O Garoto Que Tinha Medo De Amar escrita por Gin


Capítulo 9
A Poesia Do Coração


Notas iniciais do capítulo

Para Diego

Por apoiar a minha ideia e seguir do meu lado

Não chegaria onde estou se não fosse por você



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Ícaro corria, corria bastante, corria tanto, que começou a achar que entrar para o clube de atletismo seria uma boa ideia, ele ganharia destaque. Procurou Clara no campo de tênis, no campo de futebol, deu a volta por trás da escola, na piscina, e até próximo ao dormitório feminino. Não a achava em lugar algum. Respirando ofegantemente, Ícaro começou a sentir tontura após correr tanto, seu rosto suado e o calor que fazia apenas aumentava seu cansaço, o vento batia em seu rosto, mas o máximo que ele poderia fazer, era varrer as gotas de suor que pendiam do corpo do garoto.

Não iria demorar para o primeiro sinal tocar, e ele entrar na sala, se isso acontecesse ele perderia outra chance de conversar com Clara, o que seria decepcionante para ele. Olhou em volta, muitos alunos direcionavam o olhar para sua pessoa, provavelmente se perguntando o porquê dele estar correndo logo de manhã cedo, mas ele não ligava. Respirou fundo e correu, não tão rápido quanto antes, mas correu, adentrando o colégio e passando pelas salas, um faxineiro que fazia a limpeza matinal o avistou correndo e logo segurou seu braço.

— O que está fazendo tão cedo, rapaz? Não sabe que é proibido correr nos corredores do colégio? – Disse ele com uma voz rouca e cansada.

— Eu sei senhor. Mas no momento eu tenho que fazer isso, estou com pressa! – Falou Ícaro ofegante e logo se soltando do braço do velho faxineiro, correndo novamente.

Ícaro passou por várias salas de aula, onde até já haviam alguns estudantes dentro, esperando que o sinal tocasse, olhou o primeiro andar e subiu as escadas, correu por entre as salas do segundo andar, mas foi sem sucesso, ela não estava ali também, antes que pudesse voltar a correr, ele respirou ofegantemente, muito cansado. Metade do seu corpo não estava acostumada a fazer isso e a outra metade se perguntava o motivo de fazer o que ele estava fazendo. Antes que ele pudesse começar a cair em pensamentos novamente, Ícaro se levantou e olhou para frente, foi quando ele viu Daemon, o professor de física o olhando intrigado. Vestia um terno preto, ajustado com uma gravata vermelha, usava calça escura. Seus cabelos curtos meio grisalhos estavam bem penteados e ajustados. Daemon olhou fixamente para Ícaro, procurando uma resposta.

— Tão animado assim, já de manhã cedo? – Falou ele, dando um sorriso.

— Pois é, dizem que se você acorda com disposição, o dia se torna mais fácil. – Ícaro retribuiu o sorriso de Daemon.

— O que está fazendo, realmente? – Daemon deu uma pausa entre as palavras, para que Ícaro entendesse que ele queria saber a verdade.

— Eu... Eu estou procurando uma pessoa senhor.

— E a pressa de encontrar essa pessoa é tão grande que você não consegue nem mesmo esperar acabar o primeiro turno? – Falou Daemon o encarando.

— Eu... Eu tenho que encontra-la antes que comece a primeira aula.

— Então sugiro que seja rápido, pois não vai demorar muito para que ela comece. – Fez uma pausa e olhou para os lados, depois sorriu. – Posso ajudá-lo em alguma coisa?

Ícaro estava prestes a negar, quando passou um pensamento pela sua cabeça.

— Professor, você sabe onde fica a sala do conselho estudantil?

Daemon assentiu.

— A senhorita Clara se encontra no terceiro andar, na sala 2-C. – Ele sorriu.

Ícaro enrubesceu, Daemon havia descoberto quem ele queria encontrar.

— O... Obrigado! – E saiu correndo em direção as escadas que subiriam até o terceiro andar.

Eram degraus estreitos e grandes, difíceis de subir correndo, Ícaro se perguntou qual o motivo daquilo, talvez para impedir que pessoas com pressa como ele, ficassem correndo na escadaria.

Ele subiu e observou o corredor vazio. Apenas as salas intactas ali, sem ninguém. Deu uma olhada pela janela e observou o gigantesco pátio abaixo dele, com um pouco mais de altura, agora parecia bem maior, com outra visão. Deu uma olhada pelas salas, cada uma era diferente, tanto na coloração, quanto na estrutura as portas tinham a cor mais escura, e abriam-se como portas-corrediças, algumas paredes estavam decoradas com pinturas de flores, outras com quadros e vários tipos de artesanato. Ícaro deduziu que ali devia ser onde parte dos clubes ficavam.

Saiu procurando a sala e logo encontrou. “Sala 2-C”, era o que estava escrito na parede colada a porta azulada, com pinturas de livros e lápis. Ícaro tocou na maçaneta para abrir, mas logo veio um pensamento de que ele poderia atrapalhar quem quer que estivesse lá dentro. Ele não havia sido convidado, não era legal ter feito isso. Mas se não fizesse, todo o esforço que teve de procurar teria sido em vão, de que teria adiantado ter feito o que ele fez? Então ele girou a maçaneta e abriu a porta.

A sala não era o que podemos chamar de imensa, mas tinha sim sua extensão, era cheia de instantes com vários documentos pendurados nela, as paredes tinham uma coloração branca e alguns desenhos de canetas e papeis. O piso do chão era liso, mas não escorregadio, como se alguém acabasse de limpá-lo. Do teto, cujo havia algumas rachaduras, pendia um ventilador que estava ligado. O cheiro da sala era de flores lavanda, e agradava qualquer um que pudesse passar ali. Ícaro olhou mais um pouco pela sala, havia uma mesa grande, onde quatro cadeiras estavam abertas, uma delas ocupadas por uma moça de cabelos loiros soltos e olhos verdes. Clara. Ela parecia não ter notado Ícaro, pois lia um papel com uma extrema concentração, enquanto fazia algumas anotações.

Sem querer incomodar, Ícaro se sentou sobre o chão liso, e a observou enquanto escrevia. As mãos de Clara faziam movimentos rápidos e apressados, como se ela se tivesse que fazer aquilo para entregar agora. Ela pôs a mão na cabeça e fez uma expressão de cansada, depois olhou para o papel confusa e voltou a escrever. Com isso, Ícaro deduziu o que tinha acontecido. Ela anotou mais algumas coisas e olhou para a sala, talvez desviando sua atenção, para buscar respostas, foi quando Clara observou Ícaro sentado, a encarando.

— O que está fazendo aqui? O sinal já vai tocar. – Ela respondeu com um ar de severidade.

— Vim para saber o que estava acontecendo, mas parece que já sei o que é. – Ícaro abaixou sua cabeça olhando para o chão. – Onde estão os outros membros do conselho?

— Não tem mais nenhum. – Responde eu ela, se levantando. – Você poderia por favor, se dirigir a sala?

Ícaro olhou para ela, e pôde perceber que havia algo mais escondido naqueles seus olhos, do que a vontade de que ele fosse embora, algo estava implícito.

— Clara, quer ajuda? – Ele falou, encarando ela diretamente nos olhos.

Clara desviou o olhar e sentou-se novamente, observando os papeis.

— Por que eles desistiram? Digo, os membros do conselho? – Ícaro continuou.

— Não aguentaram o trabalho. De início chegaram aqui apenas com o intuito de poder se atrasarem na aula, mas quando os obriguei a fazer suas atividades, disseram que estavam se sentindo pressionados, e saíram.

Ícaro observou mais um pouco a sala, a quantidade de documentos, como tudo estava organizado e deveria estar separado por cada assunto, isso fez ele pensar que realmente daria muito trabalho organizar tudo, era como se o Conselho Estudantil fosse responsável por cada coisa que acontecesse no colégio. Era muito trabalhoso e não dava nada que recompensasse.

— E por isso você ficou tão ocupada daquele jeito. Finalmente entendi.

Clara olhou para Ícaro.

— Você percebeu isso em um curto espaço de tempo. Como fez isso?

— Quando eu conheço uma pessoa, eu estabeleço uma personalidade para ela, se ela agir totalmente fora da personalidade que estabeleci, algo de errado está acontecendo.

Clara sorriu um pouco.

— Até nisso você é incrível. – Voltou a atenção aos papeis. – Agora deixe-me terminar isso, você precisa voltar para a sala de aula. Agradeço a preocupação, mas você não pode ficar aqui.

— Não, eu não vou voltar, eu vou ajudar você nisso. – Ícaro se levantou e sentou em uma cadeira próxima a ela. – Como se resolve isso? Na verdade, o que você está resolvendo?

— Ícaro, saia daqui, você vai ter problemas se continuar aqui. – Falou ela com um olhar sério.

— Por que você não pede ajuda? – Ícaro se levantou. – Você está precisando, mas mesmo assim não pede! Não queira resolver tudo sozinha!

Clara o encarou com os olhos arregalados, sua expressão poderia ser de raiva, ou espanto, naquela hora, não dava para diferenciar.

— Como se você entendesse alguma coisa! – Clara gritou, pegou os papeis e os arremessou na mesa com força. – Você só está aqui há três dias! Não tem a menor capacidade entender o que está acontecendo!

Aquilo mexeu um pouco com Ícaro, e ele fez o suficiente para esconder sua reação, porém pareceu que não tinha dado certo, já que Clara logo falou.

— Droga, qual o seu problema? Não venha até aqui para dizer o obvio. É claro que eu preciso de ajuda, mas eu não posso pedir. – Os olhos de Clara começaram a lacrimejar.

Ícaro manteve-se calado, enquanto observava ela, tentou dizer alguma coisa, mas sabia que não precisava falar nada.

— Clara... Você tem dado bastante duro, todo mundo sabe disso, mas de vez em quando pedir ajuda... Não é coisa ruim... – Ele falou, mas pareceu ter se arrependido.

Clara começou a chorar um pouco, baixinho, não o suficiente para derramar muitas lágrimas, mas angustiante para o coração de qualquer pessoa.

— Então, o que você faria? Se a escola toda te visse como um exemplo que não pode falhar, e você ficasse encarregado de um cargo pesado demais para carregar? O quer você faria? Me responda! – A essa altura, seus gritos eram de angústia, como se ela estivesse soltando tudo aquilo acumulado de uma vez.

— Sinceramente. – Ícaro falou olhando um pouco para baixo. – Eu não pediria ajuda, pois sou orgulhoso demais para aceitar que preciso disso. – Deu um sorriso triste enquanto a olhava. – Acho que sou um pouco parecido com você, claro que não sou tão incrível, ou tenho a capacidade que você tem, mas pareço sim.

Clara soluçou e começou a chorar, dessa vez mais forte. Sentou-se e pôs a mão no rosto, quando as lágrimas começaram a cair.

— Tem... Tem sido muito difícil. É muita coisa para pensar, organizar... Eu não tenho tido tempo de fazer nada além desses trabalhos... E não posso dizer a ninguém que tem sido difícil, porque não quero decepcionar. – Chorou mais um pouco enquanto pegava os papéis. – Formulário disso, notas daquilo, é complicado!

Ícaro pensou em mil coisas para dizer a ela, mas todas elas não serviriam de nada. Em vez disso, acariciou levemente a cabeça de Clara e perguntou.

— Sabe me dizer se a sala do clube da música é aqui perto?

— É aqui do lado... – Respondeu Clara entre soluços. – Por que me pergunta isso?

— Quero que você me guie até lá. Vou te mostrar uma coisa. – Ícaro respondeu com um leve sorriso.

Clara, pôs os papeis na mesa e tentou dizer algo, mas não conseguiu. Em vez disso, guiou Ícaro até uma sala próxima, onde as paredes tinham desenhos de instrumentos musicais, a porta tinha desenho de uma sanfona, e quando a abria, parecia que estava em movimento.

Diferente da sala do conselho, o Clube da música era sim, imenso. Todas as paredes estavam decoradas com partituras e desenhos de instrumentos. Ao redor da sala, colocados de uma maneira organizada do lado esquerdo, havia violões, guitarras, violinos, e outras dezenas de instrumentos diferentes. Ícaro observou o lado direito, e apenas um instrumento existia ali, um piano. Ele sorriu ao ver aquele piano.

— Vou tocar um pouco para você, isso é, se quiser ouvir. – Ele sorriu e sentou na cadeira do grande piano branco.

Clara observou ele intrigada.

— Você... – Limpou as lágrimas. – Você sabe tocar piano?

— Não posso dizer que sei muito bem... – Ícaro deu um sorriso sincero. – Mas eu aprendi um pouco com o tempo.

Clara se sentou em uma cadeira próxima e observou Ícaro olhar para as teclas, quase que tentando memoriza-las.

— Parece que pensei em uma boa música para se tocar. – Sorriu para Clara. – Espero que goste.

Clara não respondeu, apenas ficou parada, ansiosa. Ícaro respirou fundo e olhou para as teclas. Havia muito tempo que ele não tinha tocado nada, será que estava enferrujado? Será que poderia fazer uma boa performance para Clara, afim de melhorar seu humor? Ele pensou se era realmente a melhor coisa a se fazer, mas logo percebeu que não tinha mais nada que poderia ter feito e respirando fundo ele tocou a primeira tecla.

Assim que viu que acertou a primeira nota, ele teclou a segunda e a terceira, lentamente, mas não sem perder o ritmo. Seu coração acelerou enquanto ele tocava. Começou a tocar a música, não era rápida, mas também não era lenta, seus dedos se moviam de uma forma que ele não acreditava. Ícaro não havia perdido a habilidade de tocar, ela só estava adormecida.

A cada nota a mais que Ícaro tocava, ele se sentia bem, como um rapaz que não via sua namorada há muito tempo, reencontrar ela. Era uma sensação de nostalgia feliz, era como se o mundo todo fosse dele. E por um momento ele se esqueceu de quem era, e do que estava fazendo, seus olhos concentrados na nos seus dedos, e seus dedos nas teclas do piano. A música estava quase acabando, quando ele escutou o som de lágrimas caindo. Clara estava chorando enquanto escutava a melodia calma e triste. Nesse momento Ícaro errou uma ou duas notas, não foi o suficiente para tira-lo do ritmo, mas o suficiente para saber que ele havia errado. Continuou tocando, calmamente e depois de uma maneira mais agitada, seguindo o estilo, e quando parou, foi como se o mundo tivesse desabado de uma só vez em cima dele, como se todos os pensamentos que ele havia tido na vida inteira, voltassem tudo de uma vez. Ícaro ficou tonto, mas manteve as mãos nas teclas até voltar ao normal. Olhou para Clara, que sorria enquanto chorava. Seu cabelo loiro caia um pouco por cima de seus olhos, olhos verdes, mas um pouco vermelhos por causa das lágrimas.

— Ícaro... Isso foi... Surpreendente... Essa melodia...

— É uma música que eu fiz para uma certa pessoa, há alguns anos atrás. Já fazia muito tempo desde que eu não tocava. Eu a chamo de “A Poesia Do Coração”. – Ele sorriu, saiu do piano e sentou-se do seu lado, numa cadeira. – Clara, não precisa se preocupar em pedir ajuda, pelo menos, não mais. Agora, estou aqui para te ajudar.

Clara soluçou.

— Muito obrigada... – E após o sorriso, chorou mais um pouco. – Você não sabe... O quanto eu fico feliz.

— Parece que seu trabalho duro me motivou um pouco também. – Ele acariciou a cabeça dela e sorriu. – Pode fazer um relatório para mim? Eu quero entregar a líder do conselho estudantil. Quero saber se posso fazer parte do clube.

Clara olhou para ele surpreendida.

— E não é só isso, você não consegue pedir ajuda, eu também não, mas posso ver se consigo trazer alguém para nos ajudar. Pelo visto vamos ter muito trabalho.

Clara limpou as lágrimas e sorriu um pouco, se animando.

— Sim, vamos mesmo. Espero que não tenha entrado no Conselho só para poder chegar atrasado nas aulas em!

— As aulas! É mesmo! – Ícaro se levantou. – Eu tinha esquecido completamente!

Clara sorriu.

— Você vem até aqui, me faz sorrir, mas continua um idiota esquecido. Francamente, será que eu posso contar mesmo com você?

Ícaro coçou a cabeça sorrindo em um pedido de desculpas.

— Estou brincando. Isso é o de menos, eu posso fazer um relatório dizendo que você estava me ajudando a fazer as tarefas do conselho, e eu estava explicando como funcionam as coisas por aqui. – Ela sorriu. – Um relatório a mais não faria tanta diferença.

— Isso não é coisa que a líder do conselho diga a um aluno novato. – Brincou Ícaro.

— Bom, dessa vez, só dessa vez!

Ícaro riu da reação de Clara.

— E então, o que faremos no resto da manhã?

— Bom, se você tiver disposto, pode tocar um pouco mais para mim, e quem saiba eu não canto para você?

— Cantar? Então você canta! – Ele disse sorrindo.

Clara ficou um pouco envergonhada.

— Ok! Vamos então começar. – Sorriu Ícaro.

E pelo resto da manhã, eles tocaram e se divertiram, deixando todas as preocupações para trás, sem se importar com o que haveria de acontecer. Naquele momento, o mundo era deles.


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Notas finais do capítulo

Dedicatória especial:

Para Arashi

Por ter me stalkeado e me fazer ter vontade de escrever

Você é um amor de pessoa



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