as novas bocas para sustentar.

Sandra ainda aguardava Michaella sair de seus próprios pensamentos. Sorriu quando finalmente aconteceu.

– Claro! Vamos! – a morena sorriu.

As duas logo se juntaram aos três homens que estavam mais a frente. Logo eles avistaram os visitantes sentados ao chão comendo, esfomeados, as frutas que Louis lhes entregara.

Michaella sentiu o peito apertar ao ver a cena. Homens, mulheres e crianças, com roupas rasgadas e sujas, magros e famintos, com o medo e sofrimento estampados em seus rostos.

– Mãe! – sorriu Louis.

Ela lhe sorriu sem conseguir evitar o pensamento de como ele era parecido com seu pai. A mesma pele morena avermelhada, o mesmo porte imponente, as mesmas rugas de preocupação, o mesmo sorriso... Apenas os olhos acinzentados vieram dela.

– Vocês precisam escutar o que eles têm a dizer. – o sorriso não estava mais em seu rosto, ele dava lugar a uma latente preocupação.

– Acho que devemos primeiro informar nossa decisão, jovem Louis. – disse Dimitre o mais velho dos anciões.

Era um homem sério, não possuía os mesmos traços brincalhões de quando aprontava com seus amigos pela antiga vila em que nascera. Depois do que aconteceu com Malaki, Dimitre tornou-se extremamente maduro e nunca mais tomou alguma decisão impulsiva.

– Claro senhor. – assentiu Louis.

Dimitre se aproximou ainda mais dos futuros moradores que aguardavam as palavras do ancião com ansiedade.

– Vocês poderão morar em nossa vila. – suspiros aliviados e agradecimentos chorosos ecoaram por todos os lados. – Não comemorem ainda. – cortou seriamente. – Como moradores vocês deverão seguir as regras da vila. Aqui todos trabalham, cada um com a função que melhor se adapta. Nossos métodos para buscar alimentos são diferentes dos que com o que estão acostumados, o que nos garante comida o ano inteiro. Então qualquer um que desrespeite esses métodos será expulso.

– Estamos dispostos a aprender senhor. – disse uma das crianças do grupo.

Dimitre lhe sorriu.

– Acredito em você criança. Agora acho que já podemos começar com as lições. Michaella lhes ensinará nossos métodos de colheita. – a mulher assentiu com o rosto cheio de compaixão.

Dimitre virou-se para Louis.

– Acho que é pertinente uma fogueira hoje à noite para que nossos novos amigos contem suas histórias.

– Claro! – sorriu Louis entendendo o recado.

Despediu-se de todos e seguiu para a cabana em que vivia com sua mãe. Pegou seus equipamentos de pesca e seguiu para o Rio Dois Caminhos.

***

O rosto era sério, observava o rio que corria entre as montanhas e se dividia entre diversas cachoeiras. Apesar da beleza do lugar ela não pode ignorar a tristeza que a paisagem lhe trazia. Tudo estava errado naquele planeta, ela tinha nojo de sua própria raça.

Em todas as vilas em que esteve tudo o que enxergou foram famílias mesquinhas brigando até mesmo entre seus próprios membros. E mesmo após três dias como visitante aguardando uma intervenção dos elementares nada aconteceu. Sua irmã estava certa, aquilo era perda de tempo, mas uma pequena esperança se mantinha em seu peito. Esperança de que os tais poderosos aparecessem e então ela lhes diria tudo o que estava preso em sua garganta, os desafiaria para um duelo e finalmente vingaria sua família.

Só que eles nunca apareciam e Anita se via na obrigação de acabar com a sujeira que os moradores faziam.

– Anna! Anita! – os gritos entre gargalhadas de sua irmã a fez sorrir levemente.

Aline sacudia as mãos se divertindo dentro do lago formado pelo deságue das diversas cachoeiras. A mais velha saltou alguns metros e pousou suavemente sobre uma pedra mais próxima ao lago. Em seguida Aline estava sentada ao seu lado.

– Para onde vamos agora? – perguntou animada.

– Para o leste. – respondeu ainda perdida em pensamentos. – Ouvi dizer que a Vila dos Pescadores é pacífica.

Aline não prendeu a gargalhada cheia de ironia.

– Sim, claro, assim como as últimas.

– Vou verificar a realidade. – disse Anita sem esbanjar grandes sentimentos.

– Ah Anita! Vamos acabar com a vila de uma vez por todas! Você sabe que não há paz nesse mundo e os tais elementares são lendas bobas que vovó contava para dormirmos. – reclamou contrariada.

Anita lhe mandou um olhar gélido.

– Se não quer ir agora, não vá. Fique se divertindo por aqui e daqui três dias nos encontramos ao pé da montanha.

Aline revirou os olhos com infantilidade.

– Tudo bem. Vou caçar algum tigre por aí. – deu de ombros e mergulhou novamente no lago.

Anita ignorou as infantilidades da mais nova. Tinha consciência de que apesar do corpo adulto sua irmã ainda era muito jovem. Então girou em seus próprios calcanhares e correu a margem do rio. Porém após poucos minutos de corrida seu espanto a fez parar. Nunca em sua vida vira um rio tão farto de peixes. Puxou o ar com força e sentiu o aroma extremamente doce. Fechou os olhos deliciada e então os abriu buscando a fonte do perfume.

O choque em seu rosto seria cômico se alguém estivesse a observando. Eram frutas! Frutas por todos os lados. As árvores estavam apinhadas, tão cheias que seus galhos dobravam com o peso.

Maravilhada correu alguns metros e saltou em um alto galho, esticou o braço retirando uma manga madura. Sentou-se ali mesmo e descascou com suas presas deliciando-se com a doce e suculenta fruta. Mas antes que pudesse terminar de comer uma movimentação estranha no chão lhe chamou a atenção.

Em um movimento rápido ficou em pé encostando-se sobre o tronco e escondendo seu corpo da vista de quem se aproximava.

Anita franziu o cenho quando a música assoviada chegou aos seus ouvidos. Mas que tipo de animal fazia esse barulho? Pela sua memória nenhum pássaro cantava deste jeito, ou qualquer outro bicho que já tenha visto.

A curiosidade ganhou da cautela e ela lentamente movimentou sua cabeça tentando espiar a tal criatura, afinal aquele lugar se mostrara bem diferente daquilo que estava acostumada.

Mas o que viu não era nenhum animal diferente e sim um homem. Forçou a vista naquela direção ainda mais confusa, pois o som estranho vinha dele. Observou que ele ainda não a tinha visto e sentiu-se segura para analisá-lo.

Ele tinha pele morena, parecia alto e forte. E mesmo que seus traços fossem fortes e marcantes existia algo em seu rosto que o tornava suave e até mesmo gentil. Talvez fossem os olhos acinzentados ou a expressão serena livre de sentimentos mesquinhos.

Notou que ele fazia aquele som com a boca. Imitou seu gesto com os lábios, mas tudo o que conseguiu foi jogar o ar para fora. Como ele conseguia fazer aquilo?

Ao contrario do que Anita pensava Louis não estava inerte a sua existência. Já tinha notado a estranha presença há algum tempo, mas antes de qualquer apresentação resolveu se mostrar pacífico. Ele sabia da situação nas outras vilas e muitas vezes os estrangeiros chegavam a sua vila um tanto selvagens, geralmente movidos pelo medo e desespero.

Seguiu assoviando uma canção que sua mãe cantava quando ele era criança. Com a pequena rede de pesca ele sentou-se a beira do rio. Observou por alguns instantes o movimento dos peixes e então jogou a rede.

Anita não tirava os olhos do estranho. Sentiu-se a vontade para sentar-se no galho novamente já que o misterioso homem estava de costas para ela. Novamente ela sentiu-se confusa com as ações do rapaz. Já vira muitos homens e mulheres pescando, ou tentando encontrar peixes, mas nunca vira algum capturar tantos de uma só vez e o espanto foi maior quando ele começou a devolver os peixes.

Mas o que ele fazia afinal? Será que não tinha família para alimentar? Mas então ele colocou alguns peixes em um grande cesto feito de palha e voltou a jogar a rede. Mais uma vez ele retirou um grande cardume e após capturar alguns peixes devolveu os que não queria para o rio. E assim o fez até seu cesto encher-se completamente.

Louis levantou-se e esticou o corpo, lavou as mãos no rio e suspirou observando algumas frutas nas árvores próximas. Decidiu que era hora de falar com a criatura que o observava há tanto tempo em silêncio.

– Não quer me ajudar a pegar algumas mangas?

Anita arregalou os olhos. Com quem ele estava falando? Levantou-se rapidamente e forçou seus olhos por toda a floresta a sua volta. Não via ninguém por perto, mas então a voz soou novamente.

– Não tenha medo, sei que está me observando há um bom tempo. – disse ele distraidamente ainda de costas para ela.

Seus olhos acinzentados corriam entre as árvores buscando as frutas mais maduras sem perceber o verdadeiro perigo às suas costas.

Anita agachou-se se equilibrando sobre o galho em posição de ataque. O rosnado cresceu em seu peito e saiu por entre seus dentes. Os olhos em fenda e perigosamente cravados na nuca do estranho. Se ele reparou em sua presença então não era tão insignificante quanto imaginara, mas ele também não sabia do que ela era capaz, ele não sabia que ela era o Caos em pessoa.


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Notas finais do capítulo

Então? O que estão achando? Comentem! Deixarei programado a postagem do próximo capítulo para dia 03/01/2014.

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