People With Problems escrita por MrsHepburn, loliveira


Capítulo 13
Gratidão




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Quando eu volto, Chris me explica que meu surto não foi nada, e a gente continua a Conversação sem que ele mencione uma palavra sobre o meu pai, mas continuamos a falar sobre garotos e como eu odeio eles. Sem olhar, nem uma vez, para Perry. Me sinto culpada e um pouco envergonhada por ter sido idiota demais pra perceber que o motivo que Perry me falou, aquele dia no carro, poderia não ser o único. Talvez ele nem tenha superado ainda, por isso não me contou. 

Me sinto horrível. Mas ele ajuda não me dirigindo a palavra uma só vez. 

As próximas duas semanas passam bem rápido. As coisas continuam as mesmas, mas Kristin e eu ficamos amigas. Facilita quando moramos no mesmo quarto. Ela conta sobre as mudanças de cidade dela e que quando ela sair daqui ela vai para uma assistente social e depois vai ser mandada pra alguma família, porque seus parentes perderam sua guarda. Ela não parece triste. Nem acho que deveria estar. Danny e eu fazemos todas as atividades em grupo juntos e parece meio aliviado por poder sair da sombra do irmão. Dover é mais amigo de Perry, e apesar de Perry e Danny se darem bem, não são tão próximos.

Chris me agrupa com Liana para as atividades físicas da parte da manhã (que é nossa nova ocupação das nove ao meio dia), e comecei a conversar com ela também. Apesar de ser meio fechada e com certeza tem problemas de autoestima, dá até pra gostar dela. A única parte chata é que ela fala com uma frequência maior do que a que eu aguento sobre seu marido. Claramente, ela o ama, mas não tenho certeza se o sentimento é recíproco, já que ele a abandonou. Sei que ela acha que é por estar gorda, mas se ele estava até agora junto dela, não acho que seja isso. Óbvio, não falo isso pra ela. Ela não precisa saber dessas coisas, porque ela parece feliz em sua missão de emagrecer. É mais animada que eu pela manhã, pra correr. 

Parece que a vida de todo mundo está se tornando mais clara pra mim, menos a minha. É uma total confusão que, na maior parte do tempo, nem penso nisso. Ignoro qualquer pensamento sobre meu pai, ou vir morar nesse lugar. Minha única conexão com o mundo lá fora e o que acontecia há um mês atrás é minha mãe. E Mack, também. Falamos no telefone durante todos os quinze minutos permitidos, e elas também pararam de falar nos Pensamentos Indesejáveis. Quando eu sentia falta delas me mostrava quanto eu as amava, e eu não tinha percebido isso antes. 

Mas Mack percebeu, porque, no meio da semana, ela ligou para o telefone da senhora Kowki e toda animada me disse que iria passar o quatro de julho comigo. 

-É isso mesmo que você quer? -Eu perguntei pra ela. Porque... bem, não acho que um bando de gente triste faria o quatro de julho dela melhor. 

-Claro! Já falei com a mamãe. Ela vai ficar e eu vou. Quero conhecer seus amigos e te ver, óbvio. Será que tem gente bonita? Hmmmmm. -Ela disse, sonhadora, antes de eu desligar.

Agora faltam quatro dias para a sua chegada, e todo mundo já notou o quanto meu humor está melhor. Sem remédios. Sem horas de choro. Posso quase ouvir os "parabéns". Até Chris parou de me encher a paciência. 

Estamos fazendo uma sessão de Conversação a tarde. Deitados no meio da grama, em um campo longe da casa, então tivemos que andar um tempão. O sol está vindo entre as árvores, e eu estou de olhos fechados, aproveitando a sensação. Apesar da grama estar úmida e  me deixar nervosa, dá pra aproveitar. 

-Quero que respirem fundo, e acalmem o coração. -Chris diz. -É comprovado que se você respirar fundo, inspirando e expirando, consegue controlar sua pulsação e liberar substâncias que te acalmam. Vamos treinar. -Respiramos fundo, inspirando, expirando. E de novo, e de novo. -Isso. Obrigada por me acompanharem. 

-Isso é muito bonito. -Danny comenta. 

-Está certo. É mesmo muito bonito. Quantos de vocês odiariam perder uma vista dessas? -Ele aponta pras colinas ao longe. Não digo nada, porque ele me olharia feio. Porém, de alguma forma, ele interpreta meu silêncio. -Emerson?

-É bonito. -Respondo. 

-Mas? -Idiota. 

-Mas quero minha casa.

-Pensamentos assim não vão te ajudar em nada. 

-Não consigo evitar. -Respondo, ainda olhando pra cima. 

-Uma das principais questões que levam a depressão é o desejo de uma pessoa de conseguir algo, seja um objeto ou uma vida melhor, e falhar no processo. Muitas vezes as pessoas querem se libertar da sua vida, mas não conseguem e caem em um estado de depressão por causa da sua insuficiência. Você não vai melhorar se não parar de pensar assim. O que você tem que pensar é "se você está aqui, então esteja". Se você está no meio do mato em St. Mara, então esteja no meio do mato em St. Mara. Não pensando em sua casa, ou o que vai acontecer quando você voltar ou o que vai comer e por assim vai. Esteja ciente do lugar onde está e das coisas que tem. Agradeça pelo que você tem agora. Esteja satisfeita por poder estar inteiramente em algum lugar, em condições melhores que as de muita gente. -Chris termina. Cedo ao que ele disse, e começo a pensar nas árvores daqui ao invés de pensar em Mack e minha mãe e minha casa. Percebo os formatos que as folhas unidas criam e como a sombra cria desenhos bonitos. 

-Eu agradeço por estar quente e ter um rio atrás de casa pra nadar sempre que eu quiser. -Kristin diz, após um momento de silêncio, em que eu não consegui achar palavras pra responder Chris. 

-Eu agradeço por poder comer comida boa. -Dover diz e todos nós rimos. A comida da senhora Kowki conquista todo mundo. 

-Sou grata por poder praticar exercícios num lugar tão bonito. -Liana complementa. 

-Agradeço por ter tido a oportunidade de vir pra cá, e botar meus pensamentos em ordem. -Perry diz. Meu coração meio que se aperta, mas no fundo, não quero admitir isso. 

-Acho que... talvez, eu só esteja grata por estar viva. Tem problema? -Pergunto, tentando soar doce. Ninguém parece ofendido com a minha falta de emoção, e eu agradeço mentalmente por isso também. 

-Não, não tem. Isso é motivo o suficiente. 


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