Stranger escrita por Okay


Capítulo 26
Família.


Notas iniciais do capítulo

Beijos & Boa leitura! ♕
Capítulo revisado e reescrito 25/03/2020



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Capítulo 26 — Família. 

— Eu tentei vir o quanto antes quando vi sua mensagem. — Gustave disparou, ao passar pela porta de entrada do apartamento.

— Eu só disse que  vim mais cedo pra casa, não estou morrendo. — Lucas falou brincando, recebendo um abraço apertado de Gus.

— O que aconteceu? Me fala. — O namorado abraçou o loiro pelas costas, depositando beijos em seu pescoço. — O que você teve?

— Eu não consegui trabalhar... Aconteceu uma coisa. — Revelou seriamente.

— O quê? — Soltou-o do abraço para poder encará-lo.

— Eu me encontrei com o Bob. — Falou, após tomar um longo fôlego.

— E aí? — Perguntou ansioso.

— Eu achei que eu fosse morrer hoje. — Suspirou. — Eu tive muito medo.

— Ele te machucou?!

— Por pouco, não. — Declarou, com o olhar distante. — Mesmo com medo, eu consegui enfrentar ele, mas...

— Mas?

— Tem um problema.

— Qual?

— Eu entreguei os cinco mil e ele entendeu como uma afronta. — Revelou. — Eu precisei tentar convencê-lo de que valia a pena me dar uma chance.

— O que ele fez?

— Ele me deu um ultimato. — Respondeu. — Basicamente, eu ainda estou devendo vinte e cinco mil, mas tenho mais uma semana.

— A gente consegue. — Falou, segurando-o nos braços. — E como você está depois de tudo isso?

Lucas tomou fôlego, processando tudo o que tinha acontecido naquele dia.

— Agora que tudo passou, esgotado.

— Vem cá. — Puxou-lhe para um abraço. — Você foi muito corajoso.

— Eu precisava ser... — Acariciou as costas de Gus em meio ao abraço. — Eu fiquei com medo de nunca mais te ver.

— Você ainda vai ter que me aturar muito, rapazinho. — Falou, roubando um sorriso do namorado.

Gustave soltou-o do abraço e guiou-o até o cômodo que usava de escritório, Lucas esperou sem entender, observando o que ele fazia. Vendo-o abaixar para abrir a última gaveta da cômoda, vasculhando papéis e pastas em busca de algo.

Mesmo o loiro perguntando o que ele fazia, o namorado não lhe deu uma resposta até parecer encontrar o que procurava. Levantando-se com uma pequena pasta em mãos.

— Adivinha.

— Não faço ideia do que seja. — Lucas levantou os ombros.

— São os documentos daqui, meus pais me ajudaram a pagar então legalmente o apartamento já está no meu nome — Explicou. — Eu posso hipotecar pra conseguir o empréstimo, isso com certeza vai dar certo.

— Gus... — Exprimiu, quase sem voz.

— Eu sei que vai dar certo. — Sorriu com esperança. — Eu posso ir amanhã mesmo de novo no  banco.

Sem saber o que dizer para agradecer aquele lindo gesto de amor e confiança, Lucas pendurou-se em seu pescoço, abraçando mais apertado que antes. Estava emocionado e pela primeira vez em muito tempo, sentiu um peso sair de suas costas.

— Eu te amo. — O loiro expressou, sentindo-o em seus braços. — Eu te amo muito.

— Eu também te amo, Lu... — Gustave levou uma de suas mãos aos cabelos do namorado, afagando-os. — Seja qual for a situação, enfrentaremos juntos.

— Namoro? — Rachel estava de olhos arregalados. — Mas quando eu disse que meus pais estavam vindo, eu só quis dizer que eu não poderia vir aqui por um tempo, não significa que eu quero que você conheça eles agora.

— Por que não? Qual é o problema nisso?

— Eu não acho que é o momento certo, não faz nem uma semana que estamos nos vendo, não quero precipitar as coisas.

— Eu não vejo assim, eu simplesmente acho que se a gente tá se gostando, por que não tentar algo mais sério?

— Al, eu já sofri muito em relacionamentos anteriores, exatamente por não saber esperar, então eu simplesmente não quero cometer esse erro novamente.

— Erro? Você acha que isso seria um erro?

— Sim, eu acho. Eu sempre sofri por não saber ser paciente, então eu não quero voltar a ser a pessoa que eu era antes... Eu espero sinceramente que você entenda.

— Acho que eu entendo... Você não gosta de mim o suficiente pra ter um relacionamento agora, não é?

— Não! Não é isso, não precisa exagerar!

— Não estou exagerando, Rachel, eu só achava que eu era importante pra você!

— E você é!

— Ah, muito, sou tão importante que você não quer nem que eu conheça seus pais.

— Não agora! Você está fazendo drama à toa! — Irritou-se. — Por favor, você é um homem adulto, por que está sendo infantil desse jeito?

— Se você pensa assim... Então acredito que acabamos por aqui.

— É assim? — Ela queixou-se.

— É, é assim.

— Ótimo, eu estou cansada de homens como você! — Levantou-se do sofá onde estava.

— Homens como eu?! — Levantou-se em seguida. — Por curiosidade, o que homens como eu fazem? Se preocupam com o futuro do relacionamento? Querem algo sério? Casamento? Filhos? Sim, então eu sou esse tipo de homem! E se não é esse tipo de homem que você quer, então você realmente está com a pessoa errada!

— Eu não quero discutir com você! — Bufou, caminhando à porta. — Adeus!

Rachel bateu a porta, deixando Alberto olhar estático para onde ela tinha saído, sem conseguir acreditar que ela realmente tinha ido embora por conta de uma besteira daquelas. Estava totalmente desacreditado, jurava que ela era a mulher de seus sonhos e tudo tinha  acabado num piscar de olhos.

Quarta-feira, 28 de novembro de 2012.

— Eu odeio ter que ir trabalhar hoje... — Gustave afirmou, abraçando o namorado por trás, enquanto ele escovava os dentes, vendo-os no reflexo do espelho do banheiro. — Eu poderia ficar te olhando o dia todinho.

— Eu queria não ir hoje também. — Lucas concordou, após enxaguar a boca e cuspir. — Vamos dar uma desculpa e ficar em casa?

— Eu topo. — Riu, vendo-o enxugar o rosto com a toalha.

Naquela manhã tomaram seus cafés e se arrumaram para o trabalho, indo para o carro juntos. E quando estavam algumas quadras da livraria, Gustave xingou baixinho:

— Droga...

— O que foi? — O loiro quis saber.

— Acabei de me lembrar que esqueci a escritura do apartamento em casa, que merda viu. Vou ter que voltar pra pegar.

— Você não precisa ir ao banco hoje, pode deixar pra ir amanhã. Se você voltar pra casa, vai chegar atrasado no trabalho.

— O trabalho é o de menos. Eu não queria demorar pra conseguir esse empréstimo.

— Mas temos mais seis dias, vai dar tudo certo. — Lucas sorriu para ele, lhe passando confiança.

— Tudo bem, eu vou amanhã. — Afirmou, aparentando estar pensativo enquanto olhava para o trânsito.

Ao chegarem, despediram-se com um beijo como todos os dias, onde Gustave seguiu ao trabalho e Lucas entrou na livraria, primeiramente registrando sua entrada, para, em seguida, retirar o casaco, e guarda-lo no armário.

Enquanto fechava o cadeado, percebeu que Alberto havia passado por ele sem lhe cumprimentar, o que não era comum.

— Oi, Al... Bom dia. — O loiro seguiu-o, caminhando com ele ao depósito.

— Oi, não te vi chegando. — Falou, desanimado.

— Tá tudo bem com você? — Lucas indagou. — Sem querer ofender, mas você tá péssimo, você dormiu bem?

— As olheiras estão tão profundas assim? — O amigo esfregou os olhos nervosamente.

— Um pouquinho. — Esboçou compaixão. — Quer um pouco de protetor solar com cor? Nosso tom de pele não é o mesmo, mas você pode tentar passar só uma gotinha debaixo de cada olho.

— Ah, é melhor não. Entãoé por isso que você tem essa pele impecável? Esse é o seu segredo? — Brincou na tentativa distrair o garoto do assunto.

— Quando se é tão branco sendo quase transparente, não se pode esquecer o protetor solar. — Justificou, parando para racionar em seguida. — Mas espera, você está mudando de assunto... Vai, me fala, o que aconteceu? Você não parece bem.

— Eu e Rachel terminamos ontem à noite... — Desviou o olhar do dele. — Quer dizer, tem como terminar uma coisa que nem começou?

— Vem cá. — Abraçou o amigo, acariciando suas costas.

— Você tinha que ver o que ela falou. — Alberto choramingou, pouco depois soltando-se do abraço.

— Você está bem mesmo, para trabalhar hoje?

— Eu prefiro trabalhar a ficar em casa remoendo o que aconteceu.

— Quer conversar no almoço?

— Seria ótimo. — Alberto abriu um curto sorriso.

— Faz o que você falou, trabalhe pra se distrair, acho que é a melhor forma de lidar com alguma coisa que dói muito.

— Eu vou tentar mesmo.

Lucas compadeceu-se da expressão amargurada que ele carregava, ficando triste por ele. Não conseguia imaginar o que faria o relacionamento de ambos acabar tão cedo, mas descobriria os detalhes do que aconteceu mais tarde. Iniciou o dia tranquilamente, seu expediente estava calmo, onde até mesmo tinha tempo para ler as mensagens do celular de vez em quando. 

Passou a maior parte do tempo organizando as estantes e tirando o pó de onde precisava, até ser chamado por Alberto para fazerem o intervalo do almoço mais cedo. Antes de meio dia estavam saindo para comer, escolhendo mais uma vez o restaurante que sempre iam.

Enquanto caminhavam, o loiro sentiu o celular vibrar dentro do bolso da calça, pegando-o em seguida, vendo uma ligação de um número que não estava em seus contatos.

— Espera um minutinho, Al? Vou atender.

— Fica à vontade. — Afirmou, parando de caminhar para esperá-lo.

— Alô? — O loiro falou, assim que colocou o aparelho ao ouvido. — Sim, sou eu... Ah, oi, Karen! Eu tô indo almoçar, por quê? Tá tudo bem? Não, não estou sabendo, você tem certeza de que é ele? Pode ter sido um trote... É claro, com certeza eu posso ir lá confirmar, qual é o nome do hospital que disseram? Ok, eu vou pra lá agora. Pode deixar, eu te retorno assim que eu chegar.

Assim que a ligação foi finalizada, Lucas não podia deixar de estar confuso e preocupado, ligando para o celular do namorado em seguida.

— Droga, ele não atende!

— O que tá acontecendo? — Alberto perguntou, vendo o desespero crescente na expressão do loiro.

— A mãe do Gus acabou de me ligar, ela perguntou sobre ele, porque ligaram para ela informando que o filho dela tinha sido internado em estado grave... Até de manhã estava tudo bem com ele, mas agora ele não está atendendo!

— Como você mesmo disse na ligação, pode ser trote.

— É claro que pode, mas ela mora longe daqui e eu tenho que ir ao hospital pra excluir essa possibilidade. — Concluiu, angustiado. — Me desculpa, Al, mas nosso almoço vai ter que ficar para outro dia.

— Nem se preocupa com isso. — Alberto afirmou. — Você precisa de uma carona, não precisa? Eu te levo lá, ela te disse o nome do hospital?

— Disse sim, mas eu não quero te atrapalhar, Al. — Respondeu. — Pode ir almoçar, eu pego um táxi.

— Para de graça, vamos logo, eu almoço depois.

— Certeza?

— Já estou com as chaves do carro no bolso, vamos logo.

Com pressa foram até o veículo, Lucas passou o nome do hospital que Karen havia informado e assim seguiram rapidamente para lá. A situação toda ainda era confusa e para ajudar, não importava o quanto o loiro insistisse em ligar, o namorado não atendia. Aquilo lhe deixava ainda mais preocupado, pois o Gustave não era o tipo de pessoa que desligava o celular no trabalho.

— Eu vou te esperar, caso essa situação toda seja só um engano, você volta e aí te levo de volta. — Estacionou o carro nas vagas disponíveis do hospital. — Quer que eu vá lá com você?

— Sim, por favor... Eu não tô com um pressentimento bom. — Lucas afirmou, sentindo o estômago embrulhar. — Estou começando a acreditar que realmente aconteceu alguma coisa com ele.

— Calma, não vai ser nada, você vai ver. 

— Assim eu espero.

Atravessaram todo o hall principal e chegaram à recepção do hospital, apesar de Lucas ter travado a poucos passos do balcão, recuperou-se, conseguindo aproximar-se das recepcionistas. Alberto acompanhou-o, enquanto ele passava as informações necessárias para que as funcionárias pudessem buscar pelo paciente informado.

— Gustave Edwards, certo? Sim, consta a entrada dele no hospital há um pouco mais de uma hora. Qual é o seu grau de parentesco com ele?

— Ele é meu namorado. — Respondeu, torcendo para que aquilo ajudasse.

— Bom, senhor, eu gostaria de poder ajudar mais. No entanto, você pode esperar e assim que a equipe médica tiver notícias, posso ver o que fazer.

— Moça, eu só preciso saber como ele está, a mãe dele já está a caminho, mas ela mora longe, vai demorar pra chegar... Eu sou a pessoa mais próxima dele nesse momento. — Implorou. — Por favor, eu preciso saber qualquer coisa, o que ele tem?

— Você pode me passar seu documento de identificação, por gentileza?

— Claro, claro.  — O loiro achou a carteira em um dos bolsos de sua calça, entregando o documento para ela.

— Senhor Fontaine, vou registrar seus dados na ficha do Senhor Edwards como cônjuge, por enquanto, tudo bem? — Ela deixou o documento sobre a mesa e digitou por um breve momento as informações ali contidas antes de devolver. — Aqui está, pode guardar... Bom, sendo breve, o que posso te adiantar, é que ele está no centro cirúrgico, mas realmente apenas a equipe médica pode informar sobre o estado dele, nesse caso eu realmente não posso fazer nada, você terá que aguardar por um tempo.

— Tudo bem, eu vou esperar. — Afirmou, derrotado.

Lucas afastou-se do balcão, indo para outro canto, enquanto Alberto o acompanhava, sentaram-se em dois lugares vagos em meio às poltronas disponíveis.

— Ei, eu sinto muito...

— Eu só queria poder saber o que é... — O loiro suspirou. — Agora tenho que avisar a Karen, que merda... Eu sei que ela também vai querer saber os detalhes e vai ser uma droga não saber o que dizer... Eu sei que quando o hospital não dá detalhes significa que a situação não está nada boa.

— Não fica pensando nisso não, a moça só estava seguindo os protocolos, relaxa. Ele vai ficar bem.

— Centro cirúrgico? Assim do nada?

— Sei lá, as vezes ele começou a passar mal e descobriu que a apêndice inflamou e precisou remover.

— Não acho que ele entraria em uma sala de cirurgia sem me ligar antes, provavelmente ele entrou inconsciente no hospital, deve ter acontecido algum acidente ou nem tão acidente assim... — Bufou. — Eu sabia que não ia acabar bem.

— Como assim, Lucas? Do que você tá falando? Para de ser negativo.

— Nada de bom pode sair dessa situação, Al, eu estou sentindo que isso é minha culpa... Eu tenho certeza que ele está machucado por minha causa, alguém deve ter feito alguma coisa com ele, só pode ser isso...

—  Ei, de onde você tirou tudo isso?

— Você sabe, Al, eu te disse sobre a minha briga do Marcus e o motivo dela, não se lembra? Eu ainda estou pagando pelo erro dele, ele me deixou tão fodido que você não faz ideia.

— Você está achando que pode ter sido um acerto de contas? Que estão usando o Gus pra te ameaçar?

— Não seria a primeira vez...

— Por que não me disse antes que estavam ameaçando vocês?

— É complicado.

— Eu sei que nesses momentos a gente só consegue em pensar em coisas negativas, mas tenta fazer o possível pra se manter calmo agora, a Karen precisa de você e como mãe, ela vai pirar ao saber que o filho está no centro cirúrgico, tenta não preocupar ela, senão a viagem dela pra cá será tortuosa.

— Você tem razão, Al... Eu só espero conseguir essa proeza. — Esfregou o rosto, bufando outra vez. — Eu não sei o que fazer, eu só precisava ver o Gus...

— Ei, Lucas... Me desculpa por isso, mas eu vou ter que te deixar sozinho, não posso demorar pra voltar, o meu horário já está acabando e esse trânsito não vai me deixar chegar tão cedo.

— Tudo bem, Al, você já fez muito em me trazer aqui. — Agradeceu.

— Se precisar de mim, você sabe que pode me chamar, eu venho assim que possível.

— Obrigado mesmo, mas por enquanto vou ficar aqui, espero que venham dar notícias logo.

— Me mantenha atualizado, está bem?

— Pode deixar... Agora tenho que pensar no que dizer antes de ligar pra mãe dele.

— Boa sorte. — Deu-lhe um tapinha no ombro, reforçando seu apoio antes de ir embora.

Lucas pegou-se pensativo durante tortuosos minutos, enquanto encarava o chão brilhoso do hospital, apenas torcendo para que lhe chamassem logo, precisava de notícias de seu Gus. Olhava para o relógio e as coisas ali não pareciam mudar, já estava sem esperanças de receber notícias naquele momento, quando pegou o celular para ligar para Karen.

— Alô?

— Oi, Karen, é o Lucas falando. — Iniciou. — Olha, eu estou aqui no hospital e infelizmente, o que te disseram é verdade, Gus está internado aqui...

— E ele está bem?

— Eu gostaria de saber, mas não me autorizaram a vê-lo por que não sou da família, então venha pra cá, assim que possível.

— Eu já estou na estrada desde que me ligaram, mesmo ainda sem saber o que pensar, eu só liguei para o meu motorista e entrei no carro. — Ela explicou. — Louis está trabalhando em outra cidade e fiquei de avisá-lo, então preciso ligar pra ele, porque até agora pouco eu estava torcendo para no final ser um trote estúpido e a viagem servir como um pretexto pra visitar o meu bebê.

— Eu também gostaria de te ver, seria bem melhor se fosse em uma situação mais alegre.

— Eu acho que vou chegar em um pouco menos de duas horas, mas se receber alguma notícia dele antes, por favor, não hesite em me ligar imediatamente.

— Pode deixar, estarei aqui na sala de espera do hospital, não vou sair daqui.

— Obrigada, meu querido, te vejo mais tarde então.

— Até mais tarde, Karen.

Lucas desligou a chamada e suspirou, tirando um peso de seu ombro, aliviando-se por ela aparentar estar preparada para lidar com aquela situação. Não a via desde sua adolescência e não seria a situação mais prazerosa encontrar com sua sogra depois de anos no hall de um hospital.

A sua lembrança mais viva de Karen era o sorriso extremamente gentil que ela sempre carregava, sendo a mãe dos sonhos de qualquer pessoa, lembrava-se das constantes conversas compreensivas que ela tinha com Gus, aceitando-o desde que ele havia se assumido e sendo o maior apoio dele.

O filho tinha herdado atributos do pai, mas a maioria deles eram cópias dos traços da mãe, como as covinhas e os olhos castanho-claros, como os cabelos. Ambos os pais tinham a pele clara, mas Louis, pai de Gustave, tinha os cabelos pretos e olhos verdes, também sendo mais alto que todos.

Lucas já estava cansado de esperar, mas o relógio parecia quebrado, a hora não parecia passar e sua ansiedade crescia a cada vez que via alguém de jaleco passar pelo corredor próximo a ele, continuando a torcida por notícias breves de Gus.

O loiro havia provado várias formas diferentes de se sentar na poltrona, já havia cruzado as pernas, descruzado, escorregado as costas até estar quase deitado, também havia ajeitado a postura e voltado a cruzar as pernas, com um dos pés sacudindo ansiosamente no ar.

Olhou no relógio mais uma vez, bufando e olhar ao redor, queria tomar uma água, mas o medo de sair dali e aparecer alguém para falar com ele era constante. Mesmo assim, estava com tanta sede que precisou procurar o refeitório.

Andando pelos corredores de pisos brilhosos e estupidamente brancos, chegou até onde procurava, sentindo um cheiro irresistível que fez com que se aproximasse rapidamente de uma máquina de cappuccino presente. Um expresso, mocha ou cappuccino? Ou os três? Primeiro, matou sua sede com um bebedouro próximo, em seguida pensando melhor em começar com um café para mandar seu tédio embora, em seguida pegando o maior copo de cappuccino disponível, levando-o de volta para a sala de espera.

Andou apressadamente na volta, como se algo muito importante estivesse esperando-o, pensando que poderia ter perdido alguma notícia importante de Gus. Mas ao chegar, certificou-se com a recepcionista do que precisava, decepcionando-se ao saber que ainda não tinham nenhuma informação.

Sentado ali enquanto tomava sua bebida quente, via as pessoas da sala de espera e começava analisá-las, parando para pensar no que cada uma estaria pensando e em qual situação estavam. Morria de inveja ao imaginar que nenhuma delas ali poderia estar com uma ansiedade tão avassaladora quanto a sua.

Queria poder gritar e fazer um escândalo para que o deixassem entrar na sala onde seu namorado estava, mas enquanto sua sanidade ainda estava no lugar de sempre, terminou seu cappuccino e continuou a analisar as pessoas ali.

O maior problema era que a maioria das pessoas chegavam, esperavam um pouco e iam embora após terem seus problemas resolvidos, queria trocar de lugar com qualquer uma que estava ali, queria poder ir para casa sabendo que estava tudo bem.

Nem um copo grande de cappuccino havia conseguido enganar a fome que agora começava a sentir. Mas não queria sair dali novamente, não queria parar para comer nada, apenas conseguia pensar que Gus dependia dele ali, que apenas estava aguardando para poder levá-lo para casa.

Recebeu uma mensagem de Karen e, pelo que entendeu, ela estava chegando dali poucos minutos. Ao ver aquilo, decidiu ir lavar o rosto e tirar o sono da cara, indo ao banheiro para se arrumar. E após aliviar o copo grande de cappuccino que havia tomado mais cedo, ajeitou-se para receber a sogra, apesar de estarem em um momento ruim, não poderia parecer arruinado.

Na volta para a sala de espera, confirmou mais uma vez com as recepcionistas se tinham alguma informação nova e ainda não havia nada, fazendo-o voltar para a mesma poltrona de antes. Naquela altura, já tinha vasculhado todas as revistas boas que estavam por ali e não restava muita coisa fazer, senão gastar a bateria do seu celular com um jogo de cobrinha.

Um tempo depois, os passos de uma mulher apressada e de salto alto roubaram a sua atenção, pois ela atravessava o hall em uma velocidade que só uma mãe desesperada e elegante poderia ter. Lucas reconheceu-a de longe e levantou-se, indo para a recepção, vendo que ela já havia se apresentado para as moças de lá.

Antes mesmo que tomasse iniciativa para algo, a sogra percebeu sua presença e o abraçou com força, sem precisar se preocupar se ela ainda lembrava-se de sua aparência. Ela cumprimentou-o rapidamente e em seguida voltou sua atenção ao balcão, onde o loiro ouvia o que a recepcionista tinha a dizer.

Quando ela insistiu em saber o que o filho tinha — pois nem mesmo Lucas sabia explicar direito — uma das recepcionistas pareceu receosa ao dizer do que era a cirurgia, foi então que os olhos do loiro se arregalaram, estavam fazendo a extração de um projétil.

Gus havia sido baleado.

Não obtiveram mais detalhes sobre o porquê de tanta demora no centro cirúrgico, isso apenas o cirurgião responsável poderia dizer. Assim tendo que esperarem por mais respostas.

— Eu tenho que avisar o Louis. — Karen caçou o celular dentro da bolsa, ligando e deixando uma mensagem na secretária eletrônica por ele não estar atendendo. — Eu preciso muito de um café, minha cabeça está doendo!

— Você quer sair pra comer alguma coisa? — Lucas ofereceu. — Eu estou sem almoçar.

— Seria bom, eu também não consegui comer nada hoje.

Ambos saíram juntos do hospital e foram caminhando para um restaurante próximo, onde chegaram e escolheram uma mesa para dois. Não demorando muito para receberem o cardápio.

— Obviamente vou querer um café. — Karen falou, olhando para os doces do menu enquanto o garçom esperava. — E eu vou começar pela sobremesa, se não se importa.

— Por mim tudo bem. — Lucas falou, abrindo um sorriso discreto. — Vou pedir um doce também e depois eu vejo se vou querer outra coisa. Acho que vou querer uma fatia de torta de maçã.

— E eu vou de panacota de framboesa. — Ela entregou o cardápio ao garçom.

— Uma panacota de framboesa, torta de maçã e um café, algo mais?

— Também vou querer um café, por favor. — O loiro pediu, também entregando o menu.

— É pra já. — O garçom anotou o pedido e se retirou.

— Já sei para quem o Gus puxou a mania de comer a sobremesa primeiro.

— É verdade, desde pequeno ele me imitava. — Ela assumiu a culpa, rindo baixinho. — E estou ansiosa para comer a panacota, mas tenho certeza de que não vai superar as que a sua mãe fazia.

— Eram boas mesmo. — Respondeu, não conseguindo disfarçar que a memória havia lhe entristecido.

— E como ela está?

— Minha mãe?

— Sim, tem muito tempo de que não falo com ela.

— Eu também. — Falou, desviando o olhar do dela, envergonhado. — Ela e meu pai me deserdaram, é isso. Eu saí de casa em dois mil e seis.

— Eu não sabia... — Ela arregalou os olhos. — Então tem seis anos que vocês não se falam?

— É isso mesmo.

— E você está bem?

— Com o tempo aprendi a ficar, passei por várias dificuldades, mas eu amadureci muito sozinho. — Sentiu a voz embargar levemente ao segurar a vontade de chorar.

— Gostaria de saber o que aconteceu, se não for incômodo pra você, claro.

— Ah, na época meu pai descobriu que eu e o Gus estávamos namorando escondido, ele enlouqueceu... Eu me afastei do Gus pra não causar nenhum mal a ele, nisso saí de casa porque eu não era mais bem-vindo lá. 

— E a sua mãe concordou com tudo isso?

— Eu até hoje penso nisso e não sei dizer, ela sempre teve medo do meu pai, ele sempre foi a "autoridade maior", ela nunca abriu a boca pra me defender e isso pra mim é concordar com as coisas que ele fez e falou pra mim. 

— É uma pena... Mas eu sempre tive essa impressão da Harriet, ela era uma boa amiga, mas pouco me falava de sua vida pessoal, muito menos sobre o casamento. — Karen raciocinou. 

— Eu e a minha mãe sempre fomos maltratados pelo meu pai, nunca entendi porque ela não largava ele.

— Bom... Se eu soubesse disso na época com certeza teria te adotado, sempre gostei de você. — Ela tomou a mão do loiro e acariciou-a por alguns segundos. — Sempre te considerei como um filho, fiquei muito triste na época que você e o Gus se afastaram quando eram novinhos, jamais imaginei que fosse por esse motivo, achei que era coisa de adolescente.

— Eu também queria que tudo fosse diferente, mas as coisas aconteceram como tiveram que acontecer.

Interromperam o assunto quando viram que o garçom se aproximava deles com a bandeja que carregava o que pediram. Depositando à mesa os dois cafés e as respectivas sobremesas.

— Não sabemos quando o Gus receberá alta, mas seria muito bom marcarmos algum jantar quando ele se recuperar, eu e o Louis e vocês dois.

— Eu gosto da ideia. — Lucas afirmou enquanto provava a torta. — E eu fico muito feliz que o Gus tenha pais tão incríveis como vocês, de verdade, eu queria saber o que é ter uma família compreensiva e amorosa.

— Agora você sabe, meu bem. — Ela sorriu gentilmente. — Nós somos sua família também.

O loiro sentiu-se um quentinho preencher seu coração, não tendo como sorrir e agradecer aquele carinho que Karen sentia por si, ficando muito feliz que finalmente teria o que tanto fazia falta, uma família.

Agora estar na sala de espera já não era tão ruim com a companhia de Karen lá, tiveram a oportunidade de se conhecerem melhor e contou de sua vida para ela, poupando-a do pesadelo que estava vivendo desde o começo das ameaças, mas falando sobre seu desejo de concluir a faculdade de jornalismo trancada.

Enquanto jogavam conversa fora para esperarem notícias de Gus, viram um doutor se aproximar ainda com a máscara abaixo do pescoço e a touca, de pijama cirúrgico, mas sem as luvas.

— Alguém está acompanhando Gustave Edwards?

Karen e Lucas deram um salto da poltrona, onde andaram com pressa até ele:

— Nós estamos.

— Queiram me seguir, por gentileza.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Esse capítulo deu muuuito trabalho pra ser revisado então espero que tenham gostado, de verdade, não esqueça de deixar seu comentário por aqui ♥