Stranger escrita por Okay


Capítulo 27
Pedido.


Notas iniciais do capítulo

Beijos & Boa leitura! ♕
Capítulo revisado e reescrito 17/04/2020



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Capítulo 27 — Pedido.

Caminharam ao escritório próximo a recepção, onde entraram e se acomodaram nas duas cadeiras em frente a mesa principal. 

— Eu sou o Dr. Brennan e acompanhei Gustave Edwards desde a entrada dele. 

— É um prazer, Dr. Brennan, eu sou Karen, a mãe do Gus e vim com o meu genro, o Lucas. — A mulher introduziu-os. 

— Bom... Gustave deu entrada hoje mais cedo, com intenso sangramento. Ele foi baleado duas vezes no peito. — Explicou o médico, seriamente.

— Como isso aconteceu? — A mãe se apressou.

— Não sabemos ao certo. — Relatou o homem. — Recebemos o chamado de emergência que um rapaz tinha sido atingido em frente ao banco.

Lucas sentiu o peito virar pedra. Gus não deveria ter ido ao banco naquele dia, tinha esquecido os documentos. Sua mente estava invadida por pensamentos assombrosos da razão de seu namorado estar naquele lugar, justamente quando ele disse para que não fosse, e mesmo assim, assumia a culpa, pois ele era o motivo de Gus estar procurando dinheiro nestes últimos dias.

— E como ele está? — A mãe perguntou inquieta, enquanto Lucas mal conseguia respirar, se sentindo cego pelas luzes extremamente brancas do escritório

— A primeira bala quase atingiu um pulmão e se alojou muito próxima ao coração. A extração dela foi arriscada, mas conseguimos retirar... Porém, a outra perfurou o fígado. Causou intenso sangramento na região. Nós conseguimos conter por um tempo, mas…

— Mas? — Karen indagou, aflita. 

— Infelizmente, o sangramento foi muito intenso. Gustave teve uma parada cardíaca. Fizemos de tudo para reanimá-lo, mas ele acabou não resistindo. Eu sinto muito.

— Eu preciso ver o meu filho... agora. — Karen exigiu. Estava petrificada e ao seu lado o genro já não tentava esconder sua fraqueza, vendo o queixo dele tremer, anunciando suas lágrimas que cairiam em breve.

— A equipe cirúrgica ainda está terminando de preparar o corpo do seu filho. — O médico pediu, notando que o tom da mulher beirava o desespero e que simplesmente negar o pedido não seria suficiente. — Seria imprudente que vocês o vissem no estado atual, por favor, preciso que tenham apenas um pouco mais de paciência.

— Paciência?! — A mulher que antes continha seus nervos elevou ainda mais a voz, com o doutor tendo um sobressalto. 

— Karen... — Lucas tocou-a no ombro, tentando acalmá-la, mas não conseguia acalmar a si mesmo. Parecia surreal que estivesse ouvindo que seu namorado, o homem que amava, que ele vira sorrir tão brilhantemente naquela mesma manhã, tinha falecido.

— É meu filho! Meu único... — Karen tentou continuar gritando, mas sua voz falhou com um soluço, dando o primeiro sinal de choro, demonstrando que sua ficha tinha caído e que o pior realmente tinha acontecido.

— Eu realmente sinto muito, aposto que ele era um ótimo rapaz.... E espero que as lembranças boas deem forças a vocês nesse momento tão difícil.  — Compadeceu-se, vendo que ambos não conseguiriam responder. — Podem esperar por aqui se preferirem, entre dez a quinze minutos eu pedirei para que uma enfermeira venha buscá-los para que possam se despedir. Vocês terão todo o tempo que precisam, mandem me chamar se precisarem de mim, estou à disposição.

Dr. Brennan deixou-os sozinhos para absorverem a informação tão pesada que havia sido lançada sobre eles. Lucas sentia seus olhos arderem a cada vez que esfregava seu pulso para enxugar suas lágrimas, respirando dificilmente em meios aos soluços.

O celular de Karen tocou pouco depois e assim que atendeu, descobriu que o marido já havia chegado na cidade e que estava a caminho do hospital. Ela não lhe disse por telefone o acontecido, embora ele insistisse em saber o porquê de ela estar chorando.  Ela parecia se recusar a assumir a tragédia em voz alta.

Lucas e Karen estavam em silêncio, segurando a mão um do outro em busca de consolo. Cada um pensava em iniciar uma frase, mas eram tomados por uma onda súbita de desespero onde o choro se intensificava e as palavras iam embora. 

Alguns longos e tortuosos minutos depois, uma enfermeira entrou na sala acompanhada de Louis, que correu para os braços da esposa. Como a grande maioria dos homens, ele dificilmente se sentia confortável em deixar as pessoas verem seu lado mais exposto, mas provavelmente aquele tipo de pensamento nem se passava pela sua cabeça, suas lágrimas eram inevitáveis. 

Lucas sentiu-se desconfortável com a situação, como se fosse um intruso em meio aquilo tudo. O peso em suas costas parecia aumentar a cada vez que pensava que tinha causado aquilo e não se sentia nada bem, precisava ir embora. 

A enfermeira convidou-os para se despedirem de Gustave, onde o loiro recuou, dizendo para irem, pois não teria coragem de vê-lo naquele momento. Karen o abraçou com força mais uma vez, sem conseguir dizer muita coisa, apenas enxugava as lágrimas, encarando-o como em um pedido silencioso de que precisava de coragem para enfrentar aquilo também. 

Lucas trocou um olhar breve com Louis, que entendeu como uma apresentação, já que não tinham se cumprimentado desde a chegada desesperada dele. Não havia o porquê de formalidades quando todos estavam desesperados e em prantos. 

Sentindo uma pontada de culpa por não conseguir prosseguir, se despediu dos dois e saiu do escritório. Olhando para trás enquanto caminhava pelo corredor, vendo-os caminhar solenemente atrás da enfermeira, amparados um no outro, percebendo assim que deixá-los irem sozinhos tinha sido a melhor decisão. 

Precisava conseguir continuar em pé, mas era difícil ter forças quando outra onda de choro parecia subir e ficar presa em sua garganta, só precisava que o doutor voltasse e lhe dissesse que tinham cometido um tremendo engano, queria que aquilo tudo pudesse ser desfeito, mais do que nunca precisava voltar no tempo. 

Esperava um táxi em frente ao hospital enquanto via várias mensagens de Alberto acumuladas, pedindo notícias de Gustave. Lucas não teria forças para respondê-lo, muito menos para atender as ligações do amigo.

Do táxi seguiu diretamente ao apartamento e durante o caminho olhava para as ruas e não conseguia sentir nada, sentia-se anestesiado. Quando chegou e passou pela portaria, entrou em casa com a mesma sensação de vazio. 

Não conseguia pensar em nada, também não conseguia processar o que tinha acontecido, como se não tivesse vivenciado nada de diferente naquele dia. Olhou para o relógio da cozinha imaginando quanto tempo Gustave levaria para chegar do trabalho, indo preparar um café. 

Ouvia o barulho da máquina e olhava para ela com a mente em um profundo abismo escuro, totalmente desligado de qualquer memória recente. Adoçou seu café com várias colheres de açúcar e aconchegou-se ao sofá, ainda esperando o namorado chegar do trabalho. 

Ligou a televisão e não pensou em deixar em algum canal específico, apenas assistiu o que passava. Viu o noticiário; uma reprise de uma série antiga; os comerciais; o noticiário da madrugada; mais comerciais e não soube quantas vezes nesse meio tempo havia feito café ou ido ao banheiro. 

Nem mesmo cochilou, o sono não vinha, apenas pensava em que horas Gustave chegaria. Assim levantou-se do sofá, caminhando ao quarto, pensando em ser prestativo, decidiu escolher a roupa que Gustave usaria para ir ao trabalho, abrindo uma cômoda e tirando dali as peças de roupa que mais gostava de vê-lo usando. 

Colocou as roupas sobre a cama e viu algo que lhe chamou atenção ao fundo da gaveta, era uma pequena caixinha escondida. Mesmo sabendo que não era certo mexer em coisas que não eram suas, decidiu dar uma espiadinha, pegando-a. Sentou-se na beirada do colchão e mesmo com a luz apagada, a claridade do sol que começava a invadir o quarto já era o suficiente para ele enxergar o que tinha ali. 

Dentro da caixinha aveludada reluziam dois pares de um lindo conjunto de alianças prateadas, trabalhadas com delicados brilhantes. E não precisou analisar muito para descobrir que uma delas era sua. Não queria ser esperançoso demais, mas era incrível como ela se encaixava tão perfeitamente em seu dedo. Decidindo mantê-la. 

E quando estava prestes a fechar a gaveta da cômoda que estava aberta, ao fundo dela pôde ver um envelope, onde pegando-o viu que estava endereçado com seu nome. Não sabia se Gustave estava planejando uma surpresa ou se propositalmente havia colocado aquelas coisas ali para que ele encontrasse. 

Mesmo assim abriu o envelope e leu seu conteúdo, o seu amado provavelmente não ficaria chateado que teria encontrado antes do planejado, afinal, a resposta da carta claramente seria afirmativa. Jogou-se na cama de alegria, rolando de um lado para o outro, parando apenas para encarar sua aliança e em como ela ficava linda em seu dedo.

Apoiou sua cabeça ao travesseiro, sem deixar de encarar sua mão com o anel reluzindo, mal percebendo o momento em que finalmente pegou no sono. O loiro estava a madrugada toda sem dormir e não conseguiu dormir por muito tempo, pois uma hora depois, ao dar oito horas da manhã, sua campainha tocou, assustando-o.

Lucas estava com o coração disparado, jurando que Gustave havia voltado e que estava sem as chaves. Correu para a entrada e abriu a porta com pressa, sendo contrariado ao encontrar com Alberto. 

— Lucas! — Abraçou o amigo abruptamente, assustando-o mais. 

— Oi, Al, entra… — Falou, com ele entrando em seguida no apartamento. — Você quer um café? 

— Não, não quero… Vim para saber como você está. 

— Eu estou bem. — O loiro sorriu, caminhando até a cozinha, ligando a cafeteira. — Eu tenho uma novidade! 

— Ah, é? — Alberto fez uma careta, vendo as olheiras profundas dele e estranhando aquele comportamento estranhamente otimista diante da tragédia.

— Eu e o Gus estamos noivos! Olha! — Aproximou-se do amigo, mostrando-lhe a aliança. — Eu não sei quando a gente vai casar, mas quando acontecer eu quero que você seja o nosso padrinho! 

— Lucas… — Alberto quis chamar-lhe a atenção. 

— E o Gus tá trabalhando, mas quando ele chegar a gente vai escolher uma data, eu só espero que não seja agora no final do ano porque faz muito frio e eu não tenho vontade de me casar no frio…

— Lucas! — Precisou gritar para que o loiro olhasse para si. — Vocês não vão escolher uma data. 

— Tá, eu sei que é cedo, mas....

— Não, não é isso que quis dizer. — Encarou-o, vendo-o parecer fora de si. — Isso não vai acontecer porque o Gus não vai voltar. 

— Ele só foi trabalhar… 

— Ei, Lucas, olha pra mim! — Aproximou-se mais dele e pegou-o pelos braços. — O Gus não vai voltar.

— Às vezes ele atrasa, mas ele sempre chega às cinco da tarde do trabalho. 

— Lucas, me escuta, ele não vai voltar. 

— Como assim, Al? Não tô te entendendo. — O loiro indagou, parecendo cair em si, com lágrimas formando no canto de seus olhos. — Ele vai voltar, sim… Ele tem que voltar.

— Ele não vai, Lu. 

— Não vai? — Choramingou, encarando o amigo nos olhos. 

— Me desculpa, mas não… — Acariciou os ombros do amigo, subindo as mãos para as bochechas dele, enxugando as primeiras lágrimas que surgiam. 

— Mas a gente tá noivo. — Fungou, ainda com as mãos do amigo sobre seu rosto. — A gente vai casar.

— Eu sei, eu sei. — Não aguentou vê-lo chorando, trazendo-o para outro abraço apertado, massageando suas costas com carinho. — E saiba que eu adoraria ser o padrinho de vocês, mas isso não vai acontecer… Eu sinto muito, muito mesmo. 

Em seguida dois soluços fortes vieram, que se transformaram em soluços mais frequentes, no momento seguinte Alberto afastava-se do abraço para analisar a respiração desgovernada do amigo, percebendo que suas fungadas tornavam-se cada vez mais curtas, sendo acompanhadas por uma tosse violenta. 

Instantaneamente lembrou-se do dia que Marcus havia lhe contado que o loiro tinha asma. De imediato perguntou onde ele guardava o broncodilatador, vendo-o apontar para um armário da cozinha com uma mão, e com a outra cobrir sua boca pela tosse incontrolável. 

Alberto procurava pela bombinha, assustado com os chiados da respiração dele, jamais havia presenciado alguém sem ar daquela maneira, com ruídos tão horríveis que o deixava cada vez mais desesperado para encontrar o remédio logo. 

Quando encontrou, entregou com as mãos trêmulas ao amigo, que pegou e agitou o inalador, segurando-o na posição correta, soltando todo o ar que conseguiu antes de inclinar a cabeça enquanto inspirava o medicamento. Alberto percebeu que ele parecia segurar a respiração e pouco depois repetiu todo o processo mais uma vez. 

Lucas foi melhorando gradualmente e assim que percebeu que estava melhor, foi escovar os dentes, tanto para tirar o resíduo do remédio da boca, como também para melhorar seu hálito, pois há muito tempo não escovava os dentes.

— Você tá melhor? — Alberto indagou, após segui-lo até o banheiro.

— Depende do que você quer dizer com melhor. — Respondeu, enxugando o rosto. 

— Eu nunca tinha visto alguém ter uma crise de asma na minha frente, eu fiquei com medo de acontecer alguma coisa com você. 

— Eu percebi que as minhas são desencadeadas pelo emocional. — Lucas explicou, encostando-se na parede do banheiro, suspirando. — Então pode aguardar mais crises. 

— Você tá com olheiras profundas, você dormiu direito essa noite?

— Na verdade eu estava cochilando quando você chegou, mas sinceramente eu não dormi muito, não. 

— E você tá com a mesma roupa de ontem, também não deve ter ido tomar banho e presumo que também não jantou. 

— Eu não consegui fazer nada, Al. — Assumiu, sem conseguir encarar o amigo. 

— Acho que em momentos assim o mais importante é realizar uma coisa de cada vez… Você deveria ir tomar um banho, eu te espero, posso pedir alguma coisa pra gente comer nesse meio tempo. 

— Alberto… — Chamou o amigo, agora encarando-o. — Como você soube?

— No momento em que você não me respondeu e não me atendeu mais eu achei que você tinha precisado passar a noite no hospital pra fazer companhia pro Gus, então hoje de manhã fui pra lá pra te procurar… As recepcionistas me informaram e aí eu vim correndo ver como você estava. — Resumiu. — Ainda bem que os porteiros já estão cansados da minha cara por aqui, nem precisaram da sua confirmação pra me deixar subir. 

— Obrigado por se preocupar comigo. — Agradeceu com um sorriso triste. 

— Eu sinto muito… — Aproximou-se do loiro, abraçando-o. — Eu posso imaginar a dor que você está sentindo agora.

— O que eu vou fazer? — Perguntou pouco depois começando a soluçar, ainda dentro do abraço. — Eu não… não sei como vou fazer… eu não quero viver sem ele. 

Alberto afagou as costas dele, sem soltá-lo do abraço, deixando-o chorar enquanto ele precisasse. Apenas livrando-o de seus braços quando percebeu que ele estava um pouco mais calmo, dizendo:

— O que você pode fazer agora é tomar um banho, depois você pensa no resto. Eu vou te esperar na cozinha, tá bom? Se precisar de mim é só me gritar. 

Lucas acenou positivamente com a cabeça, vendo-o deixar o banheiro. Demorou alguns minutos para finalmente decidir tirar suas roupas, entrando debaixo do chuveiro, sentindo a água escorrer por seu rosto e corpo, como se fosse uma extensão de suas lágrimas. 

Agora seus cabelos já estavam encharcados, sua pele enrugada e avermelhada pela sensibilidade da água quente, mas mesmo depois de longos minutos, não tinha se lavado. Só conseguia olhar para o nada, sentindo uma dor tão intensa no peito que gostaria de arrancar seu coração com qualquer objeto pontiagudo que encontrasse.

A cada vez que pensava em todos os momentos que perderia com Gus seu ar faltava, arfava em meio ao choro pensando que nunca mais sentiria os braços dele, nem os beijos, muito menos tomariam banho juntos como gostavam de fazer, ele era sua alegria, seu sopro de felicidade de todos os dias, não saberia como prosseguir vivendo se seu amor já não vivia mais. 

A dor de perdê-lo conseguia ser menor do que a culpa que sentia, porque sabia que era o causador de todo aquele mal. Uma mãe, um pai, uma família inteira havia perdido aquele brilhante e lindo jovem por conta de sua incapacidade de controlar seus sentimentos. Mesmo depois de tanto tempo ainda não havia aprendido a deixar de confiar em pessoas que não mereciam. 

Gustave só trouxe o bem e o amor, não merecia nada daquilo, ele mesmo havia perdoado sua terrível traição que resultou em sua morte. Para Lucas, era como se tivesse cometido o pior dos crimes, era como se ele mesmo houvesse apunhalado Gustave pelas costas, já não bastava ter antes o traído, agora havia lhe tirado a vida também.

Lucas olhava para sua aliança debaixo da água corrente e seu peito apertava, trazendo mais um choro exasperado à tona, onde agora apenas soluçava e gemia de dor, sem mais lágrimas conseguindo derramar. 

♚ 

Quase uma hora tinha se passado desde que Lucas havia entrado no banho, Alberto sabia o quanto ele estava sofrendo e lhe daria um pouco mais de tempo para absorver aquela situação, deixaria-o lá para chorar o quanto fosse necessário. 

Apenas lembrava-se do quanto sofreu com a morte de seu melhor amigo, Marcus tinha lhe deixado um buraco no coração que não conseguia suprir e ainda doía pensar nele. Era como estar vendo seu reflexo, pois se via nos sentimentos de Lucas, não desejando que ele também passasse por isso. 

Pouco depois percebeu que a porta do banheiro foi aberta e gritou de que a comida que tinha pedido havia chegado. O amigo respondeu dizendo que logo iria, pedindo um tempo para se trocar. 

O loiro em seu quarto teve que olhar para as roupas de Gustave no caminho, com a dor não dando trégua. Para não chorar, trocou-se para sair daquele quarto o mais rápido possível, colocando um conjunto de moletom confortável e não penteando os cabelos.

Foi à cozinha, com sua barriga reclamando ao sentir o cheiro da comida, lembrando-se que não comia desde a tarde do dia anterior. 

— Tá se sentindo melhor? Nem que só um pouquinho? — Alberto perguntou, servindo um prato para ele.

— Eu não sei te dizer o que eu estou sentindo, Al. — Lucas respondeu. — Mas estou um pouco aliviado por ter tomado banho, eu estava mesmo precisando. 

— Aqui, toma. — Colocou o prato sobre a mesa de jantar. — Fiz seu prato. 

— Eu não sei se eu vou conseguir comer tudo. — O loiro falou, juntando-se à mesa.

— Tenta. — Alberto sentou-se com ele, com seu prato já feito ao lado. — Eu experimentei e te garanto que tá uma delícia. 

— Obrigado mais uma vez. — Falou, fazendo uma pausa antes de dar a primeira garfada.

— Eu estou aqui pra você, pode contar comigo pra qualquer coisa. 

— Ei, Al… Não querendo parecer ingrato nem nada, mas você não tá atrasado para ir à livraria? — Perguntou, com a boca cheia. — Eu posso ter faltado, mas sinceramente eu não ligo de ser demitido agora, mas eu não quero ser o culpado por fazer você ser demitido também. 

— Relaxa, não vai acontecer nada, eu já deixei tudo avisado por lá, tá tudo bem, eles sabem o que aconteceu.

— Ah, então menos mal. — Abriu um curto sorriso.

Assim que acabaram de comer, Alberto recolheu as louças e colocou na lavadora, enquanto Lucas se afastava para atender um telefonema. 

— Alô? Karen?

— Oi querido, como você está?

— Se eu falar que já estou sabendo lidar, estou mentindo. — Respondeu. — E você?

— Nesse momento estou sobrevivendo a base de sedativos e álcool... — Fez uma pausa para suspirar. — Estou lidando com coisas que eu não gostaria e isso envolve o embalsamento do corpo do meu filho e um funeral, Louis está me ajudando muito porque sinceramente, eu não conseguiria fazer tudo sozinha.

— Eu também tenho estado a beira da loucura. Sabe? Eu passei a noite em claro esperando o Gus voltar do trabalho e hoje mesmo eu juro que vi ele indo trabalhar. Não sei quando vai deixar de parecer que é apenas um pesadelo.

— A minha vida também está parecendo um filme de terror, só tive pesadelos ontem… Eu nunca achei que fosse passar por isso, Lucas... ver meu filho partir antes de mim. — Sua voz estremeceu e ela necessitou de mais uma pausa antes de continuar. — Eu não consigo entender porque essas coisas acontecem com a gente. Meu filho nunca fez mal a ninguém e de repente... Eu não consigo suportar isso.

O loiro continuou em silêncio, enquanto dava o primeiro soluço que anunciava que estava prestes a chorar novamente, ouvindo Karen continuar a dizer:

— Enfim, eu te liguei porque eu quero que você venha até Elmira no sábado. Estarei fazendo o velório e eu sei que ele gostaria de você aqui, assim como eu preciso de você.

— Eu vou… — Respondeu, com a respiração pesada. — Depois você me passa o horário e o endereço. 

— Daqui a pouco te mando por mensagem, tá bom? E se precisar de uma ajuda para a viagem, não hesite em me procurar.

— Tudo bem, obrigado. 

Lucas desligou a chamada e assim não teve mais que conter as lágrimas, aquele pesadelo só parecia pior e sentia que seu coração não aguentaria tanta dor por muito mais tempo. 

Alberto aproximou-se da sala onde ele se encontrava, caminhando de mansinho até Lucas. 

— Era a Karen? 

— Uhum. — Enxugou as lágrimas com seu pulso. — Ela me chamou pra ir até Elmira.

— Elmira? É a sua cidade natal, né? 

— É, o velório vai ser no sábado, ela decidiu embalsamar o Gus. — Explicou, sentindo outra ponta de angústia. 

— Se você quiser ir, eu posso te levar. 

— Querer eu não queria. — Queixou-se, enquanto se esforçava para respirar normalmente. — Mas eu não vi ele ontem, eu não tive coragem… então, eu acho que… agora eu devo ir, eu tenho que me despedir dele. 

— Sim, vai ser doloroso, mas é preciso. — Incentivou-o. — Eu vou com você, tá?

Lucas envolveu o amigo com seus braços repentinamente, fungando e molhando os ombros dele enquanto Alberto retribuía o gesto, monitorando a respiração dele, com medo de que ele tivesse outra crise asmática. 

— Eu quero te falar uma coisa, Lu.

— Fala. — O loiro pediu, controlando o choro. 

— O que você acha de ir dormir uns dias lá em casa? — Indagou. — Eu vou entender se você quiser ir para outro lugar, mas ficar aqui não vai ser bom para você. 

— Eu não faço ideia do que fazer, eu com certeza não vou poder continuar aqui, mas também não sei o que fazer em relação as coisas dele… Eu não queria ter que lidar com isso, eu só queria explodir e evaporar. 

— Você não precisa lidar com isso, pelo menos, não agora, nesse momento tudo o que você precisa é descansar e cuidar do seu psicológico. E aqui eu acho que você não vai conseguir. 

— Eu concordo, Al...

— Eu posso te ajudar a pegar as suas coisas daqui e levar para onde você quiser ficar, mas eu não tenho ninguém para me fazer companhia.  — Sorriu carinhosamente. 

— Se não for te incomodar, tudo bem. — Lucas aceitou, recebendo outro abraço do amigo. 

— Quando você quiser a gente vai. 

Lucas não conseguia deixar de agradecer Alberto a cada gesto de bondade, era muita sorte ainda ter alguém como ele para se apoiar, principalmente quando sentia que não tinha mais chão. 

O loiro conversou com o amigo quando recebeu a mensagem de Karen, passando as informações sobre a viagem, como distância, clima da cidade, o necessário para saber se ele realmente iria querer levá-lo até lá. 

Depois de acertarem os detalhes, Lucas pensou que havia chegado a hora de se despedir do apartamento de Gus, pelo menos por aquela semana tentaria dar um intervalo para o seu coração, pois a cada segundo que ficava ali sentia a presença do namorado, era como se uma parte de si ainda acreditasse que ele chegaria.

Pegou umas malas que encontrou no quarto e colocou-as sobre a cama, não deixando de notar ali a carta que antes havia ficado tão feliz em encontrar. Sentou-se sobre o colchão e respirou fundo para preparar-se, tomando coragem para ler novamente.

“Olá... Eu não quis começar essa carta com "Querido Lucas", pareceria muito formal para o que eu quero te dizer, e eu quero dizer da maneira mais informal possível, então, presta bem atenção:

Eu quero acordar todos os dias do teu lado, trazer o teu café da manhã e rir de você querendo evitar meus beijos por causa do hálito. Mas não quero fazer isso como nós já fazemos. Quero fazer isso sabendo que estamos ligados pra sempre, que você é meu marido e eu sou o seu. 

Quero saber que nós somos quem escolhemos para passar o resto das nossas vidas sem nunca soltar nossas mãos. Não sei se você está pronto para isso... Mas agora, abaixa a carta, por favor, tenho um pedido pra te fazer.

Gustave.”

Abaixou a carta, mas o seu Gus não estava ali. 

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Queria fazer um agradecimento muito especial ao Caví (Doctor Aquarius no nyah), que me ajudou MUITO nesse capítulo! ♥