Filhos escrita por Bellah102, CaahOShea


Capítulo 2
Capítulo 1 - Casa


Notas iniciais do capítulo

O primeiro de muitos que virão.
Preparem seus corações, porque vem um monte de drama a caminho!



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Grace

                -Tem como ir mais devagar? – Perguntei de forma sarcástica, impaciente. Elijah tirou o pé do acelerador, deixando que o carro se movesse apenas pelo embalo. Lancei a ele um olhar sarcástico. –Nossa, você é tão engraçadinho... O comediante pode ir mais rapidinho? Eu não quero morrer de velhice antes de rever a mamãe e o papai.

                Ele acelerou até reavermos nossos vagarosos 60 KM/H.

                -A estrada está escorregadia e você não me deu tempo de colocar os pneus de neve.

                -Não precisa colocar pneus de neve se não tem neve!

                -A perícia vai discordar quando tirarem seu corpo frio e sem vida do carro capotado.

                Um arrepio percorreu minha coluna, mas provavelmente era apenas o estado de Washington sendo Washington no inverno.

                -Você é tão fúnebre às vezes, irmaozão...

                Ele riu de leve e ligou o rádio. Uma de suas rádios caipiras já estava sintonizada. Estendia a mão para mudar de estação, mas Elijah segurou meu pulso a meio caminho, sem tirar os olhos da estrada, como o motorista responsável que era.

                -Não toque no rádio do Elijah – Disse, calmamente – Elijah não gosta que mexam no seu radinho caipira. Elijah gosta de ouvir música Country. E Grace vai ficar caladinha porque está no carro do irmaozão dela.

                Suspirei, recolhendo a mão e cruzando os braços.

                -Posso ir com a minha vespa, então?

                Perguntei, pela milésima vez, mas novamente, ele fez que não com a cabeça.

                -É claro que não. Você vai congelar. E eu prometi à mamãe que eu cuidaria de você.

                -Sinceramente, Elijah. Você está ficando cada vez pior. Ela não precisaria saber.

                -Bem eu acho que ela notaria quando seus dedos ficassem pretos e caíssem.

                Revirei os olhos e alcancei o celular dentro da bolsa, ajeitando-me no banco, desativando o bloqueio do celular e abrindo o menu de mensagens.

                -O que está fazendo?

                Perguntou os olhos oscilando entre meu celular e a estrada úmida de granizo da noite anterior.

                -Mandando uma mensagem para Angela.

                Comecei à digitar, tocando a tela. Elijah está bancando o paizão de novo... Acho que – Senti o carro oscilar lentamente porém perceptivelmente para a esquerda. Levantei os olhos. Elijah tentava espiar meu telefone, ignorando totalmente a estrada, levando nosso carro na direção de uma vala.

                -ELIJAH! – Exclamei, alcançando o volante e virando-o para a estrada novamente, fazendo com que nós dois balançássemos violentamente. Assustado, Elijah se virou para o volante, segurando-o com as duas mãos, ofegante de repente. – Você quer matar a gente?!

                -Desculpe. Desculpe, Grace, eu...

                -É sério! Controle sua obsessão doentia pela minha amiga! É estranho! -            Eu disse, afundando no banco e escondendo o celular. Suspirei, vendo que ele estava realmente arrependido. – El, eu te amo. Mas você tem que ir com calma nesse assunto tá? Vai assustar a menina.

                Ele suspirou e assentiu. Vi-o espiar-me de tempos em tempos, mas não levantei os olhos para ele. Logo estaríamos em casa.

                A nossa casa cresceu a medida que subimos a colina, um reduto familiar em um mar de névoa gelada. Um sorriso encontrou seu caminho até o meu rosto e até o de Elijah.

                -Bem vinda ao lar, irmãzinha.

                Ele disse, sorrindo para mim e estendendo a mão livre. Apertei-a, sorrindo e olhando para fora.

                -É... Estamos em casa.

                -Nervosa?

                -Por quê?

                Ele olhou-me seriamente. É claro que eu sabia o motivo. Só evitava pensar nisso, ao contrário de Elijah, que parecia não tirar isso da cabeça havia um ano inteiro. Balancei a cabeça.

                -Ele não vai estar dentro da nossa casa, Elijah. É tão segura quanto sempre foi.              

                Ele assentiu, observando-me por um momento antes de soltar minha mão e manobrar para entrar na vaga de cascalho em frente à casa. O primeiro à nos receber foi Captain Buns, com seus latidos fortes e patas geladas em nossos ombros enquanto tentava lamber nossos rostos. Ri, empurrando-o de cima de mim. Nada decepcionado, ele atacou Elijah.

                -Oi CB!

                Ele saudou, acariciando o cachorro. Eu ri, aproximando-me para passar as mãos pelos seus pelos tricolores. Pobre Captain, já estava velhinho.

                -Elijah, diga o nome dele certo!

                -Não. Eu me recuso. É idiota.

                Fiz uma careta.

                -Pareceu uma boa ideia na época. Eu era só uma criança, por Deus, supere isso!

                Ele riu, beijando entre as orelhas do nosso velho Pastor Alemão. A porta da casa se abriu atrás de nós e mamãe saiu dela, correndo na nossa direção. Virei-me para ela e sorri, abrindo os braços para prendê-la em um abraço. Mesmo ela sendo pequena, eu nunca consegui passar de sua altura, o que era muito bom em termos de abraço – embora fosse ruim em outros milhares de aspectos.

                -Oi crianças, que saudade...

                Ela disse, apertando-me com força, e então puxando quase dois metros de Elijah para perto. Embora não fôssemos nem perto de crianças, mamãe seria sempre mamãe.

                A gola escondia as cicatrizes do pescoço – um dos maiores mistérios acerca dela, e algo que ela se recusava à falar sobre, assunto proibido na casa dos Black – e o casaco de camurça era macio ao toque. O cabelo estava preso em um coque desajeitado e caído para o lado. A botas pareciam ter sido enfiadas às pressas e ela estava sem polainas. Ela estava escrevendo, conclui com um sorriso.

                -Oi mãe.             

                Responde Elijah girando-a num imenso abraço de urso. Ela riu quando ele a pôs no chão e pegou minha mão e a dele, levando-nos para dentro.

                -Vamos logo antes que vocês dois peguem um resfriado!

                -Mas as malas...

                Ela me lançou seu olhar abrasivo – a Cara de Mãe – e imediatamente me calei, seguindo-a docilmente escadas acima. A casa estava quente e convidativa como sempre, com a calefação ligada a uma temperatura agradável e as lareiras acesas. Suspirei, tirando o casaco, pendurando-o e inspirando para sentir o cheiro de casa. Baunilha, madeira e luz do Sol.

                -Estão com fome? Adivinhem o que tem no forno?

                -Biscoito?!

                Elijah perguntou, com um sorriso radiante invadindo seu rosto. Esse é o meu irmão. Como o mantenho assim perto de Angela? Mamãe assentiu e ele correu para a cozinha. Nós duas rimos. Elijah nunca cresceria... Pelo menos não enquanto mamãe continuasse fazendo cookies para ele. Ela me abraçou e nós caímos sentadas no sofá à frente da lareira.

                -Cadê o papai?

                Perguntei, aconchegando-me em seu abraço.

                -Ele deve chegar da oficina a qualquer momento. No inverno, a garagem fica cheia. As pessoas usam mais os carros. Sabe como é querida, o de sempre – Ela respondeu, beijando o topo da minha cabeça. – E como foi a viagem?

                Dei de ombros, bocejando.

                -Cansativa. Isso e Elijah quase matando a gente tentando ver minhas mensagens.

                -Suas mensagens? – Mamãe uniu as sobrancelhas – Por quê?

                -POR NADA! Grace cala a boca!

                Gritou Elijah, da cozinha, com a boca cheia de biscoitos. Ri baixinho, dando de ombros para mamãe. Ela sorriu e revirou os olhos. Beijou minha testa e foi atrás de Elijah na cozinha. Fechei os olhos por um segundo.

                -Grace... É hora do jantar. Acorde, querida.

                Abri os olhos, bocejando. Estava no meu quarto. Acima de mim, os olhos negros do meu pai chamavam. Sorri e me espreguicei antes de abraça-lo com força, sentando-me na cama. Ele apertou-me contra ele, beijando o topo da minha cabeça.

                -Senti sua falta, minha coisinha linda.

                -Eu também senti a sua, papai.

                Suspirei, soltando-o e levantando-me da cama. Juntos, descemos as escadas até a mesa de jantar. Um frango estava deitado sobre a mesa em uma travessa, suculento e douradinho. Purê de batata, sopa de aboboras e uma torta de carne também faziam parte do menu, o que era bom já que, com dois lobisomens presentes, era possível que isso finalmente os satisfizesse – pelo menos por algumas horas. Senti-me salivar, mas obriguei-me a ir ao banheiro e lavar as mãos ao lado de Elijah, provocando-o ao empurrar seu quadril com o meu. Minha mãe beijou o topo da minha cabeça na saída do banheiro, indo à mesa. Sentamo-nos todos, conversando baixinho.

                Grande parte do assunto girava em torno das notas de Elijah e da sua incrível temporada no futebol. Eu me matinha a parte enquanto não falavam comigo. Era como tudo funcionava na nossa casa. Elijah era o menino de ouro e eu era o bebê. Cada um tinha sua área de dominância muito bem estabelecida desde que éramos pequenos. Porém dessa vez, extraordinariamente, Elijah parecia mudado. Já não falava tanto. Imaginei que quando chegasse em casa, isso passaria.

                -Qual o problema, filho?

                Perguntou mamãe, observando-o. Ele brincava o com purê distraidamente no prato. Levantei os olhos. Era aquele olhar perdido. Os olhares dos meus pais recaíram sobre mim. Encarei Elijah em silêncio. Alguém tinha que fazer alguma coisa. Eu vou salvar você do jeito que você me salvou, decidi.

                -Elijah está apaixonado. Por uma garota lá de Seattle.

                Elijah levantou o rosto assustado. Puxei as pernas para cima da cadeira para que ele não pudesse chutá-las. O silêncio se instalou na mesa. Porque você fez isso? Sabe como eles ficam quando estou com alguém! Dizia seu olhar. Normalmente era sempre fácil saber o que ele estava pensando. Mas distante como estava, estava ficando cada vez mais difícil.

                -Como ela é?

                Mamãe perguntou, sem conseguir conter um imenso sorriso, como fazia toda a vez que eu ou Elijah trazíamos novidades amorosas para casa. Romântica incorrigível, essa era minha mãe. Elijah não respondeu, encarando-me com raiva. Desviei o olhar para mamãe.

                -Ela é ótima. É minha melhor amiga. O nome dela é Angela.

                Elijah empurrou a cadeira e deixou a mesa, indo na direção da porta da frente.

                -Elijah!

                Chamou minha mãe, mais surpresa do que irritada.

                -Elijah.

                Chamou meu pai, mais rígido, mas Elijah bateu a porta atrás de si, saindo para o cenário nevado lá fora. Ouvimos a porta do seu carro bater, mas ele não ligou o motor. Mamãe fez menção de levantar, mas pousei minha mão sobre a sua, balançando a cabeça. Olhei para papai e ele assentiu. Mamãe era ótima para desilusões amorosas e fracassos, já que podia fazer você se sentir melhor num instante. Papai era pé-no-chão. Ele era quem nos incentivava a ir em frente e falar sobre nossos problemas e era do que Elijah precisava agora. Falar.

                Quando paramos de falar um com o outro?

Elijah

                O pai ficou sentado do meu lado por um longo tempo, a mão pousada sobre minhas costas enquanto eu estava na minha concha, afastado do mundo, os braços cruzados sobre o volante, a cabeça escondida nele.       

                -Eu gosto muito dela, pai.          

                Sussurrei, quebrando o silêncio longe de ser desconfortável. O pai fazia isso o tempo todo. Fazia parecer que os problemas não eram nada e assim, era mais fácil de falar sobre eles. Mas nada parecia deixar mais fácil de falar sobre ela. Era como se, se eu falasse, ela fosse sair daquele pequeno espaço onde eu a guardava e não ser mais algo apenas meu - pelo menos aquela pequena parte imaginária. Não queria me decepcionar idealizando algo que eu nunca poderia fazer. O pai respirou fundo, assentindo e pensando, sem pressa de voltar para a casa.

                -E ela gosta de você?

                Meu estômago se revirou, assustado como uma garotinha em um noite de Halloween.

                -Eu não sei. Eu acho que sim.

                Ele assentiu, coçando a barba por fazer que fazia um ruído engraçado.

                -Esse é o problema?

                -O problema é que eu sou um idiota envergonhado. Esse é que é o meu problema.

                Balancei a cabeça, lembrando-me do incidente na biblioteca, e depois, no café. Meus olhos enchiam-se de lágrimas estúpidas de frustração, me fazendo querer socar o volante com força até que meus dedos sangrassem ou que o airbag estourasse. O pai esperou até que eu me explicasse, e quando eu não o fiz, ele me pressionou de leve. Sua postura era clara. Não precisa dizer nada, se não quiser.

                -Você quer me dizer o que aconteceu?

                Pensei por um segundo e soltei o ar com força, ajeitando-me no banco, encostado às costas do banco. Estava tão cansado. Olhei para o teto do carro, frustrado.

                -Quando eu chego perto dela é como... Cara, é tipo pegar fogo. Não dá para respirar direito. Tudo gira. Aí ela vem, e mexe naquele cabelo loiro dela e pisca aqueles olhos azuis para mim e diz: "Oi Elijah, como vai?" - Disse, falhando miseravelmente na tentativa de imitar sua voz e sotaque. Ah, o sotaque... Soltei o ar. - E quando dou por mim estou fazendo alguma besteira estúpida, ou falando alguma besteira estúpida ou... Tropeçando... Pai, você já me viu tropeçar em alguma coisa?

                Ele balançou a cabeça devagar, pensativo.

                -Não. Você tem a cabeça no lugar. Agora Grace e Lizzie...

                -Exatamente!

                -Então o que você quer dizer é que você fica tímido?

                -Tímido. - Me permiti soltar um riso. Antes fosse. - Uma secundarista no seu primeiro baile é tímida. Uma criança de 6 anos conhecendo os amigos dos pais é tímida. Eu sou o cúmulo do tímido. Consigo tropeçar nos meus próprios pés, derrubar uma pilha de livros e elogiar as orelhas dela em menos de 1 minuto.

                Nos encaramos por um segundo e então começamos a dar risada. Sim, de fora aquilo era engraçado. Mas o meu nervosismo incômodo era a única coisa entre Angela e mim e isso era horrível. Era tão frustrante! O pai pousou a mão sobre o meu ombro e apenas olhou para mim por um longo tepo. Eu nunca tive dúvidas do orgulho que a minha família nutria por mim, mas aquele, nos olhos do meu pai, naquele momento, era um tipo diferente de orgulho.

                -Você sabe que é incrível, não sabe? - Dei de ombros. As pessoas me diziam aquilo o tempo todo, e era o que pareciam ver. Mas, de algum modo, por dentro, eu ainda me sentia o moleque magricela que era empurrado contra os armários da Forks High pelos seniores. E embora eu tivesse virado um dos seniores - exceto pela parte de intimidar os outros - eu sempre voltava a ele quando Angela surgia - Angela é uma pessoa. Ela só está te intimidando porque você a colocou em um pedestal. Só... Pense nela como sua irmã e dê a cara ao tapa - Ele deu de ombros olhando tranquilo para a nossa casa. Sabia que ele estava pensando na mamãe - Quem sabe? Ela pode estar esperando que você o faça;

                Soltei o ar, balançando a cabeça, incrédulo.      

                -Até parece...

                Ele deu de ombros novamente.

                -Você não vai saber se não perguntar.

                Nós ficamos em silêncio enquanto ele esperava que suas palavras caíssem sobre mim. Mas a mesma pergunta que sempre me atormentava retornou.

                -Pai.

                -Hum?

                -E se ela não gostar de mim? Da forma que eu gosto dela?

                Ele deu de ombros e apertou meu ombro com firmeza.

                -Você a conquista. A convence. E se ainda assim ela não quiser, você sempre terá a sua família. É a vida.

                -Mas...

                Soltei o ar, as palavras presas na garganta. Ele sorriu de leve, aquele olhar diferente novamente nos olhos.

                -Você realmente gosta dela, não é?

                Assenti. Ele deu de ombros, mas algo na sua expressão dizia que ele estava escondendo algo.

                -Eu acho... Que você devia dizer isso à ela.

                Com isso, ele abriu a porta do carro e voltou para casa devagar, sem pressa e foi recebido na entrada com um beijo da mãe, que olhou na minha direção e fez sinal para que eu entrasse. Pedi que ela entrasse com um aceno e ela assentiu, suspirando e sendo surpreendida ao ser puxada pela cintura para dentro da casa. Voltei a cruzar os braços sobre o volante e respirei fundo.


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Notas finais do capítulo

O próximo capítulo é lindo e foi muito divertido escrever.