Um Anjo (quase) Caído escrita por Gaby Molina


Capítulo 3
Capítulo 3 - Delinquentes Convencidos




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Heath

— Vocês parecem perdidos — notou uma garota, se aproximando. A pele era ligeiramente mais bronzeada que a minha, e ela possuía cabelos escuros enrolados e olhos cor de âmbar.

— De fato — sorri. — Qual é o seu nome?

Ela pareceu surpresa por eu querer saber o nome dela.

— Audrey Miller.

Merda.

— Eu sou Heath Seeler, e esse é o meu primo, Damien Gull.

— Americanos?

— Sim, senhorita, alunos de intercâmbio — fitei-a nos olhos.

— Por quanto tempo?

— Depende do que eu encontrar aqui — sorri novamente.

O sinal tocou.

— Bem, preciso ir para a aula agora — ela me fitou. — Mas se precisar de qualquer coisa... Sabe onde me encontrar.

Ela sorriu uma última vez. Pisquei, dando um sorriso de canto, e ela foi feliz para a aula.

— Heath, que merda foi essa? — Damien ergueu uma sobrancelha.

— Uma missão de reconhecimento, oras.

— Precisa que eu te lembre do que aconteceu da última vez que você deu em cima de alguém?

— Mas era diferente, a garota era um anjo. Essa menina é mortal. E, se me permite citar — pigarreei. — Nefilim que servem aos Céus não devem se envolver fisicamente ou emocionalmente com mortais. Eu não fiz nenhuma das duas coisas, fiz?

— Essa é realmente a única parte do Código que você se lembra?

— Claro que não. Também me lembro dos cinco elementos: ar, fogo, água, terra e queijo.

— Queijo?

— Tenho certeza de que li em algum lugar que o quinto elemento é queijo.

— Só não entendi o que você descobriu com essa missão, Sherlock Holmes.

— Eu descobri que aquela garota não é Serena Argent. Isso diminui nossa busca de 98 garotas para 97, viu só? — sorri e o arrastei para o corredor. — Precisamos pegar nossos horários. Como fazemos isso?

— Acho que temos que ir para a diretoria.

— Hã... Certo — aproximei-me de uma garota loura que estava arrumando o próprio armário. Encostei-me nele. — Oi — sorri.

Ela não retribuiu o sorriso, nem sequer olhou para mim.

— Onde é a diretoria? — perguntei.

Ela se virou para mim. Seus olhos azuis me analisaram de cima a baixo, e não demonstraram reação.

Menina estranha.

— Você tem cara de quem vai aprender o caminho rapidinho — fechou o armário, quase me acertando, e saiu andando graciosamente.

Damien estava se segurando muito para não rir.

— Está rindo do que, retardado? — ergui uma sobrancelha.

— Da sua cara de cachorrinho pidão quando percebeu que ela não ia se jogar em cima de você. Deve ser uma sensação nova.

— De fato — admiti. — Será que ela é lésbica?

— Ou apenas não está interessada em você.

Ponderei a ideia por um minuto.

— Isso não faz o menor sentido. Ela com certeza é lésbica.

Apesar de tudo, chegamos à diretoria. Bati na porta e entrei.

— Com licença...

Uma mulher de meia-idade com óculos quadrados me encarou.

— Os senhores não deveriam estar em aula?

— Nós... Hum... Nos atrasamos. Precisamos do nosso horário.

— Ah, vocês devem ser os novos alunos de intercâmbio. Seeler e Gull?

— Isso mesmo.

Ela nos entregou dois papéis.

— Como eu chego à sala 3B? — indaguei, ingênuo.

— Considerando seu atraso colossal, sr. Seeler, eu diria que o senhor tem muito tempo para descobrir.

E então ela nos enxotou para fora da sala dela. Simples assim. Senti saudade de Caius.

Serena

— Tenho certeza de que Heath estava prestes a me chamar para sair — contou Audrey na aula de Matemática.

— Hm.

— Pode ao menos fingir estar feliz por mim, por favor?

Quase contei a Audrey que o tal garoto veio ser engraçado comigo cinco minutos depois também, mas não o fiz. Até porque ele devia fazer isso com qualquer coisa viva que aparecesse no campo de vista dele.

Típico americano delinquente com complexo de superioridade.

— Estou feliz por você.

A dark shadow hid your face

When I found out you didn't tell me

Everything that there was to know

About...

Outra música sobre Patricia. Chega de músicas sobre a Patricia, censurei-me.

— O que você está anotando aí? — perguntou uma voz na minha frente.

— Não é da sua conta — soltei.

E depois percebi que a pergunta havia vindo do professor.

— É mesmo? — o sr. Timann ergueu uma sobrancelha. Ele amava fazer isso.

— Ah, não percebi que era o senhor.

— Agora percebeu. O que me diz?

— Já disse. Precisa que eu repita? O papel é meu.

— É isso. Srta. Argent, vou mandar ligarem para os seus pais.

Soltei uma risada alta.

— Boa sorte com isso.

Ele me fuzilou.

— Detenção.

— Era tudo o que eu queria — zombei, deitando a cabeça na mesa.

Heath

— Damien! — encontrei o garoto no horário de almoço. — O que é "detenção"?

— Hã... Espere aí — Damien pegou seu celular (que havia ganhado da família com quem estávamos morando, e que deveria ser usado apenas para emergências) e digitou no Google. — Aqui, achei. Detenção. Ah, é quando você desrespeita alguma regra e tem que ficar até depois da aula na escola.

Até os professores sabiam que aquele lugar era um inferno.

— Então... Eu consegui ir parar no Corredor das Indulgências mortal no primeiro dia de aula?

Damien deu dois tapinhas em minhas costas, compadecido.

— Exatamente.

Depois da última aula — alguma coisa inútil terminada em ia —, ainda tive que descobrir sozinho onde ficava a sala de detenção.

Então, é, eu fui parar na detenção por chegar atrasado. E cheguei atrasado na detenção.

— Atrasado — a professora de Inglês, que mais parecia uma górgona, me encarou. Fiquei esperando virar pedra, mas não aconteceu.

— Desculpe — murmurei e me sentei no fundo da sala.

— Vocês vão passar a próxima hora aqui — a Górgona nos encarou. — Sem aparelhos eletrônicos. Sem conversa. Sem comida. Sem sair. Mijem nas calças, no lixo; eu realmente não me importo. Espero não vê-los aqui de novo amanhã.

Dito isso, ela saiu e trancou a porta.

Havia apenas quatro pessoas na detenção: eu, um garoto que estava desenhando na carteira com a ponta seca do compasso, uma menina ruiva que não parava de tentar me devorar com os olhos e a garota loura que fora rude comigo mais cedo.

Ela não fizera questão de acenar para mim, nem nada. Não me importei.

Foi quando ela começou a ouvir música.

— A Górgona disse "sem eletrônicos" — comentei.

— Você é o que, meu pai? — ela zombou, com sua voz fina carregada de sarcasmo. — Não gosta de The Beatles?

— O que é isso?

A garota ergueu uma sobrancelha, me encarando como se eu fosse louco.

— Você não conhece The Beatles?

— Não tem isso lá de onde eu venho.

— Quer dizer na América?

Sorri.

— Por aí.

— Tenho certeza de que as pessoas escutam Beatles na América.

— Ah, já que você é uma especialista no assunto...

Ela desviou o olhar, fingindo nunca ter falado comigo.

— Qual é o seu problema? — disparei, ainda encarando-a. — Você é alérgica a sorrisos, ou algo do gênero?

— Só a sorrisos de delinquentes idiotas com complexo de superioridade — ela praticamente cuspiu as palavras, escrevendo alguma coisa em uma folha de papel. — Essa coisa de sorrir e fazer as menininhas fazerem tudo o que você quiser? Não funciona comigo.

— É mesmo? — encarei-a, sorrindo para irritá-la.

— Audrey passou o dia todo falando de você.

— Quem?

— Exatamente — ela pegou uma barrinha de cereal e mordeu como se estivesse arrancando a minha cabeça. — É claro que você não se lembra. Afinal, veio dar em cima de mim cinco minutos depois, não é mesmo?

Dar em cima de você? — soltei uma risada. — Para quem está falando de mim, você é bem convencidinha, não é? Afinal. Conversa com as pessoas, come barrinhas de cereal, ouve música... Que grande rebelde da detenção você é.

— Cara, alguém deveria realmente te chutar de volta para o seu país — ela revirou os olhos. — Ou te expulsaram de lá também?

Não respondi.

Ainda não, mas estão quase lá.


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