“Anjos geralmente não vão a Terra e possuem pessoas, mas podem observa-la livremente e interferir quando lhe forem ordenados. Eu observava, porém acabei fazendo algo mais do que simplesmente interferir...”.

SEIS MESES DEPOIS...

Domingo, 2:53 PM.

Já havia me acostumado com aquele corpo, os amigos do garoto, seu modo de se alimentar e com seus familiares também. Era raro quando ele passava as barreiras entre o corpo dele e eu, Arian sabia que eu estava aqui e foi complacente, me ajudando em coisas “terrenas”.

Voltei a deitar na cama, após vários minutos a campainha tocou. Tive que me levantar e lentamente saí do quarto.

“Não seja tão lerdo!”, Arian, o garoto que de tão sensível e bonzinho parece uma garota, resmungou em minha mente.

— Garoto irritante... — Murmurei enquanto descia as escadas.

Sono. Eu sentia sono, e aquele garoto nem respeitava isso. Eu sou um anjo, não fui feito para ficar sonolento. Não sou acostumado com essa porcaria.

Abri a porta e logo uma garota de cabelos ruivos envolveu seus pequenos braços sob meu pescoço, me abraçando. Isso... Meio que me surpreendeu.

— Quem é vo— Comecei a perguntar, porém fui interrompido.

Ela me deu uma tapa na cabeça e revirou os olhos. Minha cabeça doeu.

— Pare de graça, Arian! — Ela falou me olhando com seus olhos verdes brilhantes.

“Minha pequena Cassie!”, Arian berrou em minha... ‘Nossa’ cabeça. Esse idiota estava animado? Ah, por favor...

— Ah... Cassie, não é? — Perguntei desengonçadamente, coçando a cabeça sem motivo algum (mas em parte era a dor da tapa de segundos antes...).

Cassie se afastou e pôs suas mãos na própria cintura num gesto de birra.

— Claro! Quem mais seria? Ás vezes você é tão bobo, Arian! — Exclamou ela.

“Abrace-a!”, ordenou Arian ansioso.

Abracei a garota a “meu modo”. Apesar dos seis meses que tive de treinamento para tentar ser um “humano normal”, Arian nunca havia me pedido para abraçar alguém.

“Seu estranho” murmurou o garoto em minha mente.

“Ah, aquiete-se! Isso é apenas questão de prática...”, retruquei mentalmente.

Cassie estranhava aquela posição estranha que era supostamente um abraço.

“Deixe-me fazer isso direito!”, Arian pediu. Fechei os olhos e o deixei passar, confesso que fiquei com raiva por não saber fazer tal coisa. Arian endireitou a posição de seu corpo e deu à garota um abraço de verdade, porém ele corou. “Então você gosta dela...?”, perguntei para Arian num tom malandro e ele se enfureceu, mas não mostrou isso muito, porque, aliás, ele estava numa conversa com... “Ui, Cassie...”, tentei imitar Arian mentalmente de um jeito patético.

E ele se enfureceu novamente, como esperado. Quase fez uma cara de raiva para sua “pequena amada”... Há, há...! Como eu adoro imitar pessoas em tom de escárnio...! É realmente muito divertido...

— Tá! Chega de abraço por hoje! Estava mesmo com saudades de mim, não é? — Disse ela se afastando e soltando uma risadinha.

— Sim... — Respondeu Arian por mim com um sorrisinho tímido para a garota.

“Mesmo sendo humano fez vexame”, provoquei.

“Shh! Pare de falar comigo enquanto eu estou no controle! Sabe que eu não consigo brigar e ao mesmo tempo ser humano...”, contrapôs a casca num tom inofensivo.

— Você cresceu! — Notou numa expressão surpresa para a garota.

Cassie fez careta.

— Mentiroso! — Resmungou.

“E ficou linda também...”, inconscientemente pensou Arian.

“Aah... Então quer dizer que você gosta MESMO dela...”, pensei numa conclusão inteligente.

“Oras...!”, começou Arian. Seguindo meu raciocínio, pensei em fazer algo e fiz: Envolvi a cintura da ruiva com os braços de Arian e a beijei. Cassie ficou imóvel por um pequeno instante antes de retribuir, e retribuiu, até que repentinamente se afastou.

— Tonto! — Ela reclamou me encarando.

— Cassie... Me des....des....Desculpa! — Arian balbuciou passando por mim mais uma vez.

Eu senti sua raiva aquecer seu corpo, pelo jeito, eu não deveria ter feito aquilo. “Então o relacionamento deles ainda não chegou a esse ponto...?”, pensei soltando um riso.

A garota bufou apagando tudo o que aconteceu e logo um sorriso repreensivo e quase travesso passou pelo rosto dela.

— Não vai me convidar para entrar, Etthan? — Ela perguntou arqueando a sobrancelha direita.

Eu na verdade não entendi a tal da Cassie, mas o albino deve ter entendido...

“Ela tem o costume de me chamar de Etthan para corrigir meus modos”, logo explicou Arian.

“O que eu faço?”, perguntei.

“Convide-a para entrar e não ouse colocar suas mãos nela!”, advertiu ele.

“Tecnicamente são as suas mãos...”, rebati mentalmente.

Humph. Se Arian não tivesse uma consciência tão boazinha como realmente tem, ele me xingaria de nomes e mais nomes, isso eu garanto.

— Claro... Mas acho que você nunca precisou de permissão para entrar. — Falei com as lembranças do ‘menino bege’ na minha cabeça e uma expressão qualquer que Arian me ensinou. Ele disse que aquilo se chamava “ser simpático”...

Cassie fez uma careta engraçada, o que me fez rir.

— Não me lembre! — Ela pediu dando um beijo em minha bochecha.

F-foi a minha vez de corar...

“Tá se apaixonando, ‘anjinho’?”, perguntou Arian caçoando de mim.

“Fique quieto!”, mandei.

“É meio difícil ignorar sentimentos por ela... Cassie é uma fada”, comentou ele dando um riso abafado.

“Esse garoto é estúpido mesmo...”, pensei não tão alto. Se eu estivesse no lugar dele agora eu aproveitaria e caçoaria de mim com os mesmos argumentos que usei quando caçoei dos sentimentos dele por essa ruiva. E ele preferiu não fazer isso. Realmente não entendo esse garoto. Mas que seja...

De repente uma dor inesperada tomou conta do meu peito e eu e Arian nos contorcemos na frente de Cassie. Acabei ficando de joelhos no chão.

— A-ai...! — Gemi alto. — Mas o que diabo é is—

— Ai, meu Deus! Arian! Você está bem?! — Preocupou-se Cassie se abaixando e colocando as mãos sobre as minhas costas para socorrer-me.

— Claro que não! Você não está ven— Comecei a retrucar, porém Arian me interrompeu gritando um “Pare de ser rude!”. — Grr... Quer dizer... O-o meu peito... — Grunhi de dor. — E-está... Doendo! — Falei com a voz meio baixa, porque algo me corroia por dentro.

Cassie fez uma expressão chocada, depois pegou seu celular no bolso e tentou me acalmar:

— N-não se preocupe! E-eu vou chamar uma ambulância e—

“É ISSO O QUE VOCÊ GANHA POR COMETER UM CRIME TÃO GRAVE!”, gritou uma voz na minha cabeça na qual não era a de Arian e que me fez agonizar de dor á medida que suas palavras saíam sabe-se lá de onde.

Gemi encolhendo meu corpo caído no chão.

— A-a-ai meu Deus! — Falou Cassie desesperada. — C-calma! Calma, Arian! O-o socorro j-j-já vai che-che-chegar! — Balbuciou digitando alguns números no seu aparelho. A garota estava suando frio.

Bufei.

— Na verdade é você que tem que se acalmar, não ach— Comecei a perguntar em um tom de desdém, mas fui tomado pela dor novamente e acabei gemendo outra vez.

“VIVER COM OS HUMANOS... É UMA PUNIÇÃO FÁCIL DEMAIS PARA VOCÊ, URIEL... NÃO TINHA SE DADO CONTA?”.

— Porcaria de demônios... — Resmunguei com a voz num tom baixo e rasgado... “Dor maldita!”.

— Sim, esquina com a Washington... — Explicou Cassie falando no celular e depois soltou um olhar em minha direção para checar o meu estado.

Dei um sorriso para ela e depois me contorci novamente em meio a várias dores em lugares que eu nem sabia que existia!

“O quê... Diabos você fez, HEIN, URIEL?!”, perguntou-me Arian com dificuldade, pois ele também sentia aquelas dores infernais.

— N-não importa... O que eu fiz... — Respondi para Arian com sua própria boca e depois tudo se apagou repentinamente, a última coisa que pude ver foi o rosto desesperado de Cassie indo ao meu socorro.