O Garoto Que Tinha Medo De Amar escrita por Gin


Capítulo 33
Nunca Perca esse seu Sorriso


Notas iniciais do capítulo

Para Julie

Por todos nossos momentos juntos e por me amar

Sinto sua falta



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/421004/chapter/33

A multidão logo estava amontoada no pátio do prédio, como o local era grande cabia muita gente ali, melhorava ainda mais, por ser próximo às salas, então ficava mais fácil de buscar as cadeiras e deixar as pessoas mais confortáveis.

A chuva continuava impiedosa lá fora, o vento forte levava vários objetos, e se você não fosse uma pessoa um pouco mais pesada, dificilmente conseguiria andar com a força daquele vento, era uma tempestade sem igual.

— Que azar isso acontecer justamente nesse dia. – Falou Richard, se aproximando de Clara.

Clara não viu o jovem se aproximar, provavelmente pela concentração que estava tendo, mesmo ela tendo a ideia de cantar para aquelas pessoas, ainda estava bastante nervosa com isso. Ela olhou para Richard, não eram de conversar muito, e havia acontecido algo algum tempo atrás que fez com que ela tivesse certo receio em falar com ele, por isso parecia ter um clima estranho, mas Richard aparentemente não estava se importando com isso.

— É, parece até que não queriam que o festival desse certo. – Ela deu um sorriso baixo.

— Ícaro falou que vocês vão se apresentar, ele foi buscar o piano com a ajuda de alguns professores, você acha que ele consegue? – O jovem passou a mão sobre seu pescoço com um olhar meio preocupado.

 Clara se lembrou que Richard e Ícaro eram amigos de infância, e provavelmente eles se conheciam muito melhor do que ela poderia imaginar conhecer, qualquer coisa que Clara diria, Richard teria muito mais credibilidade em falar. Mas ao mesmo tempo em que pensou isso, também ficou um pouco curiosa em relação à Ícaro.

— Ele é tímido nessas coisas, não é? Sempre foi desse jeito pelo visto. – Clara perguntou.

Richard balançou a cabeça, quase que sem reação.

— Ele não era desse jeito quando era mais novo, muito pelo contrário, ele tinha tanta confiança em si que as vezes até irritava. – Falou ele, levantando a cabeça como se estivesse tentando lembrar.

Clara pensou consigo mesma, Ícaro podia até ter confiança que poderia resolver as coisas sozinho, mas ela tinha certeza que ele não pensava muito desse jeito, ele fazia as coisas assim, simplesmente por achar ser a única opção.

— Ele se achava também? – Ela deu uma leve risada.

Richard assentiu, rindo um pouco.

— Você nem imagina, ele era completamente egocêntrico, e se achava a pessoa mais esperta do universo. – Richard fez uma pausa, assumindo uma expressão mais triste. – Mas erámos crianças, não é? Toda criança é assim.

— Ícaro perdeu alguém que se importava muito quando era mais novo, quem era essa pessoa? – Clara simplesmente perguntou, sem pensar, depois de pronunciar as palavras foi que percebeu o que havia perguntado.

Richard olhou para ela, ainda com uma expressão triste.

— Leila era o nome dela, eu também cheguei a conhecer, mas nunca fui tão íntimo dela quanto Ícaro foi, por isso não posso simplesmente falar por ele, mas se você me perguntar o motivo principal pelo qual o garoto foi mudado, digo que foi ela.

Clara se sentiu um pouco incomodada naquele momento, mas era um incómodo do qual ela não conseguia identificar o motivo, simplesmente tinha algo naquelas palavras que faziam ela se sentir um pouco frustrada, e ao mesmo tempo triste, por que será?

— Eu entendi, se houver uma brecha, eu perguntarei a ele sobre isso. – Disse ela, com um sorriso. – Obrigada, Richard.

Ele levantou a mão, sorrindo baixo.

— Eu quem devo agradecer, se vocês não se oferecessem para se apresentarem à essas pessoas, eu teria que fazer isso, e bom, eu nem sei se conseguiria, é muita gente. – Ele falou.

Não muito tempo tempos, a grande maioria das pessoas estava sentada, e os que não estavam eventualmente iam se sentando com mais cadeiras sendo trazidas a toda hora, Clara observou Ícaro descendo com o piano, acompanhado de dois professores, colocando ele um pouco longe do pátio para não atrapalhar a peça que já estava começando.

Com Brandon no papel principal, a peça contava a história de uma família pobre que vinha do interior, fugindo da fome que cobria o local, eles tinham dificuldades de se adaptarem a essa nova vida, mas os laços que cada um tinha com o outro, fazia com que superassem todas as dificuldades, Brandon era o irmão mais velho, e aquele quem fazia a história girar, ele era quem se comunicava mais, e conseguia emprego para seus pais. A peça tinha duração de trinta minutos, Ícaro ajudava a trazer os objetos que ainda estavam no palco e que serviria para a apresentação, logo, tudo parecia estar correndo muito bem.

— Brandon é um ótimo ator, se ele quisesse seguir profissão nisso, tenho certeza que se destacaria e alcançaria grandes horizontes. – Falou Richard, ao lado de Clara.

Clara assentiu, o jovem era realmente muito bom naquilo que fazia, e ao pensar nisso, também lembrou que ele havia passado para uma universidade ainda no 1° ano do Ensino Médio, e que não havia contado se ficaria ou não no colégio, se fosse embora, aquele provavelmente era o último dia que iriam se ver.

A cena final era uma cena feliz, mostrava a família se reunindo, depois de bastante esforço, eles se juntavam em uma mesa e começavam a comer, cada um havia conseguido se superar durante a peça, e o roteiro foi muito bem escrito, Clara se lembrou que Ryan ajudou bastante para ele ficar pronto, o garoto era do clube de literatura, e também sabia o que fazia.

— Bom, acabou, acho que agora é sua hora. – Falou Richard.

Clara estava tão impressionada com o final da peça que sequer pareceu lembrar do que ela tinha que fazer agora.

— É verdade. – Ela olhou para o local próximo ao refeitório, onde Ícaro estava, ajeitando alguma coisa no piano. – Agora é com a gente.

A tempestade continuava lá fora, o que ainda prendia as pessoas lá dentro, alguns estudantes do clube de literatura recitavam alguns poemas enquanto o som e o piano eram colocados ali, Ícaro e Clara tinham ido se trocar. Ryan recitou uma poesia sobre o colégio, e como aquela metade do ano que eles tinham percorrido havia sido cheia de surpresas e acontecimentos, Clara conseguiu se arrumar logo e conseguiu pegar parte da poesia do rapaz. Realmente, já havia se passado metade de um ano, tanta coisa aconteceu nesse tempo, que quando se parasse para pensar, meio ano é muito pouco para tanta coisa.

Estava tudo pronto, Clara usava um vestido longo e branco, que ia até abaixo dos seus joelhos, usava também sapatilhas embranquecidas, combinando com seu vestido, seus cabelos loiros estavam soltos, com algumas mechas caindo pela sua testa, destacando seus olhos verdes. Ícaro chegou alguns segundos depois, usava um terno e gravata, com uma calça e sapatos sociais, o seu cabelo que normalmente tinha franja, estava puxado para trás, deixando sua testa a mostra, ressaltando também, seus olhos azuis.

Clara e Ícaro se entreolharam, na verdade, se olharam por tempo mais que o suficiente, até ele dar uma risadinha e se aproximar dela, tocando em seu ombro.

— Você está linda. – Ele disse, olhando para o lado em seguida.

Aquilo fez o coração de Clara disparar, e ela ficou completamente enrubescida, sem saber o que dizer.

— Você... você também está...

— E agora, teremos uma apresentação única para todos vocês! – Ryan havia acabado de pronunciar a sua poesia e começou a anunciar a próxima atração, as pessoas olhavam animadas.

Clara se inquietou, estava um pouco nervosa, mas quando olhou para Ícaro, percebeu que ele também estava, a multidão toda olhava para os dois, havia milhares de pessoas ali, mesmo não sendo em um palco, o pátio cabia todos, era a primeira vez que ela iria cantar para tanta gente assim. Antes que Ryan pudesse terminar, Ícaro segurou a mão dela, numa atitude desesperada, causada pelo nervosismo, o que fez com que ela ficasse ainda mais nervosa, mas ao notar a mão trêmula de Ícaro, se acalmou um pouco, mesmo com o coração disparando.

— Vamos conseguir. – Disse o jovem baixinho em seu ouvido.

— Uma apresentação musical, com grande estilo e classe! Recebam com palmas os dois membros do nosso Comitê Estudantil! Ícaro Arnetold e Clara Meyer! – Ryan anunciou.

Uma salva de palmas se estendeu no pátio, com o som um pouco abafado, se intensificou ainda mais com o barulho da chuva lá fora. Só então, Clara percebeu que já era mais de meio dia. A garota, junto de Ícaro levantou a mão, ainda segurada com a dele, e todas as pessoas viram, o que fez Clara ficar com mais vergonha ainda, mas conseguiu se controlar. Depois, Ícaro fez uma reverência ao público e para Clara, ele sabia se apresentar, não era a primeira vez que fazia isso, e mesmo não sendo tão confiante, ele não parecia estar tão nervoso assim.

Ryan entregou o microfone para Clara, e desejou um, “boa sorte” para os dois, Ícaro caminhou até o piano e sentou-se sobre um pequeno banco colocado ali, olhou para Clara, e para a pessoas.

Clara se endireitou-se no meio do público, com o microfone a postos apenas esperando para cantar, ela já sabia qual seria a primeira música, sabia a letra, eles já haviam feito aquilo antes, mesmo que sem ninguém olhando. Ícaro parecia muito concentrado, olhando bastante para as teclas, como se não quisesse errar de jeito nenhum, depois olhou para Clara que deu um sorriso para ele, o que fez com que o garoto se acalmasse. E respirando fundo, Ícaro começou a tocar.

O toque suave do piano, deu início a música, era calma, quase uma serenata aos ouvidos, mas ao mesmo tempo tinha um ritmo leve, Clara já sabia, mas logo reconheceu “Amanhecer”, uma composição que o próprio Ícaro havia feito, e eles tinham ensaiado juntos há um tempo atrás. A música continuou, e logo chegou o momento em que Clara entrava na música.

Somos como peças ao vento
Reclinadas sobre um luar
Trazendo esse sofrimento
À peça de nosso altar

 

Somos areia no rosto
Melchior, Gaspar e Baltasar
O mundo jogado em seu corpo
O amanhecer que floresce no ar

 

O dedilhar de Ícaro continuava, e ia se tornando cada vez mais leve, Clara observava algumas das pessoas balançando a cabeça e fechando os olhos, aproveitando ao máximo a canção, Ícaro não conseguia ver aquilo, estava concentrado demais nas teclas, Clara decidiu que contaria a ele depois sobre isso. A música então agitou-se um pouco mais, era novamente a deixa para Clara.

Mas quando o ar se acaba
O brilho dispara
A esperança me trai

 

Do corpo do rei sem perfume
Da doença imune
Do coro do pai

 

E que o amanhã traz agonia
E que a manhã fria
Me leva e se vai

Traz comigo toda essa graça
No parque, na praça
Tão forte, distrai...

E então, a melodia continuou, Ícaro respirava fundo enquanto tocava, Clara percebia o esforço que o garoto estava tendo naquele momento.

Amanheça, traga seu domínio
De terra, de sino
E de onde estiver

 

Pois por mais que pareça distante
A felicidade
Está um passo a pé

 

E logo Clara, fez uma reverência acompanhada por mais algumas notas de Ícaro, que parou ao término da música. Clara manteve a cabeça baixa por uns segundos, ouvindo o som de palmas das pessoas, ao levantar, viu que muitos estavam de pé, aplaudindo com um grande sorriso no rosto, outros pareciam maravilhados. Ela olhou para Ícaro sorrindo, e o garoto retribuiu o sorriso, e fez um gesto para ela, como se dissesse que sua voz era maravilhosa.

A emoção da garota era tão grande, que ela nem percebeu que o tempo lá fora melhorava gradativamente, a chuva estava aos poucos parando e o vento não estava mais tão forte. Do lado dela Sebastian fez um gesto, dizendo que iria arrumar as coisas, e Clara assentiu.

— A chuva está passando, tivemos alguns problemas, mas já estão arrumando o palco, onde terá o show da nossa banda em breve, assim que acabarmos aqui, podem ir para lá! – Ela falou no microfone para o público, que também olhava para trás, como se não houvessem notado a chuva passando.

Clara notou Richard correndo com algumas caixas de som, e outros instrumentos, felizmente nada do palco parecia ter sido derrubado, então eles só precisavam ajustar poucas coisas e tocar. Ela também ficou feliz em saber que mesmo sem ela pedir, as pessoas sabiam o que deveria ser feito, o show ainda iria acontecer.

— Mais uma! – Gritava algumas pessoas da plateia.

Clara sorriu para as pessoas ali, e olhou para Ícaro que confirmou. Logo o garoto tocava mais uma melodia, e também, a que Clara mais gostava pois tinha sido a primeira composição de Ícaro que ela havia escutado. Era “A Poesia do Coração”.

E logo lá estava ela, acompanhando a música enquanto cantava felizmente com um sorriso no rosto, a letra além de ser muito bonita, não era trágica, na verdade era bem alegre, Clara sentiu que as pessoas ali estavam gostando, o que a fazia cantar com mais vontade. A cada nota que Clara acompanhava, algumas pessoas batiam palmas, ou movimentavam a cabeça no ritmo da melodia.

Ao término da canção, novamente foram aplaudidos de pé, o que fez Clara sorrir para todo mundo apontando para Ícaro, e ele apontando para ela, agora se levantando do piano. Os dois estavam muito contentes naquela hora.

Clara observou Sebastian um pouco ofegante e suado, chegando próximo, fazendo um sinal de “Ok”, confirmando que estava tudo pronto.

— Muito obrigado! Vocês podem se dirigir ao palco principal! Haverá mais um show para vocês da banda da nossa escola, divirtam-se! – Ela disse, ainda aplaudida por algumas pessoas que agora se levantavam contentes e satisfeitas.

— Conseguimos! – Falou Clara, olhando para Ícaro muito feliz.

Ícaro assentiu, parecia estar bem alegre também.

— Caramba, foram apenas duas músicas, mas foi tão intenso, eu realmente não prestaria para viver da arte. – Falou ele.

Clara correu e o abraçou, sem pensar, apenas fez.

— Obrigada. – Ela disse.

Ícaro parecia estar um pouco envergonhado, mas retribuiu o abraço da garota, de longe os dois pareciam escutar alguns acordes de violão, logo o show começaria, o que significava que eles haviam feito seu papel perfeitamente bem. Clara sentiu a exaustão nos braços de Ícaro, ele praticamente não havia dormido e corria de um lado para o outro, pensou em dizer alguma coisa mais foi interrompida pelo próprio.

— Bom, eu estou com fome, já passou da hora do almoço, o que acha de comermos alguma coisa? As barracas ainda estão na cantina, e como hoje é um dia especial... acho que podemos comer porcaria, não é? – Ele falou sorrindo.

Clara também sorriu.

— Sim, vamos.

Ainda havia trabalho pela frente, mas naquele momento, Clara sentiu ter jogado um peso para fora do corpo, e nem percebendo direito, os dois estavam de mãos dadas, caminhando até a cantina, o Campeonato de Clubes ainda não havia acabado, mas naquele momento, os dois se sentaram e comeram alguns pães, e pela primeira vez em bastante tempo, tiveram um merecido descanso.

— Quer ir ver o show depois daqui? – Ícaro perguntou para Clara.

— Sim, vamos ver, mas sei que os membros do clube de música farão um ótimo trabalho.

Ícaro assentiu.

— Isso eu sei que farão mesmo.

Clara olhou para Ícaro enquanto comia, sentada de frente para ele, o garoto olhava para o longe, observando a multidão que saia do pátio aos poucos, alguns ainda conversando com as pessoas, outros totalmente perdidos. Clara se deu conta de uma coisa ali, do motivo pelo qual ela se sentia tão bem do lado de Ícaro, do motivo pelo qual a garota sempre tinha seu coração disparado quando ele falava algo sobre ela. Agora parecia fazer muito sentido. Clara estava apaixonada e finalmente havia percebido isso.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Desculpem a demora, obrigado por lerem. Deu uma leve bugada, mas essas coisas acontecem.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Garoto Que Tinha Medo De Amar" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.