Música do capítulo: The 1975 - Me

A expressão fixa no carpete acinzentado do quarto escuro apenas indicava a fúria de Charlotte. A ruiva não conseguia acreditar que o pai iria mesmo forçar toda a família a mudar para Nova Orleans. Não que a jovem odiasse a cidade natal, mas não era o lugar onde seu coração pertencia. Ir embora da Califórnia não era uma opção válida.

“Filha?” Amelia bateu na porta entreaberta

“Eu não vou” Respondeu quase de imediato

A mãe sentou-se ao lado da menina e afagou seu cabelo ruivo.

“Eu sei que você não quer ir” seu tom de voz era calmo ao contrário do marido, Amelia acreditava que uma conversa honesta valia mais do que gritos e promessas raivosas “Que tal você sair para dar uma volta, ou ir para aula? Que daí eu converso com seu pai, aposto que tudo isso foi um surto de raiva.”

“Nós duas o conhecemos o suficiente para saber que não foi” Charlie suspirou baixo e se levantou da cama, calçou seu Vans preto, pegou a bolsa e caminhou para a porta.

Deu uma ultima olhada para trás, para ver a mãe chorando e olhando em seus olhos

“Apenas diga a ele que eu não vou” Saiu do quarto e desceu as escadas silenciosamente

Entrou dentro do carro, mas não conseguiu dar partida. Seus olhos queimavam, as lágrimas que desciam pareciam ácido, corroendo sua pele branca. Alcançou o celular dentro da bolsa e discou o único número que sabia de cor.

“Alô?” A voz ainda meio adormecida do irlandês indicava que o mesmo não iria à aula “Charlie?” sua voz era uma mistura de sotaque embolado no sono com preocupação.

“Austin” o nome escorregou para fora de sua boca num suspiro dolorido e embromado em lágrimas “Preciso de você” foi simples e precisa, não conseguia falar, apenas chorar e desejar a presença do loiro.

Ela chorou por mais alguns segundos e Austin apenas escutou o sofrimento da então namorada. O loiro não sabia se era fingimento da fotógrafa por conta da briga da noite anterior, ou o choro era honesto e ela precisava dele.

"Charlie? O que foi?" Disse após um suspiro demorado

"Preciso de você, Austin" ela secou as lágrimas, mas novas caíram. Toda vez que abria a boca para tentar explicar, uma enxurrada de lágrimas alagavam seu rosto

"Consegue chegar aqui em casa?" Ele disse com pesar no coração. Era genuíno, ela precisava dele.

O loiro mal conseguia se lembrar quando foi a ultima vez que Charlotte estava frágil o suficiente para precisar de alguém, ainda mais dele.

"Não consigo, Austin" a voz fina agora era apenas um suspiro fraco

"Estou indo, Charlie" ele disse rápido "Estou indo" desligou o telefone e levantou da cama com rapidez.

Tudo o que Charlotte poderia fazer era apenas continuar sentada dentro de seu carro a chorar. E foi tudo o que a fotógrafa fez até o jogador chegar até ela.

Austin levantou da cama num pulo, mesmo que ele e a namorada não estivessem nos melhores termos, ele ainda se preocupava muito com ela. Eles têm esse tipo de conexão inexplicável, é como mesmo se ficassem semanas sem se falar, no segundo que um precisasse o outro pararia a Terra para ajudar.

O jogador demorou oito minutos para chegar até a grande casa dos Sullivan. Ele encontrou a ruiva dentro de seu carro abraçada nos joelhos e de cabeça abaixada.

"Ei, Charlie" ele disse ao abrir a porta do carro da fotógrafa "Vem cá"

Então tomou a ruiva em seus braços e toda a raiva fora diluída. Eles ficaram em silêncio durante longos minutos. Charlotte apenas chorava e soluçava enquanto Austin a apertava em seu peitoral.

"Ele vai me fazer ir embora, Austin" ela disse com a voz embargada

"Seu pai? Pra onde?!"

"A gente discutiu novamente sobre o balé e eu disse que não dançaria mais." Secou as lágrimas para encarar os olhos acizentados do jogador "Dai ele disse que nós vamos voltar pra Nova Orleans" soluçou novamente.

O aperto no coração do jogador foi grande. Ele sabia que Charlie sempre fora cabeça dura, assim como o pai, mas jamais poderia imaginar que ele estava falando sério ao deixar a Califórnia.

"Eu não quero ir" sua voz saiu tão frágil que nem parecia ela mesma

"Tenho certeza que você vai encontrar um jeito" Austin não queria deixar transparecer sua preocupação, ele sabia muito bem que sua sanidade mental estava condicionada a Charlotte. Ela precisava encontrar um jeito. "De qualquer forma, estou aqui pra você" depositou um beijo leve no topo da cabeça da ruiva.

"Como? Como, Austin? Como vou dar um jeito?" Lágrimas e mais lágrimas escorriam pelo rosto da jovem que não se preocupou em parecer perfeita como sempre, ela só queria chorar e receber consolo do namorado.

"Como você sempre faz, se tem alguém capaz de traçar um plano e convencer teu pai, é você." Ele disse com toda a convicção.

"E se eu não conseguir?" A ruiva perguntou com lágrimas descendo ao longo de seu rosto perfeito

"Então eu terei de te sequestrar!" Ele disse seguido de uma risada morna. Charlie sorriu e aninhou-se em seu abraço.

"Austin?" Chamou o jogador e olhou para a rua, não conseguia focar-se em seus olhos cinza

"Sim?"

"Sinto muito por ontem a noite, de verdade" ela disse pausadamente, pedir desculpas não era uma prática da fotógrafa, mas quando Austin está envolvido nada mais faz sentido. "Não era da minha conta fazer dois bilhões de perguntas e esperar que fosse você algum tipo de cavalheiro no cavalo branco"

"Charlie" ele disse embutido num riso, sabia que a ruiva estava sendo verdadeira.

"Eu só me preocupo contigo" ela disse baixinho, mas ele ouviu "Não quero que nada de ruim te aconteça, mesmo que você seja o causador a só mesmo" ela apertou a mão do namorado "Mas quero que saiba que eu não sairei do teu lado."

"Onde você quer chegar?" O irlandês sentiu-se perdido por um segundo

"Que se você cair," ela tirou o frasco amarelo da jaqueta do jogador, destampou-o e separou dois comprimidos "Eu caio contigo" segurou um em sua palma e o outro entregou à Austin

Nem ao menos esperou o namorado colocar o comprimido na boca, ela o fez primeiro. Engoliu a cápsula branca e encostou seu rosto na nuca do irlandês.