A Aurora escrita por rkaoril


Capítulo 9
E o vento levou (o bafo do dragão)


Notas iniciais do capítulo

Queridos leitores - minhas mais sinceras desculpas.
Após uma imprevista tempestade, o meu servidor de internet parou por aproximadamente duas semanas e eu não pude postar. Agora, já que devo um par de capítulos vou postar o dez logo após esse.

Aproveitando lembrar que a segunda temporada será sobre as Cronicas dos Kane, e se precisarem dos links para baixar me peçam nos comentários.

Atenciosamente, RKaoriL.



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HÁ UM LIMITE de quanto uma pessoa pode suportar.

Primeiro, eu mal tinha dormido/me alimentado o dia todo. Segundo, eu tinha acordado no meio da noite em meio a uma tempestade de raios e tinha sido atacada por uma bruxa. E terceiro, eu tinha sido trancafiada em um sarcófago de barro.

Após ter de alguma maneira apavorado o caixão de barro, eu tive que esperar uma meia hora até o meu corpo se lembrar que tinha que bombear sangue pelas veias, e mesmo que eu pudesse me mover, era muito difícil andar corretamente com suas pernas dormentes. Eu cambaleei pela floresta, caindo um tombo a cada dois passos e sentando por dez minutos em raízes tentando recuperar o fôlego – para uma filha da noite, eu estava bem rodada.

Em meio a uma tempestade de raios, ter recém saído do meu corpo e voltado para um caixão de barro, eu apenas deitei minha cabeça contra o tronco da árvore e apaguei – e esse foi o meu maior erro.

Eu tive um sonho estranho no qual eu flutuava por nuvens de trevas me sentindo tão leve quanto uma – e então eu ouvia um latido, muito alto, que vinha mesclado com palavras em uma voz estranhas. Ei garota! – dizia a voz – Acorde!

E então eu acordei, soltando um grasnado de susto quando as raízes da árvore me envolveram.
– Ah não, não, não! – eu gritei quando a raiz me apertou contra o tronco, como grandes tentáculos vegetais. Oh, eu estava louca – primeiro fome, então tempestade, caixão de barro e agora isso? Não, era de mais para alguém com meu nível de paciência – ME LARGA! – eu vociferei, e juro que a árvore deu um pulo eriçando as raízes para cima, e temporariamente me libertando de seu aperto. Vou falar a verdade para você – eu não desperdicei a oportunidade: dei no pé assim que foi possível, correndo como uma condenada.

Sendo de dia, eu naturalmente caí a cada dois passos – de novo – e tive que me desviar de galhos espinhosos estranhamente baixos (fala sério, eu tenho 1.55!) e raízes muito travessas. Resultado: quando cheguei ao que parecia a civilização estava parecendo uma campeã dos jogos vorazes.

A civilização não era tão civilizada. Eu podia ver uma longa autoestrada que não terminava no horizonte. Na minha frente havia um loja dessas de madeira de beira de estrada que vende todo o tipo de coisas, essa era um tanto estranha: construída de pedra como um fortaleza, pequena como uma lojinha. Quando cheguei na porta da loja, dei de cara com uma daquelas plaquinhas de boas-vindas, mas essa tinha uma escrita engraçada que compreendi como grego – a mesma da carta de Namesis e da enciclopédia de flores da minha avó, que eu ressalto ser muito suspeito.

A escrita dizia “Que a graça me guie”. Eu levantei uma sobrancelha para aquilo – era realmente uma frase familiar, como uma canção de ninar que você tem certeza que já ouviu mas não se lembra a letra. Eu girei a maçaneta gélida e dei uma passo para frente – e quase enfartei quando vi o lado de dentro.

Dentro era absurdamente grande em comparação ao lado de fora, feita de pedra e parecendo uma taverna da idade média. Ela tinha várias mesas redondas feitas de madeira ao redor, algumas estavam ocupadas com um pessoal estranho – a maioria ruiva, usando kilts e bebendo cerveja como bárbaros. Havia uma melodia de gaita de fole no ar, na qual um grupo maior de pessoas pulava, batia palmas, brigava e dançava numa área grande sem mesas, rindo e se divertindo com seus kilts e cabelos multicoloridos.

Eu me dirigi pelo bar – ou taverna – tentando passar pela multidão de escoceses e procurando um balcão ou alguém que parecesse trabalhar ali. Eu o encontrei, era uma estrutura de tijolo à vista com maquinas de refrigerantes às costas, um homem ruivo apoiado pelos cotovelos conversando com uma moça sentada em um dos bancos altos do balcão. Quando eu estava à alguns metros do balcão, a moço se virou para mim.

Ela era definitivamente digna do meu ódio: usava um belo vestido escocês azul celeste, e sua aparência é difícil de definir. Imagine o tipo de cabelo mais belo, a cor e o tipo dos olhos, o tom da pele e os traços faciais. Era assim que ela se parecia: seus olhos constantemente mudavam de cor, cada vez assumindo uma aparência mais bela – uma hora azul celeste como se vestido, outra transparentemente cinza, outra de um verde esmeralda, outra um castanho quente. Seu cabelo alternava entre cachos castanhos desgrenhados, um loiro dourado liso até a cintura, um ruivo ondulado e um preto brilhante caindo em cachos. Sua pele hora rosada albina, hora pêssego, hora negra chocolate estava definitivamente brilhando. A única coisa que não mudava era sua expressão: um toque de malícia com interesse.
– Eevelyn – ela disse, sua voz parecia veludo líquido – sente-se ao meu lado.

Eu me sentei, pasma de mais com sua aparência para fazer qualquer outra coisa. O barman me serviu um copo grande de coca-cola que eu ignorei automaticamente. A mulher estalou seus dedos, e então deu um bocejo digno de burguesa.
– Como você já deve ter percebido – ela disse, tomando um gole de seu cosmopolitan* - eu sou Afrodite, e eu estou aqui para te pedir um favor.
– Eu já estou em uma missão – me surpreendi falando isso, e então ela já não parecia mais tão deslumbrante (embora ainda odiosamente linda) – eu não tenho tempo de ficar fazendo favores para vocês, deuses. Eu tenho que encontrar um modo de chegar em Los Angeles em 3 dias ou o mundo acaba, não sei se você sabe. – ela deu um sorriso digno de perua.
– É exatamente por isso que eu vim falar com você – ela disse, tomando outro gole de sua bebida – veja bem, Hermes roubou minha escova de cabelo...
– Compre outra. – eu recomendei.
– ... mas não é uma escova comum. Eu a ganhei do meu marido, Hefasto, e é extremamente importante e eu vou estar em uma grande encrenca se não encontra-la.
– Suponho que essa escova seja feita de ouro? – eu provoquei.
– Platina encrustada em diamantes. – ela corrigiu – E é extremamente valiosa. Como eu ia dizendo, Hermes roubou a minha escova e antes que eu pudesse tentar negociar de volta, ele a trocou com Dionísio por um garrafão do melhor vinho da Itália. Dionísio fez o preço de uma maçã de ouro do Jardim das Hesperides, e se você as conseguir para mim eu te dou um jeito de chegar à LA. – eu pisquei para ela.
– Por que você mesma não vai buscar? – ela suspirou.
– Já te disseram que não podemos exatamente sair quebrando tudo e pegar o que queremos? – eu assenti – Bem, por mais incrível que pareça essa regra também se aplica a mim. – ela disse – Eu vou te deixar em frente às macieiras, no momento em que você pegar a maça você vai aparecer aqui, na minha frente, e eu te darei sua recompensa.
– Você fala sério? – ela assentiu.
– Você concorda Eevelyn? – ela me disse, e eu não precisei de visão de raio-x para perceber que estava tramando alguma além de me mandar colher maçãs. De qualquer forma, que outra escolha eu tinha?
– Certo. – eu disse, e tomei um longo gole da minha coca.
– Ótimo. – disse Afrodite satisfeita.
– Boa sorte baixinha. – disse o barman, e quando eu olhei para seus olhos azul-transparentes percebi que era extremamente familiar.
– Você... – eu comecei, mas quando vi de novo, estava em outro lugar.

Um belo outro lugar, aparentemente. Eu não sabia que hora era nesse lugar, mas quando deixei a Carolina do Norte era no máximo um pouco depois das duas da tarde, mas lá era no meio do por do sol. Até onde eu podia ver, um vale oculto por névoa – aquela névoa comum que todos conhecem – se estendia ao meu redor, seguido por lindas colinas e grandes árvores de eucalipto. Na minha frente, havia uma das coisas mais assustadoras que eu já tinha visto – um dragão, até sua calda mantinha-se grossa como um poste de luz, ele tinha tantas cabeças que eu havia perdido a conta nas 26 e eu tinha certeza que mais do dobro desse número se encontrava debaixo das visíveis, que caíam no chão parecendo um monte de macarrão. Depois do dragão próximo à mim, havia um bosque de macieiras com maçãs douradas em seus galhos.

Eu já estive em muitos bosques de maçãs na minha antiga escola, a Cherry High School, mas maças realmente não tinham cheiro até ir para a panela, quanto mais antes de serem colhidas – aquelas maçãs douradas eram, obviamente uma exceção: seu odor doce e suave chegava até em mim, e de repente o café da manhã não tomado se tornava mais necessário.

Um passo em falso na direção das maçãs e eu ouvi um som estranho, e olhando para trás sombras se enroscavam, tomando forma em lindas garotas de mantos gregos brancos, pele dourada e cabelos negros pela cintura arrumados ao mais clássico estilo grego.
– Regressa-te – disse uma das garotas, sua postura era infinitamente irritante – o Jardim Sagrado não é um dos teus assuntos.
– Com licença – eu respondi – sim é meu assunto, obrigada. – elas estreitaram seus olhos negros para mim.
– Invasora – disse outra – esse é vosso último aviso: regressas ou morrerás. – eu comecei a caminhar na direção das maças, cuidadosamente evitando o rabo do dragão.
– Desculpe – eu disse – questão de vida ou morte.

Quando eu estava mais ou menos no meio do caminho de atravessar o dragão, uma das vozes gritou.
– LANDON! – e o dragão despertou com um pulo, balançando sua calda que chicoteava meus pés, os deixando doloridos enquanto eu dava com as costas na grama prateada.
– Ai. – eu disse, então o dragão rugiu com pelo menos metade de suas cabeças, e um forte vento amarelo veio em minha direção.

Infelizmente, não era simplesmente um vento amarelo. Era o bafo do dragão, que cheirava a uma mistura de rato morto com eucalipto estragado. Dei um grasno levantando com um pulo e desviando novamente de seu rabo, que avançava como um chicote hiperativo. Enquanto tentava desviar de seu rabo, seu bafo me entorpecia fazendo meus olhos lacrimejarem, meu nariz arder e minha garganta apertar. Para derrotar o dragão eu precisaria acabar com aquela catinga.

Primeiro eu saquei Retaliadora, desviando de sua calda na névoa amarela malcheirosa ao meu redor e fazendo o possível para não me cortar/matar. Quando eu falhei em desviar, caí por cima de sua calda, Retaliadora na mão enquanto ele me balançava como se eu estivesse dentro de um Kamikaze. Antes que eu pensasse em me enjoar, dei um rápido golpe na calda do dragão. Ela não foi cortada fora, mas realmente fez algum dano: o dragão gritou de dor me arremessou com sua calda na direção das macieiras, poucos metros de uma suculenta maça dourada.

Eu saquei Retaliadora, as costas no chão e as pernas doloridas de mais para que eu pensasse em me levantar. Pelo menos eu não estava mais na névoa de mau hálito – pensei enquanto o dragão virava seus cem pares de olhos na minha direção, suas muitas cabeças sibilando enquanto ele gritava e corria na minha direção, invocando outra névoa malcheirosa. Quando ele estava a uma distancia relativamente perigosa, comecei a tentar me levantar, o que era muito difícil com suas costelas ardendo. Se eu tivesse um pedaço de ambrósia por perto... mas eu não tinha tempo de vasculhar a mochila, apertei os pés doloridos contra o chão soltando um grasno, enquanto o dragão mandava outra série de baforadas na minha direção, dessa vez tão espessa que eu não podia ver ele se aproximando. Inutilmente, golpeei a névoa amarela com a espada, sabendo que era uma perda de tempo tentar alcançar o dragão que logo me faria em pedacinhos.

Por mais incrível que pareça, assim que eu golpeei o ar uma rajada de vento soprou sobre o monte tão forte que eu me desequilibrei caindo no chão segurada apenas pela grama. O dragão não teve tanta sorte, tendo sua névoa de bafo soprada em sua direção, ele se desequilibrou no mau cheiro e foi soprado em direção à queda da colina.

Tão perto das maçãs, mas com o vento tão forte quanto um furacão, eu me arrastei pela grama, usando-a como a própria Lara Croft faria. Quando estava perto o suficiente de um galho baixo repleto de maçãs, um grito raivoso ecoou pelo monte e algo foi arremessado na minha direção. Deslizei com esse algo um pouco para longe do galo, sendo presa entre as pernas de uma das Hesperides.

Ela estava usando uma daquelas adagas antigas de cerimonia, e mesmo com o vento seriamente ameaçando leva-la, ela tentava me esfaquear. Eu facilmente dominei sua adaga, dando impulso junto ao vento para parar em cima dela do modo como ela fez comigo, a adaga levada com o vento e Retaliadora em sua garganta.

Tão perto da morte, a Hesperide me fitou com olhos como argila vulcânica, tão cheios de tristeza e impotência. Eu fitei aqueles olhos, e instantaneamente soube que não poderia mata-la, era só uma ninfa fazendo seu trabalho. Tão próxima de mata-la, embainhei Retaliadora com ela ainda entre minhas pernas, e quando levantei o vento parou, a Hesperide ainda no chão.
– Você me deve sua vida. – eu disse, e então peguei uma maçã.


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Notas finais do capítulo

*cosmopolitan - um drink caro americano, geralmente a preferência de mulheres de classe alta.



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