Desejos escrita por Vivian Sweet


Capítulo 21
Capítulo 21 - Bailes de Boas-Vindas


Notas iniciais do capítulo

Um baile, ou melhor 2 bailes estão vindo por aí.



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Durante a abertura dos Jogos de RPG, no vilarejo de Wish, Nicolas mal conseguia andar. Estava esgotado. Ele lembrou vagamente da caixa que levou pro quarto, e por consequência, lembrou-se também da encomenda que estava esperando Klaus enviar: a arma. Resolveu dar uma escapadinha até o Correio da cidade. Como não conhecia o lugar, tentou descobrir com alguns moradores. Falava um pouco de inglês e conseguiu descobrir onde ficava. Andando entre as casas da Vila teve a impressão de ver alguém parecido com seu padrasto. O sangue ferveu na mesma hora, espantando qualquer cansaço da sua mente. Esqueceu que ia ao Correio e entrou pelos becos. O homem percebeu que estava sendo seguido e desapareceu entre as casas. Nicolas voltou, mas não notou que dessa vez era o homem que passou a segui-lo. Nicolas procurou novamente o prédio dos Correios. Havia um homem com ar de entediado no balcão.

— Com licença, Senhor. Estou procurando uma encomenda, queria saber se já chegou.

— Encomenda? Em nome de quem?

— Sou Nicolas Albuquerque de Almeida. Espero uma encomenda do Brasil. Estou hospedado no Hotel Castellamare.

Ao mencionar o hotel o homem arregalou os olhos e passou a olhá-lo estranhamente.

— No Black House? Quer dizer, no Hotel é... bom, os carteiros não vão lá!

— Sério? Então, como faço? A correspondência vem pra cá?

O homem abriu um caderno de anotações e conferiu alguma informação.

— Bom. Estou vendo que essa encomenda tinha um alto valor declarado, nesse caso, nós enviamos um dos carteiros, quer dizer, o único que topou ir. – fez uma pausa depois acrescentou: — Inclusive o carteiro não voltou e faltou hoje. Mas a encomenda ele levou.

— Estranho, eu não recebi nada. – lembrou-se vagamente da caixa, das aranhas... mas não conseguia ligar uma coisa com a outra. — Como faço agora? E por que os carteiros não vão até lá?

— Bom, é... – o atendente olhou pra fora. Do outro lado da rua tinha um homem parado olhando com uma cara medonha. Nicolas só percebeu que o cara começou a gaguejar e ficou nervoso. — é... eu tenho que fechar a loja. Tá na hora do almoço. Qualquer coisa volte aqui.

O atendente saiu e esperou Nicolas do lado de fora. Fechou a loja e sumiu por entre as ruelas.

Nicolas nem reparou no homem, que há essa hora já tinha saído de lá também.

Por que será que não me entregaram?” – ficou intrigado. Teria que conferir isso quando voltasse.

...........................

As duas amigas decidiram ir atrás de alguma informação sobre o cacheado misterioso. Saíram até a frente do hotel. Julie se lembrou de que mais cedo viu Daniel caminhando pela propriedade. Ele tinha ido resolver os últimos detalhes do baile que haveria à noite. Ninguém sabia informar onde ele estava. Então as duas decidiram dar uma volta pra ver se o encontravam.

Era próximo ao meio-dia. Exatamente na hora que os hóspedes voltariam do Festival de RPG, entre eles Nicolas. Julie olhou pra Bia com ar de desânimo. Tinham andado bastante e nem vestígio do rapaz. De repente ouviram ao longe o barulho da ponte baixando. Sabiam que era o fim da busca. Iam entrar, mas avistaram Daniel voltando do lado oposto de onde estavam. Julie sentiu-se eufórica ao vê-lo, seu coração disparou. Ele também a avistou e seus olhos não desviaram mais dela. Mas ele estava muito longe e vinha caminhando, enquanto os amigos e o noivo chegavam nas carruagens. Não daria mais tempo de se falarem.

Infeliz ou felizmente os hóspedes chegaram rápido do festival. O estado deles era lastimável. Estavam imundos! Principalmente Nicolas, que vinha caminhando em sua direção parecendo um mendigo. Todo suado e com o cabelo molhado. De longe já dava pra sentir seu cheiro horrível, afinal ele já tinha saído de lá sujo.

— Meu amor! Que bom te ver! Nossa! Você está linda!

Julie faz cara de nojo, tentou se esquivar, mas ele, sem noção, a abraçou e beijou. Ela deu logo um empurrão e se limpou.

— Ficou louco, Nicolas? – estava irritadíssima. — Olha só o seu estado!

— Pensei que estivesse aqui me esperando.

Ela não respondeu. Mudou de assunto. — Eu vou ter que subir e me trocar! Você precisa de um banho! E só me procure quando for pra conversarmos sério!

A cabeça dele até doeu ao imaginar esse abacaxi. Conversar a sério com aquela ressaca, fome e imundície era a última coisa que ele queria.

— Você é muito estranha! – ele se virou e foi para o hotel, sem esperá-la.

Ela ficou indignada. — Olha só! Eu que sou estranha! Meu Deus dê-me paciência.

Olhou em volta e viu que Daniel já não estava mais ali. Suspirou fundo, decepcionada.

Nicolas foi pro quarto e tomou um banho. Estava tão cansado que se jogou na cama e dormiu sem almoçar mesmo.

Julie também subiu e trocou sua roupa toda. A trança ficou espetacular. Não podia estragar aquela obra-prima. Passou no quarto de Bia para irem almoçar. Bia saiu do quarto mostrando um livro pra Julie.

— Amiga, por acaso esse livro é seu? Tava lá no meu quarto.

— Não Bia! Nem peguei em livro hoje.

— Estranho. Estava procurando meu diário de bordo e não achei. Só esse livro que não é meu.

— Deve ser legal. “Crime e Castigo”

— Ah! Eu não gosto de livros assim. Vou devolver lá na portaria. Deve ter algum funcionário fazendo confusão.

Talita foi com má vontade ao salão do hotel, onde poderia escolher uma roupa para o baile. Ela estava certa de que nenhuma roupa seria melhor do que alguma das suas. Quem estava cuidando do salão era Martin. Era sua vez de ficar lá.

Ela já entrou lá se achando. Tinha certeza de que o loiro babava por ela. De certa forma não estava tão errada, pois o loiro babava por todas as garotas que passavam em sua reta. Mas dessa vez ela se enganou em dobro, primeiro porque as roupas eram incríveis. A outra era porque Martin já estava enrolado com duas hóspedes, não tinha dormido e sabia que não teria chances com a loira esnobe, então não estava parecendo interessado. Ela ficou invocada com isso, como se fosse um absurdo ele não dar em cima dela. “Eu sou dessas que se sair de casa, passar em frente a uma obra e ninguém mexer comigo, volto em casa e troco tudo.” Era uma de suas filosofias. Começou a puxar assunto, jogou o cabelo pra um lado, depois para o outro, encarou e nada. Havia alguma coisa estranha ali. Porque ele não fazia nada? Os dois eram dois convencidos. Os dois se achavam irresistíveis e não admitiam serem ignorados.

Mas Martin se sentia intimidado. Tinha medo da loira fazer um escândalo e reclamar dele. Se bem que começou a perceber que não era bem isso que ela parecia estar pensando.

— Você vai em qual baile? – perguntou pra ela.

— Olha tenho até medo! O baile do Salão dos Ossos! Oh! Que tragédia! Acho que vai ser mais uma furada!

Ele desconversou, fazendo cara de paisagem.

— Acho que esse vestido vermelho ficaria encantador em você.

Talita sorriu ao ouvir o elogio. Um elogio difícil era sempre melhor, na sua opinião. E se ligou que Martin era a melhor pessoa pra informar sobre esse baile.

— Hum. Como é esse baile?

— Ah! É bem... diferente.

— Esse vestido é um luxo! Posso experimentar?

— Claro! – seus olhos brilharam. — Vai ficar perfeito em você!

— É, eu sei!

— Uma loira de vermelho é sempre um perigo.

— Hum... E eu adoro brincar com fogo! – ela diz sem maiores intenções.

— Pode se vestir, eu vou sair.

— Não! Não preciso experimenta-lo! Eu sei que vou ficar linda nele! Mas, fale mais sobre esse baile de hoje.

— É assim. São dois bailes. Um é no Salão dos Ossos. O outro é surpresa... Eu daria tudo pra estar nesse baile surpresa!

— Ah! Surpresa é... – não se lembrava de ter visto essa opção no formulário. — E como é esse baile surpresa hein? O que tem de tão bom nele?

— É surpresa, ora! – disse com a maior cara lavada.

— Ha! Muuuuito engraçado! – ela disse debochada. — Pensando melhor, acho que vou experimentar essa roupa sim. Vire-se!

— Não, imagina, eu saio.

— Não, só se vire. – ela já foi tirando a roupa. Martin virou num salto.

Ela colocou o vestido, que era fechado atrás.

— Me ajude com esse fecho! – falou com ele.

O coitado estava quase tendo um treco. Quando viu a loira de costas com a nuca à mostra e o vestido aberto esperando ele fechar, foi ficando nervoso.

— Tá... Eu já to fechando! – disse meio embaraçado.

Talita se virou pra ele subitamente, ficando cara a cara com ele. — Então, o baile surpresa é como mesmo?

— Ah! Eu... – foi beijado antes de acabar a frase. A loira deu-lhe um beijaço, segurando sua nuca e movendo seus lábios, sendo logo retribuída.

Os dois se afastaram do beijo pegando fogo. Até se abanavam.

— Nossa! Você é demais! – diz Martin já tentando avançar o sinal de novo.

— Opa! Nã-nã-não! Você está sendo muito malvado, nem quer me contar nada sobre o baile.

— Pra você eu conto tudo, princesa!

Martin só deu um puxão e foi com ela pra trás das cortinas, onde deram uns agarros.

Uns 20 minutos depois Talita acabou de “escolher” a roupa, deixando pra trás um pobre loiro apaixonado. Saiu de lá com menos informação do que queria, mas pelo menos sabia que o baile surpresa seria num barco no lago. E que Juliana estaria lá. O que significava que ela e Nicolas não estariam na mesma festa. Subiu sorridente em direção ao seu quarto.

Acabou se encontrando com Bia e Julie, que vinham em direção contrária.

— Uau! Que vestido mais maravilhoso! – Julie ficou deslumbrada com o pouco que viu.

— Uau! Vermelho escarlate! Quem você vai atacar essa noite? – Bia perguntou pra Tatá.

— Vocês vão morrer sem eu responder essa! – Talita saiu curtindo com a cara das duas.

— Mas vamos ficar sabendo de qualquer jeito! – Julie falou com ela.

Talita seguiu pro pelo corredor, mas ao passar pela porta do quarto de Mano ele saiu do nada e esbarrou nela, que deixou cair seu iPhone.

— Ah! Seu retardado! Pega meu iPhone que você derrubou! Anda logo!

— Pega você, mal educada!

— Foi você que derrubou! – ela se estressa. — Pega logo!

— Ah é? Quer que eu pegue? – ele mirou e chutou o iPhone pra baixo de um móvel que ficava no corredor. — Pega você! – deu as costas e foi almoçar.

— Seu idiota! Se estragar vai ter que me dar outro! – Talita fica com muita raiva. Ela se achava sempre certa. Pegou o iPhone muito contrariada. — Isso não vai ficar assim! – resmungava.

Após o almoço, Julie e Bia foram também olhar os vestidos que o hotel ofereceu de cortesia. Se até Talita gostou, com certeza devia ter coisas lindas. O Hotel ficava com diversos pertences de hóspedes que saíam de lá desesperados. Como milionários e roupas de griffe sempre andam juntos, eles ficaram com uma coleção de roupas e acessórios incríveis. Por fim montaram essa boutique dentro do próprio hotel. Ninguém jamais voltou para reivindicar as coisas esquecidas lá. Bia e Julie se perderam no meio de tantas coisas lindas.

As duas deixaram o livro na recepção e voltaram para o salão de beleza para fazerem a maquiagem. Débora já não estava mais lá. Ela tinha ido se arrumar, pois seria a grande anfitriã do baile no Salão dos Ossos. Quase todos os brasileiros iriam, exceto Bia e Julie, que escolheram a festa surpresa. Débora tinha escolhido vestido preto e vermelho, bem vampiresco. Ela usava unhas pintadas de vinho e um anel de pedra vermelha. Ficou exuberante e misteriosa. Pra completar passou um batom berinjela e prendeu seu cabelo em cima, deixando a parte de trás solta. Estava pronta, vestida para matar!

O chá das cinco foi servido no quarto para facilitar os hóspedes que já estavam se arrumando. O programa começaria às 19 horas. Então logo após o chá eles já começariam a se arrumar, aproveitando o resto da luz do dia.

Julie estava sozinha no quarto. Esticou o vestido e ficou olhando pra ele. Estava se sentindo vazia e sozinha. Nicolas já não parecia mais o mesmo. Ele parecia distante e indiferente. Por que ele a levou pra esse lugar e a deixou de lado? Tinha pensado em como seria essa viagem, mas nunca imaginou que seria assim.

— É... o preto vai combinar com a minha vida hoje.

Bia escolheu um vestido prata, que a deixava ainda mais pálida.

Enquanto as duas se aprontavam, Talita vestia sua roupa perto de Nicolas. Ela tinha feito babyliss pra dar volume aos cabelos.

Nicolas ainda não tinha acordado. Como já estava ficando tarde, Talita resolveu chamá-lo.

— Nicolas! Acorda! Vai! Chega de dormir!

— Huh... Que horas são?

— Tá na hora de sair daí, tomar um banho e colocar sua roupa de festa! – ela se admira no espelho. — Olha só esse meu vestido! Você tem que comprar ele pra mim! Foi usado num filme que ganhou Oscar! Deve ser uma fortuna! – sonha acordada.

— Eu não vou à festa nenhuma. Vou dormir. – Nicolas responde, ignorando o resto.

— De maneira alguma! Eu já estou arrumada!

— Você pode ir com a Julie e a Bia.

— Elas não vão pro mesmo baile. Se quer mesmo saber, não vai ser difícil arrumar uma companhia nesse baile.

Depois dessas duas revelações, Nicolas levanta a cabeça da cama. Olhou pra irmã que estava escandalosamente sexy.

— Onde você acha que vai assim?

— Mas eu acabei de falar! Vou pro baile de boas-vindas. Vou me acabar!

— Sozinha você não vai! E cadê a Julie?

— Não sei! Deve estar se arrumando. Acho que ela nem quer te ver!

— Como assim? Claro que quer! E você não vai sozinha. Fica aqui e me espera, vou tomar banho e me arrumar.

Talita sorri por dentro. “Nicolas, você é tão tonto.”

Nicolas colocou sua roupa de gala. Ficou lindo, cheiroso e elegante. Pra Talita a única coisa que o fazia imperfeito era a enorme aliança que ele usava.

— Deixa essa aliança no quarto! Ela é muito cara! Pode sumir.

— Que ideia hein! Estou muito bem com essa aliança. E ela só sai daqui quando eu casar com a Julie.

— Vamos! Você é um tonto! – Talita emburrou e saiu na frente.

Nicolas, ao invés de ir atrás dela, foi direto ao quarto de Julie e bateu na porta.

— Quem é? – ela perguntou.

— Sou eu, amor. Abre aqui.

— Nicolas, eu estou me arrumando! Espere-me lá embaixo!

— Tá bom! Te amo! – ele vai sem pensar duas vezes.

“Idiota! Tá pensando que vai me enrolar, Nicolas! Você vai ver o que é bom! – ela pensou.

Instantes depois escuta alguém bater na porta de novo.

— Já falei pra você me esperar lá embaixo, Nicolas! Não insista! – mas continuaram batendo e ela foi atender.

— O que é? – foi falando ao abrir a porta, mas deu de cara com Martin. — Ah! Oi! Desculpe, eu pensei que fosse outra pessoa.

— Sem problema. É... Eu vim aqui porque sua amiga pediu pra te avisar que é pra você encontrar com ela lá embaixo, porque ela teve que sair um pouco antes.

“A Bia deve estar tentando falar com seu affair.” – deduziu. — Só estou terminando de me arrumar e já desço.

— Eu vou te esperar aqui fora pra te acompanhar.

— Não precisa!

—Faço questão...

Julie achou aquilo muito gentil e acabou concordando. E além do mais, Nicolas estava merecendo vê-la ser cortejada por alguém. Ela entrou pra dar os últimos retoques, conferiu todos os detalhes, mas já estava bem mais escuro, não deu pra ver muito bem. Finalmente pegou uma capa e saiu.

Martin estava do lado de fora já com um candelabro aceso.

— Senhorita... – deu o braço pra ela segurar.

— Podemos ir.

Momentos antes, Félix foi ao quarto de Bia e lhe disse que sua amiga Julie mandou avisar que encontraria com ela na festa. Disse que era porque Julie teria que conversar antes com o noivo.

Bia achou estranho que a amiga desse detalhes do que ia fazer pra alguém estranho, mas não quis que o rapaz percebesse que desconfiou dele.

Félix estava ansioso esperando Bia sair do quarto. Quando ela surgiu produzida, levou alguns segundos pra acordar. Chegou até ela e beijou sua mão. Depois a acompanhou até à margem do lago, onde embarcariam.

Nicolas estava no saguão, perto da escada, quando avistou Daniel passando em direção aos cômodos da parte baixa.

— Ei! Por favor! Senhor Daniel.

— Sim. – Daniel disse seco.

— Estou esperando uma correspondência do Brasil. É muito importante e confidencial. O gerente do Correio afirmou que ontem mandou um carteiro vir aqui entregar, mas não chegou em minhas mãos.

— Nem vai chegar. Carteiro nenhum vem aqui. Nem carteiro, nem ninguém. Se é que me entende. – encarou-o com um olhar que atravessava seu corpo.

— Eu preciso muito dessa encomenda. Por favor, confira com seus subordinados.

— Posso te garantir que nenhum estranho pisou nesta propriedade ontem.

Nicolas fez cara de aborrecido.

— Eu preciso conversar com alguém do Hotel sobre essa festa. Aconteceu um engano e acabou que eu e minha noiva ficamos em festas separadas.

— E...

— E eu quero desfazer esse engano, é claro. Se você puder.

— A sua noiva está em qual das duas festas? – Daniel se faz de desentendido.

— Numa festa surpresa. Mais um motivo pelo qual eu sei que ela não vai gostar e...

— O Senhor não pode ir a essa festa. O número de hóspedes é limitado. A não ser que ela queira acompanhar o senhor até o outro baile.

— Então eu vou falar com a minha noiva. Vou chamá-la.

— Acho que não vai precisar chamá-la. – diz um já boquiaberto Daniel ao ver Juliana deslumbrante descendo as escadas.

Ela trava no primeiro degrau que iria descer. Viu Daniel. E o pior, junto com Nicolas. Seu estômago ficou cheio de borboletas.

Martin percebeu o clima. E também sabia que o amigo não devia estar gostando nada de vê-los de braços dados.

Nicolas nem piscava. Ele estava certo de que ela aceitaria trocar o programa.

Daniel saiu de perto, mas não sem antes dar uma boa encarada nela, que sentiu o rosto queimar.

Por dentro, Daniel estava se corroendo de ciúme. Pensou até em mandar alguém dar um jeitinho de apagar o rapaz por algumas horas. Depois desistiu. Juliana jamais o perdoaria. Mas também não queria presenciar essa cena: os dois irem juntinhos pra festa. Ele sabia que Julie ainda estava com muita raiva dele, pelo menos queria se explicar... Mas agora Nicolas tinha aparecido e estragado seus planos. Foi saindo de perto devagar, para tentar ouvir uma parte da conversa.

— Você está linda! – disse Nicolas, sorridente.

Julie estava séria, e assim continuou.

— Obrigada.

— Por algum erro ficamos em festas separadas! Mas o Sr. Daniel disse que, se você quiser, ele pode tirar você dessa festa surpresa pra irmos juntos na outra.

— Mas era só o que me faltava! Eu não quero ir à outra festa, tá entendido? Eu vou na festa que EU escolhi! Pelo menos desta vez fui eu!

Daniel ouviu aquilo, estupefado. “Ela deu um fora nele?” – sorriu por dentro. Teve vontade de se virar e correr até ela e abraçá-la. Só vontade, é claro.

— Julie! Eu sei... você está com raiva, com razão, mas a gente pode conversar na festa. Não torne as coisas mais difíceis.

— Quem está tornando tudo um inferno é você! Já estou cansada de você ficar adiando nossa conversa! Deixe-me em paz, preciso pensar! Quero ficar na minha hoje, “pensando”! A gente conversa a sós amanhã.

Passou por Nicolas acompanhada por Martin, que tentou fazer cara de paisagem. Daniel se adiantou, antes que Julie pudesse falar alguma coisa com ele. Nicolas ficou bolado com o jeito que ela saiu. E é claro: preocupado. Estava com sua cabeça a prêmio. O melhor era não insistir em falar com ela nervosa como estava. O dia já tinha sido tenso demais e precisava relaxar. Mas aquela sensação de ter visto o padrasto andando pelo vilarejo persistia e, pensando nisso, acabou esquecendo de seu desentendimento com a noiva.

Os hóspedes desciam para o saguão. Alguns eram levados pra fora do hotel, outros continuavam ali, aguardando. Alguns minutos depois ouviram uma voz estridente atravessar o salão.

— Boa noite! Cheguei para levá-los ao baile que o Hotel Castellamare preparou para dar as boas-vindas a todos vocês essa noite!

Só então dois funcionários que acompanhavam Débora acenderam tochas pra iluminar a escada. Todos estavam atentos, em silêncio, nesse momento.

Débora foi descendo as escadas com uma cobra albina pendurada em seu pescoço. Uma senhora japonesa caiu desmaiada ao ver o animal. Chegando ao final da escada, Débora tirou a cobra e entregou para um dos funcionários, que saiu de lá com ela se enroscando nele. Débora olhou pra todos com ar misterioso. Um olhar de quem sabia mais do que eles, sabia tudo o que eles passariam. E se divertia com aquilo.

Mano chegou e se juntou ao grupo.

— Sigam-me. Nosso baile é no subsolo, no ‘Salão dos Ossos’.

Começaram a querer conversar de novo, mas ela interrompeu.

— Se eu fosse vocês ficaria em silêncio. Nós entraremos na ala onde estão guardadas as recordações mais obscuras da história desse lugar. Um passado que nunca será esquecido.

Depois disso as pessoas se calaram e começaram a suspeitar um pouco desse baile.

Atravessaram alguns salões até chegarem num corredor de paredes brancas e chão de tábuas. Mais adiante havia uma grade de frente para uma escadaria que levava ao subsolo.

O grupo avançou até perto da grade, onde Débora parou.

— Vocês estão diante do guardião do castelo. Vejam!

Se aglomeraram para olhar o que havia por trás das grades: uma armadura como se fosse realmente um guardião medieval.

— Nunca, jamais abram esse portão! Essa é a armadura de um dos mais violentos moradores desse castelo. Era ele quem arrastava os presos de guerra até o calabouço. E lá atrás daquelas paredes, muitas histórias terríveis... – ela deixou o resto em suspense.

Havia um intérprete que repetia em japonês tudo o que ela falava.

Mano achou aquela história fraquíssima, boa pra assustar garotinhas de 7 anos. Deu uma olhada no tipo de tranca da grade e teve uma ideia muito melhor.

— O que aconteceria se a grade fosse aberta? – ele perguntou.

— Se a grade por acaso fosse aberta... Não poderíamos garantir mais nada.

O grupo começou a cochichar.

— Preciso que façam silêncio para descermos agora.

Olharam pra escuridão da escada e muitos ali engoliram em seco. Descer aquela escada era como saltar no escuro. Ficaram calados, com medo.

— Podem me acompanhar!

..............................................................

Julie e Martin foram caminhando para outra direção no hotel.

— A Bia deveria ter marcado num lugar mais perto do saguão. Olha o tempo que estamos levando pra sair daqui.

— É. O Hotel é muito grande. Mas esse é o melhor caminho pra você chegar à festa. Pode ter certeza.

Eles atravessaram alguns salões e passaram pela cozinha. Viraram à direita e saíram num salão com vidraças para o lado de fora.

— Sua amiga disse que te esperaria ali naquela porta. Pode ir até lá, eu tenho que voltar. Estou escalado para trabalhar na outra festa.

— V-vou ficar aqui sozinha?

— Pode ir não tem erro. – Martin falou com tanta convicção que Julie acabou acreditando. Foi andando lentamente até a porta, que estava aberta.

Martin correu pra tentar acompanhar Débora.

Quando Julie foi se aproximando da porta, bateu certo pavor. Estava escuro e tinha uma sensação estranha de que estava sozinha. Foi andando meio vacilante, pisou do lado de fora, deu três passos e parou.

— Bia! – olhou pros lados e não viu ninguém. Suas pernas começaram a fraquejar.

— Bia!

— Olá Juliana! – disse uma voz vinda um pouco mais de atrás de onde ela estava. — Acho que finalmente nos encontramos!

— Ela se virou. Reconheceria aquela voz até mesmo no escuro. Ao se virar logo percebeu aquele par de olhos brilhando em sua direção.

— Você!

......................................................................

Débora foi descendo as escadas. Ninguém queria ficar por último e duvidar da história do tal guardião. Olhando escada acima, ele parecia ainda maior. Porém pra um deles, quanto pior, melhor seria. Para Mano aquilo não passava de uma enganação. Ele olhava pra armadura e não sentia nada de errado com ela. Era aí que estava o problema. Aquela armadura o intrigou. Por que inventariam uma história dessas? Qual seria a finalidade disso? Afugentar hóspedes medrosos daquele lugar?

— Vamos! – uma mão puxava seu casaco.

— Ah! Eu só queria conferir uma coisa aqui.

— Nem pensar! – falou Clarisse. — Da última vez que você abriu uma porta eu quase morri de susto!

— Ok, ok. Vou deixar pra conferir mais tarde então. Lá pela meia-noite.

— Não conte comigo!

Débora párou pra dar alguns avisos.

— Até chegarmos ao salão dos ossos, e vocês logo verão o porquê desse nome, quero o máximo de silêncio. Os convidados especiais já estão nos esperando.

— Está tudo escuro, não to vendo nada! – diz um dos amigos de Nicolas.

— Aqui embaixo, é um pouco estreito, vocês vão ter que me seguir em fila, porque vamos passar por um corredor que só cabe um de cada vez.

Foram andando por um corredor mais largo até chegarem numa porta, onde estava o tal corredor. Quando Débora estendeu o braço com o candelabro lá dentro, os hóspedes não acreditaram no que viram.

— Tenho certeza de que esse baile será inesquecível! – Débora deu um sorriso diabólico.

— Eu não vou nessa loucura aí não! Nicolas! Vamos voltar! – Talita fala. — Pra mim já deu!

— Que isso, relaxa. Tá até excitante.

— Se quiser eu acompanho a moça. – Mano provocou.

— Pensando bem, eu resolvi continuar. – ela disse, com raiva.

Débora entrou sem esperar e foi andando rápido. A parede do corredor era feita com ossos humanos, empilhados como tijolos.

— Meu Deus! Que horror! – Clarisse falou. — Estou passando mal, eu não posso ficar em lugares fechados.

— Vamos, ande logo!

— Que sinistro!

— Eu não vou entrar nisso aí! – uma das gêmeas gritou.

— Então é só voltar pela escada!

— Mas, e o homem da armadura! Eu não volto nem por nada, sozinha não!

Eles ouvem passos e uma claridade vinda das escadas.

— Ah, meu Deus! É ele!

Logo os últimos entraram pelo corredor. Mas era Martin, chegando com mais um candelabro.

— Até o candelabro é de osso! – alguém gritou desesperado.

— Não pode gritar! Você não ouviu? – outro sussurrou.

As paredes estavam pouco iluminadas, mas dava pra ver vez ou outra alguns crânios, alguns ossos.

Débora falava lá na frente:

— São ossos de presos de guerra. Não tinham como se desfazer de tudo aí tiveram essa ideia.

Ninguém queria imaginar como é que faziam pra desossar essas pessoas.

Era uns 50 metros de corredor sufocante. No final, Débora entrou num grande salão redondo, o Salão dos Ossos. Estava iluminado fracamente por candelabros e luminárias. Tudo era feito de ossos lá dentro. Era muito macabro.

Também havia um palco montado. Alguns convidados já estavam lá. Todos esquisitíssimos.


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Notas finais do capítulo

O baile continua no próximo. Comentem e dê alguma sugestão, por favor.Obrigada!



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